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Para a percepção das dificuldades que as PDV enfrentavam nas suas deslocações no seu dia-a-dia e em específico na CHVC, foi realizada uma entrevista/questionário, a pessoas com essa deficiência, que possuíssem uma vida activa e fossem frequentadores da zona de estudo.

Esta entrevista foi realizada a quatro pessoas com idades a variar entre os 25 e os 50 anos, sendo três do sexo feminino e uma do sexo masculino. Todos os entrevistados possuem habilitações literárias sendo que três completaram o ensino secundário e um o ensino superior, concluindo o grau de licenciado. Três dos entrevistados possuem trabalho remunerado e sabem ler de Braille e apenas um não possui qualquer trabalho nem sabe ler braille.

Dos quatro entrevistados, dois são cegos (Cego 1 e Cego 2) e dois possuem baixa- visão (Baixa-visão 1 e Baixa-visão 2), em todos os casos essa deficiência foi adquirida ao longo dos anos como resultado do avanço de doenças de nascença, como glaucoma congénito e a retinite pigmentar. Feita assim a caracterização da amostra vão ser apresentados por tópicos a principais perguntas e respectivas respostas.

1. Desloca-se com o auxilio de:

Tabela 16: Definição do elemento de auxílio na deslocação

Cão guia Bengala Guia

Humano Nada

Cego 1 X X

Cego 2 X X

Baixa-visão 1 X X

Baixa-visão 2 X X

Fonte: Elaboração própria

Tal como podemos ver na tabela 16 apresentada, os utilizadores cegos, deslocam-se sempre com o auxílio de algum elemento, podendo variar entre a bengala ou o Cão Guia, já os utilizadores com baixa visão normalmente deslocam-se sem qualquer auxílio. Contudo todos os entrevistados dizem que quando vão acompanhados com alguém de confiança tem essa pessoa com guia preferencial.

2. Quais as principais barreiras que encontra no seu dia-a-dia?

Cego 1: estacionamento abusivo, em alguns casos, esse estacionamento cria barreiras em altura (espelhos de carrinhas muito proeminentes em relação ao restante veiculo)

Cego 2: Mobiliário Urbano, os pisos e desníveis, passeios estreitos com muitos obstáculos

Baixa-Visão 1: mobiliário urbano, estacionamento abusivo, pilaretes e objectos de pequena dimensão dispostos nos passeios

Baixa-Visão 2: postes de trânsito, publicidades, obras não sinalizadas, estacionamento abusivo

Podemos dizer que os problemas mais apontados dizem respeito essencialmente a elementos móveis como sejam, vendas e propagandas do comércio, esplanadas de cafés e restaurantes, obras não sinalizadas. Relativamente aos elementos fixos são apontados os postes de trânsito e de iluminação, os pilaretes e mecos de separação, bancos e floreiras em praças ou zonas amplas e pontualmente buracos existentes no piso ou desníveis abruptos. Como outro grande obstáculo, que nem sempre existe, mas que causa grande transtorno, é apontado o estacionamento de veículos em cima de passeios e passadeiras, obstáculo este

considerado, não apenas por impedir ou dificultar a passagem das pessoas, mas também no caso de serem carrinhas ou veículos grandes, por possuírem os seus espelhos muito proeminentes relativamente a toda a lateral do veículo.

3. Quais os materiais e equipamentos importantes e que ajudam na deslocação?

Para os entrevistados cegos, o principal equipamento apontado é a bengala e o cão guia. Para além dessas, a resposta foi unânime em apresentar que o mais importante de tudo é existir uma faixa ao longo de toda a rua que não possua obstáculos.

O piso táctil, também seria uma ajuda, dizendo que devia ser usado ao longo de todo o passeio apenas se justificativo e sempre nas passadeiras e nas suas aproximações, sendo o mais importante que o piso na zona central, caso exista, seja diferente na sua textura, relativamente à zona de atravessamento da estrada, para deste modo ser perceptível e a pessoa aguarde com atenção à passagem.

Relativamente à sinalização sonora, esta também foi apontada como uma sendo uma ajuda, devendo ser colocada apenas nas passadeiras. Os entrevistados salientam que o mais importante de tudo é que tanto o piso táctil como a sinalização sonora sejam colocados com rigor, precisão e de forma uniforme em toda a cidade de modo a serem evitados enganos ou situações que possam confundir.

