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As composições coreográficas na Ginástica para Todos

2 A GINÁSTICA PARA TODOS

2.4 As composições coreográficas na Ginástica para Todos

As composições coreográficas (CC) fazem parte de um grande universo, que engloba tanto manifestações esportivas gímnicas (em modalidades Ginásticas como a GA, GR, GPT, GAF, GAE, GACRO, Ginástica Estética, Ginásticas de Condicionamento), quanto esportivas (patinação no gelo e nado sincronizado), além de manifestações artísticas relacionadas às Artes circenses, Artes cênicas e à Dança (SCARABELIM; TOLEDO, 2016).

Elas conferem a essas manifestações uma conotação artística, fato já observado por autores como Dantas (1999), Roble, Nunomura e Oliveira (2013) Scarabelim e Toledo (2015; 2016), Toledo, Tsukamoto e Carbinatto (2016), Toledo e Antualpa (2016) e Gerling (2017).

Especificamente em relação à GPT, Gerling (2017) aborda os elementos artísticos inerentes a uma coreografia da prática e dá sugestões de como desenvolvê-los, como, por exemplo, a relação do movimento com a música, o espaço e os cenários, os efeitos dos figurinos, dos adereços e luzes, a dramaturgia etc. Toledo et al. (2016a) e Sborquia (2008) também ressaltam esse viés artístico quando apontam a necessidade de se contemplar uma coreografia por meio do contexto estético que ela exige.

Quando vistas sob a ótica da GPT e da Dança, as composições coreográficas são livres, uma vez que permitem mais possibilidades de criação e não necessitam da estruturação segundo regras de Códigos de Pontuação, como é o caso da GA e da GR, por exemplo (FIG, 2018).

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Figura 6 - Composição coreográfica apresentada na World Gymnaestrada (2019)

Fonte: <www.wg2019.at>.

Assim, as CC podem se configurar como obras de arte. Dantas (1999) sustenta essa premissa ao mencionar que “os movimentos e gestos [...] possibilitam a elaboração de impressões, de concepções; a representação de experiências; a projeção de valores, sentidos e significados; e a revelação de sentimentos, sensações e emoções”.

Para Marcassa (2004, p. 180),

[...] a coreografia é como um texto. E se para um texto escrito é necessário ter conteúdo, narrativa, coerência interna, situalização, intencionalidade, coesão, contextualização, intertextualidade, etc, na linguagem corporal gímnica alguns desses elementos também estão presentes. O conteúdo é o tema a ser problematizado; a narrativa possui uma lógica e se manifesta por meio de movimentos, gestos, ações motoras, posturas, expressões que, por sua vez, são como as palavras, signos de linguagem; pela investigação temática e pesquisa de movimentos buscamos a coerência interna, que também se traduz pela harmonia e sincronização na execução das formações e figuras.

Para Santos (2009, p. 43), na GPT a coreografia se configura como

[...] composições de uma apresentação da modalidade, valendo-se fundamentalmente de elementos corporais, predominantemente os ginásticos, interligados entre si, de forma lógica, harmoniosa, com início, meio e final, utilizando ou não grande e/ou pequenos aparelhos.

Alguns autores afirmam que elas não são fundamentais à prática da GPT e que não há necessidade de sua elaboração; outros, por outro lado, reforçam a sua

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importância devido ao seu caráter pedagógico e motivacional para o grupo (TOLEDO, 2005).

Silva (2013, p. 98) ainda destaca que as CC são “a síntese do processo de aprendizagem da GPT e engloba os conteúdos abordados nas aulas e a forma como cada participante assimilou os conhecimentos tratados”. Nessa perspectiva, podemos pensar a coreografia como um produto final e a sua construção como o processo de ensino.

Porém, segundo Ayoub (2013, p. 94)

[...] ao considerarmos a Ginástica Geral como algo a ser demonstrado, devemos estar atentos para que ela não seja vista apenas como um “produto”, desconectada de um processo. Ao contrário, essa perspectiva de demonstração da Ginástica Gera; precisa ser tratada como parte integrante do processo educativo da GG [...] no processo de elaboração de uma composição coreográfica, devem ser privilegiadas as experiências e interesses dos alunos e o trabalho em grupo, estimulando a cooperação, a capacidade de ação e a autonomia dos educandos como sujeito do processo educativo, para que possam compor em coautoria com outros sujeitos, buscando novas interpretações, novas leituras, novas significações antes desconhecidas.

Logo, enfatizamos que o processo de construção coreográfica é tão importante quanto o “produto final”, ou seja, tudo que é vivido no processo é tão importante quanto a experiência da apresentação. Isso, segundo Toledo, Tsukamoto e Carbinatto (2016), é o que distingue a GPT das demais práticas gímnicas, principalmente as competitivas, nas quais as CC são avaliadas somente no momento da apresentação. A aprendizagem antes, durante e após o processo de montagem coreográfica é muito relevante, dado que ela se alicerça não somente em construções técnicas e artísticas, mas, também, e principalmente, em um processo de construção e formação humanas.

