• Nenhum resultado encontrado

CAPÍTULO I FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

1.3 Avaliação: meio para (re)construir a sala de aula

Esta seção tem como objetivo apresentar os fundamentos teóricos gerais sobre avalição de PO e os específicos sobre o teste oral, TEPOLI, a que os alunos foram submetidos no transcorrer desta pesquisa.

Além das dificuldades resultantes da má formação, Romão (2001) levanta a questão de que os problemas da avaliação da aprendizagem resultam também do tráfico ideológico das

elites, mantendo o status quo individualista, meritocrático, discriminatório e injusto sustentado por meio de nove mitos32. Dois desses mitos, “Avaliar é muito fácil e qualquer um

pode fazê-lo”, e “Avaliar é tão complicado que se torna, praticamente, impossível fazê-lo de forma correta”, mecanismos de defesa de quem teme e não procura aprofundar conhecimento

e técnicas sobre a avaliação serão relevantes para analisarmos as expectativas e concepções dos alunos.

Do mesmo modo, vale ressaltar que o mito de que “é preciso eliminar os aspectos

quantitativos da avaliação” aqui é quebrado, visto que esta tese abarca os dois aspectos, o

qualitativo, que independentemente da expressão final dos resultados é construído durante o processo, e o quantitativo, que também deve ser considerado e, provavelmente, nunca será totalmente descartado. O objetivo é buscar o equilíbrio entre os dois aspectos, já que a oposição absoluta entre quantidade e qualidade constitui um falso dilema.

Portanto, na reflexão aqui apresentada, surgiu a necessidade de repensar o processo de avaliação em meio às novas concepções, derrubando esses mitos e buscando um equilíbrio das relações entre o aluno e o professor no bojo das novas concepções pedagógicas a fim de alterar o descompasso entre uma imagem idealizada da avaliação – em teorias mais atuais e progressistas – e a realidade cotidiana das escolas, condicionadas, estruturalmente, pelo sistema de promoção e seriação e, conjunturalmente, pelas péssimas condições concretas de trabalho e pelas determinações dos superiores de plantão (ROMÃO, 2001).

Mitos à parte, há que se conceituar avaliação neste trabalho. Para tanto, será apresentado um pequeno histórico dos tipos e concepções sobre avaliação, sua finalidade no processo de ensino e de aprendizagem, para que ela não seja considerada um fim em si mesmo, antes de focar explicitamente o instrumento de avaliação em questão, o TEPOLI.

Na década de 1960, Scriven (1973) traz a ideia de mérito, valor do que está sendo objeto de avaliação (programa, currículos, materiais, desempenhos dos alunos, entre outros). São dele os termos “avaliação formativa’’, aquela produzida ao longo do programa, projetos e produtos educacionais a fim de proporcionar informações destinadas ao aprimoramento das ações, e “somativa”, aquela que determina o mérito, o valor final de um programa, com o objetivo de proporcionar a tomada de decisões sobre sua continuidade ou não. Scriven (1973) iniciou seus estudos com a ideia de alcance de objetivos, mas, após algum tempo, propôs uma

32 “Escola boa é aquela que exige muito e ‘puxa’ pela disciplina”; “O bom professor é aquele que reprova

muito”; “a maior parte das deficiências dos alunos é decorrente das carências que eles trazem de casa”; “Nas escolas avalia-se apenas o conhecimento adquirido pelo aluno, desprezando-se os aspectos de seu amadurecimento físico e emocional” são alguns dos mitos que podem ser analisados com a leitura de Romão (2001).

nova forma denominada “avaliação independente de objetivos”, na qual o avaliador deveria interessar-se pelos objetivos colaterais de um programa e não ficar circunscrito somente aos objetivos predefinidos no planejamento.

