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CAPÍTULO 1: EDITH DERDYK E SEU CONCEITO DE DESENHO

1.2 CONCEITO DE DESENHO E USOS NAS ARTES VISUAIS

1.2.4. Artistas

1.2.4.1. Artistas de origem europeia

A partir de cada um dos textos sobre os artistas de origem europeia coletei as suas indicações sobre alguns usos do desenho nas artes visuais.

a) Paul Klee

52 Derdyk, 1994, p. 146

53 Na edição de 1994 foram escolhidos quatro artistas de origem européia e de orientação modernista ou próxima a este

movimento, como Van Gogh. Na edição de 2010, foi nesta parte que se deu a mudança mais significativa, com a inserção de mais oito artistas, somando doze ao todo. Dentre eles quatro brasileiros e contemporâneos. Este capítulo passou a ter na edição de 2010 os seguintes artistas (em ordem de aparecimento): Leonardo Da Vinci, Ingres e Delacroix (num mesmo texto), Van Gogh, Paul Klee, Saul Steinberg, Iberê Camargo, Amílcar de Castro, Regina Silveira e Artur Barrio.

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Outra mudança significativa na edição de 2010 foi a exclusão destes ensaios poéticos.

Fig. 11: Paul Klee, S/ Título, 1933.

Fonte: DERDYK, 1994, p. 152. Fig. 12: Paul Klee,

Autorretrato, 1922.

Fonte: DERDYK, 1994, p. 147.

Fig. 13: Paul Kleee, S/ Título, 1927.

Por meio da escrita de Derdyk entendo que em Paul Klee, o desenho não precisa servir à representação da realidade, como uma cópia neutra, ou um instrumento servil de seu conteúdo (Fig. 11 e 12), já que a autora afirma que neste artista, “a linha não se esforça em representar, referenciar o mundo visível e material figurando seres, animais, objetos. A linha simplesmente é”55 e “por sua natureza conceitual, nos conduz a uma concepção de desenho

como atividade mental”56; interpreto que a linguagem em Klee tem voz, potência expressiva de

fala e autonomia, constituindo-se como significado em si. Pois, como disse Bergson, citado por Merleau-Ponty (apud DERDYK, 1994, p. 152-3): “Nunca, antes de Klee, havia-se deixado uma linha sonhar.” (Fig. 14) Para Derdyk (1994), Klee faz a linha movimentar-se, ganhar personalidades diversas. “Personagens estas que representam a natureza essencial da linha, a linha em estado puro”57 (Fig. 13).

b) Saul Steinberg

Por meio da obra de Steinberg, Derdyk mostra que nas artes visuais o desenho pode brincar com os sentidos mais banais e corriqueiros de si próprio, como quando cria

55

DERDYK, 1994, p. 148

56 Ibid., p. 152 57

Ibid., p. 148

Fig. 15: Steinberg, S/ título, 1969.

Fonte: DERDYK, 1994, p. 157.

Fig. 14: Paul Klee, S/ Título, 1932.

Fonte: DERDYK, 1994, p. 153

Fig. 16: Steinberg, S/ título, 1968.

personagens e paisagens a partir de “entes gráficos, manchas, assinaturas oficiais, selos governamentais, carimbos de borracha”58 (Fig. 18), que com a simplicidade que lhes são

características têm o poder de dignificar o rabisco - “gesto ao alcance de qualquer indivíduo”59

- e subverter a ordem comum do mundo ao criar novos sentidos para o que já se dá como entendido. Como quando trabalha “a troca entre o verbal e o visual”60 (Fig. 15 e 16) ou quando

mistura estilos: “nuvens barrocas convivem com penhascos matematicamente colocados em camadas, ao lado de círculos concêntricos instrumentalizados”61. Ao aproveitar os significados

que tais elementos e estilos possuem na cultura geral (Fig. 17 e 18), Steinberg pensa “a natureza da paisagem cultural”62. A autora mostra também que no campo artístico o desenho é

uma forma de pensar, de refletir, de criar proposições filosóficas, como quando uma mesma linha pode gerar toda sorte de situações, permitindo que se vislumbre as coisas de pontos de vista muito diferentes (Fig. 19).

O próprio Steinberg afirma: “Minha linha quer me lembrar constantemente que é feita de tinta.”63 58 DERDYK, 1994, p. 149 59 Ibid., p. 160 60 Ibid., p. 156 61 Ibid., p. 168 62 Ibid., p. 168 63 Ibid., p. 162

Fig. 17: Steinberg, S/ título, 1966.

Fonte: DERDYK, 1994, p. 168.

