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1.4.2 As Formas de Trabalho Segundo o Sexo

ROY (1999), aponta que a inserção da mulher no mercado de trabalho passa pela divisão sexual do trabalho e as inovações tecnológicas não ocorrem do mesmo modo entre homens e mulheres, pois também levam em conta a idade, raça, sexo. Há uma acentuação dessa divisão no mercado de trabalho, pois ocorre uma segregação vertical onde as mulheres ocupam cargos baixos, enquanto os altos cargos ficam por conta dos homens.

Por sua vez SOUZA-LOBO (1991) aponta que o trabalho feminino na indústria de São Paulo possui algumas características específicas como: a) salários

femininos mais baixos que os masculinos, se acentuando com a idade, b) as mulheres se concentram em atividades não qualificadas ou semi-qualificadas, c) as tarefas são monótonas e repetitivas d) as atividades requerem destreza e habilidade.

Ao se assalariar, as relações estabelecidas no âmbito privado do lar, passam a serem reproduzidos no âmbito público e assim o gênero feminino submisso no âmbito privado, pelo marido ou pai, passa agora a ser submetido às condições do capitalista e este a subjuga não somente como classe, mas como gênero, provedora da força-de- trabalho.

FARIA e NOBRE (1997) colocam que a mulher ao se inserir no mercado de trabalho, realiza atividades tipicamente femininas, como professoras, enfermeiras, secretárias, assistentes sociais, etc. Fato confirmado pela análise que procedemos nos sindicatos, onde as mulheres se concentravam em funções de professora, funcionária pública municipal, limpeza de ruas e limpeza de bancos, além das trabalhadoras do setor do comércio, que atuam como vendedoras.

Apesar do número de mulheres no mercado de trabalho estar aumentando, juntamente com o aumento da escolaridade, poderiam indicar uma maior qualificação e maior estabilidade do setor produtivo, porém o que ocorreu foi o contrário, ou seja, o aumento do número de posto de trabalho tendo a frente às mulheres se dá às custas da ausência de registro e à base de rendimentos menores do que os percebidos pelos homens.

Segundo OLIVEIRA (1997b), a tendência de aumento da participação da mulher no mercado de trabalho nas últimas décadas vem acompanhada de duas características interessantes:

Primero la permanencia de la segregación entre trabajo doméstico y extradoméstico impide la igualdad de condiciones en el acesso al trabajo remunerado y refuerza la situación de desvantaja social de las mujeres en ambos espacios. Segundo, es necesario evaluar la calidad del trabajo extradoméstico que las mujeres están desempeñando para tener una idea del tipo de inclusión social que éste les propicia. (OLIVEIRA, 1997b, p. 188).

Para ROY (1999), a qualificação está baseada na construção histórica de homens e mulheres trabalhadoras, pois ambos não são capacitados de forma igual na família e na escola, para o mercado de trabalho.

Esse processo acaba desqualificando a mulher, pois mesmo com a qualificação real, ou seja, o conhecimento adquirido, quando analisado seu dados

curriculares, esse saber não constará oficialmente. Seria o mesmo que dizer que a desqualificação do posto de trabalho vem ao encontro à sua própria desqualificação25.

A questão da qualificação com a implantação dos programas de Qualidade Total (QT) e Círculo de Controle de Qualidade (CCQ), passou a ser implantado, com a retomada do crescimento econômico, que entrou numa nova fase a partir da década de 70, no Brasil. Essa fase se dividiu em 3 momentos diferenciados: o primeiro momento ocorreu com a difusão do CCQ, no início da década de 70, o segundo momento em 84, com a Inovação Tecnológica e Organizacional e a terceira fase no início dos anos 90, com a reestruturação produtiva e a implantação por muitas empresas, do Programa Brasileiro de Qualidade e Produtividade (PBQP).

Ou seja, as transformações no mundo do trabalho trouxeram a exigência da qualificação profissional, para saber manipular e operar os equipamentos, porém a exigência da formação não condiz com as funções e o salário. Não é a alfabetização que determina o salário, pois este tem sido tendencionalmente achatado e deflacionado e no caso da mulher trabalhadora, ela sofre duplamente com a discriminação, pois na mesma função e muitas vezes mais qualificada que o homem, a mulher recebe menor remuneração.26

O fato é que, se a tecnologia possibilita que uma pessoa execute várias tarefas, por outro lado, existe a inutilidade de se qualificarem tantas pessoas para dado trabalho, pois certas funções na fábrica são extintas com o emprego da tecnologia.

