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3 O REGIME JURÍDICO DO PLANO DIRETOR PARTICIPATIVO EM SEU

4.1 O Banco de Experiências e a Audiência do Plano Diretor

4.1.2 Bancos de Experiências no Paraná

4.1.2.1 Araucária: organização e realização para revisão do Plano Diretor (2005)

O conteúdo do Banco de Experiências de Araucária344, referente ao ano de 2005,

baseia-se na revisão do Plano Diretor da cidade, estruturação de núcleo para pesquisa e planejamento urbano, bem como habilitar gestores públicos e aproximar os representantes da sociedade civil. Araucária está inserida na categoria de cidade com mais de 20.000 mil habitantes, isto é, possui obrigatoriedade, segundo o EC, de Plano Diretor; é integrante da Região Metropolitana de Curitiba (RMC) e; está inserida em área de influência de atividade ou empreendimentos com impacto ambiental de caráter regional ou nacional345.

A caracterização do contexto local ressalta o acelerado processo de urbanização do município, ocorrido após a década de 1970 – influenciado, basicamente, pela instalação de indústrias, refinaria e a Cidade Industrial de Curitiba –, e a taxa de mais de 90% de população urbana, atualmente346. A proximidade com a Capital do Estado propiciou o processo de conurbação entre as duas cidades, uma vez que os custos de terrenos eram menores em Araucária. No ano de 1978, a Lei Municipal 512, instituiu um PD para o desenvolvimento da cidade, elaborado pela Coordenação da Região Metropolitana de Curitiba (Comec), mesmo órgão estatual que planejou a RMC347.

Em 2005 criou-se o Núcleo de Pesquisa e Planejamento Urbano (NPPU) da Secretaria de Planejamento do município, mediante Lei Municipal 1.547/2005, para organizar o processo anterior a elaboração o novo PD, com participação de técnicos da prefeitura (dois arquitetos,

343 Todos os dados utilizados para este item foram retirados da ficha padrão do Banco de Experiências do

Muncípio de Araucária. BRASIL. Ministério das Cidades. Banco de Experiências de Planos Diretores Participativos. Araucária. Organização e realização de atividades para a revisão participativa do Plano Diretor. Disponível em: <http://www.cidades.gov.br/images/stories/ArquivosSNPU/ExperienciasEstados/Araucaria_Or ganizacaoPR.pdf>. Acesso em: 10 nov. 2014.

344 Existem três fichas de experiências para a Cidade de Araucária. A ficha analisada, que trata das atividades

para revisão do plano diretor, é nomeada de “Organização e realização de atividades para a revisão participativa do Plano Diretor”.

345 BRASIL. Ministério das Cidades. Banco de Experiências de Planos Diretores Participativos. Araucária.

Organização e realização de atividades para a revisão participativa do Plano Diretor. Disponível em: <http://www.cidades.gov.br/images/stories/ArquivosSNPU/ExperienciasEstados/Araucaria_OrganizacaoPR.pd f>. Acesso em: 10 nov. 2014.

346 BRASIL, Araucária (2014). 347 Ibid.

um psicólogo e uma pedagoga)348. Mediante o Projeto Revisão do Plano Diretor Municipal, do NPPU, as seguintes etapas foram fixadas:

(I) organização interna do Núcleo de Pesquisa e Planejamento Urbano; (II) sensibilização de Prefeito e Secretários; (III) mobilização, sensibilização e capacitação dos técnicos municipais; (IV) aprovação e legitimação da proposta de trabalho pelo executivo municipal; (V) seminários para sensibilização da sociedade; (VI) levantamento de possíveis fontes de financiamento e captação de recursos; (VII) elaboração do termo de referência para viabilizar a abertura de licitação para contratação de consultoria para elaboração do Plano Diretor; (VIII) abertura e execução do processo licitatório para contratação de consultoria e (IX) constituição do grupo de trabalho da Prefeitura Municipal para acompanhamento do Plano Diretor349.

