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2.4 COMPLEXIDADE CONCEITUAL DO INDIVIDUALISMO METODOLÓGICO

2.5.1 As rotinas, mudança organizacional e os aspectos performativo e ostensivo

COLOMBO, 2014; SAFAVI; OMIDVAR, 2016). Estão relacionadas também a melhoria contínua e ao estabelecimento de um sistema de produção estável (PAGELL et al., 2015). Primeiramente afirmava-se que, as rotinas apresentavam caráter estável, porém atores a mudança quando estimulados por eventos externos. Recentemente as rotinas apresentam-se como elementos de mudança também pelo seu aspecto performativo. As rotinas são práticas e modelos de ações interdependentes de múltiplos atores que servem para compreender a mudança endógena e também a inovação organizacional (FELDMAN; PENTLAND, 2003; MELLA; COLOMBO, 2014).

Dado a organização estar em interação com o ambiente, a rotina representa um conjunto específico de recursos que está em contínua mutação (NELSON; WINTER, 2005). Para os autores, “a organização não é uma máquina de perpétuo movimento”. Afirmam que, em um lapso de tempo, as mudanças no ambiente produzem eventos mutagênicos que desequilibram os sistemas de controles da organização.

Através destes eventos mutagênicos, as rotinas são repositórios das capacidades organizacional. São componentes chaves, portanto, do comportamento organizacional (BECKER et al., 2005). Entendimento semelhante é chancelado por March e Simon (1958) e Becker (2004). Para eles a compreensão sobre como as capacidades são estocadas, transferidas e aplicadas passa pelo estudo das rotinas. Representam unidades de análise que capturam mudanças, em nível micro, fazendo com que as forças de mudanças tornem-se explícitas. As rotinas não apenas preservam o passado, mas deliberam aprendizagem modelando, sob efeito, o futuro da organização.

Na concepção de Schumpeter (1954), a inovação apresenta relação com as rotinas prioritárias, sendo fundamentais para o aumento da produtividade e do crescimento econômico. Por serem consideradas estocagem de conhecimento tácito contribuindo com a memória organizacional, as rotinas são consideradas não apenas fonte de mudança, mas fontes endógenas de variação competitiva.

Além da inovação, em termos de rotinas e mudanças, é mister tomar por base a teoria evolucionária da firma (FELDMAN, 2000). O autor propõe o desenvolvimento de um modelo performativo das rotinas organizacionais baseado na definição de Nelson e Winter (1982) e de Cyert e March (1963). Parte-se da definição de que rotinas são padrões de comportamento legitimados por regras. Segundo Feldman (2000), existe um elemento interno dinâmico das rotinas que podem prover mudanças contínuas. Isso é possível a partir do momento em que os indivíduos não são separados das rotinas, o que estabelece uma perspectiva de agência.

desenvolvidas para realização de determinado trabalho. Feldman (2000) acredita que as mudanças das rotinas não acontecem apenas por crises financeiras ou novas ideias da indústria, ou expectativa de falha ou mudança estrutural na indústria. Tem-se que as rotinas são desenvolvidas por indivíduos que pensam e sentem, sendo que suas reações são situadas no contexto institucional, organizacional e pessoal. Apresentam capacidade de criação, de conflito e dominação, sendo motivados por intenção.

Dessa forma, a dinâmica interna das mudanças nas rotinas tem como causa o fluxo conectado de ideias, ações e resultados (FELDMAN, 2000). Parte-se da concepção de que as ideias geram ações e de que estas promovem resultados. Estes, por sua, vez conduzem a novas ideias. Esse fluxo é que promove as mudanças. Ideias, portanto, podem resultar em ações que não necessariamente representam os ideais, podendo ser resultados não pretendidos. Segundo o autor, em sua pesquisa, identificaram-se dois tipos de resultados: resultados que ficaram aquém dos ideais e resultados que apresentaram novas oportunidades. Para o autor, os resultados possibilitam a criação de novos recursos e oportunidades. O modelo performativo das rotinas, segundo Feldman (2000), a partir do aspecto da agência, abrange uma extensão de pensamentos, sentimentos e ações que os atores obtêm a partir de suas atividades organizacionais. Envolve um ciclo de planos, ações, resultados e ideais, conforme Figura 10.

Figura 10 - Modelo performativo de rotina

Fonte: adaptado de Feldmann (2000).

Resultados em determinados períodos podem ser comparados com ideais ou pré-planos que podem constituir a próxima iteração das rotinas. A qualidade cíclica do modelo resulta em ações de reparação, expansão e esforço que muda as rotinas.

As rotinas flexíveis, segundo Feldmann (2000), decorrem do ápice gerencial, contudo, podem também modificar-se endogenamente dado envolvimento dos atores. Assim, a rotina caracteriza-se pela determinação gerencial e pela capacidade de evolução interna da rotina. Essa flexibilidade, para March (1994), pode decorrer pela visão dos atores, a instabilidade dos indivíduos, das metas organizacionais e negociações dos indivíduos e interesses coletivos. Contudo, os padrões de comportamento de interação delimitam a rotina e não o padrão gerencial desejado (BECKER et al., 2005).

