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2 A REVOLUÇÃO INFORMACIONAL: EVIDÊNCIAS DA

3.2 O Trabalho Imaterial no Contexto da Revolução Informacional sob a

3.2.1 A Sociedade “Pós-Industrial”

O melhor entendimento da tese da revolução informacional passa pela verificação e análise dos fatos históricos que levaram a sociedade do trabalho ao patamar global e informacional.

A ideia central da revolução informacional, em Lojkine (2002), está assentada na verificação da substituição da produção pela informação. Não há como avançar o raciocínio, nesse sentido, sem que haja uma real interpretação das relações existentes entre a indústria e serviços, concepção e fabricação, ciência e experiência e, consequentemente, entre assalariados da produção e assalariados da concepção.

Atribui Lojkine (2002) a esta capacidade de interpretação de conceitos, e percepção de alteração da estrutura da sociedade do trabalho na Alemanha e no Japão como principal influência para o “sucesso” de tais economias e, por outro lado, o fracasso da economia americana, que não haveria se apercebido de tais metamorfoses do mundo do trabalho.

Traz à tona D. Bell (BELL, 1976 apud LOJKINE, 2002), um prognóstico bastante relevante para a sociedade do trabalho. Afirma que,

estamos assistindo a uma substituição inexorável (ligada ao progresso técnico) das atividades industriais fundadas na manipulação da matéria por atividades industriais fundadas no tratamento da informação – tal como se assistiu, no século passado, à substituição da agricultura pela indústria. (BELL, 1976 apud LOJKINE, 2002, p. 239)

O autor demonstra que o capitalismo pós-fordista exige um novo tipo de mão- de-obra verdadeiramente adaptado às novas tecnologias da informação. Os novos postos de trabalho exigem uma perfeição diferenciada, com maior preparo técnico. Verifica-se uma intelectualização dos novos ofícios, sendo esses essencialmente

informacionais: “o saber abstrato da „ciência‟ e dos cientistas substituiria a experiência concreta dos saberes-fazeres produtivos” (LOJKINE, 1990, p. 239 apud LOJKINE, 2002, p. 239).

No dizer de Bell, o “princípio axial” da sociedade pós-industrial é, na verdade, “a centralidade do saber teórico, tanto gerador da inovação quanto das ideias- matrizes que inspiram a coletividade” (BELL, 1976 apud LOJKINE, 2002, p. 239).

É preciso entender corretamente o conceito de “tecnologia do intelecto” desenvolvida pelos teóricos que examinam a revolução informacional. A ideia está centrada na observação das metamorfoses que se estabelecem no seio do sistema produtivo e passam a ser baseados na ciência. Entenda-se ciência no seu sentido epistemológico, bem como suas aplicações técnicas. O conhecimento passa então a ocupar posição de destaque no processo produtivo.

A sociedade, que passou por modos de produção conhecidos como fordismo e taylorismo, sistemas de trabalho simples e parcelado, que integravam a base da produção, agora está se reorganizando através de novos conceitos fomentados pela revolução científica e técnica.

Nesse novo cenário, da revolução científica e técnica, “a prioridade da ciência sobre a técnica e a da técnica sobre a produção diretatornam-se a lei de desenvolvimento das forças produtivas” (RICHTA, 1969 apud LOJKINE, 2002, p. 239-240).

A substituição do trabalho material pelo trabalho imaterial chega ao prognóstico do fim do trabalho material. Como se vê a expressão “substituição”, para os autores estudados neste capítulo, é encarada no sentido literal. Haverá de se substituir o trabalho material pelo imaterial, absolutamente, ou seja, o primeiro tipo de trabalho deixa de existir em função do outro.

Mas como então transformar a natureza produzindo riqueza? O trabalho manual, físico, material será absolutamente tomado pelas máquinas, em substituição total ao trabalho braçal humano. As máquinas requererão, por outro lado, o trabalho imaterial dos trabalhadores capazes de manipular, produzir seus programas, capazes de gerenciar os braços cibernéticos das máquinas que agora montam os veículos na linha de montagem.31

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Se, como pensam Bell e os teóricos da sociedade pós-industrial, o saber abstrato (a ciência) substitui o trabalho simples na produção direta, o valor-trabalho, fundação da economia política

Observe-se que o trabalhador substituído pela máquina não está apto a operá-la, uma vez que não possui, em regra, preparo técnico para tanto. O trabalhador que estava na porta de entrada do estacionamento entregando o comprovante de entrada com a hora, fora substituído por uma máquina que, através de um simples toque, é capaz de imprimir um comprovante e entregá-lo em mãos.

