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3 O REGIME JURÍDICO DO PLANO DIRETOR PARTICIPATIVO EM SEU

4.1 O Banco de Experiências e a Audiência do Plano Diretor

4.1.4 Bancos de Experiências no Rio Grande do Sul

4.1.4.1 Bagé: macrozoneamento rural e preservação do patrimônio cultural (2001-2006)

Bagé possuía na época do Banco de Experiências analisado 114.908 habitantes (segundo o censo demográfico do IBGE de 2000), fator único que estabelece a obrigatoriedade da cidade em elaborar Plano Diretor. Em outras palavras, a cidade não faz parte de região metropolitana ou aglomerações urbanas, nem está inserida em área de especial interesse turístico ou de interesse de fixação de empreendimentos com considerável impacto ambiental, de âmbito nacional ou regional414. A área do município corresponde a 4.096 km², sendo que cerca de 4.000 correspondem ao território rural415.

A caracterização do contexto local apresenta alguns problemas ambientais e sociais enfrentados pelo município em face do planejamento feito até então. Cita-se, por exemplo: (i) deficiência no abastecimento de água (gerando escassez em períodos de seca); (ii) precário sistema de saneamento e esgoto; (iii) segregação de uma periferia, com poucos índices de urbanização; (iv) espaços urbanos vazios416.

Diferentemente, por exemplo, da cidade de Maringá, Bagé teve sua ocupação urbana no início do século XIX, ocorrida por um acampamento militar às margens do arroio Bagé; e a urbanização, a partir daí, adequou-se à topografia, clima, e vegetação da região417.

A cidade de Bagé, historicamente, expande-se sem a necessidade de adequações radicais, por parte da administração municipal. Atualmente, a expansão urbana se dá mediante abertura de novos loteamentos, preservando o patrimônio cultural e arquitetônico da localidade418. Assim:

O reconhecimento, recuperação e preservação do patrimônio cultural do Município de Bagé foi pautado, desde o início do processo de elaboração do Plano Diretor, como tema central e estratégico para o desenvolvimento municipal. Não só destaca- se a quantidade expressiva de prédios com valor histórico-arquitetônico, mas

413 Todos os dados utilizados para este item foram retirados da ficha padrão do Banco de Experiências do

Muncípio de Bagé. BRASIL. Ministério das Cidades. Banco de Experiências de Planos Diretores Participativos.

Bagé. Políticas de preservação do patrimônio cultural. Disponível em: <http://www.cidades.gov.br/images/stories/ArquivosSNPU/ExperienciasEstados/Bage_FichaRS.pdf>. Acesso em: 12 nov. 2014. 414 Ibid. 415 Ibid. 416 BRASIL, Bagé (2014). 417 Ibid. 418 Ibid.

também o traçado urbano peculiar que a área central de Bagé apresenta, com suas vias largas e ortogonais, projetadas originalmente no século XIX419.

Bagé teve seu desenvolvimento urbano acompanhado pelas normas fixadas no Plano Diretor de 1973 (com alterações e atualizações), até a presente experiência relatada. Os trabalhos iniciaram-se em 2001, com etapas distintas e maior intensificação em 2006, quando a cidade teve auxilio de consultoria externa, financiada por recurso da Caixa Econômica Federal420.

Após estabelecer uma equipe de trabalho, ligada à SCOPLAN [Secretaria de Coordenação e Planejamento], realizaram-se debates públicos com temáticas diversas: (i) fóruns de debates Planejando a Cidade: com público alvo de escolas municipais, entidades e conselhos, universidades, associações de moradores, entidades religiosas e os Poderes Legislativo, Judiciário e Executivo, etc.; desses fóruns, ressalta-se o Patrimônio Cultural, Histórico e Arquitetônico (junho de 2002), que contou com a presença de 130 pessoas421.

Os outros sete fóruns realizados abordaram os seguintes temas: Relatos, Experiências e Impressões (100 participantes), Patrimônio Natural, Desenvolvimento Sustentável e Saneamento Ambiental (100 participantes), Política de Inclusão Social (142 participantes), Mobilidade Urbana (84 participantes), Situação Socioeconômica de Bagé e Região (69 participantes), Sistemas de Gestão, Planejamento e Financiamento da Cidade (61 participantes), Legislação Urbanística (49 participantes)422. A participação é usualmente considerada um ponto forte da cultura política do município de Bagé.

