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A linguagem pode ser abordada sob diferentes ângulos teóricos, a partir de posições e perspectivas distintas, segundo vários caminhos conceituais. Na Educação a Distância, assim como no ensino presencial ou no ensino semipresencial, a maneira de se conceber a linguagem é um aspecto determinante para que as ações educativas, como um todo, sejam conduzidas. Dessa forma, o enfoque dado a um curso, bem como a abordagem a ser adotada, a metodologia de trabalho utilizada, a condução e desenvolvimento das aulas virtuais por parte dos envolvidos no processo educacional, os modos de avaliação a serem considerados em um curso ou em uma disciplina, as estratégias de interação utilizadas entre os interlocutores da aprendizagem, a elaboração de material didático e das atividades a serem postadas na plataforma, enfim, todo o contexto teórico-prático que envolve as atividades e ações da educação a distância tem como fio condutor a concepção de linguagem que permeia o universo de formação dos seus interlocutores discursivos, como podemos verificar na figura 10:

Figura 10 – Concepções de linguagem e implicações na EaD

É a concepção de linguagem que adotamos e a que somos afiliados que vai perpassar o emaranhado de ações que diariamente são desempenhadas e desenvolvidas no processo de ensinar e de aprender, seja essa ação avaliar, elaborar material, interagir, mediar, entre outras. Diante disso, optamos por iniciar este capítulo focando as concepções de linguagem, e nos posicionando em relação à concepção de linguagem adotada tendo em vista o trabalho aqui desenvolvido.

Uma concepção de linguagem tem seu berço e origem nos estudos tradicionais e filosóficos da língua/ linguagem. Nessa perspectiva teórica de pensamento, a linguagem é concebida como sendo a pura expressão do pensamento. O papel da linguagem, nesse sentido, seria o de um veículo ou suporte para a simples exteriorização e/ou manifestação externa do pensamento. É importante ressaltar que o fundamento dessa primeira concepção de linguagem está amparado nos preceitos da Gramática Normativa ou Tradicional, a qual não leva em conta o interlocutor, o contexto, ou os aspectos discursivos sociais e históricos. Considera-se, do contrário, um segmento de regras estáveis, autônomas, estruturais e pré-estabelecidas.

Concepções de Linguagem Contexto teórico-prático de condução de uma disciplina ou curso Enfoque e abordagem adotada.

Condução das aulas.

Modos de avaliação

Elaboração de material didático Interações mantidas

Outra concepção de linguagem, que retoma os estudos de Saussure, é vista como um instrumento de comunicação. A língua, nesse sentido, é concebida como um código, um conduto, capaz de transmitir uma mensagem a um receptor. Se focarmos no ensino, sua preocupação seria a de transmitir conhecimento. A linguagem apresenta-se vinculada a um emissor e a um receptor, a partir de uma perspectiva teórica assumida pela teoria da comunicação. A língua apresenta-se, ainda, sob uma visão estruturalista tendo em vista que a linguagem é utilizada e entendida como um meio para se realizar a “tarefa”, para cumprir uma etapa da comunicação, não levando em conta questões como as situações de uso da fala, os interlocutores, o contexto sócio-histórico de produção do enunciado, entre outros elementos.

A terceira concepção de linguagem, concebida enquanto interação, diferencia-se das demais por não considerar a linguagem apenas como meio de se exteriorizar o pensamento ou de informar o receptor, mas por procurar, sobretudo, despertar ações e reações sobre o ouvinte/leitor. A linguagem é vista como objeto de interação, estabelecendo uma relação de sentido entre o que se diz, para quem se diz, e/ou como se

diz, e tendo como foco o interlocutor e todo o aspecto sócio-histórico que o circunda e

no qual ele se encontra inserido. A língua, dessa forma, é uma atividade sócio-histórica, observada em situações reais e a partir da ideia de que a significação se produz de maneira contextualizada, e não autônoma.

A linguagem é situada como o lugar de constituição das relações sociais. É nessa instância que se estabelecem os vários discursos, uma vez que as condições sociais e históricas são consideradas como partes integrantes da interação. Essa concepção de linguagem, a enunciativo-discursiva, vem, de fato, modificar a essência do ensino de língua, pois é a partir daí que a linguagem passa a ser concebida e entendida como um processo de interação:

Bakhtin coloca, em primeiro lugar, a questão dos dados reais da linguística, da natureza real dos fatos da língua. A língua é, como para Saussure, um fato social, cuja existência se funda nas necessidades de comunicação. Mas, ao contrário da linguística unificante de Saussure e de seus herdeiros, que faz da língua um objeto abstrato ideal, que se consagra a ela como sistema sincrônico homogêneo e rejeita suas manifestações (a fala) individuais, Bakhtin, por sua vez, valoriza justamente a fala, a enunciação, e afirma sua natureza social, não individual (...).” (BAKHTIN/ VOLOCHINOV, 1929/ 2010, p. 14)39

Bakhtin, dessa forma, vai considerar aspectos como (1) os diferentes e inesgotáveis significados nas várias situações e contextos de produção, (2) a relação interpessoal entre os interlocutores, (3) a fala, (4) a enunciação, (5) a evolução da língua, (6) a natureza social e real dos fatos linguísticos e (7) os gêneros.

Essa concepção de linguagem, fundamentada na noção de interação bakhtiniana, nas situações reais de uso real da língua, na enunciação, nos gêneros e no caráter dialógico da linguagem, se apresenta como fio condutor desta pesquisa. Tal concepção é detalhada no item 2.2, tendo em vista o conceito de interação verbal de Bakhtin/Volochinov (1929/2010).

2.2 Interação Verbal na Visão Bakhtiniana

Na concepção de linguagem centrada na interação, a relação linguagem e

social ganha destaque e espaço. Nesse sentido, os interlocutores do processo de

comunicação atuam um sobre o outro, através da interação verbal. Tal fenômeno social, diferentemente dos sistemas abstratos, imanentistas e conteudistas das formas linguísticas, vai constituir a realidade fundamental da língua, para Bakhtin e para o seu círculo:

A verdadeira substância da língua não é constituída por um sistema abstrato de formas linguísticas nem pela enunciação monológica isolada, nem pelo ato psicofisiológico de sua produção, mas pelo fenômeno social da interação verbal, realizada através da enunciação ou das enunciações. A interação verbal constitui assim a realidade fundamental da língua. (BAKHTIN, 2010, p. 127)

A língua, a partir desse viés e amparo teórico, não é considerada pelas suas formas linguísticas estáveis, completas e acabadas (características de uma visão estruturalista e imanentista da linguagem), pois se assim o fosse, ela não daria conta da sua realidade concreta. Ela é considerada, ao contrário, a partir da interação verbal, que se dá por meio da enunciação, ou das enunciações e pelo processo de evolução real da língua. É importante ressaltar, nesse universo de conceitos, que a enunciação “é o