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As diferentes terminologias usadas nas intervenções em Vigilância em

5. CONFIGURAÇÃO DO CAMPO

5.2. As diferentes terminologias usadas nas intervenções em Vigilância em

INTERVENÇÕES EM VIGILÂNCIA EM SAÚDE DO

TRABALHADOR E SEUS CONCEITOS

No dia a dia, há uma dificuldade na escolha da denominação apropriada para as intervenções desenvolvidas em VST: visita, vistoria, diligência, vigilância, intervenção, investigação, inspeção e fiscalização. Essa confusão reflete não só os diferentes momentos pelos quais os profissionais passaram na evolução de suas ações, mas também as diversas terminologias presentes nos documentos que normatizam essas ações.

É preciso também lembrar que, associado ao termo utilizado, está implícito o conceito adotado.

Segundo alguns dicionários da língua portuguesa, Michaellis, Aulete e Houaiss, a palavra vigilância significa cuidado, atenção desvelada, precaução, prudência, diligência, cautela, interesse, zelo que se aplica na realização de algo, ainda, estado de quem permanece alerta, de quem age com precaução para não correr risco; cuidado. Vilela (2003) explica que esse termo amplo passou a ser aplicado à Saúde Pública entre os séculos XVIII e XIX, na Europa e América do Norte, especialmente relacionado às doenças infectocontagiosas, porém já trazendo alguns aspectos da ST. Seu significado original, surveillance, estaria ligado mais a um caráter punitivo e coercitivo, com poderes restritivos, de policiamento e estigmatizantes. No Brasil, comenta o autor, em Saúde Pública, esse termo estaria ligado mais a ações preventivas e de zelo pela saúde da população, porém o caráter de “polícia” aparece em diversas ações denominadas “vigilância”.

Durante o período de cerca de 20 anos em que os profissionais dos CRST da cidade de São Paulo não tinham respaldo legal para suas ações de VST e para entrar nas empresas, as “idas” aos locais de trabalho eram chamadas de “visitas”, ou ainda “vistoria”, “vigilância” e até mesmo “diligência”. Os relatórios então elaborados eram, em geral, denominados de “relatórios técnicos”.

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Processo de trabalho dos profissionais de saúde em Vigilância em Saúde do Trabalhador

Como esses mesmos profissionais continuam até hoje desenvolvendo ações em parceria com o MPT-F, na qualidade de “assistentes técnicos”, no dia a dia, os termos se misturam, apesar das diferenças implícitas em cada um dos papéis desempenhados.

Hoje a confusão se mantém nos relatórios decorrentes das ações de VST. Eles também recebem nomes como “relatório de vigilância”, “relatório de inspeção”, “relatório de vistoria”, “relatório técnico”. Para seus relatórios de VST as autoridades sanitárias foram orientadas pela COVISA a utilizar o software SIVISA41 (Sistema de Informação em Vigilância Sanitária) e um modelo de relatório disponível no site oficial da PMSP (anexo D). Neles, o relatório é denominado “Relatório de Inspeção Sanitária”. Como o software não foi especificamente desenvolvido para o registro de atividades de VST e sim para as outras categorias de vigilância (Sanitária, Ambiental, de Zoonoses e de Alimentos), as autoridades sanitárias dos CRST precisam se adaptar a esse modelo onde não estão previstas muitas das peculiaridades das VST, inclusive o termo relatório de vigilância em Saúde do Trabalhador. Esse preenchimento não está completamente implantado e incorporado à rotina de todos os CRST42 e relatórios feitos nos moldes tradicionais continuam sendo elaborados e anexados aos processos. Alguns técnicos, contudo, optam por seguir o modelo disponível no site.

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O SIVISA é um Sistema de Informação em Vigilância Sanitária elaborado pelos técnicos do Centro de Vigilância Sanitária, da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo, e deve permitir o gerenciamento das ações de Vigilância Sanitária nas diversas esferas do SUS. Deve, ainda, registrar dados referentes à produção e à qualidade dos serviços prestados pelas equipes de Vigilância, tanto municipais como estaduais, bem como o universo de estabelecimentos alvo das ações de Vigilância Sanitária (São Paulo, Estado, 2010).

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Ainda falta esclarecimento sobre o preenchimento desse relatório no sistema e as orientações recebidas pelos técnicos dos CRST também não são claras no que se refere a quando preencher ou criar um novo relatório SIVISA. Há um entendimento de que a cada novo procedimento desenvolvido pelos profissionais de VST, novo relatório de SIVISA deve ser criado. Outro entendimento aponta que somente um relatório de SIVISA deve ser criado para cada empresa investigada e nele devem ser registrados todos os procedimentos desenvolvidos ao longo do tempo. Outra dúvida aparece quando são desenvolvidas ações conjuntas entre SUVIS e CRST, onde não está claro quem deverá preencher o SIVISA, podendo ocorrer duplicidade nos registros. Como o SIVISA se propõe a ser um banco de dados, essas confusões comprometem seu objetivo. O sistema também não está implantado em todas as unidades dos CRST e, onde está, os dados registrados precisam ser encaminhados à COVISA, via e-mail, para então serem inseridos no banco de dados centralizado nessa Coordenadoria, pois os serviços não estão integrados on line. Por essa razão e pela falta de uniformidade de acesso à intranet da PMSP, ainda inoperante em vários CRST, é pouco prático para esses serviços o acesso aos dados do sistema como um todo, podendo comprometer os processos de VST pela ausência de informações acerca das empresas investigadas.