Nessa linha, destacam-se os trabalhos de Fidalgo (2002) e Duboc (2007), que focam a perspectiva formativa de avaliação e também reforçam a importância de se incluir a perspectiva do aprendiz no processo avaliativo. Fidalgo (2002) pesquisou dezessete instrumentos de avaliação e suas contribuições para a formação de agentes críticos, destacando que, mesmo os instrumentos vistos como democráticos, podem mascarar formas de controle, visto que todos os processos avaliativos, em maior ou menor grau, são representações sociais (não necessariamente conscientes) sobre como e o que se deve avaliar. Entretanto, essa mesma autora destaca que o uso da argumentação como parte das práticas avaliativas pode ajudar (i) o aprendiz a perceber o que, de fato, sabe/conhece e (ii) o professor a perceber essas formas de controle.

Duboc (2007) apresenta a re-conceituação da avaliação dentro das novas teorias de letramento, o que implica uma prática avaliativa colaborativa, distribuída e negociada, que se contrapõe a uma prática individualista, homogênea, estanque e objetiva. A autora afirma que isso, necessariamente, não pressupõe a substituição de instrumentos de avaliação pré- existentes por outros mais recentes e inovadores, mas levanta a possibilidade de alunos e professores priorizarem o conceito de verdades provisórias e de validade móvel que emergem do contexto de uso da língua e compartilharem suas apreciações e deliberações, de uma forma menos verticalizada e mais pública.

De volta à linha histórica, o modelo estruturado por Stufflebeam et al. (1971), entre outros, conhecido como CIPF (contexto, input, processo e produto), no qual a cada decisão dessas fases de um programa deveria haver um tipo de avaliação, mantendo a concepção de avaliação para tomada de decisão, defendiam que a avaliação era processo sistemático e contínuo de delinear, obter e fornecer informações úteis ao julgamento das alternativas de decisão. Entretanto,

Para Stake [1982], a avaliação deveria permitir a compreensão de todo o processo relacionado a um programa, por meio de ampla gama de informações e tomada de decisão. Sua concepção de avaliação é a de que ela esteja voltada mais para as atividades do programa do que para seus objetivos. Stake denomina a avaliação de responsiva, que deve detalhar os vários procedimentos e apresentar diferentes momentos. Para esse estudioso, importam o que está ocorrendo no programa, a reação das pessoas e as reflexões feitas, o que configura a avaliação responsiva como essencialmente formativa, sem, entretanto, tirar-lhe a possibilidade de ser também somativa (DEPRESBITERES; TAVARES, 2009, p. 33).

Com Parlett e Hamilton (1977), surge, na década de 70, uma nova concepção de avaliação, a iluminativa ou naturalista, que procura investigar e interpretar as práticas e as experiências dos participantes do processo de ensino/aprendizagem, os procedimentos institucionais e os problemas gerenciais, sob uma visão holística, focando os fenômenos ao ocorrerem, naturalmente, em um contexto real, sem criar condições artificiais de estudo. Tem caráter interpretativo, o que não limita o avaliador a descrever e elaborar um relatório final, “mas o estimula a fomentar a discussão sobre os resultados, a levar pessoas a refletirem sobre o que é realmente significativo e relevante nas informações dos vários participantes da avaliação” (DEPRESBITERIS; TAVARES, 2009, p. 34).

Com relação especificamente aos instrumentos de avaliação, Vianna (2005) apresenta como divisor de águas entre psicometria tradicional e as atuais teorias de WILLIANS aprendizagem a publicação de um artigo de Glaser (1963), propondo que deveriam existir instrumentos que servissem a uma avaliação formativa, tendo como referencial o desempenho da própria pessoa diante de objetivos previamente definidos.

Para Glaser (1963), os testes referenciados em normas eram adequados a funções de classificação, enquanto os referenciados em critérios eram para uma avaliação de melhoria dos desempenhos, cuja preocupação se centrava na promoção do uso sistemático de objetivos educacionais e no problema de uma instituição mais individualizada. Assim, medidas referenciadas em critério trouxeram uma nova perspectiva para a teoria de que todos ou quase todos podem aprender e atingir um nível considerável de capacitação, já proposta por Bloom (DEPRESBITERIS; TAVARES, 2009).