É sabido que o CCQ objetivou disciplinar a iniciativa operária, principalmente os trabalhadores mais qualificados e assim desviar o ímpeto participativo para formas que contassem com o controle gerencial, haja vista que no final dos anos 70 houve uma retomada do movimento sindical. Assim, a implantação da QT foi também uma meta para atingir a produção e assim dominar a força-de-trabalho. Ou seja, essas novas formas de organização do trabalho, trouxeram uma característica nova aos trabalhadores, que é a sensação de comando da situação na produção, pois em sintonia com os demais componentes do grupo, podem se organizar e conseguirem atingir patamares mais elevados

25

Cf. ROY (1999)

de produtividade, ficando a responsabilidade e sustentação da firma nas mãos dos funcionários.

No caso da mulher, essa questão é mais firmemente ideologizada, com sua inserção nos programas de QT, apesar dela não ocupar os cargos de comando, essa inserção traz não só a sensação de participante, mas faz com que sinta mulher-trabalhadora- responsável na produção, assim como é socialmente reconhecida como mulher-mãe- responsável-na esfera-doméstica. (ROY, 1999)

Porém o que está colocado para os trabalhadores de forma geral, apoiado nesses programas de controle de qualidade, é a busca da produtividade pela intensidade e sem o conhecimento do processo completo de trabalho. A inovação trouxe a substituição do homem pela máquina, o conhecimento passou a se fragmentar e a realização de toda a etapa da produção, antes realizada por uma única pessoa se fragmentou, com a implantação da divisão técnica do trabalho.

O capitalismo, com a “ajuda” da ciência, substituiu o saber artesanal de todo o processo produtivo das mãos do trabalhador, para a fragmentação das etapas, pela utilização da máquina, assim distanciou o trabalhador cada vez mais do produto de seu trabalho.

As inovações na estrutura organizacional do trabalho e as inovações tecnológicas trouxeram também uma tendência a precarização do trabalho com perdas salariais, dos direitos trabalhistas, enfim da fragilização do trabalhador, que acaba se submetendo a essas condições. O maior desdobramento dessa renovação no mundo do trabalho, portanto, são as formas de trabalho precárias que foram criadas sem qualquer preocupação com a seguridade social, como os trabalhos de tempo parcial, o trabalho informal, o trabalho domiciliar e o trabalho de tempo temporário. É como assevera ANTUNES que “A sociedade do capital e sua lei do valor necessitam cada vez menos do trabalho estável e cada vez mais das diversificadas formas de trabalho parcial ou part-time, terceirizada....” (1999, 119).

OLIVEIRA (1997b) nos coloca que, com as inovações tecnológicas e as novas formas de organização e gestão do trabalho, percebe-se que novas oportunidades são criadas às mulheres. Funções até então ocupadas somente por homens, agora estão sendo

ocupados por mulheres, como nas indústrias metalúrgicas e químicas, mudando o perfil das funções “ditas femininas”.

Nesse sentido HIRATA (1998) afirma que as novas oportunidades criadas para as mulheres, com as inovações tecnológicas e organizacionais, na verdade foram acompanhadas da manutenção de uma hierarquia social e técnica, com a supremacia masculina, com as mulheres permanecendo controladas por formas e procedimentos tayloristas, além de não haver aumento na qualificação.

Ou seja, nas indústrias, de acordo com SOUZA-LOBO (1991), existe o pretexto de que determinadas funções são específicas às mulheres, pois somente elas possuem aptidão à realização de tarefas monótonas e repetitivas, e que são também as menos qualificadas e de salários menores. Enquanto que aos homens, devido à força física, são destinadas funções que exigem destreza, que são as mais qualificadas e os salários condizentes, mesmo que este não tenha formação adequada. O que não acontece de forma linear com a mulher, que exercendo a mesma função que os homens, seu serviço não é reconhecido socialmente e economicamente, apesar de tal fato ocorrer em casos raros, já que as funções são pré-determinadas, sendo as femininas às de alta rotatividade, que não visam a construção de carreira.

Dessa forma:

Desqualificação, baixos salários, ausência de carreira se articulam compondo o círculo vicioso: as mulheres ganham menos porque não são qualificadas porque não fazem cursos técnicos, pois não vêem perspectiva de carreira. (Debate Sindical, 1989, nº 10, p. 35)

Assim a possibilidade de se fazer carreira é consubstanciado na política de salários, pois segundo a lógica da divisão sexual do trabalho, o gênero é que define a função e o salário, e a possibilidade de formalizar seus conhecimentos, depende, portanto de quanto se ganha.

