• Nenhum resultado encontrado

As ocupações como acontecimentos e práticas políticas

3 CIDADES REBELDES: “A CIDADE É NOSSA OCUPE-A”

3.3 REIVINDICANDO A CIDADE: AÇÃO E REVOLTA POLÍTICA

3.3.2 As ocupações como acontecimentos e práticas políticas

Em fins de 2011, vimos surgir no Zuccotti Park, distrito financeiro de Manhattan, na cidade de Nova York, o Occupy Wall Street. Sob o lema “nós somos os 99%”, oferecia uma denúncia sobre a crescente desigualdade, social e econômica, na distribuição de renda da riqueza nos Estados Unidos entre o 1% mais rico e o resto da população. Tratou-se, como é possível acompanhar no site, de uma ação de resistência que se utilizou da tática revolucionária da Primavera Árabe154, em 2010, para alcançar nossos fins e incentivar o uso da não violência:

153

CASTELLS, Manuel. Redes de indignação e esperança: Movimentos sociais na era da internet. Jorge Zahar Editor Ltda, 2013.

154

Onda revolucionária de manifestações e protestos que ocorreram no Oriente Médio e no Norte da África a partir de 18 de dezembro de 2010. Houve revoluções na Tunísia e no Egito, uma guerra civil na Líbia e na Síria; também ocorreram grandes protestos na Argélia, Bahrein, Djibuti, Iraque, Jordânia, Omã e Iémen e protestos menores no Kuwait, Líbano, Mauritânia, Marrocos, Arábia Saudita, Sudão e Saara Ocidental. Os protestos compartilharam técnicas de resistência civil em campanhas sustentadas envolvendo greves, manifestações,

with people of many colors, genders and political persuasions. The one thing we all have in common is that We Are The 99% that will no longer tolerate the greed and corruption of the 1%. We are using the revolutionary Arab Spring tactic to achieve our ends and encourage the use of nonviolence to maximize the safety of all participants155.

Convidados/convocados por redes de mídias sociais, em pouco tempo, manifestantes, entre vários segmentos da sociedade civil, desde moradores de ruas, hippies, sindicatos, jovens, artistas e intelectuais, passaram a ocupar o Parque Zuccotti promovendo diversas atividades.

A ocupação do parque Zuccotti durou dois meses. Nesse período, os ativistas também realizaram atos públicos em outros lugares emblemáticos de Nova York, como na Time Square, o local de maior concentração de teatros da Broadway e de turistas na Washington Square, defronte à Universidade de Nova York [...] Ao chegar em cada endereço, os manifestantes gritavam frases como “Sem justiça, sem paz” e “Nós somos os 99% da população” (GOHN, 2014, p. 42)156.

A tática da ocupação, emerge, assim, como estratégia de luta e visibilidade social. São, desse modo, movimentos e iniciativas que nos ensinam que, hoje, “a luta contra o capital global que desterritorializa é a luta pela territorialização ampliada, difusa e descentrada (os novos movimentos sociais não têm um líder) ”. (ALVES, 2012 p. 33). Por consequência, apresentam um horizonte complexo e rico de formas de consciência crítica, de comunicação, mobilização e conquista dos territórios urbanos, praças, ruas, espaços públicos marginalizados pela lógica neoliberal.

Tamanha a abrangência, a adesão e a força dos protestos, o fato é que vimos multiplicar, de forma simultânea e contagiosa, uma onda de protestos mundial muito, em parte, influenciados pelo êxito e inovação do OWS, de sua capacidade reacionário do establishment, criticando um quadro que impregna a ordem burguesa do mundo e abrindo

passeatas e comícios, bem como o uso das mídias sociais, como Facebook, Twitter e Youtube, para organizar, comunicar e sensibilizar a população e a comunidade internacional em face de tentativas de repressão e censura na Internet por partes dos Estados.

155 Disponível em: www.occupywallst.org/. Acesso em: 10 de junho de 2017. 156

uma fenda da ordem do Capital e suas contradições. Assim, pelas formas de contingenciamento e lutas assemelhadas, terminaram por permitir uma consciência de solidariedade mútua, tomando um contorno mundial que, por sua vez, fez aparecer inúmeras expectativas, aspirações, insubmissões e estratégias de contrapoder.

Produzindo sinergias sociais em rede, num cenário de crise social ampliada, manifestaram-se rebeliões praticamente espontâneas em todo o mundo, causando, inclusive, uma euforia inicial com toda a potência disruptiva advinda de tais mobilizações.

