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As Línguas Estrangeiras nos Primeiros Anos de Escolaridade – a realidade

CAPÍTULO I A Importância da Línguas Estrangeiras nos Sistemas Educativos

8. As Línguas Estrangeiras nos Primeiros Anos de Escolaridade – a realidade

Expostas as diferentes formas de abordar as línguas estrangeiras, não nos podemos esquecer que a realidade portuguesa sofre, neste ano lectivo de 2005/2006, uma mudança relativamente à introdução de LEs nos primeiros anos de escolaridade.

No início do presente ano lectivo de 2005/2006, o Governo Português seguiu o exemplo da maioria dos países da União Europeia, ao optar por introduzir uma LE nos primeiros anos de escolaridade, mais concretamente nos terceiros e quartos anos do 1º Ciclo do Ensino Básico (CEB).

Ainda que seja um assunto que nos últimos anos tem feito correr alguma tinta, o tema das LEs nos primeiros anos de escolaridade não é, como se pode constatar, um assunto, assim tão recente como se possa pensar.

Em 1989, a possibilidade de aprendizagem de LE no 1º CEB tornou-se num dos aspectos inovadores contemplados na reforma do sistema educativo através da publicação do Decreto-Lei nº 286/89, de 29 de Agosto. O referido Decreto-Lei deu o devido relevo à aprendizagem de LE no âmbito dos ensinos básico e secundário, tendo determinado, no nº 1 do artigo 5º que, no âmbito do 1º Ciclo do ensino básico, as escolas podem

contexto lúdico, de acordo com os recursos disponíveis”. O mesmo despacho determina

ainda as condições em que pode ser proporcionada a iniciação à aprendizagem de uma LE no âmbito do 1º CEB, “poderá realizar-se em qualquer ano de escolaridade, devendo desenvolver-se ao longo do ano lectivo, em actividades de complemento curricular gratuitas e facultativas, sem exclusão de qualquer aluno interessado”.

Relativamente às actividades referentes à mesma aprendizagem, o despacho anota que estas poderão “ser promovidas por instituições oficiais, órgãos autárquicos, associações de pais e outras instituições, que suportarão os encargos”. O mesmo despacho explica que a referida aprendizagem deverá ser articulada com o desenvolvimento dos planos curriculares, “ não podendo perturbar o normal funcionamento da escola, nem originar acréscimo de encargos”. Finalmente, deverá a escola decidir as actividades de iniciação à língua, ponderando, no entanto, os recursos humanos disponíveis, as características da população escolar, os recursos materiais existentes, assim como o interesse e colaboração da comunidade, designadamente dos encarregados de educação.

Desta forma, evidenciamos que o despacho concede às escolas a plena responsabilidade para a iniciação da aprendizagem da língua na sua “vertente oral e lúdica”.

Depois desta data foi publicada alguma legislação explicativa de como esta nova reforma deveria ser implementada. Mas, com o decorrer do tempo, nada se concretizou no sentido de tornar real o que o se pretendia com a publicação do referido Decreto-Lei.

Em 1990, um ano depois da nova reforma, os programas aprovados pelo despacho nº139/ME/90, de 16 de Agosto, incluíam o seguinte: “d) Proporcionar a aprendizagem de uma primeira língua estrangeira e a iniciação de uma segunda” (Objectivos Gerais do Ensino Básico, página 9). No entanto, somente dois anos depois o Ministério da Educação começou a revelar alguma preocupação com o lançamento do ensino de uma LE no 1º Ciclo, quando em Julho de 1992, a Direcção-Geral do Ensino Básico e Secundário publicou o documento “Aprendizagem de uma Língua Estrangeira no 1º Ciclo”.

Neste documento foram delineadas algumas características importantes para um projecto de LE no 1º Ciclo. Este documento, segundo Dias & Mourão (2005), pouco continha que pudesse apoiar os professores que entretanto tinham tomado a iniciativa de

documento, estava descrita a forma como a LE deveria ser abordada, explicitando os processos a utilizar. Os processos deveriam ser aliciantes e motivadores para as crianças, visto que neste Ciclo estava pensada apenas uma sensibilização à LE, sendo aconselhadas metodologias baseadas na oralidade e em actividades lúdicas.