Por trás da máquina há trabalho humano, sim, mas em outra dimensão, é o trabalhador imaterial que a programou para o seu adequado funcionamento, bem como aquele que possui conhecimento técnico suficiente para manuseá-la bem e como fazer a sua manutenção.

Por outro lado, o trabalhador que fora substituído pela máquina (que agora, faz o trabalho material, sem intervalos para descanso ou férias, e sem ônus trabalhista e previdenciário) terá cada vez mais dificuldade para se reintegrar ao mercado de trabalho baseado na produção voltada ao conhecimento, enquanto estiver tentando alienar a sua força de trabalho simplesmente baseada no trabalho material.

Todas essas transformações estão diretamente relacionadas ao valor do trabalho que é bem estudado por Gorz e Lojkine, Veja-se a concepção do autor:

O valor-trabalho da sociedade industrial (capitalista) seria substituído, então, pelo “valor-saber” da sociedade pós- industrial (pós-capitalista). Por isto, a sociedade pós-industrial recupera as teses sobre o pós-capitalismo gerencial: uma nova classe de “gerentes”-organizadores deslocaria o poder dos acionistas capitalistas (Burnham, Dahrendorf, Galbraith, Bell, etc.); as antigas relações de exploração seriam substituídas por relações de dominação (Touraine). (LOJKINE, 2002, p. 240)

Como observação daquilo que mais interessa ao presente estudo, perceba-se que a sociedade pós-industrial, traz, em seu conteúdo matricial, a ascendência de uma nova espécie de trabalhadores, a referência àqueles que dominam a técnica, a ciência.

clássica (Smith, Ricardo) e de sua crítica marxista, deixa de ser o critério central para a avaliação do progresso tecnológico e do crescimento das atividades informacionais. O valor-trabalho da sociedade industrial (capitalista) seria substituído, então, pelo “valor-saber” da sociedade pós-industrial (pós- capitalista). Por isto, a sociedade pós-industrial recupera as teses sobre o pós-capitalismo gerencial: uma nova classe de “gerentes”-organizadores deslocaria o poder dos acionistas capitalistas (Burnham, Dahrendorf, Galbraith, Bell, etc.); as antigas relações de exploração seriam substituídas por relações de dominação (Touraine) (LOJKINE, 2002, p. 239).

Quando se fala na substituição do trabalho material pelo trabalho imaterial, fala-se, igualmente, na substituição do protagonismo da classe operária da revolução industrial pela classe dos trabalhadores do conhecimento. É essa classe de trabalhadores a bola da vez do capitalismo pós-industrial. Serão esses os agentes capazes, portanto, de se mobilizarem e se fazerem ouvir com a mesma intensidade que se viu nos operários das fábricas no capitalismo industrial.

Todavia, esclareça-se que a hipótese levantada pelo presente estudo é de que não é apenas dos trabalhadores do conhecimento a responsabilidade de retomar o movimento sindical verdadeiramente emancipatório e contra-hegemônico. Faz-se necessária a mobilização geral dos trabalhadores, sejam eles do conhecimento ou não. Deve-se chamar à discussão os empregados e desempregados, os não empregáveis, os microempreendedores, os ambulantes, autônomos, sem terra e sem teto. O movimento sindical pós-moderno deve abranger toda a classe-que-vive-do-trabalho.

Se está claro que o desenvolvimento tecnológico demanda cada dia mais, trabalhadores que operem os seus sistemas, que manuseiem as suas máquinas, que programem os seus softwares. Assim, cresce a demanda para a formação de tais profissionais.

