• Nenhum resultado encontrado

As ASO – Definição do conceito

No documento Spin-offs académicas em Portugal (páginas 61-67)

CAPÍTULO II – REVISÃO DA LITERATURA

4. As empresas spin-offs académicas e a transferência de conhecimento

4.2. As ASO – Definição do conceito

Ao longo dos pontos anteriores temos vindo a referir-nos às ASO como um dos mecanismos mais importante e mais eficazes de conversão e exploração de conhecimento do sistema de ensino para o mercado, sem que, no entanto, tivéssemos discutido o significado de ASO. Este ponto que encerra a revisão da literatura sobre a produção e transferência de conhecimento tem justamente o propósito de discutir o conceito de ASO e clarificar a definição adotada neste estudo.

Em primeiro lugar a literatura sugere que as ASO são um subconjunto das denominadas Novas Empresas de Base Tecnológica (NEBT) com especificidades próprias,

nomeadamente por serem sempre um mecanismo de transferência de conhecimento do sistema de ensino para a economia e a sociedade.

Sendo um subconjunto das NEBT, antes de nos debruçarmos sobre o conceito de ASO iremos debater o conceito de NEBT. Assim, a primeira e muito evidente constatação é que o termo NEBT não reúne consenso na literatura. A sua designação não tem contornos bem definidos sendo comum encontrarem-se outras classificações para empresas com o mesmo perfil. Taxonomias como “empresa de tecnologia avançada”, “empresa intensiva em tecnologia”, “empresa de tecnologias emergentes” e a mais comum “empresa de alta tecnologia”, são de forma recorrente utilizadas com significados similares. Além desta diversidade de nomenclaturas, a abrangência de diversos aspetos associados ao tema torna o conceito confuso (Viardot, 2004) e a classificação deste tipo de empresas complexo.

Uma das classificações mais comummente utilizada para este tipo de organização é a de “empresa de alta tecnologia”. No entanto, mesmo nesta classificação específica há variadas formas de as enquadrar. Alguns autores fazem-no a partir dos sectores em que atuam, outros a partir das características dos produtos e serviços que comercializam, não estando, por isso, associadas a sectores pré-determinados (Viardot, 2004; Bowen, 2004). Outros aspetos mencionados que caracterizam este tipo de empresas são as elevadas qualificações técnico-científicas dos trabalhadores, investimentos elevados em investigação e desenvolvimento e projeção internacional no sentido em que os produtos e serviços são direcionados para o mercado global (Gibson & Rogers, 1994). Há ainda outras taxonomias como por exemplo a utilizada por Day e Schoemaker (2000), que usa o conceito de empresas de "tecnologias emergentes" em oposição ao conceito de tecnologias “estabelecidas”, onde as primeiras representam uma base de conhecimento em permanente e acelerada expansão com potencial para criar novos sectores ou transformar um existente.

Esta diversidade de olhares usados na literatura introduz alguma confusão neste campo de estudo, o que tem tornado difícil a construção de um quadro teórico de análise coerente e integrado (Cunha et al., 2013). Isto implica que quando se analisam as conclusões de diferentes estudos, as generalizações são praticamente impossíveis, porque as amostras estudadas não são diretamente comparáveis (Storey & Tether, 1998).

Feita esta pequena digressão pelo conceito de NEBT iremos de seguida concentrar a nossa atenção no conceito de spin-off académica que apresenta especificidades próprias relativamente à NEBT, tanto no que se refere aos atores envolvidos, como à ligação à instituição de origem.

Ora, tal como o conceito de NEBT não tem uma única definição consensualmente aceite, também o conceito de spin-off académica tem várias propostas. Djokovic e Souitaris (2008) num artigo de revisão de literatura sobre ASO argumentam que a definição deve conter três elementos principais: o resultado do processo; os principais agentes envolvidos; e, os principais elementos a ser transferidos. Os estudos sobre o resultado do processo de ASO são bastante consensuais. Uma ASO é uma nova

empresa, com personalidade jurídica própria (Djokovic & Souitaris, 2008). De acordo com Klofsten e Jones-Evans (2000), esta característica ligada à criação de uma nova empresa é uma das pedras angulares das ASO. Neste estudo, iremos adotar o mesmo posicionamento e investigar apenas empresas, excluindo assim novas divisões ou departamentos dentro das organizações existentes ou as entidades existentes mudando apenas a forma jurídica.

O segundo aspeto central do processo de ASO diz respeito aos principais agentes envolvidos. Roberts e Malonet (1996) identificaram como principais, os seguintes: (1) a organização-mãe, a partir da qual a tecnologia é desenvolvida; (2) o originador da tecnologia, ou seja, a pessoa ou equipa que traz a tecnologia de um estágio de I&D básica para um ponto em que a tecnologia pode ser transferida; (3) o empreendedor que tenta criar um novo negócio centrado nessa tecnologia, e (4) o investidor de risco que fornece financiamento para a nova empresa.