Mais recentemente o Decreto-Lei nº 6/2001 de 18 de Janeiro que estabelece os princípios da organização e gestão curricular do ensino básico, refere no ponto 1 do Artigo 7º que “as escolas do 1º Ciclo podem, de acordo com os recursos disponíveis, proporcionar a iniciação a uma língua estrangeira, com ênfase na sua expressão oral”. No artigo 9º do mesmo decreto, a iniciação a uma LE surge enquanto actividade de enriquecimento do currículo, mencionando que “as escolas no desenvolvimento do seu projecto educativo, devem proporcionar aos alunos actividades de enriquecimento do currículo, incidindo, nomeadamente, nos domínios desportivo, artístico, científico, e tecnológico, de ligação da escola com o meio, de solidariedade e voluntariado e da dimensão europeia na educação”.

Neste enquadramento, a integração de uma língua estrangeira no 1º CEB deverá então ser considerada enquanto actividade enriquecedora do currículo, gerida e decidida pela escola e respectivos professores.

Sabemos que assim foi durante alguns anos, os alunos tinham contacto com uma ou duas LEs, principalmente nas Escolas Básicas Integradas, onde os professores do 2º ciclo iniciavam esse contacto numa vertente o mais lúdica possível. No entanto, também sabemos que a orientação legal existente, que guiasse o professor para tal tarefa, era escassa, ficando todo o processo somente a seu encargo pessoal.

Entretanto, também em 2001, o Ministério da Educação (ME), organizou um documento, Currículo Nacional do Ensino Básico – Competências Essenciais, onde definiu o conjunto de competências consideradas essenciais e estruturantes no âmbito do desenvolvimento do currículo nacional, para cada um dos ciclos do ensino básico.

Relativamente às LEs, o documento visa “fazer emergir as competências específicas na construção de uma competência global em línguas estrangeiras” (Ministério da Educação, 2001a: 39).

fase (1º ciclo) e determinou-se que o processo de ensino se centrasse na promoção de uma relação afectiva com a LE. O mesmo documento refere que “a sensibilização à diversidade linguística e culturalexige que aos aprendentes sejam dadas oportunidades de se envolverem em tarefas e actos comunicativos que lhes proporcionem vivências estimulantes” (Ministério da Educação, 2001a: 41)

Neste documento é referenciada uma “sensibilização à diversidade linguística e cultural” existente, defendendo que “as aprendizagens em línguas estrangeiras, no 1º ciclo, deverão ser orientadas no sentido de uma sensibilização à diversidade linguística e cultural. A abertura da escola a essa pluralidade traduzir-se-á na criação de espaços de receptividade a outras línguas e outras culturas – eventualmente presentes no meio envolvente -, ao estabelecimento entre estas e a língua materna e ao convívio com outros modos de ser, de estar e de viver” (Ministério da Educação, 2001a: 45).

Quatro anos volvidos desde a publicação do documento acima referenciado, muitas foram as escolas que seguiram as recomendações das políticas educativas nacionais e viveram experiências de contacto com línguas estrangeiras, através das quais o tipo de abordagem era da responsabilidade das entidades que as desenvolviam.

No entanto, o actual Governo em Junho de 2005 aprovou o Programa de Generalização do Inglês no 1º Ciclo do Ensino Básico, regulamentado pelo Despacho nº 14 753/2005 (2ª série), o qual se desenvolve ao longo do ano lectivo, em regime de complemento educativo, de frequência gratuita, abrangendo os 3º e 4º anos de escolaridade dos estabelecimentos públicos onde seja ministrado o primeiro ciclo do ensino básico e com uma duração semanal, correspondente a um tempo e meio lectivo (135 minutos). O desenvolvimento do programa não poderá perturbar o normal funcionamento das actividades curriculares dos alunos nem do estabelecimento de ensino (ou seja, deverá ter lugar em situação extra-curricular, e todos os alunos envolvidos no programa beneficiarão de um apoio financeiro fixado em €100 por aluno para o ano lectivo de 2005/2006).

