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Incidência das políticas públicas nos fatores que influenciam o desempenho das ASO

No documento Spin-offs académicas em Portugal (páginas 186-191)

CAPÍTULO VIII – DISCUSSÃO DE RESULTADOS

4. Incidência das políticas públicas nos fatores que influenciam o desempenho das ASO

Neste ponto iremos analisar a eventual incidência das políticas e programas públicos de apoio ao empreendedorismo académico nos fatores que são sugeridos nos pontos anteriores como influenciadores do desempenho das ASO. Enquanto a influência dos diferentes fatores no desempenho das ASO foi avaliada com base na recolha de dados primários e testes estatísticos, a eventual incidência de políticas e programas públicos é avaliada com base na revisão da literatura efetuada no capítulo IV. Seguiremos a mesma metodologia que tem vindo a ser utilizada nos capítulos anteriores, estruturando a análise nas quatro dimensões definidas no modelo de análise explicitado no capítulo V.

4.1. Recursos Tecnológicos

No que se refere aos recursos tecnológicos, que como vimos no capítulo VII inclui os fatores “patentes”, “investimento em I&D” e “relacionamento com a instituição de origem”, pudemos observar alguma incidência dos programas públicos e especialmente das políticas universitárias sobre os mesmos.

No que se refere às patentes, fator associado à proteção da propriedade intelectual, verifica-se que apesar da influência positiva no desempenho, durante as entrevistas foi manifesto o desinteresse de algumas ASO em proteger o conhecimento, quer por considerarem o processo demorado e consumidor de tempo, quer pelos custos associados ao patenteamento internacional, quer por não reconhecerem mais-valias na patente (apenas) nacional.

É neste campo que os programas públicos podem desempenhar um papel importante pois como alegam Feldman et al. (2002), ao apoiar este processo podem estar a contribuir para que algum conhecimento importante possa ser protegido e aumentar o retorno dos investimentos públicos realizados em I&D. A este respeito, foi possível verificar que a maioria das instituições de origem tinha Gabinetes de Apoio à Propriedade Intelectual (GAPI) ou outras estruturas (as nomenclaturas são muito

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diversificadas) de apoio aos empreendedores e às ASO, especialmente no processo de registo de patentes, sugerindo que as políticas públicas têm acrescentando algum valor às ASO ao incidir sobre a proteção do conhecimento.

No que se refere à incidência das políticas públicas sobre o investimento em I&D constatou-se que grande parte do financiamento da I&D nas ASO teve a sua génese em programas públicos ligados aos fundos europeus. Este apoio revelou-se de capital importância para as ASO, dadas as necessidades de desenvolvimento da sua base tecnológica e de conversão do conhecimento em produtos e serviços inovadores. No caso presente as ASO beneficiaram de dois tipos de apoio público. Em primeiro lugar, de forma indireta por via da participação dos seus fundadores em atividades de I&D na instituição de origem, na fase prévia à constituição legal da empresa e, numa segunda fase, de forma direta, quando a empresa já constituída consegue obter apoio nos programas estruturais (no caso presente, maioritariamente do QREN, mas também alguns do QCA III) que, no caso das ASO da nossa amostra, atingiu valores elevados em comparação com, por exemplo o seu ativo ou o volume de vendas. Também neste caso as políticas públicas parecem ter algum alinhamento com este fator, embora alguns fundadores tivessem considerado que os programas de apoio não levam em linha de conta as especificidades das ASO de base tecnológica. Por exemplo, algumas empresas das áreas da biotecnologia e farmacêutica consideram que os apoios públicos à I&D sendo positivos, não se ajustam às necessidades dessas empresas, por serem desenhados numa perspetiva de curto prazo, quando este tipo de novas empresas necessita de instrumentos de apoio de longo prazo.

No que concerne ao relacionamento com as instituições de origem a incidência sobre este fator faz-se sentir mais por via das políticas universitárias de apoio às ASO. Como referido na revisão de literatura, os apoios disponibilizados por algumas universidades abrange uma vasta gama de serviços e facilidades, incluindo o acesso a laboratórios e escritórios de forma gratuita, apoio administrativo, acesso a professores e estudantes, apoio de incubação ou rede de contatos e por vezes compras diretas. Outros aspetos com incidência das políticas públicas neste fator, citados frequentemente pelos respondentes, foi o incentivo à participação em projetos de I&D em co-promoção ou programas de estágios para estudantes, especialmente mestres e doutores.

