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As conferências nacionais de C&T no Brasil

CAPÍTULO 1: CIÊNCIA, EDUCAÇÃO, CULTURA E POLÍTICAS PÚBLICAS

1.8 As conferências nacionais de C&T no Brasil

Muitas diretrizes já foram apontadas pelas muitas conferências e encontros internacionais do setor de C&T. Os países assumem compromissos de investir em determinada área, contudo, na teoria tudo é possível enquanto que na prática, as promessas podem se perder ao longo dos anos.

Na Conferência Mundial sobre Ciência para o Século XXI: um novo Compromisso, realizada em Budapeste, Hungria, em 1999, os países do Caribe e da América latina assumiram mais um destes compromissos:

Na América Latina e no Caribe, o novo compromisso da ciência deve abranger uma série de objetivos explícitos a serem alcançados conjuntamente pelos governos, empresas, comunidades científicas e acadêmicas e por outros atores públicos, bem como as instituições de cooperação internacional. Trata-se de fornecer uma base sólida e de longo prazo para as estratégias e políticas de ciência, tecnologia e inovação, direcionadas a um desenvolvimento humano autossustentável, através de um pacto de pesquisa interdisciplinar. (UNESCO, 2003: 18)

Esse foi apenas um dos muitos compromissos assumidos pelas nações. É necessário um esforço conjunto. O planeta não muda se apenas uma nação fizer a sua parte, todas precisam colaborar. Este documento diz que o Estado deve estimular:

 pesquisa científica;

 pesquisa tecnológica;

 divulgação de inovações e técnicas;

 serviços de informação;

 serviços consultivos e de Engenharia;

 metrologia e padronização;

 planejamento e administração da C&T – incluindo indicadores de C&T; e

 formação de pessoal técnico-científico necessário às atividades acima citadas (UNESCO, 2003: 18)

Além de sugerir, claro, inúmeras outras ações e cooperação internacional. Enquanto isso, as conferências nacionais de C&T também discutiram as políticas públicas de ciência.

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Quatro conferências de C&T aconteceram no Brasil: 1985, 2001, 2005 e 2010. Há pouco material referente à primeira conferência. Há ainda de ser considerado que a ditadura havia terminado, e como já descrito neste trabalho, o Brasil ainda engatinhava para resolver problemas urgentes quanto à economia. Ainda sim, foi naquele mesmo ano que foi criado o MCTI, antigo MCT, contribuição fundamental para a valorização do setor de CT&I.

No entanto, as outras conferências tiveram maior importância no que tange às discussões de políticas públicas na área da ciência. A 2ª Conferência acontecia no final do governo FHC. Segundo Caldas (2011):

Somente na última década, com a realização da II Conferência de C&T, no governo Fernando Henrique Cardoso, e as III e IV Conferências, no governo Luiz Inácio Lula da Silva, respectivamente em 2005 e 2010, e a criação, em 2004, do Plano Nacional em Ciência, Tecnologia e Inovação, conhecido como PAC da Ciência, a área de CT&I começa a ser reconhecida como estratégica no desenvolvimento nacional e geração de riqueza e bem-estar social. (CALDAS, 2011:10)

A 2ª e a 4ª Conferências publicaram livros importantes, sempre citados pela comunidade acadêmica. A 2ª publicou o Livro Verde, que discutiu questões sobre o avanço do conhecimento, qualidade de vida, desenvolvimento econômico, desafios estratégicos e institucionais e o Livro Branco com os compromissos para o desenvolvimento da ciência, tecnologia e inovação para os dez anos que se seguiriam. A 4ª, o Livro Azul.

