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Categoria 5: Relação entre satisfação e insatisfação no trabalho

7. RESULTADOS

7.2. Apresentação dos resultados segundo categorias e subcategorias de

7.2.5. Categoria 5: Relação entre satisfação e insatisfação no trabalho

Percebe-se, entre os entrevistados, uma certa insatisfação com o distanciamento entre os referenciais teóricos abraçados e as possibilidades da prática em si.

A insatisfação é permeada por um sentimento de frustração e impotência, e os profissionais avaliam que têm feito pouco diante da grandiosidade da demanda de VST. Em de situações de trabalho consideradas por eles “terríveis” e “violentas”, demonstram preocupação com os trabalhadores e com o ônus decorrente das doenças e acidentes de trabalho para toda a sociedade, inclusive para o SUS e o INSS. Segundo eles, é patente que as empresas não assumem sua responsabilidade nesse processo.

Fazer um trabalho que é considerado “incompleto“ aparece como fonte de frustração. Os entrevistados referem sentir falta de condições para realizar análises da organização do trabalho e de aspectos psicossociais. Para isso, necessitariam de mais tempo para as intervenções e de maiores recursos tanto materiais quanto humanos:

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Processo de trabalho dos profissionais de saúde em Vigilância em Saúde do Trabalhador

O que a gente faz a gente sabe que não é o ideal [...] se for realmente pra mudar alguma coisa, não basta mexer em posto, em bancada, em cadeira, as pessoas vão continuar adoecendo. (Entrevista 10)

[...] desenvolver a parte de organização do trabalho dentro de uma empresa exige uma série de requisitos, como entrevista, análise, tudo mais, não há condições [...] fazer o trabalho completo é muito difícil, ideal seria, mas para isso nós teríamos que contar com muito mais recursos, entre materiais e recursos humanos. (Entrevista 5)

[...] e eu entendo que a gente tem que construir uma lógica de análise no ambiente de trabalho que te permita identificar potenciais riscos à saúde mental. [...] tem uma forte conotação vinculada à organização do trabalho, eu acho que a gente tem que desenvolver métodos de abordar os riscos da saúde metal, minha preocupação atualmente tem sido essa. (Entrevista7)

[...] essa questão de organização do trabalho com relação a pausa, hora extra, a gente não vê durante a inspeção, tem que ser com a fala do trabalhador, isso que a gente perde. (Entrevista 13)

Esse aspecto é apontado por vários entrevistados, em especial por aqueles com formação em ergonomia. Eles gostariam de realizar intervenções que fossem além do simples apontamento de riscos, procurando conhecer mais a organização do trabalho e seus efeitos sobre a saúde. Nas falas, aparece um desejo de que aspectos como condições do ambiente e fatores biomecânicos sejam observados não apenas como fatores de risco, mas também do ponto de vista do conforto dos trabalhadores:

[...] entre o que eu estudei e o que eu podia fazer, havia uma longa distância, primeiro porque a ergonomia trabalha com a questão de conforto ambiental na parte de condições do ambiente, conforto térmico e não risco, a corrente francesa trabalha visando principalmente a organização de trabalho, claro não deixando de ver os fatores biomecânicos, as condições do ambiente, mas dando um enfoque maior na organização de trabalho, e ai o que a gente faz na vigilância é muito mais pontual [...] dá para aproveitar conhecimentos e sair dessa questão do risco. (Entrevista 10)

Há uma clareza de que mesmo utilizando os conceitos da ergonomia francesa nas ações, elas não se caracterizam como ações de “Análise Ergonômica do Trabalho”. Geralmente nas intervenções são pouco exploradas questões como absenteísmo, sazonalidades, inconformidade de matéria-prima, aspectos subjetivos do trabalho, entre outros, tanto pelo escasso tempo disponível para realizar as análises, quanto pelo fato da demanda não ser espontânea:

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[...] pra você estar vendo a organização do trabalho precisa estar dentro da empresa analisando mais profundamente pelo menos um setor ou uma tarefa, pra estar analisando mais atividades, estar levantando outros tipos de documentos onde a gente possa ver melhor a produtividade, absenteísmo, tudo aquilo que a gente aprendeu na ergonomia. (Entrevista 10)

As autoridades sanitárias não estão exercendo um papel de consultores ou analistas, mas de “fiscalizadores”. Não estão lá a convite da empresa ou dos trabalhadores, mas cumprindo uma designação que lhes foi dada pela PMSP:

[...] não vai dar pra ser uma análise ergonômica, porque fica distante da realidade, você não pode ficar quatro ou cinco meses dentro de uma empresa [...] outra questão importante, na ergonomia a gente aprende que a demanda tem que vir espontaneamente, provavelmente da empresa, e lá nós não estamos com esse papel, nem de consultores nem de analistas, nós estamos lá como fiscalizadores, autoridades sanitárias e só isso já muda o enfoque do que a gente tá fazendo, muda a relação completamente. (Entrevista 10)