Este prognóstico já pode ser evidenciado pelo desenvolvimento dos setores ligados à formação e ao desenvolvimento de inteligências, conforme anteriormente demonstrado. Repitam-se as palavras de Lojkine já citadas no ponto 2.1 do presente estudo:

Na sociedade rural e feudal, o crescimento dos “serviços” corresponde ao desenvolvimento de “serviços pessoais” (tais como os fornecidos pelos domésticos); na sociedade industrial, ele resulta de “necessidades subsidiárias ligadas à produção (tais como transporte e ou a distribuição)”; mas, na sociedade pós-industrial, é a expansão de atividades de saúde, de ensino, de pesquisa e de administração que desempenha o papel decisivo – “ora, é nestes domínios que cresce a nova intelligentsia (nas universidades, nas instituições de pesquisa, nas profissões liberais e similares, mas administrações)” (LOJKINE, 2002, p. 240-241).

O crescimento e a valorização da nova classe de trabalhadores do conhecimento são considerados como uma nova oportunidade para a reestruturação dos movimentos coletivos dos trabalhadores, em face da perda de força do operariado tradicional.

O esvaziamento dos trabalhadores no chão-de-fábrica minou a força dos movimentos sociais obreiristas. Contudo uma nova oportunidade se vislumbra no cenário do capitalismo pós-industrial32.

As novas demandas em busca dos trabalhadores do conhecimento determinam o encolhimento da classe operária tradicional e a questão que se levanta entre os teóricos do pós-fordismo é a seguinte: a nova classe revolucionária será necessariamente obreira? Ou será que a revolução informacional é capaz de mexer tanto com as estruturas da sociedade, ao ponto de reformular completamente a relação capital x trabalho? Não seriam simplesmente os trabalhadores (lato sensu), com ou sem vínculo empregatício, os novos agentes de transformação? Ou seria a união de todos eles?

Fato é que a cada dia cresce a massa de desempregados no mundo. E o que é pior, cresce a massa dos “não empregáveis”, trabalhadores vítimas do desemprego estrutural, que não encontram mais espaço onde possam se inserir.

Por outro lado, a diminuição da classe operária, o crescimento do desemprego, e o próprio desemprego estrutural não podem ser interpretados como sintomas de uma desaceleração da economia ou da própria atividade industrial.

Ocorre que o desenvolvimento tecnológico propicia, na produção, o emprego cada vez menor de trabalhadores. Há que se despender cada vez menos trabalho humano, especialmente, na execução de trabalhos manuais ou que exijam mero esforço físico, em que é fácil a substituição por máquinas. Segundo Lojkine,

O declínio correlato da parte do trabalho produtivo no emprego total criado não contradiz, absolutamente, o crescimento industrial necessário à saída da crise, na medida em que, justamente e como já o vimos, a revolução informacional permite criar mais produtos com menos empregos produtivos e mais empregos informacionais. Mais fundamentalmente ainda, o desenvolvimento da revolução informacional suporá, a médio prazo, a diminuição global do emprego ocupado com o aumento maciço da população em formação – isto é, improdutiva e inativa, mas, ao mesmo tempo, rica de potencialidades

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Esta ultima tese apresenta duas variantes, menos antagônicas que complementares: a tese “consensual”, sobre a proeminência da classe dos “profissionais”; e a tese “conflitual” da “nova classe operária” – os técnicos da sociedade pós-insdustrial substituindo os operários da sociedade industrial em seu combate revolucionário contra a classe dominante. É de notar que D. Bell sabe, admiravelmente, utilizar as contradições de alguns trabalhos qualificados como “neomarxistas” (Richta, Mallet, Gorz, Garaudy) para demonstrar que, de fato, eles também se vinculam ao tema da sociedade pós-industrial: “Se é verdade que, na sociedade pós-industrial, a classe operária está em regressão, como preservar a visão marxiana da história? [...] Não é afirmando que todo mundo, ou quase todo mundo, faz parte da classe operária que se poderá salvar a teoria” (LOJKINE, 2002, p. 241).

criativas. De fato, as novas tecnologias da informação permitirão, no marco de novas normas de eficácia social, uma diminuição maciça do tempo trabalhado e um aumento maciço do tempo disponível para atividades criadoras de alto nível (LOJKINE, 2002, p. 263).

As alterações sociais promovidas pelo desenvolvimento tecnológico são bem mais intensas e profundas do que se pode imaginar ou prever num estudo superficial. No contexto da sociedade do conhecimento os poderes são redistribuídos a novos atores que protagonizam uma nova luta de classes, que migram do chão de fábrica para o mundo virtual, seja no uso da tecnologia, para mera organização de forças, agrupamento, seja no sentido da própria guerra virtual, como será demonstrado adiante.