Ficava cada vez mais claro que a avaliação direciona o objeto numa trilha dinâmica de ação, enquanto a verificação congela o objeto; que a primeira envolve um ato que ultrapassa a obtenção de configuração do objeto, exigindo decisão do que fazer ante ou com ele. Atualmente, parece inquestionável que a avaliação deve ser encarada em uma perspectiva mais ampla, que englobe todos os elementos do processo de ensino e aprendizagem, com especial atenção ao acompanhamento e desenvolvimento integral do educando. Os instrumentos são fundamentais, mas não suficientes para esse processo.

Nessa visão ampliada de avaliação, segundo Figari (1996), há a noção de estrutura que designa realidades muito diferentes: macroestruturras (sistemas educativos), mesoestruturas (estabelecimentos de ensino) e microestruturas (turmas de alunos). A estrutura evoca uma instituição estabilizada que pertence mais ao campo social e político do que ao da pedagogia.

é o de Cardinet (1993), pelo qual o processo de observação e interpretação dos resultados da aprendizagem visa orientar as decisões necessárias ao bom funcionamento da escola.

Na visão de Afonso (1998), é possível elencar cinco níveis de avaliações, visualizados na Figura 4, a saber: o internacional, que fixa padrões de desempenho que servem de referência para o estabelecimento de diretrizes e metas para os sistemas de ensino entre países33; o nacional, que verifica a qualidade do ensino em determinado país34, no qual poderia ser classificado o TEPOLI; o institucional, voltado para cada instituição de ensino a fim de analisar todos os componentes do processo educacional: currículos, desempenho de professores, materiais didáticos, infraestrutura, recursos econômicos e cursos de formatação, entre outros35; o curricular, que se refere especificamente ao currículo, entendido como todas as atividades intra e extracurriculares de uma instituição de educação; e o de sala de aula, cujo primeiro estágio – o da aprendizagem – ocorre no âmbito da sala de aula, laboratórios e oficinas, sendo de responsabilidade do docente.

Assim, o conceito de avaliação foi-se ampliando desde uma perspectiva de microavaliação (feita em sala de aula, na instituição) para uma de macroavaliação (currículo), reforçando o interesse por diferentes indivíduos (professores, alunos, pais, administradores) e diversos projetos, produtos e materiais, tais como o currículo, considerado tão importante como todas as atividades realizadas pela escola e as próprias filosofias e políticas adotadas pelos sistemas de ensino, como pode ser visualizada na figura a seguir.

33Um exemplo é o Programa Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa), coordenado e desenvolvido pela

Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).

34 No Brasil, um exemplo é o Sistema de Avaliação da Educação Básica (Inep), cujo objetivo é estabelecer

normas e padrões gerais e assegurar, por meio de amostras periódicas, um “termômetro” nacional do rendimento escolar.

35 Comissão Própria de Avaliação (CPA) instituída dentro das Faculdades e Universidades de acordo com as

Figura 4 - Níveis de Avaliação36

Fonte: DEPRESBITERIS; TAVARES, 2009, p. 36.

De modo a diferenciar a avaliação de sistemas de avaliações mais específicas de sala de aula, poderíamos dizer, sucintamente, que ela abrange um grande universo de alunos e utiliza instrumentos formais, preferencialmente com questões fechadas e previamente testadas. A avaliação em sala de aula baseia-se na relação professor e aluno, tem caráter fortemente formativo, devendo ser contínua para abranger poucos alunos e utilizar instrumentos de vários tipos.

A criação desses níveis mais globais (macro) deve-se ao papel que vem sendo colocado para a avaliação de sistemas, que é o da accountability, termo inglês interpretado como “prestação de contas”, que suscita inúmeras controvérsias. Para Macpherson (apud AFONSO, 1998), o que tem incentivado a ideia da prestação de contas nos diversos países é a perspectiva de educação vista sob a ótica do mercado, cujo principal pressuposto é o chamado individualismo possessivo, como ele o denomina. Para o autor, por trás da lógica de mercado encontra-se a ideia de que os indivíduos são proprietários de suas capacidades e que são livres para colocá-las em prática, numa sociedade de outros indivíduos iguais e livres.

