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As mulheres quilombolas que se reinventam: de agricultoras camponesas a

CAPITULO III O DESVENDAR DOS SUJEITOS DA PESQUISA: as mulheres

3. Quem são as mulheres quilombolas na Paraíba?

3.4. As mulheres quilombolas que se reinventam: de agricultoras camponesas a

Atualmente o trabalho na agricultura não representa para a maioria das famílias, que vivem nas comunidades quilombolas da Zona Mata Paraibana a atividade mais importante, embora não tenha deixado de exercer um papel fundamental. Assim, fazer os roçados permanece sendo uma prática recorrente e importante para as famílias das comunidades quilombolas de Gurugi, Ipiranga e Mituaçú, todavia não mais como a principal fonte de renda, como havia sido no passado, mas como importante fonte de alimento. Isso não quer dizer que não existam atualmente famílias que se sustentem tendo o trabalho na agricultura sua principal atividade. Não queremos afirmar que as mulheres quilombolas na Zona da Mata trabalhavam somente na agricultura, fazendo os roçados. Realidade que não reflete a forma como o campesinato se reproduz socialmente. Não somente plantavam os roçados, outras atividades também faziam e ainda faz parte da sua reprodução social como o artesanato, a pesca, a criação de animais. Nas comunidades da Zona da Mata Paraibana, fazer os roçados estava associado principalmente à pesca do peixe amoré, do siri, do caranguejo, a coleta da manga e da mangaba.

129 Tem lugar principalmente em Gurugi e Mituaçú a intensificação da criação de gado e de animais de pequeno porte realizada pelas famílias, que antes viviam basicamente do trabalho nos roçados, da pesca e da coleta de frutas. Na comunidade de Ipiranga, que ocupa um pequeno território, tornou-se inviável para as famílias obter do trabalho na agricultura o seu sustento em função da escassez de terra. Algumas das famílias de Ipiranga que participaram do processo de luta pela terra do assentamento Barram de Gramame, vizinho à comunidade na década de 1990 conseguiu obter uma parcela de terra. Mas isso não reflete a realidade da maioria das famílias, que têm apenas a casa com o terreiro ou quintal.

A comunidade de Paratibe considerada urbana, por ter sido atingida nos últimos trinta anos pelo processo de expansão urbana do município de João Pessoa, não tem mais áreas que possibilite as famílias desenvolver a agricultura. Na comunidade de Paratibe as famílias, da mesma forma que em Ipiranga, tem a posse apenas da casa e do terreiro, geralmente ocupado por um pequeno pomar. Há ainda famílias que criam galinhas ou algumas cabeças de gado nestes espaços.

A negação do direito a terra é uma realidade evidente nessas comunidades, mas também é um limite à falta de condições de permanecer trabalhando na terra. As famílias foram crescendo e o tamanho das posses permaneceu igual, ao passo que os filhos, os mais jovens, já não querem repetir as trajetórias de sofrimento dos pais. Mulheres e homens buscam então outras estratégias, que lhes permitam continuar se reproduzindo socialmente enquanto grupo. Essa realidade se reflete no Gráfico 08 (p.130), onde observamos que uma parcela significativa das mulheres se autodefine como dona de casa, pois plantar no terreiro da casa para alimentar à família não é considerado agricultura, nem tão pouco trabalho, já que não gera valor de troca.

Embora a agricultura não se configure mais na principal atividade que sustente a família, estas mulheres não deixaram de ser camponesas, antigas estratégias foram consolidadas, outras foram criadas, permitindo às mulheres quilombolas da Zona da Mata Paraibana existir enquanto tais.

130 GRÁFICO 08: Ocupação das mulheres quilombolas na Zona

da Mata Paraibana (2012)

Fonte: Trabalho de campo (2012) Org. Monteiro (2013)

Como já destacamos são diversas as estratégias acionadas pelas famílias dessas comunidades, que lhes permitem continuar se reproduzindo socialmente enquanto grupo. Dessa forma, procurar empregos e se empregarem fora do lugar onde moram é uma constante na trajetória de vida de homens e mulheres quilombolas das comunidades da Zona da Mata Paraibana. Constatamos que há uma parcela de homens mais jovens, que trabalham geralmente em fábricas dos municípios de Conde e João Pessoa tais como a Ondunorte, Conpel, Coteminas, Elizabeth e Brastec. Tendência que imaginamos se incremente nos próximos anos em função da expansão do zoneamento industrial do litoral sul da Paraíba. Principalmente na Comunidade de Paratibe os companheiros das mulheres quilombolas costumam se empregar na construção civil como ajudantes de pedreiro, todavia podemos afirmar que é uma prática recorrente em outras comunidades quilombolas na Paraíba. Por outro lado, uma parcela das mulheres mais jovens, com baixa escolaridade, se ausenta dessa comunidade durante a semana para trabalhar em serviços domésticos, principalmente no município de João Pessoa. Outras procuram empregos temporários em bares e pousados localizadas na orla do município de Conde, que se destaca pelos seus atrativos turísticos. Essas ocupações, geralmente, se realizam por meio de contratações temporárias e informais, em troca de baixos salários. 47% 43% 10% Dona de Casa Agricultora Outros

131 As mulheres que se identificaram como donas de casa não desempenham apenas o trabalho na casa ou terreiro desenvolvem outras atividades como: serviços de babá; venda de frutas; participação na tradicional coleta da mangaba; confecção de artesanato; como feirantes; diaristas em casa de família; promotoras de vendas e comerciantes.

As mulheres que se identificaram como agricultoras, também desenvolvem outras atividades como: feirantes; pescadoras; diaristas; costureiras; prestadoras de serviço; funcionaria pública; comerciante. Em relação às demais ocupações, identificadas como “outros” no Gráfico 08 destacam: professoras, pescadoras e comerciantes. A pesca tanto de peixe quanto de crustáceos é uma atividade tradicional praticada pelas famílias das comunidades localizadas na Zona da Mata Paraibana, destinada principalmente para o consumo familiar, mas também para a venda, especialmente do camarão. Foi na comunidade de Mituaçú onde encontramos o maior número de famílias que não só pesca o camarão para o consumo interno, mas também o comercializa, tanto na própria comunidade, quanto em feiras livres nos municípios de João Pessoa e Conde. Ver Fotografias 24, 25 e 26 (p.131 e 132)

Fotografia 24: Vista parcial do curso do Rio Gramame, local de pesca das famílias da Comunidade Quilombola de Mituaçú.

Fonte: Trabalho de campo (2012)

Fotografia 25: Covo (armadilha confeccionada artesanalmente para capturar camarão no Rio Gramame por mulher quilombola moradora de Mituaçú).

132

Fotografia 26: Mulher quilombola pescadora e moradora da Comunidade Quilombola de Mituaçú.

Fonte: Trabalho de campo (2012)

3.5. Reconhecendo-se como agricultoras: as mulheres