O fato é que a agitação social, acompanhada pelas manifestações de indignação social ocorridas em todo mundo no ano de 2011, logo após ao colapso no sistema financeiro global, tendo seu início nos Estados Unidos da América (EUA) em meados de 2007, acarretou, simultaneamente, na realização de inúmeros protestos com "reivindicações peculiares em cada região, mas com formas de luta muito assemelhadas e consciência de solidariedade mútua", perpassadas pelo sentimento de insatisfação global. (CARNEIRO, 2012)157.

Por sua vez, seguidos de uma articulação realizada via internet e redes sociais, especialmente, Facebook e Twiter, os manifestantes encontraram um meio de disseminação e visibilização158, incitando as pessoas a saírem às ruas com objetivos diversos, mas perpassadas por um sentimento de mudança.

Na América Latina, as manifestações que ganharam amplitude foram no Chile, mobilizando principalmente estudantes pela causa da educação. No entanto, grandes protestos estudantis também foram realizados no México, Bolívia e Colômbia. No Brasil, além do “Ocupa Brasil”159

, o rebatimento inicial ocorreu no contexto da “Marcha da Liberdade”, iniciativa resultante da proibição, no ano de 2011, da realização da “Marcha da Maconha” em São Paulo, Belo Horizonte e Curitiba. Na convocatória, distribuída indefinidamente pelas redes digitais, lia-se:

157

CARNEIRO, Henrique S. (2012). Rebeliões e ocupações de 2011. In: Harvey, D.; Davis, M.; Žizek, S.; Ali, T., & Safatle, V. P. Occupy: movimentos de protestos que tomaram as ruas. São Paulo: Boitempo/Carta Maior.

158

De acordo com as pesquisadoras Ruth Milkman, Penny Lewis e Stephanie Luce, do Departamento de Sociologia da City University of New York (CUNY), em meados de outubro de 2011, movimentos similares aconteciam em 951 cidades de 82 países (2013, p. 195).

159 A estrutura do braço brasileiro do movimento “Occupy” (criada em 17 de setembro de 2011, segundo informações na página do Facebook) possui um perfil público no Facebook, datado de 1 de outubro de 2011, um blog, “Ocupa Brasil” - http://ocupabrasil.wordpress.com/ - criado em 10 de outubro de 2011, uma conta de Twitter, @OccupyBrazil, criada em 20 de outubro de 2011, e um tipo de storify, criado em julho de 2013.

Quando a tropa de choque bateu nos escudos e, em coro, gritou CHOQUE! a Marcha pela Liberdade de Expressão do último sábado se tornou muito maior. Não em número de pessoas, mas em importância, em significado. Foram liminares, tiros, estilhaços, cacetadas, gases e prisões sem sentido. Um ataque direto, cru, registrado por centenas de câmeras, corpos e corações. Muita gente acha que maconheiros foram reprimidos. Engano...Naquele 21 de maio, houve uma única vítima: a liberdade de todos. E é por ela que convocamos você a aparecer no Vão Livre do MASP, sábado que vem, dia 28, às 14hs. (VÁRIOS AUTORES, 2011).

O movimento terminou ganhando amplitude e, em pouco tempo, estavam marcadas 40 Marchas em todo o país. O que era, inicialmente, um debate sobre a maconha, estendeu-se para uma imensidão de reivindicações de todos os gêneros. Emergiram, assim, movimentos, lideranças, estratégias e formas alternativas de utilização da mídia. Multiplicaram as reações, expressadas sob as formas de: a) denúncia, protesto, explicitação de conflitos, oposições organizadas; b) cooperação, parcerias para resolução de problemas sociais, ações de solidariedade; c) construção de uma utopia de transformação, com a criação de projetos alternativos e de propostas de mudanças (MARTELETO, 2001, p. 10)160.

Esse panorama logo encontrou fôlego e renovação no contexto da cidade do Recife. O #OcupeEstelita, lançado em abril de 2012, encontrou, além de inspiração Occupy Wall Strett, diversas aproximações do ponto de vista do acontecimento e da prática política, como é possível acompanhar na convocação realizada por meio do Facebook:

No Recife, um movimento de ocupação do espaço público, com inspiração no Occupy Wall Strett, convoca todos os descontentes com o consórcio Novo Recife Empreendimentos, para tomar as calçadas dos armazéns do Cais José Estelita no próximo domingo (15), das 9h às 16h. Com apoio de diversos segmentos da sociedade, o OcupeEstelita não se opõe apenas à criação, na região central do Recife, de ao menos 12 torres, algumas com mais de 40 andares. O movimento busca manter vivo o debate sobre o modelo de ocupação verticalizado que a cidade adotou nas últimas décadas. No alvo, também está a controversa construção de quatro viadutos sobre a Avenida Agamenon Magalhães. Segundo a mobilização, levada a cabo em redes sociais, com destaque para atuação do grupo Direitos Urbanos, no Facebook, o modelo adotado pelas políticas públicas do Recife e do estado desconsidera questões urbanísticas básicas como a mobilidade, a preservação da memória histórica e o arejamento da cidade. Além de semelhanças com o Occupy Wall Street, como a falta de programa e a coordenação difusa, o

160

MARTELETO, Regina Maria. Confronto simbólico, apropriação do conhecimento e produção de informação nas redes de movimentos sociais. 2001. DataGramaZero - Revista de Ciência da Informação - v.2 n.1 fev/01.

OcupeEstelita aproxima-se de mobilizações como o movimento paulistano Baixo Centro, associando ações culturais ao discurso político161.

Como fica notório, a luta não é apenas, em si, contra o empreendimento imobiliário Novo Recife. Ela enreda novas formas de reinvindicação e prática política, mostrando, ao mesmo tempo, “alguns limites da democracia representativa e, por outro, a nova agenda política protagonizada pelas novas formas de atuar politicamente que tentam caminhar, na sua própria prática, no sentido contrário àquele da democracia representativa” (ANDRADE, 2014, p. 109)162. Por esse viés, ocupar o Cais Estelita significa, sobretudo, exigir modelo de urbanismo alternativo que passa, antes de tudo, pela participação popular nas decisões sobre o desenho urbano das cidades, alertando-nos para o caráter social da riqueza e, portanto, social das cidades. Nesse sentido,

O Ocupe Estelita se conecta com demais Ocupes, pois o que está em jogo é a percepção da cidade como um organismo cujas partes não podem ser fragmentadas ao sabor de decisões, tomadas por poucas pessoas, que atendem aos interesses privados de quem decompõe o organismo sem compromisso com a falência dos seus órgãos e, em última instância, sem compromisso com o próprio organismo. O que o Ocupe Estelita mostra é que a democracia representativa não consegue fugir da chancela do capital. No presente caso, do capital imobiliário. Por trás do Ocupe Estelita, como dos demais Ocupes, existe uma crítica mordaz à democracia representativa, que tenciono mostrar agora. (ANDRADE, 2014, p. 110).

Apesar de ter sido gestado e mobilizado, com o tempo, a ocupação física fez-se necessária, não apenas para garantir maior visibilidades, mas, principalmente, para deslocar a “discussão da cidade para o seu palco, para a praça, que não apenas é o lugar onde deve ocorrer a discussão, mas é também o objeto da discussão”, como nos chama atenção Érico Andrade, Professor de Filosofia e integrante do DU:

O Ocupe Estelita, na forma de uma ocupação física no Cais Estelita, acontece quando um militante é agredido enquanto tenta registrar, motivado por uma denúncia, a destruição dos antigos armazéns do referido cais. Imediatamente, faz-se necessária uma intervenção política urgente, capaz de inibir de alguma forma o famigerado projeto. Ocupar fisicamente – com os nossos corpos – foi a solução

161

Ocupação & Manifesto | Cais José Estelita. Disponível em:

https://www.facebook.com/events/352462881472624/. Acessado em: 20 de janeiro de 2017. 162

ANDRADE, Erico. Ocupe Estelita: novas formas de atuação política. In: Insight Inteligência, julho-agosto- setembro, 2014

imediata para o impasse da invisibilidade. Os corpos ocupando o espaço público denunciam a publicidade do espaço, a sua dimensão coletiva, e, por conseguinte, reorientam a discussão da cidade para o seu palco, para a praça, que não apenas é o lugar onde deve ocorrer a discussão, mas é também o objeto da discussão, porque nela, como diria o poeta, o povo se encontra com a noção de espaço público. Para garantir a uma cidade mais espaços de convivência e construções sustentáveis, o corpo humano é convertido, como pontua Harvey (HARVEY, 2012, p.60), em espaço político, pois o trânsito dos corpos, de algum modo, coletivizam o espaço, num sentido geral, tornando-o público. A ideia do Ocupe Estelita, como a dos demais Ocupe, é coletivizar o espaço por meio da presença das pessoas nele. Tanto física quanto simbolicamente, ocupar expressa a reivindicação de pertencimento ao lugar, à cidade, ao Cais, que deveria ter uma destinação pública por ter sido terreno da união. Nesse contexto, ocupar também consiste em exigir uma participação sobre os destinos desse lugar. (ANDRADE, 2014, p. 109).