No Branco, de 2001, havia propostas de linhas de política a longo prazo; ―uma direção que se iniciou por uma ampla reforma do sistema nacional de CT&I e que pode ser sintetizada pelos seguintes pontos‖ (BRASIL, 2001:xv): (aqui, selecionados de acordo com os interesses desta pesquisa)

 (...) diálogo permanente com a comunidade científica e tecnológica, que inclui a própria Conferência Nacional de CT&I;

 (...) reforma das Unidades de Pesquisa do MCT, agora reunidas sob a coordenação de uma mesma Secretaria, com reavaliação de suas missões;  (...) ampliação do diálogo do MCT com os ministérios setoriais na

definição de prioridades de alocação de recursos do fomento à CT&I; (BRASIL, 2002:xv,xvi)

O diálogo com a comunidade científica foi verdadeiramente restabelecido. As outras conferências reforçam esse compromisso. As reformas de pesquisa e a reavaliação de

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missões e prioridades devem ser feitas com frequência. O engessamento só atrasa o progresso. A colaboração do MCTI com outros ministérios, conforme revela os resultados deste trabalho, ainda são ínfimos e insuficientes, ao menos ao que se refere à SNCT, porém existem e devem ser fortalecidos.

O Livro Branco formulou, em 2001, a Política Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação com seis objetivos a serem alcançados até 2012, que eram:

1. Criar um ambiente favorável à inovação no País;

2. Ampliar a capacidade de inovação e expandir a base científica e tecnológica nacional;

3. Consolidar, aperfeiçoar e modernizar o aparato institucional de Ciência, Tecnologia e Inovação;

4. Integrar todas as regiões ao esforço nacional de capacitação para Ciência, Tecnologia e Inovação;

5. Desenvolver uma base ampla de apoio e envolvimento da sociedade na Política Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação;

6. Transformar CT&I em elemento estratégico da política de desenvolvimento nacional. (BRASIL, 2002:36)

O documento reconhece que esses objetivos dependem de outros fatores que colaborem para que fossem bem-sucedidos, além do esforço coletivo. Algumas metas são bastante ambiciosas e subjetivas. Nota-se também uma prioridade para a temática da inovação. A popularização da ciência ainda não era contemplada de forma direta, mas foi citada nas diretrizes estratégicas, conforme abaixo:

I. Implantar um Efetivo Sistema Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação.

II. Promover a inovação para aumentar a competitividade e a inserção internacional das empresas brasileiras.

III. Ampliar de forma sustentada os investimentos em Ciência, Tecnologia e Inovação.

IV. Expandir e modernizar o sistema de formação de pessoal para Ciência, Tecnologia e Inovação.

V. Ampliar, diversificar e consolidar a capacidade de pesquisa básica no País.

VI. Modernizar e consolidar instituições e procedimentos de gestão da política de Ciência, Tecnologia e Inovação e os mecanismos de articulação com as demais políticas públicas.

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VIII. Intensificar e explorar novas oportunidades da cooperação internacional em Ciência, Tecnologia e Inovação.

IX. Ampliar a dimensão estratégica das atividades de Ciência, Tecnologia e Inovação. (BRASIL, 2002:49)

Dentro de ―Educar para a sociedade do conhecimento‖, o Livro Branco sugere:

 Induzir um ambiente favorável a um aprendizado permanente;

 Difundir a cultura científica e tecnológica na sociedade;

 Ampliar condições de acesso e uso de Tecnologia de Informação e Comunicação (TIC) para os distintos segmentos da sociedade;

 Estimular a utilização da TIC na universalização do acesso à educação científica e tecnológica;

 Incentivar o envolvimento dos meios de comunicação na cobertura dos assuntos de CT&I;

 Contribuir para modernizar e aperfeiçoar o ensino de ciências;

 Promover e apoiar a implantação de museus e exposições de C&T (BRASIL, 2002:67)

Essa era a semente do que se tornaria, futuramente, a política de popularização da ciência e o incentivo à educação científica. Inclui, ainda, a contribuição da mídia, as mudanças de contexto tecnológico como as TIC‘s, além de alterações no sistema educacional e do investimento nos centros e museus de ciência.