Um elemento referido como importante, é a faixa central existente em algumas ruas da cidade, esta apesar de não possuir cor diferente, a sua textura altera-se sendo perceptível pelas PDV, facilitando o percorrer da rua.

4. Quais os itens que dificultam a sua deslocação no espaço público?

Os elementos apontados são a existência de muito mobiliário urbano tais como os produtos destinados a vendas das lojas de comércio, vasos e postes, situados nos locais de passagem dos passeios. De acrescentar, um factor apenas apresentado por um inquirido, mas de muita importância, o piso nas separações centrais das passadeiras, que caso este seja igual em altura ou textura à restante passadeira, as pessoas cegas não se apercebem da sua existência, o que pode trazer graves consequências.

Os entrevistados dizem ainda que, um elemento que pode dificultar a deslocação é o rebaixamento dos passeios demasiado camuflado, uma vez que se ele não for perceptível para as PDV, estas podem não se aperceber de uma zona de passagem ou do inicio desta, podendo

ir para a estrada sem saber, porém esse problema é facilmente resolvido com a colocação de piso táctil.

5. A deslocação no passeio é realizada:

Tabela 17: Definição da zona de deslocação no passeio

Junto à fachada do edifício

No centro do

passeio Junto à berma

Cego 1 X

Cego 2 X

Baixa-visão 1 X

Baixa-visão 2 X

Fonte: Elaboração própria

Como podemos verificar na tabela 17, não existe qualquer relação com o grau de visão e a zona escolhida para normalmente caminhar. Para cada uma das opções tanto existe uma pessoa cega como uma com baixa visão e as zonas preferenciais para a passagem são o centro do passeio ou junto à fachada dos edifícios.

Os argumentos apresentados para cada uma das escolhas bastante válidos. Quem se desloca pela zona central do passeio, dá preferência a essa área pelo facto de estar longe dos degraus e rampas de acessos a casas ou postes de electricidade, bem como outros objectos que normalmente são colocados juntos às portas e paredes dos edifícios. Relativamente ao argumento apresentado por quem caminha junto dos edifícios, esse é essencialmente por serem estes edifícios que servem de guia, e de localizador no espaço.

6. O que acha da acessibilidade em geral no CHVC?

Tabela 18: Qualificação do grau de acessibilidade do CHVC

1 – Bastante má 2 - Má 3- Boa 4 – Bastante

boa 5 - Óptima

Cego 1 X

Cego 2 X

Baixa-visão 1 X

Baixa-visão 2 X

As qualificações, tal como podemos ver na tabela 18, variam entre 1 – 5, considerando o 1 como “Bastante má “ e o 5 como sendo “Óptima” sendo que em média a acessibilidade no CHVC é considerada de “3 - Boa”. Podemos verificar que não existe qualquer relação entre o grau de visão e a qualificação atribuída.

Contudo esta classificação pode ser melhorada, uma vez que o maior número de obstáculos existentes, são obstáculos móveis, podendo ser mudados de local e assim permitirem a criação de uma faixa livre ao longo de toda a rua e consequentemente um CH mais acessível.

7. O espaço público do CH foi pensado na PDV?

Tabela 19: Qualificação se o CH foi projectado a pensar na PDV

1 – Discordo

totalmente 2 – Discordo 3- Concordo

4 – Concordo plenamente Cego 1 X Cego 2 X Baixa-visão 1 X Baixa-visão 2 X

Fonte: Elaboração própria

Na tabela 13, a opinião dos entrevistados varia entre a qualificação “1 – Discordo totalmente”, o “2- Discordo” e “3-Concordo”. Mais uma vez verificamos que não existe qualquer relação com o grau de visão do entrevistado.

8. O que acha indispensável existir no CH?

As respostas para além dos itens enunciados anteriormente como as faixas livres de obstáculos, o piso táctil e a sinalização sonora foram:

 Sensibilização dos comerciantes para que respeitem a faixa livre nos passeios

 Faixa central existente em algumas ruas, com textura diferente mas cor igual

 Utilização de luzes de chamada de atenção de existência de passadeira para os veículos, que em simultâneo ajuda a visualização por pessoas com baixa-visão da localização da passadeira.

