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2 A REVOLUÇÃO INFORMACIONAL: EVIDÊNCIAS DA

3.4 Definições da Imaterialidade do Trabalho na Visão de André Gorz

3.4.1 As metamorfoses da sociedade do trabalho

Neste ponto, o estudo traz à tona o entendimento de Gorz sobre a forma que o capitalismo tem encontrado para redefinir-se, no contexto da sociedade pós- industrial. O autor identifica as metamorfoses da sociedade do trabalho referindo-se a conceitos clássicos do capitalismo que agora precisam adaptar-se à sociedade do

conhecimento, ao capitalismo cognitivo. Vejam-se os seus pontos de partida para uma visão crítica da sociedade pós-industrial:

Nós atravessamos um período em que coexistem muitos modos de produção. O capitalismo moderno, centrado sobre a valorização de grandes massas de capital fixo material, é cada vez mais rapidamente substituído por um capitalismo pós-moderno centrado na valorização de capital dito imaterial, qualificado também de “capital humano”, “capital conhecimento” ou “capital inteligência”. Essa mutação se faz acompanhar de novas metamorfoses do trabalho. O trabalho abstrato simples, que, desde Adam Smith, era conhecido como a fonte do valor, é agora substituído por trabalho complexo. O trabalho de produção material, mensurável em unidades de produtos por unidades de tempo, é substituído por trabalho dito imaterial, ao qual os padrões clássicos de medida não mais podem se aplicar (GORZ, 2005, p. 10).

O raciocínio de Gorz, em certa medida, é mais respeitoso à teoria Marxista, o autor não subverte os conceitos de Marx com tanto vigor quanto Jean Lojkine61. Observe-se o alinhamento de Gorz ao pensamento de Marx: “o trabalho em sua forma imediata”, mensurável e quantificável, deverá, por consequência, deixar de ser a medida da riqueza criada. Esta “dependerá cada vez menos do tempo de trabalho e da quantia de trabalho fornecida”; ela dependerá cada vez mais “do nível geral da ciência e do progresso da tecnologia” (GORZ, 2005, p. 592). “O trabalho imediato e sua quantidade não mais parecem como o principal determinante da produção”, mas então apenas “como um momento indispensável, porém subalterno em relação à atividade científica geral” (GORZ, 2005, p. 587). O “processo de produção” não poderá mais ser confundido com um “processo de trabalho”62(MARX, 1953, p. 593apudGORZ, 2005, p. 15).

Gorz encontra no marxismo o fundamento para as suas próprias previsões. A ideia de que o trabalho imaterial ascenderia e se tornaria cada vez mais determinante na economia já estava contida no pensamento de Marx. Conceitos subjetivos como a criatividade, inteligência, conhecimento, agregam mais valor ao trabalhador do que a sua capacidade física.

O que importa não é sequer a ciência ou o conhecimento, mas a inteligência, a imaginação e o saber que, juntos, constituem o “capital humano”. O individuo enquanto ser criativo e inteligente torna-se, portanto, capital humano da empresa.

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Vide ponto 3.2 da presente dissertação: pensamento de Lojkine sobre a imaterialidade do trabalho.

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Karl Marx, Grundrisse, Berlim, Dietz Verlag, 1953, p. 593. As citações que se seguem, assim como as menções de páginas no texto, se referem a essa obra.

Por exemplo: alguém que trabalha há certo tempo exercendo funções de gerenciamento de uma área, adquire conhecimentos específicos relacionados ao desenvolvimento de suas tarefas, desenvolve a capacidade de resolver diariamente, questões problemáticas, e, em geral, fora submetido a processos de treinamento e capacitação – tudo o que agrega valor a si.

Nesse contexto, o trabalhador faz parte do capital da empresa, capital que se denomina humano. A soma das suas características e qualidades subjetivas representam um valor que compõe o capital da empresa.

A saída deste trabalhador da empresa implicará na saída de conhecimento, criatividade e demandarão custo adicional para readaptação dos procedimentos às novas inteligências. Em que conta foram investidos aqueles recursos? Como manusear aquele programa de computador? Onde aquela máquina foi comprada? todas estas perguntas demandarão recursos para serem respondidas adequada e rapidamente, uma vez que aquele capital humano fora perdido e deverá ser ressarcido o mais rápido possível, para evitar prejuízos.

Substituir tal trabalhador implica, em encontrar, outro equivalente no mercado, investir em treinamento, esperar sua maturação, adaptação à nova empresa, correr o risco de não dar certo. Tudo isso são fatores que implicam na valorização do capital humano.

O trabalho não é mais mensurável segundo padrões e normas preestabelecidas. “Não se sabe mais como definir as tarefas de maneira objetiva. O desempenho não é mais definido na relação com essas tarefas; ele tem a ver diretamente com as pessoas” (VELTZ, 2001, p. 67)63

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São qualidades subjetivas, para Gorz, impossíveis de mensurar. Jean Lojkine, indica que o capitalismo insiste em manter inapropriadamente os velhos padrões de mensuração de valor do trabalho64.

A subjetividade do trabalho que se torna impossível de valorização são: “o discernimento, a capacidade de enfrentar o imprevisto, de identificar e de resolver os problemas” (GORZ, 2005, p. 18). Assim, o tradicional modelo de mensuração do trabalho, através do tempo, não é mais adequado, uma vez que o que importa ao

63 VELTZ, Pierre. La nouvelle révolution industrielle. Revue Du Mauss, n.18, “Travailler est-il (bien)

naturel?”, 2001.

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capitalismo cognitivo são as capacidades de resolução de problemas, a inteligência e o discernimento do trabalhador.

Se não é possível determinar o valor do trabalho através do padrão tradicional tempo, as empresas optam por mensurar o trabalho através do cumprimento de metas, do alcance de objetivos específicos. Estipulam-se metas a serem cumpridas, independente da quantidade de horas dispendidas65.

Evidente que o fator tempo será considerado. A quantidade de horas necessárias para a realização de uma tarefa é fator considerável, mas não determinante.

Esta categoria de trabalho, imaterial, portanto, torna-se a mola propulsora do sistema capitalista pós-fordista. Na economia do conhecimento os trabalhadores imateriais são os produtores da riqueza que não se mede simplesmente por capital imobiliário, mas, sim, e principalmente, pela capacidade de criação, de inovação.