A satisfação aparece quando relatam processos bem sucedidos de intervenção em empresas que respondem positivamente, realizando as adequações entendidas como necessárias para proteção da saúde dos trabalhadores:

[...] é gostoso na vigilância quando você faz uma colocação, aponta uma irregularidade e você vê a coisa resolvida, é isso que trás satisfação. (Entrevista 4)

No entanto, a insatisfação novamente aparece quando as empresas se mostram refratárias à intervenção. Segundo os entrevistados, algumas delas chegam a apresentar um cronograma de adequações, mas os pontos a serem adequados nem sempre são contemplados, deixando de fora aspectos importantes a serem transformados. Alguns cronogramas não são cumpridos e certas empresas parecem não se importar com a aplicação das penalidades previstas no Código Sanitário Municipal. Em algumas, o discurso é promissor, mas na verificação das ações, os entrevistados percebem que não passou de discurso e se decepcionam ao retornar para novas inspeções:

[...] na defesa que a empresa apresentou ficamos super contentes, parecia que tinham resolvido todos os problemas e qual não foi nossa surpresa quando voltamos para inspecionar e teve coisa que eles conseguiram piorar ainda mais em comparação com a inspeção anterior. (Entrevista 4)

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Os relatos apontam que os próprios programas de saúde e segurança do trabalho (PPRA, PCMSO, etc), apresentados pelas empresas são, em sua maioria, teóricos e não trazem propostas práticas de promoção e proteção da saúde dos trabalhadores. Analisar tais programas é descrito como frustrante e gera um sentimento de estar sendo enganado e desrespeitado:

[...] a gente vê muita bobagem nessas documentações, PPRA, PPMSO, muita teoria, é cópia da NR em todos. Tem aqueles que, no final dos documentos, colocam uma coisa específica. [...] tem coisas boas, não vou dizer que é tudo negativo [...] eles contratam alguém pra fazer, no PPRA eles apontam irregularidades, fazem um cronograma, e esse cronograma não é cumprido. Só fica no papel. Tem outros que a gente vê que muitas irregularidades não foram apontadas pra serem tomadas as providências. (Entrevista 4) [...] existem muitas normas legais que não são cumpridas, entre outras os programas [...]a grande maioria dos programas de saúde ocupacional, seja de PPRA, PCMSO, PCA PPR, programa de ergonomia, todos são de gaveta[...] não são nada mais do que isso. [...] o empresário que compra esses papéis não está fazendo com que esse pessoal trabalhe honestamente, ele está sendo conivente com isso. (Entrevista 5)

[...] aqui na COVISA somos críticos. [...] pedimos um PPRA e, se vemos que é ruim, criticamos e pedimos para a empresa fazer um novo. [...] Um PCMSO vagabundo que não cobre todos os aspectos da legislação recusamos e pedimos para a empresa entrar em contato com o médico e refazer. Nos casos que temos reclamado, a empresa tem atendido e enviado novos documentos. [...] uma nova versão não quer dizer que está 100% [...] já melhorou muito comparado com o que foi primeiramente apresentado. (Entrevista 8)

Segundo os entrevistados, apesar das sanções aplicadas, a maioria das empresas segue sem se comprometer a fazer as adequações necessárias e por vezes apenas “desaparecem”, mudam de endereço, de razão social e de município, carregando com elas todas as situações nocivas aos trabalhadores:

[...] outro dia fui em uma marmoraria que o cara tinha tanta coisa pra cumprir, que ele simplesmente foi embora. (Entrevista 5) [...] ele também vai fazer de tudo para burlar o acidente. A gente teve casos de notificação com endereço errado. De a gente não encontrar a empresa. (Entrevista 9)

[...] era um lugar insuportável que a gente entrava dava vontade de sair correndo pelo calor, pela bagunça, pela desorganização, muita poeira, sem ventilação, tudo fechado, primeira coisa você tentava entender o que era aquilo [...] ficamos lá um tempão, e ai não deu para fazer tudo no mesmo dia, a gente retornando para aquele

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endereço eles tinham mudado, a gente ficou sem dar continuidade, tá ai nessa pendência. (Entrevista 13)

Eles relatam satisfação ao desenvolver projetos interinstitucionais e vigilância com base em ramos de atividade de maior risco e presença elevada de doenças profissionais, por seguimento econômico, como os bem sucedidos projetos de marmoraria, que resultou, inclusive, em mudanças na regulamentação das atividades desse ramo, e o de máquinas e equipamentos de panificação, que determinou especificações a serem seguidas por seus fabricantes.

Como tais projetos foram interinstitucionais e envolveram a promotoria e procuradoria públicas, extrapolaram o município de São Paulo, o que não seria possível se as ações tivessem se desenvolvido exclusivamente pela PMSP:

[...] isso extrapola a competência da saúde, é por isso que tem que ser demandado a quem de competência, ao Ministério do Trabalho e Emprego, ao Ministério Público Federal do Trabalho [...] a gente pega o agravo, mas nem sempre está na nossa esfera de competência fazer toda a gestão do risco. (Entrevista 7)

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