9. Do que tem receio ao deslocar-se no CH?

Os obstáculos e as obras foram os únicos elementos apontados pelos entrevistados.

10. Como tem percepção da existência de ruas transversais à deslocação?

Cego1: sons, movimentos dos carros e das pessoas, vento, o eco, conhecimento do percurso

Cego 2: Deslocações de ar, sons a variarem nos diferentes locais, conhecimento do percurso

Baixa-visão 1: visão, e conhecimento do percurso

Baixa-visão 2: visão da zona onde termina a rua, e conhecimento do percurso

As respostas variaram de acordo com o grau de visão, ou seja, para as pessoas cegas essa percepção é feita através dos sons, dos movimentos das pessoas e automóveis, das deslocações de ar e o conhecimento do trajecto. Já para as pessoas com baixa-visão os factores são a visão ou seja, através desta são capazes de percepcionar quando acaba a rua ou existe um cruzamento, acrescentando como as pessoas cegas, o conhecimento do percurso.

11. Qual o local no CH que possui maiores dificuldade em se deslocar

 Praça da República, figura 10

 Avenida dos Combatentes da Grande Guerra, figura 11

 Passadeira no Passeio das Mordomas da Romaria, figura 12

Os dois primeiros locais foram apontados por três dos inquiridos, e são assim considerados devido ao grande número de obstáculos que se encontram nestes, sejam móveis – esplanadas, sejam fixos – floreiras e bancos. Por sua vez, um outro questionado apontou a passadeira no Passeio das Mordomas da Romaria. Apesar de esta subir até ao nível do passeio na zona de passagem e existirem pilaretes a fazer a divisão, o piso mantem-se igual, não permitindo a percepção da zona de passagem, permitindo a PDV aguardar que o veículo pare para o seu atravessamento.

12. Que exigências faria a quem projecta as cidades?

Cego 1: sensibilização para a colocação de mobiliário arrumado no espaço público, homogeneidade e coerência na colocação de materiais e elementos do espaço.

Cego 2: repensar/adaptar a arquitectura de modo a esta ter maior foco no sentido funcional em detrimento da parte estética

Baixa-visão 1: maior sensibilização, colocação da população na situação das PDV Baixa-visão 2: maior sensibilização, quem projecta e legisla devia chegar junto da população com DV e questionar quais as necessidades

A resposta mais obtida foi sensibilizar. Sensibilizar quem projecta e quem usufruí dos espaços, para que não coloquem objectos nas zonas de passagem. Para além disso, quem projecta deve ter em atenção ao sentido funcional, sendo esse o foco mais importante em detrimento da parte estética, mas também, se não sabe quais as adaptações e normas que deve

Figura 10: Fotografia da Praça da República Fonte: Elaboração própria

.

Figura 11: Fotografia da Avenida dos Combatentes G.G. Fonte: Elaboração própria.

Figura 12: Fotografia do Passeio das Mordomas da Romaria Fonte: Elaboração própria

seguir, perguntar a quem passa pelas dificuldades. Um outro factor apontado é que haja coerência e igualdade nas adaptações adoptadas, pelo menos na zona de estudo.

13. Como reconhece se um lugar é seguro para a deslocação?

Cego 1: não reconhece, vai caminhando com muito cuidado e atenção

Cego 2: tenta fazer antes o reconhecimento, ter ideia geral do que pode ou vai encontrar

Baixa-visão 1: não tem forma de saber, vai caminhando com cuidado Baixa-visão 2: caminhando com muita atenção e cuidado

A resposta foi unânime dizendo que não tem forma de saber, é necessário caminhar com muito cuidado, atenção e precaução, podendo fazer uma análise prévia junto de outra pessoa dos obstáculos que pode encontrar para além dos habituais.

