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Capítulo 1. Introdução

1.3.3. Arte esquemática pintada em Espanha

35 Nas pinturas pré-históricas da Península Ibérica são muito abundantes as manifestações pictóricas associadas ao agropastoralismo do Neolítico e do Calcolítico (Collado, 2000). A arte Neolítica é uma arte desenvolvida principalmente em paredes de abrigos e afloramentos rochosos geralmente ao ar livre, que tem paralelos nos primeiros vasos de cerâmica, onde é comum encontrar uma decoração semelhante, se não idêntica, às várias manifestações dessa arte rupestre (Collado et al., 1999, 2014).

As diferentes representações identificadas, as suas origens, cronologia e significados culturais continuam a ser fortemente debatidos, e este debate é firmemente ligado com pontos de vista concretos relacionados com o processo de neolitização de cada região (Collado e García-Arranz, 2007; Utrilla, 2013).

A consolidação dos sistemas económicos de produção conduz á implantação de novas formas de vida sedentária, á extensão de novos marcos de pensamento, crenças, e formas de organização social (García-Arranz, 1990a,b,c; 1997). Alguns fatores refletem estas mudanças: novos elementos de cultura material, novos rituais de enterramento e novas formas de entender a arte rupestre (Collado, 2006).

Ao realizar qualquer estudo de arte rupestre esquemática, um dos primeiros problemas que se coloca é o grande número de sítios com esta técnica, são conhecidos mais de 500 na Península Ibérica (número constantemente a aumentar) (Bécares-Pérez, 1983). A denominada arte esquemática, principalmente da Península Ibérica constitui um dos variados modos de expressão gráfica e de múltiplas expressões culturais dos grupos humanos durante a pré- história recente (Ripoll, 1996, 1997).

O maior impulso à arte pós-Paleolítica veio com a publicação em 1968 de Pilar Acosta sobre a arte esquemática na Península Ibérica. A investigação das pinturas rupestres esquemáticas, na província de Badajoz começou no início do século XX, motivada pelo reconhecimento da extensão de arte rupestre muito além das fronteiras tradicionalmente estabelecidas, por isso começaram a canalizar-se os estudos especializados para a arte rupestre pós-paleolítica (Ortiz-Macías, 1998). Os anos 80 do século passado foram extraordinários na proliferação de resultados e publicações sobre a arte esquemática em toda a costa oriental da Península Ibérica.

Os estudos sobre sítios de arte esquemática (Figura 19) encontram-se sistematizados por regiões em praticamente todo o território Peninsular (Garcia et al., 2010).

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Figura 19. Principais estações de arte esquemática na P. Ibérica (Benito-Álvarez, 2006).

Na arte esquemática as representações são compostas por figuras antropomórficas, zoomórficas e geométricas (sóis, linhas, ziguezagues, pontos, entre outros.). Motivos similares são comummente encontrados na cerâmica em toda a sequência do Neolítico á Idade do Bronze. (Collado, 1995ª,b, 1997a,b,c, Collado et al., 1997; Torregrosa, 1999, 2001; Martins et al., 2004; Martins, 2007b; Collado e García-Arranz, 2005, 2007a,b, 2010, 2013;).

Centrando-nos exclusivamente nas pinturas rupestres, o elemento técnica apesar de uma uniformidade apresenta alguma variabilidade. A aplicação de técnicas do tipo:

Tinta plana em traços contínuos de grossura variável. No entanto a técnica de tinta plana pode reunir varias formas diferentes numa só figura de modo a realçar certos detalhes;

A técnica de pontilhado é mais rara, mas é costume ser utilizada na delimitação externa de algumas figuras (Figura 20);

Linhas de escassos milímetros que podem ser executadas com pequenos pinceis feitos de pelos de animal, penas, fibras vegetais ou simplesmente com pequenos ramos com as pontas afiadas;

Manchas interpretadas como provas de pintura e são manchas irregulares onde se conservaram linhas evidentes de um pincel ou instrumento de ponta fina.

37 Em relação as cores, predominam os vermelhos (várias tonalidades), os alaranjados e amarelados, que podem corresponder a diferentes estados de conservação ou preparação do pigmento. Os pretos são pouco frequentes, os brancos escassos e as policromias raríssimas.

Figura 20. Pinturas rupestres (Monfrague) com técnicas de aplicação de pigmento diversas.

Nos primeiros trabalhos de síntese sobre a arte esquemática registava-se a predominância das cores vermelhas em território espanhol (Acosta, 1968). Os vermelhos e todas as tonalidades da sua gama (alaranjados e amarelados) seriam muito mais frequentes que o preto e o branco. Já nos trabalhos de Breuil, a série cronológica estabelecida tinha tido em consideração as diferentes colorações, das mais claras às mais escuras, não fazendo menção sequer aos pretos e brancos. Também foi considerada a inexistência de policromia e nos pouquíssimos exemplos do registo de cores diferentes das já conhecidas, estas eram consideradas como uma decomposição da cor original ou um retoque da imagem posterior (Acosta, 1968, 1983).

As cores aplicadas, são maioritariamente o vermelho e em menor quantidade o negro e o branco (Figura 21). Como exemplo paradigmático do uso de pigmento negro temos o exemplo da Cueva de los Murciélagos de Zuheros, em Córdova, onde apenas um pequeno número de figuras está representada em vermelho, prevalecendo o negro (Hernanz et al., 2006b; Menéndez et al., 2009).