4.2. Recursos Financeiros

No que se refere às políticas públicas com incidência neste fator são vários os sistemas de incentivos referidos na literatura. No caso presente centraremos a análise nos subsídios públicos atribuídos às empresas.

Tendo em consideração as dificuldades de financiamento das ASO e o reconhecimento do interesse deste tipo de empresas na conversão de novo conhecimento em novos produtos e serviços, alguns governos têm criado fundos públicos com o objetivo específico de financiar empresas de base tecnológica nas fases iniciais do seu processo

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de criação e desenvolvimento, especialmente na fase de pré-arranque (pre-seed e seed

capital) (Mosey & Wright, 2007; Bathelt et al., 2010).

No anexo III são apresentados alguns programas públicos de apoio nacionais e internacionais, verificando-se que a grande maioria coloca a tónica nos apoios financeiros. As modalidades de apoio são muito diversificadas podendo incluir subsídios a fundo perdido, empréstimos bonificados, participação direta no capital social, ou prestação de garantias no caso de se registarem perdas de capital.

Em Portugal, pode referir-se o caso do programa NEOTEC, especificamente orientado para a criação de ASO e que disponibilizando subsídios públicos a fundo perdido, tinha como objetivo central colmatar as falhas de mercado na capitalização deste tipo de empresas nas fases iniciais. Estes subsídios abrangiam as fases de pré-arranque (anterior à constituição legal da ASO) com incidência na prova de conceito e no apoio à elaboração do plano de negócio e a fase de arranque (um ano após a constituição legal da empresa), com incidência no apoio à proteção da PI, da incubação e da contratação de pessoal.

Para além deste programa centrado especificamente nas ASO, pode referir-se também o programa Finicia que agregava nas suas plataformas de parceria todas as instituições do ensino superior e que tinha uma linha de financiamento orientada para as empresas de base tecnológica.

4.3. Capital Humano

No que se refere ao apoio das políticas públicas à valorização do capital humano das novas empresas têm-se registado com cada vez maior frequência a organização de cursos de formação pelas universidades nas áreas da comercialização dos resultados da investigação por si realizada e de gestão de novos negócios (Klofsten, 2000; van der Sijde & Cuyvers, 2003).

Em Portugal, tanto as universidades por si sós ou em parceria com outras entidades a operar na área do empreendedorismo (ANJE, IAPMEI, COTEC, Associações empresariais, incubadoras, empresas promotoras da criação de novas empresas, entre outras), têm também vindo a oferecer diversos cursos de formação. Verifica-se, todavia que a maior parte da formação está concentrada na fase de pré-arranque sendo necessário, segundo os respondentes que a oferta se estenda ao longo do ciclo de vida de uma empresa, ainda que com especial foco nos primeiros anos de vida.

No que se refere à incidência das políticas públicas na constituição das equipas das novas empresas, embora seja possível encontrar menções à importância da equipa nos critérios de seleção das empresas a apoiar nalguns programas públicos de apoio (p.e. programas Neotec e Finicia), aqueles critérios não têm sido suficientemente explícitos para podermos concluir que essa incidência influencia o capital humano das equipas. Por exemplo, no caso nossa amostra, em que todas as empresas beneficiaram de apoio público à sua criação, 10% das ASO foram criadas por empreendedores individuais e

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outras 10% por equipas com 6 ou mais empreendedores, apenas 24% têm formação académica em gestão ou marketing e 21% têm experiência nestas duas áreas, não sendo claros nem os critérios de avaliação das equipas nem o seu peso na seleção final das ASO a apoiar.

Parece poder concluir-se ser necessário melhorar os critérios dos programas públicos de apoio no que concerne à composição das equipas fundadoras (qualificação e experiência prévia), visto serem um dos fatores com maior influência no desempenho das ASO. Em complemento os respondentes também sugerem a necessidade de uma maior aposta dos programas públicos na capacitação das equipas em termos de reforço das competências nas áreas de gestão e marketing, especialmente nos estágios iniciais das ASO, através de programas de formação e acompanhamento.