14. Num local desconhecido o que auxilia?

Cego1: Prudência

Cego 2: nunca se desloca num local desconhecido sozinho, se não conhecer o local vai acompanhado de outra pessoa

Baixa-visão 1: calma, concentração ou preferencialmente com outra pessoa Baixa-visão 1: nunca se desloca sozinho num local desconhecido

As respostas variaram em duas vertentes, duas pessoas uma com baixa-visão e outra cega, disseram que nunca vão para locais desconhecidos sozinhos, ou seja, quando não conhecem o local vão sempre acompanhados por uma pessoa que seja capaz de lhe indicar o caminho e consequentemente os obstáculos que pode encontrar em situações de deslocação sozinho. Os restantes entrevistados dizem que vão com muita prudência, cuidado e atenção, tentando antecipar qualquer obstáculo ou perigo que possa surgir, contudo também revelam que tentam sempre ir com o acompanhamento de outra pessoa para auxiliar essa deslocaçao.

15. Sugestões

 As rampas de aproximação de passadeiras demasiado camufladas, fazem com que não se perceba o seu início e fim da passagem

 Zona central nas passadeiras de piso igual à restante passadeira, não permite identificar essa zona como zona de espera e de ter atenção

 Criação de um sinal sonoro de aviso aquando a existência de obras

 Utilização de pilaretes de cores contrastantes, como vermelho, amarelo, verde

 Mais sensibilização do comércio e dos automobilistas para a não colocação de obstáculos no passeio.

3.2.1 Conclusões gerais das entrevistas

Se este estudo tivesse que ser reduzido a uma só conclusão, essa seria, certamente nas necessidades que as pessoas cegas e as pessoas com baixa-visão têm quanto à acessibilidade, no espaço público. Essas necessidades são comuns, não havendo grandes distinções entre os dois grupos de pessoas entrevistadas.

Porém é possível concluir muitos mais com este estudo. Em primeiro lugar salienta-se que estes dados são provenientes de uma amostra muito reduzida, logo as ilações obtidas variam também da vivência de cada pessoa e do seu carisma, tendo todas elas formas diferentes de encarar o mundo que as rodeia.

A nível pessoal, seja qual for o entrevistado, se a deslocação tiver como acompanhante uma pessoa de confiança deste, a deslocação é preferencialmente efectuada com essa pessoa em preterição da bengala, do cão guia ou à confiança dos seus próprios sentidos.

Relativamente à zona onde é realizada a deslocação, as zonas preferenciais são a zona central do passeio ou pela zona mais próxima dos edifícios, não existindo relação entre o grau de visão e a zona preferencial de caminhar no passeio.

Apontados como maiores barreiras à deslocação as respostas foram unânimes em considerar o mobiliário urbano móvel - vendas e propagandas do comércio e esplanadas, e mobiliário urbano fixo - pilaretes, postes de iluminação, como sendo os maiores causadores de problemas, contudo, o estacionamento em cima dos passeios ou passadeiras e o não aviso de obras, também foram referenciados.

Dos elementos que auxiliam a deslocação destaca-se a faixa livre de obstáculos em toda a rua, o piso táctil nas passadeiras e suas aproximações e sempre que justificativo durante todo o percurso e a sinalização sonora em todas as passadeiras, contudo salientam a faixa central existente em algumas ruas da cidade, que apesar de não ter cor diferente a sua textura altera-se nessa zona, facilitando o atravessamento.

Quando questionados relativamente ao modo como têm percepção das mudanças de sentido ou do cruzamento com outras ruas, as respostas referidas foram as movimentações do ar, os sons e o conhecimento do percurso os elementos mais importantes para essa percepção, acrescentando ainda a visão no caso dos entrevistados com baixa-visão.

De uma forma geral a acessibilidade no CH de Viana do Castelo segundo os inquiridos é avaliado como sendo boa. Podendo ser melhorada, uma vez que o maior número de obstáculos existentes, tal como vimos anteriormente, são obstáculos móveis podendo ser mudados de local, permitindo assim a criação da faixa livre e deste modo tornarem o percurso e consequentemente o CH mais acessível.

Para isso é necessário que haja maior sensibilização junto dos comerciantes para que estes não coloquem obstáculos à circulação, e junto de quem projecta para que defina faixas de circulação livres ao longo de toda.

Em suma, o mais importante é que haja zonas livres para a circulação ao longo de toda e rua e que as adaptações sejam uniformes em todo o centro histórico.