• Nenhum resultado encontrado

2 CAMINHOS DA PESQUISA

2.2 ASPECTOS METODOLÓGICOS

Sendo a pesquisa de cunho qualitativo, buscamos, através da dialética e do materialismo histórico, imergir no cotidiano da FDNA, tendo como público-alvo feirantes, consumidores e moradores antigos do bairro, não deixando de ressaltar a importância dos caminhoneiros e ou transportadores das mercadorias, os carregadores de compras e os transeuntes que formam uma grande rede social em constante movimento. Contudo, não deixamos de estabelecer relações com outros espaços geográficos, pois, “fatos isolados não significam nada [...], enquanto não são relacionados, pela mediação das diferentes totalidades parciais, à totalização em processo”. (SANTOS, 2006 p. 119)

Segundo Lefebvre (1983, p. 170-184), conhecer um objeto ou um fenômeno é justamente não o considerar isolado, pois o real se apresenta como móvel, múltiplo diverso e contraditório. Assim sendo, o espaço analisado faz parte do mundo sistêmico (mercado, economia, dinheiro, Estado/poder) e do mundo vivido (cultura, personalidade, subjetividade, identidade e a sociedade mediada pela linguagem) (CARNEIRO, 2014). Além disso, buscamos no materialismo histórico a edificação das feiras ao longo dos tempos, ou seja, que têm lugar num local e durante um período determinado (MOTT, 1975, p.19). Conforme afirma Braudel (1996):

Sob forma elementar, as feiras ainda hoje existem. Pelo menos vão sobrevivendo e, em dias fixos, ante nossos olhos, reconstituem-se nos locais habituais de nossas cidades, com suas desordens, sua afluência, seus pregões, seus odores violentos e o frescor de seus gêneros. (BRAUDEL, 1996 p.15).

Nesse sentido, a Feira Dominical do Nordeste de Amaralina delineia-se como local de articulações econômicas e sociais dinâmicas que se edifica através de um espaço apropriado durante um determinado período.

2.2.1 Trabalho de campo

De acordo com Serpa (2006, p.21), ao se ressaltar a importância do trabalho de campo na Geografia, não significa pregar a volta do empirismo descolado da perspectiva da teorização, para o autor, os conceitos, teorias e procedimentos metodológicos devem constituir uma unidade orgânica e coerente no desenvolvimento dos trabalhos de pesquisa dos geógrafos.

Nessa perspectiva, ao se realizar o trabalho de campo como ferramenta geográfica dessa pesquisa, buscou-se a análise das interações entre os diversos elementos do espaço, buscando a totalidade do espaço, enquanto processo e dinâmica, pois de acordo com Santos (2008, p. 18), através do estudo das interações, recuperamos a totalidade social, isto é, o espaço como um todo. Assim sendo, o trabalho de campo foi desenvolvido em quatros fases distintas, com intuito de articular e construir interpretações geográficas do espaço estudado.

Na fase 1, exploratória in loco, foram utilizadas a observação e conversas informais, como técnicas de coleta de dados, nos meses de maio, junho e outubro de 2014, em dias e horários diferentes.

Conforme Gil (2008, p.100), a observação nada mais é que o uso dos sentidos com vistas a adquirir os conhecimentos necessários ao cotidiano. Prossegue o autor afirmando que a observação pode ser utilizada como procedimento científico desde que: a) sirva a um

objetivo formulado de pesquisa; b) seja sistematicamente planejada; c) seja submetida à verificação e controles de validade e precisão.

Desse modo, as observações foram perpetradas com o objetivo de entender diretamente a dinâmica da feira e as estratégias utilizadas pelos feirantes para a comercialização das mercadorias.

Figura 5 - Fluxograma da fase 1

Fonte: ROCHA, 2016.

Nessa fase, foi verificado que a feira, em determinados períodos, possui cerca de duzentos feirantes, o que condiz com as informações obtidas na SEMOP (2014). No entanto, a maioria desses agentes expõe suas mercadorias no chão, contradizendo a informação dessa secretaria, que indica duzentas barracas, como será mais detalhado e discutido no capítulo 4.

Para fins metodológicos e melhor compreensão do local estudado, delineou-se o croqui do espaço, dividindo-o em três partes: Alta, Intermediária e Baixa, as quais denominamos de Circuito da Feira. Contudo, essa divisão não é uniforme e homogênea, pois a distribuição espacial das mercadorias é realizada de forma arbitrária pelos feirantes.

Ressalta-se que, em 2006, a antiga Secretaria Municipal de Serviços Públicos (SESP), atual SEMOP, órgão da prefeitura da cidade, responsável pela regulamentação das feiras livres em Salvador, havia dividido o local em parte alta e parte baixa. Entretanto, tal divisão não corresponde à atual configuração de aproximadamente 500 metros lineares, mais duas transversais ocupadas pelos comerciantes, consumidores, carregadores e transeuntes.

Com base nos resultados preliminares e para prosseguimento da pesquisa, tornou-se imprescindível a aplicação de questionários semiestruturados com os feirantes e consumidores da Feira, no mês de junho de 2015, o que se constituiu na fase dois. Para tanto, a amostragem utilizada foi por tipicidade ou intencional, já que existia um conhecimento prévio dos agentes sociais.

Na Parte Alta (A), que se situa ao Norte da Feira, foram aplicados dezenove questionários. Na parte Intermediária (B), localizada na porção mais estreita e que faz ligação entre a parte Norte e a parte Sul, foram aplicados treze questionários. Na parte Baixa (C), que corresponde à parte Sul, foram aplicados vinte e dois questionários. No total, foram aplicados cinquenta e quatro questionários aos feirantes7.