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Há também o registo de sítios com pinturas em cor branca, mas quase sempre como complementos de um motivo principal, como por exemplo em Bonete del Cura em Salamanca (Bécarez Pérez et al., 1983), Mas del Cingles, Roca del Senallo e Castell de Vilafamés (Giménez, 1999) Às vezes os tons amarelos que sendo comuns podem corresponder à degradação do colorante vermelho ou branco em origem da consequência dos efeitos de alteração (Sanchidrián, 2001), assim como o castanho-carmim (Menéndez et al., 2009).

Enquanto estilisticamente as representações pictóricas das diferentes sociedades pré- históricas apresentam variações notórias, as cores e os pigmentos parecem ser mais repetitivos. Efetivamente, a cor mais utilizada no Ocidente Peninsular é o vermelho (Figura 22).

Figura 22. Friso del terror; Abrigo do Sol (Monfrague); Abrigo IX da Serra de San Servan (Badajoz).

Para a arte esquemática Collado e García-Arranz, (2013) estabeleceram a primeira classificação morfológica dos abrigos, foi necessário interagir com novas propostas de análise em conformidade com as novas abordagens pós-processuais aplicadas à interpretação da arte rupestre, especialmente do ponto de vista da paisagem arqueológica (Ingold, 1986). Assim valorizando a arte rupestre pré-histórica como um elemento integrado dentro de um sistema cultural e socioeconómico que emerge de grupos sociais específicos, desempenhando um papel de destaque na parte das estratégias de negociação e controle territorial como um sistema de comunicação em que as figuras representadas são parte de um aparato simbólico enquadrado numa série de lugares específicos, cujo significado varia dependendo do local escolhido e do público a que se destina a mensagem a ser transmitida (Bradley, 1997, 2009). Nesta linha têm sido elaborados modelos interpretativos para a arte rupestre do noroeste da Península Ibérica, que está ligado com grupos de vida itinerante que usam esses eventos como sistema de comunicação entre grupos para gestão dos recursos do mesmo território (Santos, 1998); ou para a arte levantina e para arte rupestre esquemática da área do Mediterrâneo,

39 também no que diz respeito aos sistemas de propriedade e gestão do território pelas comunidades agro-pastoris (Fairén, 2003, 2006).

Na Extremadura com base na investigação, conservação e valorização (Collado 1995a,b,c, 1997a,b,c), a metodologia de trabalho evolui para técnicas mais precisas e rigorosas, especialmente a utilização de fotografias a cores, ultravioleta e infravermelho. Um dos aspetos mais significante desta fase é o surgimento de grandes equipas de investigação constituídas por especialistas de diversas áreas. Contra o individualismo dos grandes mestres de outros tempos aparecem equipas multidisciplinares de arqueólogos, historiadores, geógrafos, geólogos, físicos e químicos, biólogos, topógrafos e fotógrafos profissionais (Collado et al., 1997). Assim, os projetos têm evoluído no sentido de uma maior objetividade na metodologia e investigação com a introdução de novas tecnologias e a formação de equipas multidisciplinares. A aplicação de modelos a diferente escala (Nash e Chippindale, 2002; Chippindale, 2004; Chippindale e Nash, 2004ª,b) e debruçando-se sobre os aspetos técnicos (pigmentos, matérias-primas, processos de preparação e produção, datações absolutas, entre outros.), estilísticas (iconografia, composições figurativas, painéis de distribuição no interior dos abrigos) e geográfica (tipo de abrigo, localizando-os e averiguando a sua relação com a paisagem) e interpretando com base estritamente geográfica, numa reiteração consciente sobre a localização dos abrigos em determinados contextos geográficos de interesse mais ou menos estratégico, e reconhecer também outras constantes relacionadas com o tipo de figuras, intensidade diacrónica e gama das representações, técnicas de preparação e variabilidade dos pigmentos usados e a localização e visibilidade dos painéis. A combinação desses fatores leva a considerar uma nova classificação que reúne os tipos de abrigos em que se propõe uma funcionalidade diferente em cada caso. A partir de critérios estritamente morfológicos, os sítios ao ar livre na Extremadura Espanhola que contêm arte rupestre pintada, são divididos em cinco categorias diferentes (Collado, 2009):

a) Estações tipo I: Grandes abrigos, com profundidade e/ou largura superior a 10m, geralmente, apresentam também um grande desenvolvimento em altura. São facilmente detetáveis na paisagem.

b) Estações tipo II: abrigos com comprimento e profundidade sem exceder os 10m, formam ambientes que poderiam servir como refúgio para uma ou mais pessoas. c) Estações tipo III: paredes lisas ligeiramente inclinadas e totalmente expostas, apenas

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d) Estações tipo IV: Estações localizadas em grandes blocos separadas das cristas quartzíticas ou em áreas de afloramentos graníticos, que quando depositados sobre outros blocos, fazem pequenos abrigos protegidos contra os agentes ambientais. e) Estações Tipo V: Pequenos furos, fendas ou rachaduras, na sua maioria insuficientes

para abrigar um indivíduo completo, e sempre com um acesso estreito exigindo uma posição forçada dentro do espaço para exibir ou executar as pinturas (Collado et al., 2013)