A ocupação do terreno, desse modo, aconteceu a partir da noite do dia 21 de maio de 2014 quando o ativista Sérgio Urt, que passava no local, constatou o início da demolição dos galpões, mobilizando, por consequência, outros manifestantes para impedir o ato. Rapidamente, um grupo de pessoas, em torno de 30, foram ao local para impedir a demolição e iniciou um “acampamento”. Em pouco tempo, esse número foi multiplicado. Passaram a compor a “paisagem” local, barracas, camas improvisadas, iluminação precária, formando a denominada “Vila Estelita”, com entrada realizada através de um buraco no muro que cercava o terreno.

Figura 11 – Registro da sinalização da ocupação realizada em 2014

Inclusive, foi exatamente no acontecimento163 político da ocupação, em suas dimensões corporal, física e coletiva, que encontrei as formas mais potentes de construções discursivas, estéticas e políticas. O acampamento montado na área logo despontou como um fator inovador de resistência cultural. Durante 27 dias, inúmeras manifestações, expressões, coletivos e indivíduos passaram pelo local.

No primeiro dia do mês de junho, de 2014, foi inaugurado o evento Ocupe Estelita, uma espécie de experimento político-cultural, amplificando, ainda, mais o alcance e os significados:

Num lugar antes desconhecido da grande maioria, um sonho se realiza ao menos em experimento: um imenso espaço perdido há anos no discurso do abandono, uma vastidão impensada, ganha, na prática dos ocupantes de simplesmente ocupar, o sentido que ele sempre poderia ter tido: o de ser o espaço de confluência de todos os cantos da cidade ao receber, acolher e misturar as pessoas. Um lugar que antes era apenas o atrás do muro e dos galpões, o espaço abandonado, de ninguém, passa ser um experimento simbólico (...) Apropriação simbólica do que antes era o não lugar de e para

todos vai, aos poucos, por conta da efetividade do ato de ocupar aquele espaço, criando de forma mais plena e concreta, a sensação de acerto

político na luta pelo lugar: o Cais José Estelita não pode ser mais um projeto que apenas segregue a cidade dela mesma164

Nesse sentido, talvez um dos principais resultados tenha sido a capacidade de utilizar o espaço, em seu viés público, para a expressão artística e coletiva, fazendo convergir uma infinidade de atores sociais instigados pela capacidade do encontro. Sem dúvida, suportado pelo forte espírito de empatia e conexão com a causa, um conjunto difuso de pessoas passaram a ocupar o acampamento:

ESTELITA, COMO ÉS FORTE!

Ontem no #OcupeEstelita realizei um antigo desejo: ver a Universidade na Rua. Embaixo do viaduto, na terra batida, sentados no chão, sem luz, na

163“Entendendo o acontecimento como aquilo que é digno de conhecimento, e debruçando-se sobre os modos de tratamento discursivo que possibilitam a circulação dele sob a forma da informação (...) feito por meio da restrição à sua efetuação espaço-temporal (o fato)” (MENDONÇA, 2007, p. 117). MENDONÇA, Ricardo Fabrino. Movimentos sociais como acontecimentos: linguagem e espaço público. Lua Nova, São Paulo, 72: 115- 142, 2007.

164

OcupeEstelita, #ResisteEstelita: a (re)significação constante do Direitos Urbanos (e do Cais). Disponível em: <http://jampapernambuco.wordpress.com/2014/05/25/ocupeestelita-resisteestelita.-a-resignificacao-constante- do-direitos-urbanos-e-do-cais/#comments>. Acessado em: 26 de julho de 2014.

penumbra dos postes, ela se fez Viva. Mais do que nunca, nós pertencíamos àquele espaço e este, não só era afetado por nós, como afetava profundamente nosso corpo, nossa mente, nosso coração.

Teorias e conceitos que se fecham dentro das bolhas acadêmicas se perdem no vazio. São inúteis por não conseguirem dialogar e mergulhar na vida da qual também é parte. Mas, ontem aqueles bravos professores mostraram que é possível sair da concha e exemplificaram que é no espaço público cotidiano que o conhecimento ganha valor e sentido profundo.

Ontem o Movimento#OcupeEstelita completou 30 dias de ocupação, marcado pelo bravo desejo de mudanças em nossa cidade. E com professores, das mais diversas universidades, pudemos sentir na prática (empiricamente, como eles gostam de dizer) o que é interdisciplinaridade e diálogo entre as mais diferentes áreas, em prol da construção de um modelo de cidade mais digno.