O processo de construção de uma coreografia ocorre a partir da perspectiva de que o sujeito, agindo sobre a natureza, vai construindo outros mundos, diferentes do seu (SBORQUIA, 2008). Ele possibilita ao sujeito a expressão de seus sentimentos e emoções, em torno de uma temática, através do gesto.

Apesar de ser uma criação artística relativamente livre, chamamos a atenção para a importância da coerência temática de uma coreografia, isto é, o alinhamento entre o tema, as vestimentas, a música e os aparelhos utilizados (SCARABELIM; TOLEDO, 2016; TOLEDO; SCARABELIM, 2019). Essa coerência dá

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significado àquela coreografia e permite uma interpretação mais precisa por parte da plateia que a aprecia.

A expressão corporal do ginasta durante a apresentação de uma coreografia se configura como parte importante no processo de transmissão de sentimentos e emoções e de apreciação do público. Ela pode ser entendida como uma “capacidade de síntese que agrupa todas as outras capacidades no relacionamento com o ambiente” (PEREZ-GALLARDO, 1997).

Para além dos elementos estéticos de uma coreografia, há também os elementos técnicos, como as formações, transições, poses, elementos ginásticos e acrobáticos etc. Há, do mesmo modo, a técnica particular de cada ginasta que compõe aquela coreografia. Segundo Bortoleto (2008, p. 175), essa técnica pode ser entendida como “os modelos de execução dos elementos gímnicos” e, no caso específico da GPT, deve permitir total exploração de possibilidades gestuais e deve ser pautada, sobretudo, na criatividade.

Sugere-se, pois, que as CC tenham uma variedade grande desses elementos, com combinações criativas e inovadoras, que possam surpreender o público e gerar, assim, uma emoção coletiva na plateia.

Todos esses elementos, tanto estéticos como técnicos, foram descritos e estudados por meio da proposição de um conjunto de fichas analíticas de composições coreográficas elaborado por Scarabelim e Toledo (2015; 2016). Nessas fichas, podemos identificar e registrar os componentes de uma CC, além de espaços específicos para os desenhos das formações.

Alguns autores(as) têm se debruçado no estudo das CC na GPT nos últimos anos. Alguns deles merecem destaque, como, por exemplo, Rocha (2002), que sugere uma diagramação das composições coreográficas do GGU; Bortoleto e Pinto (2007, 2010), que propõem uma representação gráfica e descrevem processos de criação coreográfica do GGU; Toledo (2005), que trata especificamente de formações coreográficas, suas nomeações e significados; e Gerling (2017), que aborda os elementos da coreografia em GPT. De maneira geral, esses(as) autores(as) colaboram com o desenvolvimento e divulgação de informações a respeito do tema, o qual parece não receber muito destaque em publicações científicas da área.

Outros estudos relevantes são encontrados em Santos (2009), em seu livro “Ginástica Para Todos: elaboração de coreografias e organização de festivais”,

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que traz reflexões gerais a respeito das CC, Silva (2013) e Moura e Carvalho e Cruz (2016), que tratam de propostas coreográficas com crianças.

As CC devem ser construídas a partir de características únicas de cada grupo, como, por exemplo, a faixa etária, o grau de experiência motora, as características pessoais, o nível de condicionamento físico, a cultura na qual o grupo está inserido etc. Como a GPT possibilita a participação de todos(as) e respeita a individualidade de cada um, é possível que em um mesmo grupo existam pessoas com níveis, idades e experiências diferentes. Cabe aos participantes do grupo (por meio da mediação do(a) treinador(a)), criar uma coreografia original que enalteça essas características pessoais e que torne o processo e o resultado final prazeroso e satisfatório para todos.

Nessa conjuntura, as CC, dentro da proposta da GPT que temos como referência, pautada na metodologia desenvolvida pelo Grupo Ginástico Unicamp (GGU), pelo Grupo de Pesquisa em Ginástica (GPG/UNICAMP) e utilizada pelo Grupo LAPEGI/UNICAMP, têm seu processo centrado no esforço comunitário, ou seja, todos os participantes são, ao mesmo tempo, ginastas e coreógrafos; constroem a coreografia coletivamente e, portanto, os desejos de todos e as singularidades de cada um são sempre respeitados.

A respeito disso, Santos (2009, p. 34) salienta que,

[...] ao elaborar coreografias, os responsáveis pelos grupos não podem esquecer que os objetivos destes trabalhos devem estar centrados nos seres humanos envolvidos, que têm sentimentos e objetivos próprios, que são influenciados por elementos culturais variados e que, principalmente, desejam alegria e prazer no convívio social através da Ginástica Para Todos, em busca da felicidade, objetivo maior de todos nós.

Percebe-se que as CC abrangem muitos aspectos, tanto técnicos, como artísticos, que devem ser trabalhados de maneira integrada, tarefa certamente desafiadora para ginastas e treinadores(as). Aliás, essa foi, sem dúvida, uma inquietação que me surgiu ao longo dos anos vivenciados na GPT, e foi, destarte, um dos fatores que motivou e contribuiu para o desenvolvimento deste estudo.

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