4.4. Apoios não financeiros

Os apoios não financeiros incluem os apoios à incubação, apoios de consultoria, apoio á elaboração do plano de negócios e apoio à prova de conceito.

No que se refere aos apoio públicos à incubação constatámos que se registou uma grande proliferação destas estruturas em Portugal tendo sido criadas, segundo Caetano (2012) 50 incubadoras entre 1989 e 2009, das quais 19 entre 2006 e 2009. O financiamento para a sua construção teve origem no QCA e no QREN, funcionando a maioria com base em financiamento público (75,6%, segundo Caetano (2012)).

Numa pesquisa efetuada aos sites das universidades públicas portuguesas, constatámos que praticamente todas têm ligações a uma incubadora ou parque de C&T. Como pudemos constatar na revisão da literatura parece haver uma aposta excessiva dos decisores políticos e dos gestores universitários neste tipo de apoio face ao impacto limitado destas estruturas nas economias locais e regionais. Mesmo no caso das incubadoras de base tecnológica, segundo Ratinho e Henriques (2010) salvo poucas exceções o seu efeito no desempenho das ASO têm-se revelado bastante moderado. A maioria apresenta dificuldades de financiamento e de sobrevivência parecendo limitar- se a fornecer espaços de incubação sem cuidar dos serviços de apoio.

Parece poder concluir-se que seria necessário repensar os modelos de gestão deste tipo de estruturas para que a sua influência no desempenho das empresas incubadas possa ter resultados positivos.

No que se refere à incidência das políticas públicas sobre a consultoria e acompanhamento tem havido alguns instrumentos de apoio, mas muito centrados na fase inicial de criação das empresas e no apoio ao plano de negócio. Por exemplo, no programa Neotec o apoio a consultoria apenas era considerado na fase pré-arranque e no programa Finicia essa consultoria centrava-se quase exclusivamente no apoio ao plano de negócios. Uma das notas mais salientes das entrevistas com os respondentes foi justamente a necessidade de aconselhamento na fase pós arranque por ser o período em os reais problemas da empresa aparecem, quer nos aspetos ligados à gestão interna, quer

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á entrada no mercado, sugerindo que os programas públicos poderiam incidir menos no apoio a infraestruturas (como p.e. as incubadoras) e mais em instrumentos de aconselhamento e acompanhamento das equipas de gestão.

O plano de negócios a par da incubação tem sido um dos instrumentos preferenciais das entidades públicas que gerem programas de apoio ao empreendedorismo. Por exemplo, o já antes citado “Programa Neotec”, financiava o apoio à elaboração do plano de negócios e a sua formalização era obrigatória para a passagem da fase pré-arranque para a fase de arranque. Também o “programa Finicia” privilegia a apresentação de um plano de negócio para a avaliação dos projetos empresariais financiando o apoio à sua elaboração. Outro exemplo refere-se às entidades de capital de risco públicas que também exigem o plano de negócio como ponto de partida para a análise dos projetos. Nesta perspetiva parece poder concluir-se que apesar do valor preditivo bastante limitado do PN face ao futuro desenvolvimento do negócio, as entidades públicas continuam a apostar nesta ferramenta como praticamente imprescindível para a avaliação dos projetos, revelando algum desfasamento face às evidências da investigação académica.

No que se refere às políticas públicas em relação à prova de conceito, embora seja possível registar a presença de instrumentos nalguns programas, os dados recolhidos sugerem que a sua operacionalização tem vindo a revelar-se de difícil concretização. Por exemplo, no caso do “programa Neotec” apenas 10 das 79 empresas criadas receberam verbas para este efeito. Segundo os informantes a escassez no mercado de operadores com competências nesta área da prova de conceito e o custo desses serviços tem inviabilizado a sua concretização. Começam no entanto a surgir mecanismos mais ágeis de teste das ideias no mercado, como por exemplo a metodologia Lean Startup, dinamizada, por exemplo, pela Universidade de Lisboa ou o programa +E+I que oferece um programa de apoio na fase pré-arranque com acesso a mentores profissionais. Concluída a análise de dados e a discussão de resultados iremos, no ponto seguinte, apresentar as principais conclusões deste trabalho.

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CAPÍTULO IX – CONCLUSÕES, LIMITAÇÕES E INVESTIGAÇÃO

No documento Spin-offs académicas em Portugal (páginas 186-191)