Há, portanto, neste Livro, um avanço importante. Entende-se a política nacional de CT&I como um agente transformador da sociedade. A educação para o conhecimento é uma das nove diretrizes que regulamentam uma política nacional de ciência e tecnologia bem sucedida. Um dos resultados dessa conferência foi a criação do Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE). E ainda que pontos importantes tenham permanecido na teoria, a discussão demonstra as novas preocupações da sociedade. Não por acaso, a SNCT foi criada em 2004, após esses questionamentos deixados pela comunidade científica para as lideranças.

A 3ª Conferência Nacional de Ciência e Tecnologia (3ª CNCTI) aconteceu em 2005, quando a SNCT acabava de ser criada, já no governo Lula. Essa conferência não publicou livro com diretrizes, apenas anais com informações do evento e da área e deu continuidade ao processo da discussão das políticas públicas científicas e da democratização dessas

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discussões para a comunidade acadêmica e simpatizantes do tema. O documento comprova a contribuição da 2ª Conferência:

A formulação da Política Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação (PNCT&I), implementada no governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, recebeu contribuições importantes provenientes dos debates realizados durante a 2ª Conferência Nacional de C,T&I, consubstanciadas nas análises e recomendações do Livro Branco. (BRASIL, 2006:40)

Percebe-se pelo documento que houve um amadurecimento tanto da comunidade científica quando dos líderes de governo quanto às questões referentes à política nacional de CT&I em comparação com a conferência anterior. Em 2006 já havia um movimento legítimo de centralizar esforços em áreas prioritárias, principalmente na inovação.

Dentro do marco estratégico da inclusão social, o documento rediscute o modelo de desenvolvimento e sugere, como alguns teóricos já mencionavam, a valorização social da ciência e tecnologia brasileiras. Para aumentar a autoestima do brasileiro quanto a sua própria ciência e pesquisa, o documento indica, dentre outras atividades, ―estabelecer um plano nacional de divulgação e popularização da ciência, incluindo ações como‖ (BRASIL, 2006:104):

1) organização de conferências para leigos, tratando de temas singulares e de grande interesse para o público em geral como astronomia, evolução, código genético, nanotecnologia, entre outros;

2) apoio a museus de ciência, planetários e casas de ciência, com estímulo à produção de Instrumentos de demonstração interativos. (BRASIL, 2006:104)

O documento ainda menciona o fortalecimento do ensino fundamental e médio. Nota-se que a visão governamental condiz com a visão acadêmica, já descrita neste trabalho, quanto às ações que devem ser realizadas para mudar a realidade da CT&I no Brasil. Os governos pareciam preocupados em buscar a transformação social, contudo, o que parece faltar é acompanhamento adequado, além do investimento necessário, tanto no diz respeito a tempo, quanto a recursos humanos e financeiros.

A 4ª Conferência (4ª CNCTI), mais recente, realizada em 2010, ainda no governo Lula, seguiu os moldes da 2ª CNCTI e publicou o Livro Azul, também com diretrizes para o setor. As discussões dessa conferência foram norteadas pelas prioridades do Plano de

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Ação em Ciência, Tecnologia e Inovação para o Desenvolvimento Nacional no período de 2007-2010, também conhecido como PAC da Ciência, nas seguintes linhas:

a) O sistema nacional de ciência, tecnologia e inovação; b) Inovação na sociedade e nas empresas;

c) Pesquisa, desenvolvimento e inovação em áreas estratégicas; d) Ciência, tecnologia e inovação para o desenvolvimento social A inovação continua sendo vista como motor do progresso tecnológico e no documento da 4ª CNCTI, os pesquisadores entendem que é preciso tratá-la como estratégica. A ampliação de recursos é novamente citada como necessária. A Amazônia também é contemplada, como reduto de conhecimento e biodiversidade brasileira. Também há preocupação com a preservação do meio ambiente. O documento tenta casar a importância do progresso da ciência com o respeito ao meio ambiente e aos recursos naturais, renováveis e não-renováveis.