A fragilização é uma tendência que tem atingido ambos os sexos, porém são as mulheres as mais prejudicadas, pois o índice de mulheres que ingressam no mercado de trabalho tem sido superior ao índice de ingresso masculino, mesmo no período de crises econômicas. HIRATA (1998)

Isso significa dizer que, as mulheres são as que mais se submetem a qualquer tipo de serviço, seja devido à necessidade de se tornarem mais autônomas e

independentes (do lar, do marido ou do pai) ou da necessidade de aumentarem o orçamento familiar e assim alimentarem a prole.

Em consonância com essa questão, OLIVEIRA (1997b) disserta que, são as mulheres as que mais ingressam no trabalho não assalariado, atividades por conta própria e o trabalho de tempo parcial ou part-time, apesar deste se expandir de forma generalizada a toda força de trabalho, são as mulheres que permanecem há mais tempo nessa atividade. Essa “escolha”, segundo a autora, esconde a conveniência deste tipo de emprego, pois a mulher tem as tarefas domésticas e com ela a dupla jornada de trabalho, assim ao ingressar no mercado de trabalho, realizando essas tarefas em que horário do trabalho é mais flexível, ela consegue organizar seu tempo com o serviço doméstico e dedicação de mais tempo aos filhos. Dessa forma, segundo a autora:

...las mujeres por cuenta própria no sólo están segregadas en actividades más precarias sino que incluso al interior de estas actividades ellas se ubican en una peor posición relativa respecto de los varones (OLIVEIRA, 1997b, p. 190)

Devido à segregação entre trabalho doméstico e extradoméstico, há uma repercussão nos níveis de inserção da força-de-trabalho feminina e masculina no mercado de trabalho, com uma tendência da taxa de atividade feminina ser inserida em setores inferiores, ocasionando a exclusão social. Além da segmentação ocasionada pelo surgimento de um novo modelo de emprego precário feminino, generalizado a toda força de trabalho que é o trabalho de tempo parcial.

As mulheres também se inserem no trabalho domiciliar, nessa situação, “o trabalho se confunde com a dinâmica familiar” (TELES apud RAMALHO, 1997, p. 88). Pela ausência de direitos sociais, pela pouca definição da relação de trabalho assalariado, além do fato de ser transferida os custos sociais para essas trabalhadoras.

... essa situação reforça a ideologia da domesticidade, pois a falta de possibilidade de

carreira ou promoção, ignoradas pelos sindicatos e sem benefícios sociais, faz com que as mulheres trabalhadoras tenham grande dificuldade para diferenciar a sua atividade profissional daquela de mãe e esposa. (ABREU & SORJ apud RAMALHO, 1997, p. 89).

O gênero feminino sofre além da exploração da classe, a opressão do gênero, “A exploração de classe se articula intrinsecamente com a opressão de raça, assim como ocorre com a opressão de gênero” (BALCÃO, 1993, p. 14).

O esforço da mulher duplica com a inserção no trabalho assalariado, onde mesmo com a execução da dupla jornada de trabalho, somente um trabalho é pago e

reconhecido, já que o trabalho doméstico faz parte da condição de mulher e o emprego faz parte da condição de mulher pobre, mas ambos não são fruto de uma escolha.

Dessa forma, a história de subjugação de uns sobre outros aqui tem essa particularidade, dos homens subjugarem as mulheres. E estas muitas vezes tendo em vista a sua inserção no mercado de trabalho, tem percorrido o mesmo caminho de subjugarem outras pessoas. Ou seja, muitas vezes a mulher, na tentativa de se livrar ou então amenizar sua dupla jornada usa da estratégia de empregar uma outra mulher para realizar suas funções domésticas, enquanto trabalham, ou então há um desdobramento das mulheres para elas mesmas realizarem essas tarefas domésticas.

Das categorias de trabalhadoras pesquisadas, podemos observar que 41,4% das trabalhadoras realizam as tarefas domésticas sozinhas e aquelas que contratam alguém para ajuda-las nessas tarefas são aquelas situadas nas categorias melhor remuneradas, somando 22,9%, conforme Gráfico 5. No caso das trabalhadoras entrevistadas, notamos que somente uma delas possui empregada doméstica, as demais realizam sozinhas, com duas delas que podem contar com a ajuda da mãe e outra com a ajuda da filha.

Podemos também verificar que, as tarefas domésticas ainda continuam sendo consideradas tarefas exclusivamente femininas, já que mesmo na alternativa de “outros”, são as mulheres que realizam, (a mãe ou irmã), enquanto que os maridos são ainda um dos que menos contribuem com seu trabalho na realização dessas tarefas.

Gráfico 5- Realização das Funções Domésticas (%)