• Nenhum resultado encontrado

CAPÍTULO V – A potestade normativa das agências reguladoras brasileiras

5.6. Ato Administrativo e regulamento

Segundo Eduardo García de Enterria e Tomás-Ramón Fernández, o ato

poderá ser administrativo sem que isso tenha a ver com o fato de sua concretude,

ou seja, ela não é de maior relevo na discriminação de tais atos.

Os autores assinalam que há atos que não estão dirigidos a um destinatário concreto, mas a um número indeterminado de sujeitos ou, inclusive, a toda a coletividade, que apresentam

condicionamentos de direitos e de caducidades, verdadeiras ordens coletivas destinadas aos cidadãos, e que são atos administrativos (ENTERRIA; FERNÁNDEZ, 1991, p. 206).

(1997, p. 165).

Apesar da generalidade desses atos não se está frente a um regulamento, uma vez que, em que pese sua abstração e generalidade, eles não se integram no ordenamento jurídico; são atos

aplicativos do ordenamento jurídico e não inovadores do mesmo.

Os autores ressaltam que o ato administrativo, seja singular, seja geral, tem seu círculo de

destinatários terminando com seu cumprimento, consumindo-se neste. Para um novo cumprimento, haverá que ser editado um novo ato (ENTERRIA; FERNÁNDEZ, 1991, p. 206).

Assim, verifica-se existirem atos de natureza abstrata que são administrativos e outros também da mesma natureza, contudo de finalidade diversa, qual seja a de uniformizar e

operacionalizar os conceitos emanados da lei; são os atos regulamentares, ou regulamentos, diferentes em essência dos atos administrativos e com eles inconfundíveis.

Por outro lado, vimos que há autores, como Seabra Fagundes e o próprio Hely Lopes Meirelles, que englobam na noção de atividade regulamentar todos os atos de natureza jurídica

normativa provindos da Administração, ou seja, aglutinam as noções de regulamentação e de regulação, esta aqui vista apenas como normalização.

De acordo com Eduardo García de Enterria e Tomás-Ramón Fernández, o poder de ditar atos administrativos, por via transversa, “é uma qualidade geral de todo o órgão da Administração,

seu modo de expressar-se”, enquanto que a expedição de regulamentos é ato restrito.

O regulamento é revogável ad nutum, enquanto os atos administrativos têm limites legais à

revogação, impostos no sentido de garantir os direitos que o ato provoca. Regulamento e “ato administrativo têm cursos processuais diferentes de impugnação contencioso-administrativa e de

legitimação dentro dos mesmos” (ENTERRIA; FERNÁNDEZ, 1991, p. 207).

O regulamento, afirmam, não é nem uma lei, nem um ato administrativo geral; “é, sem

dúvida um quid aliud diante dessas duas instituições mais comuns e conhecidas” (ENTERRIA; FERNÁNDEZ, 1991, p. 203).

Diógenes Gasparini, que não diferencia regulamento de ato administrativo, aponta como inconveniente dessa posição o fato de ser o ato administrativo toda emanação de vontade editada

pelo Estado, entendida, portanto, como indicativa de órgão de quaisquer dos poderes quando no exercício de função administrativa. Conseqüentemente, a prática de tais atos não seria de

competência exclusiva do chefe do Poder Executivo, cabendo o seu exercício pelos dois outros poderes.

O autor não considera, em seu raciocínio, que os demais Poderes praticam atos administrativos com ampla liberdade, por atuarem dentro da competência organizativa interna, e que

o vocábulo regulamento é utilizado tradicionalmente para esse tipo de norma.

Eduardo García de Enterria e Tomás-Ramón Fernández elucidam o equívoco destacando

que os outros Poderes exercitam o seu poder genérico de auto-organização, que é reconhecido pelo texto constitucional, não se tratando tais atos de regulamentos propriamente ditos, mas de autênticas

leis.

Diógenes Gasparini apresenta interessante quadro comparativo entre o que denomina ato

administrativo regulamentar e atos administrativos ditos executivos. O quadro em questão apresenta diferenças quanto: à impugnação, à revogação, ao conteúdo, à adequação com a lei, à forma, à

competência, à publicação, aos meios de defesa, à confirmação, ao fundamento legal, à inovação na ordem jurídica, à delegação, à referenda e, por último, aos efeitos. 90

De acordo com Eduardo García de Enterria e Tomás-Ramón Fernández, chama-se regulamento em sentido lato toda a norma escrita ditada pela Administração. Denomina-se potestade

regulamentária ao poder por meio do qual a Administração edita regulamentos.

A concepção genérica de regulamento favorece, em nosso entendimento, a existência de

situações tais como a que abre o presente capítulo em que o Poder Executivo e uma agência reguladora recebem da lei atribuição de regulamentá-la, sem considerar que a discricionariedade de

que dispõe o Executivo Federal, no caso, é diversa daquela da ANEEL.

90

Quanto à impugnação, os atos regulamentares pressupõem ser ela judicial; os atos executivos, administrativa; a revogação de ato regulamentar exige a edição de outro ato, ao passo que a revogação de ato executivo não a exige; o conteúdo do Regulamento é abstrato e o do ato executivo é concreto; a relação com a lei, no Regulamento, é de compatibilidade e autonomia, enquanto no ato executivo é de conformidade; a forma prevista para o Regulamento é o Decreto, ao passo que nos atos executivos ela é diversa, admitindo outras formas; a competência para a expedição de Regulamentos é do Chefe do Executivo, a dos atos executivos, dos agentes públicos; a publicação dos Regulamentos é necessária e deve ser integral, enquanto nos atos executivos nem sempre é imprescindível e poderá ser resumida; os efeitos dos atos regulamentares são erga omnes e os dos atos executivos são individuais; quanto aos meios de defesa, no ato regulamentar, o cabimento de mandado de segurança é bastante restrito, ao passo que no ato executivo é cabível na maioria das vezes; a convalidação de Regulamento, anulável por vício de competência, é impossível, por inexistir outra autoridade acima daquela competente para praticá-lo, bem como porque não há outra autoridade competente para sua prática; o fundamento legal nem sempre é necessário no Regulamento, ao passo que no ato executivo sempre o é; a possibilidade de inovação no ordenamento jurídico, admissível nos Regulamentos, não o é nos atos executivos; a competência para a expedição de Regulamentos é indelegável, enquanto é delegável aquela necessária à expedição de atos executivos; os Regulamentos são sempre referendados pelo Ministro que os vai executar, sendo que tal subscrição não se aplica aos atos executivos (GASPARINI, 1982, p. 11).

O regulamento para “explicar” a lei é editado no gozo de uma discricionariedade política diversa daquela pela qual as agências reguladoras editam suas normas, constituindo ato que decorre

diretamente da Constituição com margem discricionária que nos leva a qualificá-lo como ato político, conforme se analisa no item seguinte.