Fig. 18: Steinberg, S/ título, 1979.

c) Van Gogh

A partir de Van Gogh, Derdyk mostra que “o signo gráfico estoura de tanto fazer significar”64 e se torna possível perceber como nas artes visuais o registro do gestual do artista

– que de tão intenso “é uma verdadeira festa de textura”65 (Fig. 20 e 21) - pode se tornar o

canal da expressão de um estado emocional. Evidencia também que linha e cor, quando trabalhadas em conjunto podem representar com muita propriedade a complexidade da matéria e da luz66. Nessa maneira trabalhar, “a matéria é construída pela trama gráfica”67 - que “se

64 DERDYK, 1994, p. 182 65 Ibid., p. 174 66 Ibid., p. 174 67 Ibid., p. 174

Fig. 19: Steinberg, A linha, 1945.

Fonte: DERDYK, 1994, p. 170-171.

Fig. 20: Van Gogh, S/ título, 1888.

Fonte: DERDYK, 1994, p. 177.

Fig. 21: Van Gogh, S/ título, s/ data.

abre, se fecha, inventando planos, sugerindo profundidade, construindo volumes”68 (Fig. 22) -

e pelas suas relações de cor, concebidas por Derdyk como uma ideia de “desenho-pintura”69,

onde o artista “utiliza o pincel como se fosse lápis”70 e “a linha se associa integralmente à

cor”71 (Fig. 24). Além disso, Derdy explicita como, especialmente em Van Gogh, a carga

expressiva com que opera suas texturas acaba por “falar” sobre qualquer assunto com forte sentido emocional, mesmo quando a temática representada não trate de um conteúdo muito dramático (Fig. 23), conforme reafirma Ostrower (apud DERDYK, 1994, p. 179). Trata-se de uma maneira de usar um aspecto da linguagem como elemento significante.72

68 DERDYK, 1994, p. 177 69 Ibid., p. 182

70 Ibid., p. 174 71 Ibid., p. 174 72

As três pinturas acima não estão nomeadas no livro de Derdyk, por isso as legendas estão marcando “S/ título”. No entanto, seus títulos originais em francês são: Fig. 22: Champ de blé aux Corbeaux (O campo de trigo); Fig. 23: La Nuit

étoilée (A noite estrelada); Fig. 24: Vase avec quinze tournesols (em português é conhecido apenas por Os girassóis.).

Fig. 22: Van Gogh, S/ título, 1890.

Pintura a óleo. Fonte: DERDYK, 1994, p. 180.

Fig. 23: Van Gogh, S/ título, 1888.

Pintura a óleo. Fonte: DERDYK, 1994, p. 179.

Fig. 24: Van Gogh, S/ título, 1889.

d) Picasso

Por intermédio de um recorte da produção de Picasso – o uso do desenho como registro do processo de criação de Guernica -, Derdyk mostra que o desenho nas artes visuais pode ser usado como revelação do seu próprio percurso porque “responde mais prontamente à urgência expressiva, por sua característica natural de rápida execução”73; como compreensão das etapas

de um percurso artístico; e, como revelação dos meandros da execução em arte, ao preservar “os vários momentos em busca da imagem final”74, que frequentemente agregam significados

importante às obras, mas que nem sempre aparecem na imagem acabada. Torna possível inclusive avaliar aquilo que Duchamp nomeou de “coeficiente artístico” – característica fundamental do processo criativo: “a diferença entre intenção e sua realização, diferença esta em que o artista não é consciente” (DUCHAMP apud DERDYK, 1994, p. 187). Possibilitando definir a própria noção de criação para Picasso, que “envolve a capacidade de relacionar, ordenar, configurar, associar, selecionar, sintetizar, formar e compreender.”75

É também uma forma de estudo e pensamento para o trabalho artístico, assim como é uma maneira de estudar a obra por perspectivas diferentes da observação direta de seu produto final. Por fim, a autora sugere que conhecer as ações criativas do artista é uma forma de aprender a fazer imagens, pois “os mecanismos de invenção por meio da evolução gráfica, utilizados por Picasso, são um instrumento que podemos incorporar para aprender a fruir, a “ler”, a produzir e criar imagens.”76 Toda essa ideia de processo é reforçada visualmente pela

organização das imagens numa sequência de esboços (Fig. 25, 26, 27, 28, 29 e 30) que termina com a imagem pronta de Guernica (Fig. 31).

73 DERDYK, 1994, p. 186 74 Ibid., p. 184

75 Ibid., p. 188 76

Ibid., p. 189

Fig. 25: Picasso, estudos para

Guernica, 1937.

Fonte: DERDYK, 1994, p. 185.

Fig. 26: Picasso, estudos para Guernica, 1937.

Fig. 27: Picaso, primeiro esboço do mural Guernica, 1937.

Fonte: DERDYK, 1994, p. 188.

Fig. 28: Picasso, estudo para Guernica, s/ data.

Fonte: DERDYK, 1994, p. 189.

Fig. 29: Picasso, estudo. S/ data.

Fonte: DERDYK, 1994, p. 186.

Fig. 30: Picasso, estudos. S/ data.

Fonte: DERDYK, 1994, p. 187.

Fig. 31: Picasso, Guernica.