Realizou-se, ainda, o Congresso da Cidade, em 2002, (com participação de 49 delegados, eleitos nos fóruns) e oficinas de planejamento da cidade (com a delimitação das primeiras diretrizes do projeto do PD, com foco principal o patrimônio cultural)423.

A segunda etapa descrita trata-se de coleta e sistematização de informações básicas sobre o Município e, a terceira, constituição da estrutura de elaboração do Plano diretor e análise das informações coletadas. É notório que a metodologia entregada na experiência de Bagé é muito semelhante àquela pelo Guia do PDP, já mencionado.

419 Ibid 420 Ibid. 421 Ibid.

422 BRASIL, Bagé (2014).

423 O relatório esclarece: “Já as Oficinas Planejando a Cidade ocorreram posteriormente à realização do

Congresso da Cidade e tiveram como objetivos: o reconhecimento da área urbana (sistema viário principal, patrimônio natural e cultural), a discussão e avaliação do plano diretor vigente, a definição dos levantamentos e mapeamentos necessários sobre as temáticas definidas pelos fóruns e Congresso da Cidade e, depois, a apresentação destes referidos levantamentos e mapeamentos pela equipe técnica da Prefeitura Municipal. Tais oficinas ocorreram nos dias 17 e 18 de outubro de 2003 e no dia 31 de março de 2004”. Ibid.

Na terceira etapa, as atividades foram divididas em estrutura interna e estrutura externa, entre a Prefeitura e a consultoria contrata, de maneira estratégica. A composição de um Fórum Gestor, contou com a participação de representantes da sociedade civil organizada e regionais da população424. Verifica-se que a participação popular, mediante representação de membros da sociedade, foi considerada para a criação do Núcleo Gestor, responsável pela coordenação e fiscalização de trabalhos.

A leitura da realidade municipal, quarta etapa do procedimento de elaboração do PDP, dividiu-se em: (i) leitura da sociedade e (ii) leitura técnica. Acerca da primeira, explica o relatório dos objetivos:

(i) elaborar uma leitura da situação existente, criando oportunidade para o debate sobre a cidade irregular e/ou periférica; (ii) promover a integração da administração local com os diversos atores locais; (iii) reunir registros de memória; (iv) construir uma leitura coletiva dos conflitos, problemas e potencialidades; (v) levantar aspectos, gerais e específicos, da dinâmica da cidade a partir do ponto de vista da população; (vi) articular forças sociais significativas, gerando um processo de aceitação das opiniões divergentes; (viii) reduzir o caráter tecnocrático das leituras técnicas; (ix) difundir o conhecimento sobre os limites e possibilidades do Plano Diretor, transformando-o em um instrumento entendido, assimilado e utilizado pela população em geral425.

A leitura técnica, por sua vez, consistiu na sistematização das informações colhidas da leitura da sociedade, bem como na identificação de pontos positivos e negativos sobre o município, por parte da administração e do Fórum Gestor. Por fim, a etapa de Desenvolvimento de diretrizes, Campos de Atuação, Eixos Estratégicos, Modelo Territorial e Instrumentos consistiu na consolidação de ideias de planejamento em instrumentos a serem inseridos no texto do projeto do PD, sempre priorizando a preservação do patrimônio cultural.

O banco de experiência, por ser o relato dos cinco anos de procedimentos, é bem completo e descreve todas as estratégias e metas. Para concluir, o projeto de lei, segundo o relatório, estava em análise legislativa, com fortes indícios de “resistência de setores organizados vinculados à construção civil, [...] especialmente no que diz respeito às novas normativas de uso e ocupação do solo”426. Do item “recomendações, alertas e aprendizados” extrai-se a afirmação da percepção do surgimento de “uma nova ordem urbana”, que pretende superar os “processos tradicionais de urbanização e de privatização de benefícios urbanos”427.

424 BRASIL, Bagé (2014). 425 Ibid.

426 BRASIL, Bagé (2014). 427 Ibid.