CAPÍTULO III – A nova concepção da organização administrativa brasileira: as
3.8. As agências reguladoras estaduais: A ASEP – RJ
Leila Cuélar, em breve análise, destaca que a competência para a criação de agências
decorre da titularidade do serviço público ou da “competência administrativa-legislativa”. Assim, com a
delegação de serviços, o Poder Público, nos Estados, passa a exercer uma função de fiscalização de
sua prestação, desempenhada, em alguns casos, por agências reguladoras. Sublinha, ainda, a
possibilidade de os Estados e os Municípios receberem da lei delegação para exercer poder
regulador sobre setores de competência de agências reguladoras federais, como no caso das
delegações previstas nas leis da ANEEL e ANVISA (2001, p. 84).
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“§ 6.º O Ministro de Estado da Saúde poderá determinar a realização de ações previstas nas
competências da Agência Nacional de Vigilância Sanitária, em casos específicos e que impliquem
risco à saúde da população.” (BRASIL, 2001-a)
Luis Roberto Barroso descreve a opção do Estado do Rio de Janeiro de criar um único
órgão regulador, a Agência Reguladora de Serviços Públicos Concedidos do Estado do Rio De
Janeiro (ASEP – RJ), que abrange uma pluralidade de áreas de atuação, diversamente do ocorrido na
área federal em que se optou por uma regulação multisetorial (1999, p. 370).
O modelo unisetorial da ASEP – RJ é análogo ao adotado por outros Estados, razão pela
qual o apresentamos para destacar as características dos entes reguladores estaduais.
A lei de criação da ASEP – RJ58 dispõe que os serviços serão concedidos pelo Estado,
cabendo à agência garantir uma prestação adequada, observar o equilíbrio econômico-financeiro dos
contratos, buscar a estabilidade nas relações entre as partes envolvidas, proteger os usuários contra
práticas abusivas e monopolistas, otimizar o uso dos bens coletivos, e modernizar e aperfeiçoar os
serviços prestados.
Márcio C. Coimbra destaca que o modelo de criação de agências nos
Estados, abrangente de todos os serviços delegados, vem sofrendo mudanças em
São Paulo, onde se encontra em fase de constituição uma segunda agência (2001,
p. 43).
Assinala o autor que, além das funções específicas em relação aos serviços
delegados dos Estados, as agências reguladoras estaduais podem firmar convênios
com as agências nacionais, com a finalidade de realizar o serviço de regulação
daqueles entes dentro do território do Estado (COIMBRA, 2001, p. 43).
Destaca Luiz Roberto Barroso que os contratos firmados na prestação de
serviços por meio de concessão implicam a acumulação de inúmeras tarefas às
agências reguladoras estaduais, tais como o controle de tarifas, para assegurar a
viabilidade econômica do contrato; a garantia de universalização do serviço; o
fomento da competitividade em áreas em que não haja monopólio natural; a
fiscalização do contrato; e o arbitramento de conflitos entre as partes envolvidas –
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consumidores do serviço, poder concedente, concessionários, comunidade,
investidores potenciais, dentre outros (1999, p. 370-371).
Sérgio Nelson Mannheimer, ao descrever o projeto de uma agência
reguladora estadual, aponta como primeira questão definir se o ente a ser criado
deverá ocupar-se de todos os serviços regulados ou se deverá ser criado um ente
específico para cada área. A criação de um ente específico de regulação para cada
área tem, na diversidade e na peculiaridade de cada serviço público, sua
fundamentação (1997, p. 204).
O modelo oposto, em que um único órgão regulador cuida de uma
pluralidade de áreas, tem inspiração nas Public Utilities Commissions, modelo
adotado em vários estados norte-americanos. Adotou-se esse modelo no caso do
Rio de Janeiro e na quase totalidade dos Estados em virtude de ser reduzido o
número de concessões submetidas à agência reguladora, situação que não
justificaria a criação de vários entes, em razão de custos de gestão elevados e da
possibilidade de ociosidade (MANNHEIMER, 1997, p. 204-205).
Além disso, complementa, há uma maior possibilidade de aprendizado em
razão da variedade de setores que, em muitos casos, apresentam aspectos
idênticos; e facilita que se evite a concorrência entre os vários participantes, com
sensível redução do risco de interferência política e econômica, conseqüência da
concentração do poder de decisão dos reguladores a uma única área. Complementa
afirmando que a ASEP-RJ exercita o poder regulador em sentido amplo, não tendo
sido reservado um conjunto de áreas específicas para sua atuação (MANNHEIMER,
1997, p. 204).
A necessidade de dotar o órgão regulador estadual de poder de polícia
impôs ao legislador a criação da agência reguladora como ente autárquico,
assegurando sua independência por meio das garantias atribuídas aos membros de
seu conselho diretor, bem como pela existência de renda própria em volume
suficiente à sua autonomia. No caso da ASEP – RJ, foi criada uma taxa de
regulamentação de 0,5% (meio por cento) sobre o total percebido como renda das
tarifas cobradas dos usuários a ser paga pelos concessionários ou permissionários
diretamente à agência reguladora (MANNHEIMER, 1997, p. 206 e 210).
Leila Cuélar identifica ser possível a existência de benefícios decorrentes da
instituição de uma única agência reguladora. Dentre eles, destaca a adoção de um
enfoque global de regulação, afastando-se a existência de conflitos de competência
e riscos de excesso, em face da proliferação de agências.
Todavia, assinala, com propriedade, a instituição de uma única agência
regulando atividades distintas contradita com um dos objetivos da regulação, que
consiste na especialização, fato que desnatura a essência da agência reguladora,
concebida para ser ente técnico especializado. Portanto, ao se estabelecer um único
ente paralelo ao Estado, nada mais se estará fazendo que duplicar o modelo de
Estado que se deseja modificar (CUÉLAR, 2001, p. 86-87).
A criação de corpos independentes de regulação fica comprometida com a
criação de um corpo virtual ao do Estado, sem que se deixe de considerar o déficit
de legitimidade patente em tal regulador, se confrontado com a do Chefe do Poder
Executivo, que detém igual competência e cuja legitimidade é patente, em razão do
sistema democrático escolha para esse cargo político.
A regulação individualizada, com ênfase nos aspectos técnicos, justifica-se
posto não interferir, de regra, com direitos e garantias individuais dos cidadãos, não
se podendo assegurar que tal garantia esteja presente no modelo abrangente de
regulação que se esboça nos Estados brasileiros.