As rotinas, referindo-se as mudanças podem ser estudadas a partir do padrão abstrato que refere-se ao aspecto ostensivo da rotina ou por ações específicas que refere-se ao aspecto performativo. Tanto o aspecto ostensivo e performativo objetiva tornar explícito a dinâmica interna das rotinas organizacionais em termos de estabilidade e a mudança (PENTLAND; FELDMAN, 2008; HABIB; KROHMER, 2016). O aspecto ostensivo das rotinas representa o entendimento subjetivo dos atores sobre a rotina organizacional que diz respeito ao padrão abstrato, que é dependente do contexto que difere de pessoa para pessoa ou de evento para evento (FRIELS; LARTY, 2013). Para os autores, quanto mais experientes os atores, maior a tendência de mudança no aspecto ostensivo. Diante disso, a interpretação e o conhecimento dos atores referem-se ao aspecto ostensivo (MELLA; COLOMBO, 2014; OLIVEIRA; QUINN, 2015).

Segundo Feldman e Pentland (2003), o aspecto ostensivo abarca conhecimentos tanto explícito quanto tácito. O aspecto cognitivo representa o entendimento subjetivo dos atores, que variam ao longo da organização que guiam uma performance, específica da rotina (PENTLAND; FELDMAN, 2008). O aspecto ostensivo compreende, portanto, esquemas de cognição do indivíduo que dizem respeito a crenças, orientações, intenções e experiências no entendimento de uma rotina organizacional (HOWARD-GRENVILLE, 2005). Representa o entendimento subjetivo de diversos atores organizacionais (YAMAUCHI; HIRAMOTO, 2016).

Os aspectos ostensivos das rotinas também são influenciados pelos artefatos, que são regras escritas. O aspecto ostensivo acaba influenciando a performance da rotina que também pode abranger improvisação e incertezas. O aspecto ostensivo compreende a expectativa e a percepção distintiva dos atores, através de regularidades cognitivas abstratas, residindo nos indivíduos (MILLER; PENTLAND; CHOI, 2012; OLIVEIRA; QUINN, 2015). O fator

ostensivo guia o comportamento dos atores ajudando a identificar as suas atividades na rotina, sendo dependente do contexto, das restrições organizacionais e das decisões individuais, referindo-se, portanto, ao aspecto performativo (FELDMAN; PENTLAND, 2003; KOZICA; KAISER; FRIESL, 2014). Ambos são complementares e reforçam-se mutuamente (MILLER; PENTLAND; CHOI, 2012). A performance da rotina reforça o aspecto ostensivo. O entendimento ostensivo, por sua vez, evolui no processo de retenção seletiva que determina performance da rotina. Essa seleção é política, pois envolve normas, leis sobre como as rotinas desenvolvem-se no futuro.

O aspecto ostensivo também é influenciado pelas experiências de aprendizagem obtidas no aspecto performativo. Essa aprendizagem influencia a memória procedural, declarativa e transacional do conhecimento (MILLER; PENTLAND; CHOI, 2012). O primeiro refere-se a perícias de ação, o saber fazer, cercando o conhecimento tácito que é representado na execução de tarefas. O procedural é saber o que, contendo proposições, histórias e descrições aplicadas em determinadas situações. Auxilia na interpretação de situações, promovendo respostas apropriadas na execução de sequências de tarefas. Essa consciência da tarefa de identificar o problema e propor solução refere-se a memória declarativa decorrente da sequência de tarefas passadas aprendidas pelos indivíduos por experiências. A memória transacional, contudo, é acessada pela interação dos indivíduos, através do compartilhamento de expertises para execução de determinada tarefa organizacional (MILLER; CHOI; PENTLAND, 2014).

O aspecto performativo, por sua vez, refere-se a performance por pessoas específicas, em lugares e tempos específicos (MILLER; PENTLAND; CHOI, 2012). Assim, os atores estão inseridos em conhecimento e interpretação, em seu aspecto ostensivo, que também estão comprometidos em ações de performance, que se refere, portanto, ao aspecto performativo. Esses elementos, atores, ações, aspectos ostensivos e performativos, formam um processo dinâmico que gera vários efeitos na cadeia (MELLO; COLOMBO, 2013).

Essa cadeia torna-se dinâmica quando emerge e influencia outras práticas organizacionais. Outro fator que influencia na dinâmica das rotinas são os artefatos que podem ser representados pelas regras e procedimentos padrões de operação da rotina. Podem ser deliberados, contudo, quando aplicados nas rotinas, fogem de sua intenção inicial. Regras, como artefatos, referem-se a recursos de ação, contudo, na variação do contexto, não necessariamente determinam a performance (PENTLAND; FELDMAN, 2005).