Não houve armas, não houve violência. Houve a força das ideias e da ternura. Não obstante, o carro da polícia tenha feito sua "ronda" por nós oito vezes, ou mais (perdi as contas), discutíamos pacificamente qual a cidade que queremos e temos direito a ter.

Partindo das mais diferentes perspectivas e especificidades, ocuparam conosco professores universitários de diversas áreas, inclusive de outras regiões como Alagoas e São Paulo. Não conseguirei lembrar os nomes de todos, mas entre eles, fizeram uso da palavra forte e corajosa:

- Professores de Direito, conversando sobre as irregularidades jurídicas das ações do Consórcio Novo Recife e a ignorância política do Governo do Estado.

- Procuradora da República chamando atenção para a importância da ocupação.

- Professora de Arquitetura discutindo as leis urbanas da cidade e as irregularidades urbanísticas do projeto do consórcio Novo Recife, com riqueza de detalhes e informações.

- Professor de Letras demonstrando que a poesia está na política e a política está na poesia, a partir das nossas ações no mundo.

- Professor de Cinema com seus alunos, discutindo a construção de imagens que pudessem fazer uma comparação entre o antes e o depois de sermos colocados para fora do espaço que por direito nos pertence. Refletindo sobre o estar dentro e fora, pertencer e estar à margem, percebendo e fazendo perceber que quando mudamos o foco, tudo muda.

- Professor e Professoras de Saúde Coletiva, discutindo a cidade doente que adoece as pessoas, mas também alimentando em nós a chama da cura do espaço urbano e, portanto, a nossa própria cura.

- Professores de Administração, mostrando suas divergências e oposição ao paradigma que tenta passar a falsa ideia de que as empresas são soberanas e estão acima das pessoas e dos interesses coletivos.

- Professor de Antropologia discutindo o #OcupeEstelita como um espaço poderoso de vivência antropológica e de imersão nos problemas urbanos. - Professor de Ecologia, discutindo os impactos ambientais sofridos na cidade nos últimos anos e o trabalho hercúleo das organizações ambientais para intervir neste estado caótico. Chamou atenção para a força do nosso movimento no macro e no micro cotidiano, mostrando como um professor pode dar aula de cidadania, por exemplo, mostrando para o taxista, ou para qualquer outra pessoa com quem possa conversar, a importância daquele movimento para a sua e para as nossas vidas.

Teve também jornalista do Rio chamando atenção para a manipulação de informação da mídia e a importância de mostrarmos através da divulgação da informação, da maneira que pudermos, a convicção de que podemos ter a cidade que queremos.

Teve até policial "à paisana" que participou da roda de conversa. Intitulou-se um "anônimo", mas resolveu se identificar. É sargento da polícia e nós desejamos profundamente que tenha entendido as razões pelas quais estávamos ali. Como todos, ele teve o direito assegurado de se expressar e, independente das razões pelas quais estava ali, pôde ouvir tudo o que discutimos sobre a cidade que desejamos, merecemos e temos a convicção de que vamos construir. Para nós, para TODOS.

Foi assim que embaixo do viaduto, ontem tivemos um dia bonito, Recife! Ali tive a certeza de que não estamos sozinhos e de que somos muitos. Estelita, como és forte!

Hoje tem mais! Com os artistas que alimentam nossa cultura. Com a marca, o jeito e a beleza estética e política que o pernambucano sabe fazer e resistir. (Dea Bonfim)165

As participações, no entanto, eram variadas, entre ocupantes e acampantes, misturavam-se ativistas, artistas, instituições e curiosos. Haviam aqueles que levavam mantimentos, outros desenvolviam e ofereciam atividades, tantos outros davam apoio de natureza emocional. Notava-se uma pluralidade de interesses, ideologias e representações. Havia, no entanto, uma convivência respeitosa.

Figura 12 – Registro da ocupação realizada em 2014

Fonte: Eduardo Sarmento.

165

Postagem realizada por Mário Lima na página do MOE em 24 de junho de 2014. Disponível em: https://www.facebook.com/mario.lima.921025/posts/660649180682486. Acesso em: 26 de junho de 2014.

Figura 13 – Participantes do acampamento montado no Cais José Estelita

Fonte: Eduardo Sarmento

Destacavam-se, portanto, a multiplicidade de atividades, intervenções artísticas e urbanísticas: aulas públicas, assembleias, oficinas (fotografia, leitura, audiovisual, horta,