O terceiro aspeto chave da definição ASO envolve o elemento central a ser transferido da instituição de origem para a nova empresa. A transferência de alguns direitos (intelectuais), como por exemplo, bens, ideias ou conhecimento, são elementos-chave no processo de criação e desenvolvimento da ASO (Clarysse & Moray, 2004; Bathelt et

al., 2010). Alguns autores usam uma definição muito restrita, exigindo que os direitos

transferidos sejam de natureza exclusivamente tecnológica (Nicolaou & Birley 2003; O'Shea et al., 2008). Neste sentido, por exemplo, Wright et al. (2007) fazem depender a inclusão de uma nova empresa na categoria de ASO apenas quando tiverem origem em licenciamento ou cessão de direitos de propriedade intelectual. Outros autores argumentam que esses direitos podem incluir tanto conhecimento codificado (por exemplo, na forma de patentes ou direitos autorais) como conhecimento tácito (know- how técnico) (Chiesa & Piccaluga, 2000; Hindle & Yencken, 2004). Com base na natureza do conhecimento transferido, Hindle & Yencken (2004) fizeram uma distinção entre spin-offs de investigação (transferência propriedade intelectual formal, como patentes ou copyrights), empresas de transferência de tecnologia (conhecimento tácito ou know-how) e spin-offs indiretos (criado por ex-funcionários ou estudantes com base no conhecimento tácito ou know-how adquirido durante a sua permanência na universidade).

Quanto à ligação dos empreendedores à instituição de origem, a Comissão Europeia (European Commission, 2004) e a OCDE (2002) utiliza a relação laboral com a instituição de origem como critério delimitador, tendo como argumento básico que a transferência para ser completa deve ser acompanhada pelo agente gerador do conhecimento, nomeadamente o conhecimento tácito, mas há autores (por exemplo, Pirnay et al., 2003) que incluem licenciados ou estudantes, que não possuem esta ligação laboral nem tiveram um envolvimento prévio em atividades de investigação da universidade, onde o racional assenta não no agente, mas na natureza do conhecimento que deve ser novo (Nicolaou & Birley, 2003).

Este enquadramento genérico indicia desde logo uma grande diversidade de olhares, confirmada pela literatura consultada, abrangendo um largo espectro de definições que

oscila entre definições muito abrangentes até definições bastante focadas em determinados públicos-alvo.

Mas mesmo num espectro mais restrito relacionado com o ambiente universitário, podem encontrar-se diversas nomenclaturas com significados diferentes, conforme se sintetiza a seguir: Hemmer et al. (2005) referem-se a spin-offs académicas como empresas baseadas em conhecimento, com origem numa universidade ou instituição de investigação, por graduados ou pessoal académico dessas instituições; a Comissão Europeia (2003) utiliza a expressão spin-offs baseadas em investigação definindo-as como empresas criadas por empregados para comercializar uma invenção que resulte de esforços de I&D de universidades, escolas técnicas ou departamentos de I&D públicos ou privados; Nicolaou e Birley, (2003) usa o termo spin-out universitário como uma empresa que envolve a transferência de uma tecnologia de uma instituição académica para uma nova empresa em que os membros fundadores incluem um investigador académico que pode ou não estar atualmente associado à universidade; Lockett e Wright (2005) utilizam o mesmo termo (spin-out) e define-o como uma nova empresa que depende de licenciamento ou cessão de propriedade intelectual da instituição; Steffensen et al. (2000) utiliza a expressão spin-off universitária que define como uma nova empresa formada por docentes, estudantes de doutoramento ou outros membros que deixaram a universidade ou uma instituição de investigação para criar uma empresa enquanto ainda membros afiliados da universidade e/ou a tecnologia nuclear (ou ideia) é transferida da organização de origem; Pirnay et al. (2003) que utiliza a mesma expressão, definindo-as como empresas criadas para explorar comercialmente algum conhecimento, tecnologia ou resultados de investigação desenvolvidos na universidade. A OECD (2002), refere-se a spin-off de investigação pública como empresas fundadas por investigadores do sector público (incluindo pessoal, professores e post-docs), que licenciaram tecnologias que são propriedade de entidades do sector público ou empresas com participação de uma instituição pública no seu capital social ou diretamente criadas por uma instituição de investigação pública. Outros autores e entidades têm outro entendimento sobre o conceito, como pode confirmar-se através da consulta do anexo IV.

Em termos de estudos nacionais sobre o tema, abrangendo em termos geográficos e contextuais um universo similar ao presente estudo, Teixeira e Grande (2013) definem ASO como empresas cujos produtos ou serviços são baseados em conhecimento científico/técnico gerado dentro de um ambiente universitário. Sublinhamos também a definição utilizada por Rodrigues et al. (2007: 2), que incluem na definição: “a) empresas criadas por elementos ligados a instituições de investigação, tais como professores universitários, investigadores, jovens bolseiros e estudantes de pós- graduação com o objetivo de explorar, transformando ou transferindo, conhecimento e/ou tecnologia obtido ou desenvolvido na sua atividade de investigação em instituições de investigação; b) empresas criadas por jovens recém-licenciados ou pós-graduados que aplicam diretamente os conhecimentos obtidos na universidade; c) as empresas criadas por empresários externos tendo por base a transferência de tecnologia desenvolvida pela instituição de investigação.

A partir destes contributos, um dos desafios desta investigação foi a seleção de uma definição própria. No caso concreto desta tese, tendo em conta o seu objeto de estudo já antes apresentado, parece-nos adequado seguir de perto as definições da Comissão Europeia (2003), da OECD (2002) e ainda de Rodrigues et al. (2007).

Assim, partindo destes referenciais, as ASO a estudar nesta tese são: novas empresas independentes, cujos produtos ou serviços são baseados em conhecimento científico/técnico, com menos de 8 anos de idade, criadas por estudantes de graduação e pós-graduação do ensino superior, investigadores e professores com o objetivo de explorar comercialmente o conhecimento, tecnologia ou resultados de investigação desenvolvidos pelos próprios na sua atividade de investigação na universidade, financiada por fundos públicos.

No documento Spin-offs académicas em Portugal (páginas 61-67)