Se nos Despachos anteriores as actividades eram da responsabilidade de diferentes entidades (associação de pais, Câmaras Municipais, etc.) sem qualquer tipo de apoio financeiro do governo, desta feita as mesmas entidades podem candidatar-se ao referido apoio. No art.11º do mesmo despacho é definido o perfil dos professores de Inglês que

Depois de aprovado o programa, o Gabinete do Ensino Básico do Ministério da Educação disponibilizou uma lista de recursos disponíveis no mercado de apoio ao professor, tanto a nível da metodologia como de sugestões para utilização em sala de aula. A informação contida na lista está organizada em quatro secções: manuais; recursos para professores; outros recursos e Websites de editores.

Como se pode constatar, a introdução de LEs nos primeiros anos de escolaridade, é um tema pensado há quase duas décadas a nível nacional, ainda que, apenas neste ano, se tenha despertado verdadeiramente para a sua importância, ao ser aprovado o Programa de Generalização do Ensino de Inglês no 1º Ciclo do Ensino Básico.

No entanto, perante os três modelos de abordagem da LEs nos primeiros anos de escolaridade atrás descritos, vemos que Portugal optou por um modelo que se situa entre uma sensibilização a uma só língua estrangeira e a aprendizagem sistemática de uma língua estrangeira.

Com a publicação do documento “Orientações Pragmáticas” (Bento et al 2005), os objectivos para a língua estrangeira (o inglês) vão além da ideia da sensibilização à diversidade linguística e cultural, caminhando para um modelo de aprendizagem sistemática da língua. Estes objectivos focam aspectos de aprendizagem da língua, encorajando a comunicação, centrando-se também em aspectos interculturais e em estratégias de aprendizagem, na garantia de que a grande preocupação é a educação global da criança.

Segundo o referido documento, são finalidades da Língua Inglesa no 1º ciclo do ensino básico:

- sensibilizar para a diversidade linguística e cultural;

- fomentar uma relação positiva com a aprendizagem da língua e, ao mesmo tempo, promover a educação para o respeito pelo outro, a ajuda mútua, a solidariedade e a cidadania;

- contribuir para o desenvolvimento equilibrado de capacidades cognitivas e sócio- afectivas, culturais e psicomotoras da criança;

- proporcionar experiências de aprendizagem significativas, diversificadas, integradoras e socializadoras, desenvolvendo atitudes de autoconfiança e de

- promover o desenvolvimento de estratégias de aprendizagem, estimulando a capacidade de concentração e de memorização (Bento et al, 2005: 4).

Perante estes objectivos pensamos que esta nova realidade pode proporcionar o desenvolvimento de atitudes de tolerância para com a diversidade, através do contacto com o Inglês, no entanto não podemos esquecer que existe ainda uma meta mais longa a atingir e que é prioritária na sociedade europeia, preservar, manter e promover a diversidade linguística e cultural. Mas para isso não basta defender a necessidade de aprender línguas e facultar a sua expansão, é primordial que se ensine a aceitar a diversidade europeia e/ou mundial.

Desta forma, na nossa perspectiva e tal como temos vindo a defender, a sensibilização à diversidade linguística e cultural deveria ser um primeiro passo, precedendo qualquer ensino sistemático de LEs.

Portugal é, cada vez mais, um país de acolhimento de pessoas de outros países e, consequentemente, de outras línguas e culturas. Deste modo, é urgente que estejamos sensibilizados enquanto cidadãos e enquanto professores para a necessidade de formar e educar os jovens no sentido de neles despertar atitudes positivas face ao Outro.

Muitas vezes, as crianças que frequentam o 1º CEB não têm noção do ambiente plurilingue e pluricultural que as rodeia. É neste sentido que se têm vindo a fazer alguns esforços no sentido de as familiarizar e de as fazer contactar, cada vez mais cedo, com várias línguas e culturas. Cabe ao professor adoptar métodos facilitadores de inclusão de crianças alógenas e, consequentemente, de incentivar as crianças portuguesas a aceitá-las e respeitá-las.

Mas não são só as crianças que precisam de ser sensibilizadas para a diversidade linguística e cultural, os próprios professores têm de aprender a lidar com a diferença e a perceber claramente o que está em jogo nas diferentes opções de inclusão curricular das LEs nos primeiros anos de escolaridade.