Outras etapas foram inseridas ao Projeto. Destaca-se a organização e a realização da 2ª Conferência Municipal da Cidade de Araucária e, ainda, a conscientização da sociedade e da administração pública da complexidade na construção participativa – o relatório do Banco de Experiências afirma a tendência tecnicista da construção do PD, por parte do Prefeito do Secretário de Planejamento da época (fator recorrente nas administrações municipais, com relação ao planejamento urbano, como já afirmado no primeiro capítulo da presente dissertação). Retira-se dos relatos das experiências nesse munícipio, diversas passagens com a utilização dos termos educação e sensibilização, tanto por parte da comunidade local, quanto da administração pública (secretários, diretores gerais, servidores municipais).

A Oficina de Sensibilização para Secretários e Diretores Municipais teve a participação de dez secretários, dezesseis diretores gerais e uma servidora municipal, com objetivo de estabelecer o compromisso da administração local na construção de um Plano Diretor Participativo.

No que se refere as estratégias para romper com o paradigma tecnicista na criação do plano de desenvolvimento urbano de uma cidade, verifica-se que o NPPU incentivou, se diversas maneiras (oficinas, atividades, apresentações, etc.) a fixação de uma cultura participativa no município de Araucária. É o relato da oficina:

As principais dúvidas e pontos discutidos após a apresentação foram: o modo como se daria o processo participativo e de que maneira outros processos de planejamento seriam considerados no Plano Diretor (Agenda 21 Local e Plano de Desenvolvimento Integrado da Região Metropolitana de Curitiba - PDI/RMC). Aplicaram, no final, uma dinâmica de grupo que pretendia reconhecer a leitura que os participantes tinham da cidade real e do cenário de cidade que poderia ser construído a partir do processo de discussão do novo Plano Diretor. A realização dessa dinâmica seguiu os seguintes procedimentos: (I) formação dos grupos de trabalho (as pessoas se reuniram em grupos

348 BRASIL, Araucária (2014). 349 Ibid.

considerando as cores de seus crachás para proporcionar a diversidade na discussão); (II) reflexão em grupo sobre as seguintes perguntas: O que é cidade? O que é um Plano Diretor e como ele pode contribuir para a construção da cidade?; (III) escolha de um relator para orientar o grupo quanto ao tempo disponível, anotar a síntese e realizar a apresentação no grande grupo; (IV) apresentação dos grupos350.

É importante ressaltar que a metodologia utilizada pelo NPPU, nessa oficina, especificamente, assim como nos demais relatos de experiências dos municípios analisados a seguir, é livre, uma vez que o Estatuto da Cidade não fixa estratégias ou obrigatoriedades a serem cumpridas pelo município na estruturação anterior aos debates em audiência pública, para a construção do PD. Com isso, entende-se que a multiplicidade dos resultados facilita a verificação de pontos em comum de cada experiência, uma vez que a espontaneidade e a cultura (ou não) de organização de cada município geriram os procedimentos escolhidos.

Outro evento realizado de característica semelhante foi a Oficina de Sensibilização dos gestores/técnicos da Prefeitura, momento em que o NPPU apresentou o Projeto de Revisão do Plano Diretor Municipal e procurou capacitar os técnicos da importância na participação de um Grupo de Trabalho – a fim de acompanhar e analisar a viabilidade das propostas da consultoria contratada, nas diversas fases de elaboração do PD, composto pelas Secretarias de Planejamento, Finanças, Obras Públicas e Urbanização, Governo, Gestão Ambiental, Agricultura, Comunicação Social e Procuradoria Geral do Município e coordenado pelo NPPU.

Segundo o Banco de Experiência, foram dez meses de “sensibilização da sociedade” mediante atividades: palestra com agricultores locais e o NPPU; palestra com ONGs, associação de moradores, empresários locais e conselhos municipais; debates em escolas municipais; evento de lançamento público do PD e a 2ª Conferência a Cidade; de todas as atividades, atenta-se para divisão de regiões para os debates em audiências públicas:

[...] a equipe entendeu que a divisão político/administrativa dos bairros não seria a divisão territorial apropriada para promover a discussão coletiva do Plano. Em função de processos de segregação espacial, próprios da realidade municipal, a população não se reconhecia enquanto morador de um bairro, mas sim, de uma comunidade menor cujo recorte espacial era normalmente o loteamento, menor do que o bairro. Um exemplo era a diferença encontrada entre o número de bairros (9) e o número de associações de moradores (mais de 50) existentes no município. Na área rural a realidade era outra. Ali, as comunidades eram muito menores do que as que se localizavam na área urbana. Por isso, optou-se por agregar algumas delas tomando por base a proximidade geográfica e a facilidade de acesso. Desta forma, para a definição dos locais de reuniões de discussão do processo participativo do Plano foram identificados os espaços onde a população se reconhecia enquanto

morador, definindo territórios que representassem a comunidade e na qual esta população se reconhece e se organiza351.

Tal relato reafirma a necessidade de mudanças no planejamento urbano, afirmadas no EC, de caráter participativo, para ao menos minimizar a desigualdade socioespacial dos municípios brasileiros. Fica claro que a população da cidade de Araucária teve maior liberdade de expressar-se entre a sua comunidade (não necessariamente do seu bairro). Entretanto, entende-se que os debates das audiências públicas devem incorporar diversas classes sociais também no mesmo espaço físico de debate, inclusive com objetivo de superar dicotomias que segregam a população em diversas comunidades. O projeto de cidade deve ser pensado em conjunto, para toda a coletividade, com a participação do cidadão, reconhecido com tal, independentemente de suas peculiaridades sociais, econômicas ou físicas.

A finalização dos dados informados no Banco de Experiências de Araucária não contempla, entretanto, os resultados de debates em audiências públicas. Todas as informações são anteriores ao processo de construção do Plano Diretor, mas demonstram grande mobilização na conscientização e modificação na cultura de planejamento urbano.

Dos relatos, retiram-se as seguintes recomendações e alertas: (i) forte ideia na Prefeitura de Araucária de que a construção do PD é uma atividade exclusiva de profissionais da área de planejamento urbano, contrariando à previsão da gestão democrática do EC; (ii) limitações de ordem financeira, identificadas pelo NPPU; (iii) importância da integração entre os servidores das diversas Secretarias envolvidas; iv) importância de avaliações e relatórios periódicos com os resultados das oficinas.

Ponto que poderia ser questionado à luz do art. 3º, § 1º, da Resolução nº2572005 do Conselho das Cidades é o fato de que a coordenação de todo o procedimento da elaboração do PDP foi elaborada pelo Núcleo de Pesquisa e Planejamento Urbano (NPPU) da Secretaria de Planejamento do município, mediante Lei Municipal 1.547/2005, apenas por profissionais, sem a participação da sociedade civil. Entretanto, a referida resolução foi aprovada no mês de março, enquanto a criação do Núcleo ocorreu em janeiro do ano de 2005.

O Plano Diretor de Araucária (Lei Complementar nº 5) foi aprovado na Câmara de Vereadores em 06 de outubro de 2006, e prevê em seus artigos a realização de audiências públicas, a gestão democrática e a participação popular (art. 142 e ss.). Entretanto, prevê a revisão do PD mediante instrumento de conferências públicas, que deverá ser regulamentado por lei própria (art. 155). A audiência pública – de caráter não-deliberativo – é tratada como

instrumento para ser utilizada apenas no âmbito administrativo (quando do EIA/RIMA)352. Verifica-se, assim, a confusão existente em torno do instituto da audiência pública do PD e a necessidade de maiores esclarecimentos no EC.

A tendência da concepção técnica para o planejamento urbano continua sendo um dos principais entraves para a participação popular na construção do Plano Diretor, nos termos fixados pelo EC. Reafirma-se a importância de todos os técnicos, profissionais e secretários municipais para planejar o futuro do espaço urbano. Contudo, não se pode afastar de todo o processo a população que, ao compreender de fato a importância da sua participação e verificar a concretização de mudanças, sobretudo de término de segregação espacial, contribuirá de maneira coerente com a apresentação de suas necessidades, ideias e críticas do território que habita. Ampliar a concepção de cidadão é tarefa da administração local e deve ser estimulada, mediante participação em audiência pública, conforme indicação do EC.

4.1.2.2. Castro: estudo de diagnóstico sociopolítico para a participação popular e