O objetivo proposto foi detectar as suas origens, o tempo de atividade na feira, os meios de produção e circulação das mercadorias e a infraestrutura local. Para tanto, foram elaboradas vinte e cinco questões semiabertas com indagações sobre: idade, grau de escolaridade, local de residência, tempo e frequência na feira, pessoas da família envolvidas na atividade, principal produto comercializado, procedência, tipo de apoio financeiro, segurança, organização da feira etc.

Sessenta e três questionários, com dezessete perguntas cada um, foram aplicados aos consumidores, com a finalidade de identificar o perfil socioeconômico desses agentes. Principais indagações: idade, grau de escolaridade, número de filhos, profissão, renda familiar, bairro onde mora, frequência com que compra na feira, principal produto comprado, qualidade das mercadorias, importância da feira para o bairro, entre outras.

Nos dois grupos, foi aplicado um questionário como pré-teste e dois como teste. Devido ao grande movimento na feira, a amostragem foi realizada mediante acesso aos feirantes e aos consumidores, das 07h30min às 13h00. Não houve sucesso quanto a horários anteriores. Nas tentativas entre as 06h30min e 07h30min, negaram-se a responder, alegando falta de tempo. Quanto aos compradores, constatamos que esses agentes chegam mais cedo à feira para melhor aproveitar o restante do domingo.

A fim de facilitar a aplicação, contamos com a ajuda de três graduandos, sendo um de Sociologia, uma de Letras (ambos da UFBA) e uma de Turismo e Hotelaria, aluna da UNEB, todos residentes no Nordeste de Amaralina8.

7 Os questionários aplicados se encontram em apêndice.

8 Os colaboradores dessa fase produziram relatórios, acerca da aplicação dos questionários, que se encontram anexos a esta dissertação.

A divisão para aplicação foi realizada da seguinte forma: em dois domingos consecutivos, as duas estudantes se localizaram na parte Baixa, devido ser a área de maior extensão, enquanto o rapaz permaneceu na parte Intermediária. A parte Alta, a ala mais importante da Feira, para nossos estudos, devido ter como característica possuir maior quantidade de feirantes antigos e oriundos da zona rural, ficou sob minha responsabilidade. Após a aplicação dos questionários houve as discussões sobre a experiência e a entrega de relatos por parte dos graduandos9.

Figura 7 - Fluxograma da fase 2

Fonte: ROCHA, 2016.

Com os resultados dos questionários foram detectados os principais agentes sociais: os feirantes antigos, os consumidores e os moradores antigos, além de órgãos públicos. Partiu-se então, para a fase três, as entrevistas semiestruturadas como procedimento de investigação e para a narrativa, como forma discursiva para apreensão de dados, pois de acordo com Bauer et ali (2007, p. 91),não há experiência humana que não possa ser expressa na forma narrativa.

Nessa fase foram realizadas quatro entrevistas com moradores acima de cinquenta anos, que nasceram e ainda vivem no bairro. A primeira, com um grupo composto por três mulheres, que tiveram forte atuação na década de 1980 em movimentos ligados ao partido político do PCdoB e intervenção em vários acontecimentos políticos e sociais no Nordeste e suas localidades, e mais três com consumidores presentes na Feira. Em seguida, foi efetivada entrevista na 28ª Delegacia da Polícia Civil - DT e outra no Centro Social Urbano do Nordeste de Amaralina (CSU), antigo Vivanordeste. Foram dez entrevistas, cujos objetivos foram o aprofundamento sobre a origem da feira, a sua articulação política e socioeconômica. Mesmo seguindo um guia-roteiro, preservamos o diálogo informal, com vistas ao respeito da liberdade dos entrevistados.

Figura 8 - Fluxograma da fase 3

Fonte: ROCHA, 2016.

Ainda de acordo com os questionários aplicados, constatou-se que maioria dos feirantes localizados na parte Alta são oriundos do município de Amargosa, em especial do distrito de Corta Mão. A partir desse conhecimento, deu-se início à fase quatro, que se constituiu em visita ao município baiano com maior representatividade de feirantes (Amargosa), em julho de 2015.

Nessa etapa, foram entrevistados três produtores rurais na sede do Distrito de Corta Mão, quatro feirantes, três caminhoneiros e o administrador do Mercado Municipal de Amargosa. Também foi realizada visita à zona rural do distrito e a duas propriedades rurais produtoras de cacau, banana e jaca.

A entrevista foi semiestruturada e informal com base no guia-roteiro. O objetivo foi levantar informações sobre a dinâmica dos feirantes que se deslocam do município de Amargosa e do seu distrito, Corta Mão, a Salvador - BA, averiguando a relação desses agentes com a terra, as estratégias para obtenção das mercadorias a serem comercializadas e o porquê de as bananas serem o principal produto vendido na FDNA.

Todas as entrevistas foram gravadas e transcritas para posterior análise, tendo seus autores concordado com a publicação.

Ressaltamos que outras feiras em bairros de Salvador e em outros municípios baianos foram visitadas, a fim de observações e pequenas comparações, sem, contudo, serem realizadas análises aprofundadas desses espaços.

Fonte: ROCHA, 2016.

Como desfecho do trabalho de campo, foi desenvolvida a planta do Circuito da Feira, do Nordeste de Amaralina, tendo como objetivo indicar as principais ruas e transversais ocupadas pelos agentes sociais, os órgãos públicos existentes, assim como os principais estabelecimentos comerciais que compõem os circuitos de fluxos inferior formal do Circuito da Feira. Seguindo a proposta metodológica, o Circuito foi dividido em três partes:

1) Parte Alta – representada pela letra A - estão localizados os feirantes mais