Macpherson (apud AFONSO, 1998) sugere que se interprete o termo accountability como “responsabilização”, sob a qual a avaliação educacional deveria ser realizada, considerando toda a variedade de atividades no contexto do sistema educativo, desde aquelas desenvolvidas nas salas de aula até as que se referem às políticas educacionais, o que implica responsabilidades em várias instâncias (pedagógicas, políticas, institucionais e de gestão).

Willis (1996) classifica a “responsabilização” em diferentes dimensões. A “responsabilização” profissional é aquela que ressalta a formação de bons profissionais, para

36Fonte: Adaptação de Almerindo Janela Afonso. In: Políticas educativas e avaliação educacional. Braga:

que eles possam tomar decisões sobre o processo de ensino e aprendizagem. Outra idéia de “responsabilização” é a gestionária-burocrata, pela qual é imprescindível verificar como as instituições de ensino estão gerenciando a educação.

Outros estudiosos afirmam que a avaliação como accountability é importante, afinal, não há dúvidas sobre o significado da visibilidade social implícita na avaliação. Numa democracia, as informações não podem ficar centralizadas nas mãos de poucos, mas devem ser socializadas. Há, portanto, a obrigação ética de “prestar contas”.

Para Vianna (2000), os altos investimentos financeiros em educação exigem, necessariamente, um projeto de avaliação que demonstre os resultados em termos de custos/benefícios, não deixando de lado o componente humanista. Pais e demais responsáveis pelos alunos são considerados consumidores da educação e, consequentemente, podem e devem reclamar se o produto não satisfizer às exigências de qualidade.

Como se pode observar, o uso da avaliação como sinônimo de prova, de exame, de teste, tem origem remota em seu nascimento. A avaliação em sala corresponde à aprendizagem dos alunos e está somente sob a responsabilidade do professor, existe aí uma co-responsabilidade. Evidentemente, os instrumentos também precisam ser bem elaborados, pois resultados confiáveis podem ajudar o professor a tomar melhores decisões.

O valor da avaliação não está no instrumento em si, mas no uso que se faz dele. Mais do que o instrumento, importam o tipo de conhecimento que se põe à prova, a pergunta que se formula e a qualidade mental ou prática que se exige para a resolução dos problemas.

Pode-se, ainda, aprofundar outros conceitos importantes da avaliação nos dias de hoje, como o empowerment de Fetterman (2001), com quem concordo, que defende a ideia da avaliação como forma de emancipar, liberar ou esclarecer aqueles cujos programas são avaliados. A avaliação é vista como emancipadora das pessoas, o que pressupõe uma abordagem permeada por procedimentos éticos.

Desse modo, penso a avaliação como um processo contínuo que envolve decisões éticas, em qualquer um dos níveis acima apresentados. Mais especificamente no processo de ensino e aprendizagem, é preciso informar antecipadamente os alunos sobre quais serão os critérios de avaliação; não realizar apressados juízos de valor; não rotular os alunos com palavras que possam servir de “estereótipos”, de motivo de chacota; e permitir acesso aos resultados, entre outros.

Portanto, na era da informação, o grande desafio da avaliação não reside na capacidade de produzir, armazenar ou transmitir informações, mas reconhecer o que é importante saber e, de fato, utilizar essa informação (PENNA FIRME, 2009) e o que é preciso

fazer para criar e desenvolver avaliações para reduzir incertezas, melhorar a efetividade e tomar decisões relevantes.

Com base no exposto até agora, pode-se justificar algumas das concepções deste trabalho, e que serão expostas no capítulo sobre a metodologia da investigação, bem como as das próximas subseções e seções, em que a avaliação é meio de iluminação de consciência, tanto do aluno quanto do professor, para possíveis tomadas de decisões, através de levantamentos de dados em diferentes momentos do processo (durante toda a graduação), bem como do seu produto (última prova da graduação), mas não o “produto final”, pois pode, também, demonstrar a necessidade de uma formação continuada de estudo. Isso significa que o aluno, ao verificar seu nível de inglês atestado pelo TEPOLI, no final da graduação, pode usá-lo como parâmetro para, inclusive, dar continuidade à sua formação, seus estudos.