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Processo de trabalho dos profissionais de saúde em Vigilância em Saúde do Trabalhador

O CSM prescreve as ações das autoridades sanitárias, no entanto, a multiplicidade de termos que adota parece contribuir para as confusões terminológicas e conceituais existentes.

Em seus artigos 37° inciso III, 38° inciso III, 45° e no artigo 97°, o CSM adota o termo fiscalização. Entretanto esse termo tem sido usado tradicionalmente para as ações dos fiscais de órgãos como a Secretaria de Relações do Trabalho (SRT), do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), ações consideradas insuficientes para dar conta da complexidade da relação saúde-trabalho (Lacaz, 1992 p.0743, apud Santos 2001; Machado, 1996). Dessa forma, o CSM estaria propondo um retrocesso no processo de VST ao aproximá-lo das atividades outrora criticadas por suas limitações. O CSM incumbe as autoridades sanitárias de algumas atribuições que se aproximam do poder de polícia, como interdições de máquinas, equipamentos e ambientes de trabalho, imposição de multas, entre outras, conforme as descritas no artigo 8°, no capítulo V denominado “Infrações Sanitárias e Penalidades”; e no capítulo VI - “Procedimentos Administrativos das infrações de natureza sanitária”.

Há, portanto, uma aparente contradição na prescrição do trabalho das AS, pois esse mesmo CSM descreve as ações desses profissionais de forma mais ampla, valorizando a participação dos trabalhadores, porém cobrando dessas autoridades o cumprimento dos prazos e medidas implícitos nas ações fiscalizatórias, desconsiderando o caráter dinâmico e a temporalidade própria das ações de VST. Essas contradições são notadas na evolução dos pressupostos normativos que definem as VST e as outras formas de vigilância.

Sobre o melhor termo a ser usado, vemos que o mesmo CSM propõe a expressão “inspeção” para denominar as ações das AS, conforme se lê em seus artigos 36° §3° e 38°.

Apesar do artigo 36° mencionar a análise dos processos de trabalho, ele diz que “as autoridades sanitárias deverão executar ações de inspeção em ambientes de trabalho, visando ao cumprimento da legislação sanitária vigente,incluindo a análise dos processos de trabalho que possam colocar em risco a saúde dos trabalhadores”. É

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Processo de trabalho dos profissionais de saúde em Vigilância em Saúde do Trabalhador

importante salientar que, ao ter como foco das ações o cumprimento da legislação, é preciso ter o cuidado de não se distanciar sobremaneira da complexidade envolvida na análise dos processos de trabalho, a qual vai muito além do que é previsto em lei.

Outro aspecto importante é que o termo inspeção remete a um olhar especializado que observa e examina cuidadosamente e emite seu parecer. Corre-se o risco de se esquecer da essencial participação do trabalhador, ele sim o maior especialista na área, limitando-se os relatórios ao ponto de vista das AS. A importância da participação dos trabalhadores e sindicatos em todo o processo de VST é lembrada nos artigo 38° e 39°, onde são atribuídos às AS um papel que vai além da exigência do cumprimento de leis e normas.

O CSM não foi desenvolvido especificamente para a ST. Nele, apenas o Título IV trata especificamente de Saúde e Trabalho e dispõe de apenas oito artigos (do 36° ao 43°) de um total de 155 que compõe o documento. Isso pode ser um reflexo da falta de um maior apoio institucional, que reconheça as peculiaridades da VST em relação às demais áreas da Vigilância em Saúde e que valorize suas ações tão distintas e complexas.

Fala especificamente em ações de Vigilância em Saúde do Trabalhador no artigo 38°. Esse artigo define os princípios e diretrizes que devem nortear as ações de VST das AS. O que é dito no CSM, em especial nos artigos de 36° a 39°, reflete o desejo de uma prática em VST condizente com os preceitos do SUS e da concepção ampliada de Vigilância em Saúde. Embora os artigos de 36° a 39° proponham uma abordagem bastante interessante e complexa, sua aplicação é comprometida quando às AS, conforme previsto nos artigos 97° e 98° do referido código, cabe, “sob pena de responsabilidade administrativa”, “fazer cumprir as leis e regulamentos sanitários e expedir termos, autos de infração e de imposição de penalidades”, toda a vez em que verificar a violação dos preceitos legais, a fim de garantir a “prevenção e controle de tudo quanto possa comprometer a saúde”.

Permanece como um desafio para as autoridades sanitárias lotadas nos CRST viabilizar, na prática diária, o casamento entre a lógica das ações em ST, o cumprimento das leis e normas e o cumprimento dos prazos enxutos impostos pelos ritos administrativos envolvidos na aplicação do Código Sanitário Municipal.

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Processo de trabalho dos profissionais de saúde em Vigilância em Saúde do Trabalhador

Talvez o que falte às AS dos CRST seja uma maior familiaridade com o referido código e o desenvolvimento de formas mais eficientes para seu uso, podendo assim “contornar” as características que criem entraves ao desenvolvimento de seu trabalho em VST e, ao mesmo tempo, fazendo bom uso dos aspectos que podem facilitar e ampliar o alcance de suas ações. Acreditamos que isso só será possível com o passar do tempo e com uma maior experiência dos profissionais nessa nova prática.

5.3. A INFORMAÇÃO EM VIGILÂNCIA EM SAÚDE DO