O comportamento da organização depende, portanto, desta relação dinâmica entre aspectos ostensivos e performativos através de um processo de feedback. Segundo Mella e

Colombo (2013), quando se define uma rotina para ser desenvolvida, tem-se um ciclo, onde os atores seguem determinadas regras evoluindo em certas condições de ações. Tem-se ainda reprodução de ciclos subsequentes de ações que variam ou retém os padrões de interação.

Portanto, os ciclos das rotinas podem ser de mudança, inovação, estabilidade e retenção (MELLA; COLOMBO, 2014). Isso depende do feedback dado aos atores envolvidos no processo de interpretação e performance. A governança estabelece os procedimentos a serem seguidos, através da parte ostensiva da rotina em termos de performance a serem obtidas por meio de certos comportamentos repetitivos. Os atores, na sequência, através de seus esquemas cognitivos interpretam e executam os procedimentos prescritos, que se referem ao aspecto performativo. Trata-se do primeiro ciclo. Caso ocorra a performance desejada não existem motivos para variação das rotinas, assim a dinâmica e a estabilidade são garantidas. Contudo, quando a performance não é a desejada os atores e a gerência interpretam e definem novos cursos de ações geram-se novas possibilidades de mudança e inovação. Esse refere-se ao segundo ciclo de rotinas. Assim, a mudança e a inovação têm como elemento de origem o ator, desde que executadas dois fatores:

a) os atores produzem e reproduzem ações e consequentemente variam ou retém seletivamente as ações estabelecidas (performance);

b) eles determinam mudança e estabilidade, a partir da interpretação das circunstâncias de suas ações e de outros (interpretação).

A relação recursiva entre aspectos ostensivos e performativos das rotinas promovem desvios em ambos os níveis (FRIELS; LARTY, 2013). Isso pode ser fonte de estudo em termos de replicação dos fluxos de conhecimento de um replicador para uma unidade receptora. Pode-se estudar ainda os microfatores que influenciam a similaridade ou divergência dos aspectos ostensivo e performativo. A replicação envolve a criação de uma outra rotina similar a rotina anterior. A replicação pode ser estudada também em condições de transferência de conhecimento de um replicador para um replicado, destinada a performance de uma determinada rotina. Ou a replicação pode envolver ainda fluxos reversos de conhecimento de uma unidade receptora para o replicador, podendo tornar fonte de inovação.

Além dos aspectos ostensivo e performativo, entre outros elementos que fundamentam a mudança da rotina organizacional, estão os momentos críticos da organização, o estabelecimento de uma nova diretriz, a redução da performance, a inserção de um novo gerente ou colaborador na rotina (KOZICA; KAISER; FRIESL, 2014). Isso faz como que os atores sejam desafiados de forma a justificar o que eles estão desenvolvendo, promovendo novas mudanças de comportamento.

As rotinas podem ainda ser caracterizadas sob o entendimento da mudança endógena demonstrando que não apresentam tanta rigidez, conforme alguns autores afirmam. Apresentam capacidade reflexiva e graus de liberdade, sendo modeladas por normas e valores (KOZICA; KAISER; FRIESL, 2014). Eventos extraordinários podem engatilhar esse processo de mudança. Ademais as rotinas podem mudar através da retenção seletiva de determinadas performances pois onde existem atores ocorrem evoluções da rotina (HABIB; KROHMER, 2016).

Em termos de mudança, o desenvolvimento de novas rotinas requer novos valores e aprendizagem de novos hábitos (POSTREL; RUMELT, 1992). Não basta possuir sistemas de incentivos formais, pois a mudança sempre promove conflitos entre os colaboradores e perdas de autonomia. A mudança, em uma rotina, requer mecanismos sociais com vistas a sustentar valores e metas sociais. Uma das formas de compreender este processo de mudança de rotina demanda o desenvolvimento da perspectiva individualista.

A seguir apresenta-se a Figura 11, que sintetiza os elementos endógenos e exógenos que geram mudanças nas rotinas com seus respectivos efeitos.

Figura 11 - Mudanças endógenas e exógenas das rotinas e seus efeitos

Fonte: elaborado a partir de Schumpeter (1994), Nelson e Winter (2005), Kozica, Kaiser e Friesl (2014), Oliveira e Quinn (2015), March e Simon (1958) e Feldman (2000).

Considerou-se no estudo da rotina de alto nível os eventos mutagênicos provenientes no ambiente externo que influenciam a rotina de alto nível, contemplando parte da teoria evolucionária e os elementos das forças competitivas de Porter (1999). Também foram

considerados os elementos que geram micromudanças na organização bem como a capacidade reflexiva dos atores quanto a rotina de alto nível podendo dessa forma contribuir estrategicamente com a rotina de alto nível em termos de aprendizagem. Dessa forma, acessou-se o conhecimento tácito.