Dentro dos grandes desafios para a CT&I e sobre a agenda, sugere-se conhecer melhor a biodiversidade, a valorização da sustentabilidade, avanço em pesquisa, desenvolvimento regional e atendimento às demandas sociais. Ainda aconselha o estabelecimento da execução do Programa Nacional de Popularização e Apropriação Social da CT&I 2011-2022, o POP Ciência 2022, onde o programa indica algumas ações da alçada da divulgação científica:

a) Será necessário o estabelecimento de instrumentos eficazes e ágeis para a popularização e apropriação social da CT&I, com a criação de uma entidade ligada ao MCT. Propõe o fortalecimento do Comitê Assessor de Divulgação Científica do CNPq, com participação de cientistas, jornalistas e comunicadores da ciência,e uma política de editais periódicos em parceria com as FAPs. Outras ações importantes são o estímulo ao envolvimento da iniciativa privada e a criação de mecanismos para apoiar atividades de comunicação pública da ciência em todos os projetos de pesquisa de maior porte.

b) Valorizar as atividades de popularização da C&T e promover a formação qualificada de jornalistas científicos, comunicadores da ciência e assessores de comunicação, bem como a capacitação de cientistas, professores e estudantes para a comunicação pública da ciência. Criar programas que atraiam jovens de todas as camadas sociais para carreiras de C&T.

c) Criar uma Rede/Fórum Nacional para a popularização da CT&I, com participação da comunidade de C&T, governos e sociedade civil. Promover

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a expansão, aprimoramento e integração em rede dos espaços científico- culturais com uma distribuição regional menos desigual e a promoção de atividades de ciência itinerante.

d) Fortalecer, aprimorar e estender progressivamente a Semana Nacional de C&T para todos os municípios brasileiros.

e) Atingir uma presença mais intensa e qualificada da CT&I em todos os meios e plataformas de comunicação na mídia brasileira, inclusive nas redes sociais, e promover a produção/veiculação de programas de divulgação e educação científica na TV, rádio e internet, incluindo a TV Pública Digital.

f) Estabelecer legislação que promova a popularização da CT&I no País, que possibilite incentivos fiscais para investimentos nesta área, e que favoreça maior autonomia de gestão e financeira em espaços cientifico - culturais e órgãos públicos de comunicação. (BRASIL, 2010:92)

Pela primeira vez, a SNCT é citada diretamente em um documento oficial e é entendida como fator determinante para a popularização do conhecimento. Todas essas sugestões remetem à contribuição da divulgação científica para a inclusão social do cidadão. A qualificação de jornalistas e cientistas, a lembrança da contribuição midiática, tudo isso faz do documento da 4ª CNCTI um documento atual e com visão estratégica quanto à comunicação pública da ciência e as formas encontradas para inserir esses conhecimentos na cultura do brasileiro. A educação também não é esquecida: recomenda, como nas outras conferências, a melhoria do ensino de ciências e a formação de professores.

Outro marco político significativo foi o fato de que a divulgação científica ter sido incluída como linha de ação em três documentos-chave para a formulação das políticas públicas de Ciência, Tecnologia & Inovação (CT&I), a saber, os planos nacionais de 2007-2010 e 2011-2015 para CT&I e o chamado Livro Azul, uma síntese das discussões sobre o futuro da CT&I brasileira na próxima década na 4.ª Conferência Nacional de Ciência e Tecnologia, realizada em maio de 2010 (Livro

Azul, 2010). Um dos principais desafios para o país na próxima década apontados

por essa conferência é promover uma alteração radical na educação científica no país e aumentar e melhorar as ações de divulgação da C&T e iniciativas para o público geral. (MASSARANI, 2012: 94)

Por conta dos inúmeros avanços, o Brasil passou a fazer parte do circuito dos pesquisadores e cientistas internacionais. Em novembro de 2013, aconteceu, no Rio de Janeiro, o Fórum Mundial de Ciência, quando foram ratificadas a importância da CT&I e o

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papel da Divulgacão Científica. Em maio de 2014, é a vez da 13ª Conferência Internacional de Comunicação Pública da Ciência e Tecnologia, que acontece pela primeira vez em solo brasileiro, na cidade de Salvador.