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Rio Tietê Bacias Hidrográficas

II. 2.1.2 Aspectos históricos

Era o primeiro curso volumoso de água que o estrangeiro encontrava ao penetrar de São Vicente no Paranapiacaba em direção ao sertão. Na visão de Afonso d’E. Taunay, o rio Tietê é o principal caminho responsável pelas expansões das fronteiras brasileiras: “no conjunto das vias de penetração do Brasil selvagem e desconhecido, nenhuma tem a significação histórica que, sequer de longe, se aproxime da que empresta ao Tietê tão notável realce57”.

55 Ibid., p. 48. 56 Ibid., p. 145.

Outro grande caminho da colonização brasileira foi o do Tietê: de suas margens partiu o movimento conquistador de todo o Sul, do Centro e do Oeste, ondulando-se, propagando-se seus efeitos por todo o sertão do Norte e do extremo Norte, em ajuda propícia e indispensável à irradiação dos criadores. 58

Ainda que a corte portuguesa tenha visado, sobretudo, a extração da matéria- prima e das riquezas do Brasil, o Tietê favoreceu o movimento contrário. Levou imigrantes e alimentos às pedras e minerais preciosos de Minas Gerais, Goiás e Mato Grosso, principalmente no século XVIII. De modo geral, os rios paulistas integraram o litoral ao interior, e não o interior com a Europa.

O desenvolvimento econômico de São Paulo teria sido inexpressivo, comparativamente, se não existisse o rio Tietê. Além de fornecer alimento, água e orientação espacial para as expedições dos bandeirantes, transporte e alimento para as monções do século XVIII, o Tietê forneceu a água e a energia necessárias para as lavouras paulistas, via de transporte para a exportação do ouro de Mato Grosso e da produção agrícola e, mais recentemente, a energia hidrelétrica.

Foi no setecentismo, após o declínio do bandeirismo, que o rio Tietê foi mais utilizado como via de transporte de colonizadores. Foi o período das monções (fig. 05). Impulsionadas pelo ouro cuiabano e a política de expansão colonial, as monções eram viagens fluviais periódicas e sistematizadas de famílias inteiras que iam se estabelecer em Cuiabá: “pelas águas barrentas do Tietê circulou a vida inteira da Capitania na centúria de setecentos59”. Partiam de Nossa Senhora Mãe dos Homens de Araraitaguaba, atual Porto Feliz. O rio era considerado “repulsivo” e “atrativo”, de “natureza selvagem” e difícil navegação, pleno de cachoeiras, itaipavas (“série de rochas em meio a uma corrente de água que antecede uma catarata60”) e corredeiras. Os números variavam entre 75 e 160 acidentes geográficos, dependendo dos níveis das

58 Basílio de MAGALHÃES, Expansão geográfica do Brasil até fins do século XVIII IN: Mello

NÓBREGA, op. cit., p. 43.

59 Mello NÓBREGA, op. cit., p. 18.

60 Dicionário Houaiss (versão eletrônica 1.0, em CD-ROM, - Dezembro de 2001 Copyright 2001 Instituto

águas. Custódio de Sá e Faria ao descrever o Tietê, afirmou “bem se pode dizer que todo ele é uma contínua cachoeira61”.

A viagem até Cuiabá constituía uma “gigantesca jornada”, uma aventura onde, não raro, perdiam-se homens e embarcações. A navegação pelo Tietê só foi possível pelo encontro do tecnicismo português com a sabedoria da tradição indígena, originando uma navegação única e exclusiva. Nestes tempos, Araraitaguaba se tornou uma verdadeira vila de espírito talássico, devido às suas matas ricas em matérias-primas para a fabricação de canoas, armazéns e porto. Quando declinou o Ciclo das Monções (séc. XVIII), irrompendo o ciclo do Muar, o mesmo aconteceu a Porto Feliz. “Em 1809 chegava a Cuiabá com suas canoas talvez um dos últimos comerciantes a conduzir cargas pelo rio62”.

O primeiro impulso para o desenvolvimento agrícola do estado foi dado pela cultura da cana-de-açúcar. Vizinha à cultura de subsistências dos povoados que habitavam as margens do Tietê, a lavoura açucareira se desenvolveu rapidamente, principalmente no século XVIII, aliada a uma série de fatores locais.

As terras férteis, os trechos navegáveis do rio atuando como via de escoamento da produção, o comércio que as monções haviam propiciado com os núcleos de mineração, as condições econômicas e sociais e, ainda, as medidas governamentais favoráveis ao comércio exterior e à valorização do porto de Santos, fizeram com que os engenhos do Médio Tietê se expandissem continuamente, por toda a região, a partir de meados do Século XVIII. Em pouco tempo a lavoura açucareira tornou-se o motor da economia paulista, e com ela floresceram as cidades da região.63

Seguindo-se ao declínio dos canaviais, o café, nos meados do século XIX se tornou o principal produto de exportação do país. A cultura cafeeira trouxe novo fôlego à economia paulista, e novamente a presença do rio Tietê se mostrou crucial. Enfim, em 1929, com a crise do café, os fazendeiros adaptaram suas terras à policultura, que não era tão lucrativa.

61 Mello NÓBREGA, op. cit., p. 20.

62 Leonardo ARROYO, IN: Mello NÓBREGA, op. cit., p. 22. 63 ________ O Livro do Rio Tietê, p. 84.

O Estado de São Paulo, por volta de 1890, seria o centro produtor mais importante do mundo. Para o vale do Tietê, isso representou uma das bases de sua expansão econômica e das transformações que viriam em todos os aspectos da vida de suas cidades: o café desenvolveria as estradas de ferro, traria os colonos estrangeiros, o lucro dos cafezais seria investido na modernização de grandes latifúndios e provocaria mudanças nos hábitos dos moradores. 64

Mas o progresso não veio incólume à biodiversidade da região do Tietê. Do cultivo da cana-de-açúcar, do café e da policultura, pouco restou depois do desmatamento, que cobriu quase a totalidade do estado (fig. 06).

(fig. 06 – o desmatamento em São Paulo)