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NA EVOLUÇÃO FISIOGRÁFICA DAS FAIXAS COSTEIRAS

3 ACÇÕES NATURAIS E ANTROPOGÉNICAS CONDICIONANTES NA EVOLUÇÃO FISIOGRÁFICA DAS FAIXAS COSTEIRAS

3.2 Acções Antropogénicas

3.2.1 Actividades Potencialmente Geradoras da Evolução da Linha de Costa

3.2.1.1 Aproveitamentos hidráulicos

A construção de barragens, com a criação de albufeiras é encarada como uma forma de trazer mais valias para uma Região ou para um País através: da produção de energia hídrica, da criação de condições para a prática de desportos náuticos com consequente fomento do turismo, constituição de reservas de água para uso agrícola e de abastecimento às populações, controlo de cheias, criação de condições para a navegabilidade comercial, entre outras.

O aproveitamento energético dos rios, através da construção de barragens constitui actualmente uma componente indispensável do fornecimento de energia renovável à sociedade. Mas os aproveitamentos hidráulicos estão a reduzir drasticamente o caudal sólido transportado para o mar, agravando as erosões na costa (Veloso-Gomes e Taveira-Pinto, 1997). Este é um problema que assume proporções à escala mundial.

Os aproveitamentos hidráulicos conduziram no século XX, e em particular na segunda metade desse século, ao enfraquecimento das fontes aluvionares que atingiam a orla costeira. A retenção dos sedimentos nas barragens (em alguns casos) e de “sedimentação” nas albufeiras (a montante e a jusante de cada albufeira), aliada a uma redução da capacidade de transporte sedimentar dos rios por atenuação dos campos de velocidades tem impactes negativos nas quantidades de sedimentos que atingem os estuários, agravando a erosão da costa.

Por outro lado são muito significativas as alterações que têm ocorrido a nível de bacias hidrográficas com impactes potenciais na redução da capacidade erosiva dos solos e por conseguinte dos montantes de sedimentos transportados pelos sistemas hídricos: controlo da erosão nos solos onde se pratica a agricultura, regularização e canalização de margens, protecção de taludes, revestimento de solos em zonas urbanas e em vias de comunicação, actividades de florestação.

A uma escala geológica, a subida generalizada do nível das águas do mar vai, por sua vez, dificultando o transporte para o mar dos sedimentos que atingem os estuários, provocando progressivos assoreamentos dos troços inferiores desses estuários. Como muitas das actividades portuárias e de navegação estão localizadas nos estuários, as necessidades de dragagens aumentam, com retirada de volumes sedimentares dos mesmos.

Riscos de Exposição de Frentes Urbanas para Diferentes Intervenções de Defesa Costeira

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A quantificação do transporte sedimentar associado aos rios que atinge as zonas costeiras é de importância crucial para a compreensão dos fenómenos de erosão (ou de migração das praias para o interior) bem como para a previsão da evolução desses fenómenos ao longo das próximas décadas. Essa quantificação é difícil pelo que será prudente apontar ordens de grandeza dos valores em jogo. Em relação à situação em Portugal, apresentam-se alguns dados que ilustram as alterações em curso. A tabela 3.17 indica o número de barragens localizadas em território nacional com albufeiras de capacidade superior a dez milhões de metros cúbicos bem como o período da sua construção. Mais de dois terços da bacia do Douro está localizada em Espanha e aí existem grandes aproveitamentos hidráulicos.

Tabela 3.17: Número de barragens com albufeiras de capacidade superior a dez milhões de metros cúbicos, localizadas em território nacional (baseado em dados do INAG, 2002).

Ano de entrada em funcionamento

Bacias hidrográficas Até 1940 1941 a 1960 1961 a 1980 Desde 1981

Minho Lima 2 Cavado 4 2 Ave 1 Douro 1 1 6 4 Vouga Mondego 1 3

Em termos de áreas e de caudais, a importância relativa das bacias dos rios Minho, Lima, Cávado e Ave na produção e transporte de sedimentos é pequena, quando comparada com a do rio Douro. Após a análise dos volumes de dragagens à entrada do porto de Leixões no período de 1953 a 1978, foi estimado que ao porto de Leixões e proveniente da costa a Norte chegaria um valor médio na ordem dos 150000 mP 3 P /ano a 180000 mP 3 P

/ano (HP, 1981a). A bacia hidrográfica do Douro tem uma dimensão enorme, e o seu impacte na costa a Sul do porto de Leixões é muito importante. A área somada das quatro bacias a Norte de Leixões representa apenas cerca de 25% da área da bacia do Douro. Se for feito um estudo das áreas com capacidade de produção de areias essa percentagem desce para cerca de 16.5%.

Bettencourt (1997) refere que o fornecimento de sedimentos às áreas litorais diminuiu drasticamente nos últimos 30 anos, indicando os valores de 1.5 a 2 milhões mP

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/ano de sedimentos transportados pelo Douro até à foz, em regime natural e que esse valor é actualmente inferior a 250000 mP

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/ano. A retenção de sedimentos nas barragens é uma explicação que tem sido muito utilizada. Efectivamente, atentando nos dados de Oliveira (1990), apercebe-se que o rio Douro perdeu cerca de 86% da sua capacidade de alimentação do litoral devido à construção das barragens. Esse processo levou a uma diminuição muito significativa da bacia que efectivamente drena para o mar através do Douro. Dada a proximidade entre a barragem de Crestuma e a Foz do Douro, o Douro foi mesmo o rio que mais capacidade de transporte de sedimentos terá perdido. A HP (1981a) tentou caracterizar as fontes aluvionares da ria de Aveiro, considerando evidente um decréscimo regular no tempo desta fonte aluvionar. No período de 1952 a 1960 a expulsão natural de material aluvionar com característica de material de praia (cerca de 50% da expulsão total) seria de 360000 mP

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/ano, reduzindo para 310000 mP 3

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/ano no período de 1961 a 1963. No intervalo de 1964 a 1970 os valores obtidos rondariam os 220000 mP

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/ano e de 1971 a 1977 terão descido para os 165000 mP

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/ano.

A bacia do Mondego tem um impacte grande no volume de água retido, essencialmente desde a década de 80. Importantes obras de regularização da bacia hidrográfica do Mondego, executadas nas décadas de 70 e 80 criaram um sistema de barragens com grande retenção de caudal sólido. Resultantes destas intervenções foram as grandes e rápidas modificações da morfologia do estuário e da faixa litoral adjacente e uma alteração da dinâmica sedimentar estuarina e fluvial (Cunha e Dinis, 1998).

Com a indicação de alguns valores referentes às principais bacias hidrográficas do Noroeste português, pretende-se explicitar o evidente decréscimo de sedimentos a atingir a costa, mas também a dificuldade da sua quantificação efectiva.