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Banco do Nordeste: financiamento das atividades do Aeroporto de Fortaleza

3. ESTADO E INCENTIVOS GOVERNAMENTAIS

3.6 Banco do Nordeste: financiamento das atividades do Aeroporto de Fortaleza

A iniciativa privada encarregada da administração do aeroporto de Fortaleza, a fim de cumprir os compromissos assumidos no contrato de concessão do equipamento, necessita de capital. Pode ser investido capital próprio da empresa ou pode ser que se utilize de instituições financeiras para o empréstimo do capital. A opção adotada pela Fraport, empresa concessionária, foi utilizar o empréstimo.

Assim, em outubro de 2018, contratou financiamento no valor de R$ 690 milhões de reais junto ao Banco do Nordeste do Brasil (Banco do Nordeste ou BNB), sociedade de economia mista federal. O BNB, segundo o art. 1º de seu estatuto social consolidado (registrado em 23 de novembro de 2018 na Junta Comercial do Estado do Ceará), caracteriza-se como:

Banco de Desenvolvimento, sociedade anônima aberta, de economia mista, de personalidade jurídica de direito privado, Instituição Financeira Múltipla, criado pela Lei Federal nº 1.649/52, é regido por este estatuto e, especialmente, pelas Leis nº 4.595/64, nº 6.404/76 e nº 13.303/16, pelo seu respectivo Decreto regulamentador e demais legislações aplicáveis.

A organização do BNB como sociedade de anônima de economia mista conduz a algumas constatações. Primeiro, não é um órgão da administração direta do governo federal, mas sim da indireta. Pressupõe-se, dessa forma, que possui mais autonomia orçamentária e organizacional. Segundo, não é de todo pertencente à União, contando com aporte financeiro de diversos acionistas, embora haja a necessidade de participação da União na propriedade da maioria das ações a fim de manter o controle societário. Difere da Caixa Econômica Federal (Caixa), por exemplo, uma vez que a Caixa se organiza como empresa pública – quando o controle societário é completamente do ente estatal. Tanto a empresa pública como a sociedade de economia mista compõem a Administração Indireta dos entes federados. São regradas, em âmbito geral, pela Lei nº 13.303, de 30 de junho de 2016140.

140 Para situar o contraste de definições entre uma atividade econômica organizada sob a forma de empresa pública e outra organizada no formato de sociedade de economia mista, a Lei nº 13.303/2016 revela que “empresa pública é a entidade dotada de personalidade jurídica de direito privado, com criação autorizada por lei e com patrimônio próprio, cujo capital social é integralmente detido pela União, pelos Estados, pelo Distrito Federal ou pelos Municípios” (art. 3º). A Lei nº 13.303/2016 ainda relata que “sociedade de economia mista é a entidade dotada de personalidade jurídica de direito privado, com criação autorizada por lei, sob a forma de sociedade anônima, cujas

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Pelo exposto no estatuto social, o BNB se propõe por meio de atividades financeiras, a promover o desenvolvimento e a circulação de bens. Não é à toa que é autointitulado como banco de desenvolvimento.

O art. 159, I, c, da CF, com base no objetivo de redução das desigualdades regionais, prevê que a União deve destinar parte de recursos oriundos de arrecadação com impostos federais (imposto de renda e imposto sobre produtos industrializados) a programas de financiamento ao setor produtivo de certas regiões brasileiras. O Norte, o Nordeste e o Centro- Oeste são as regiões especificadas na CF, cujas instituições financeiras de caráter regional terão competência para gerir os recursos e repassá-los ao setor produtivo.

A Lei nº 7.827, de 27 de setembro de 1989, regulamenta o art. 159, I, c, da CF, criando fundos constitucionais de financiamento para todas as regiões especificadas. Para fins ilustração, assim é redigido o art. 1º da Lei nº 7.827/1989:

Art. 1º Ficam criados o Fundo Constitucional de Financiamento do Norte - FNO, o Fundo Constitucional de Financiamento do Nordeste - FNE e o Fundo Constitucional de Financiamento do Centro-Oeste - FCO, para fins de aplicação dos recursos de que trata a alínea c do inciso I do art. 159 da Constituição Federal, os quais se organizarão e funcionarão nos termos desta Lei.

Assim, os recursos repassados pela União ao Nordeste decorrentes de desconto na arrecadação de impostos federais constituem o Fundo Constitucional de Financiamento do Nordeste (FNE). Em outros dispositivos, a Lei nº 7.827/1989 indica que os fundos objetivam “contribuir para o desenvolvimento econômico e social das regiões”, o que seria alcançado por meio de “instituições financeiras federais de caráter regional, mediante a execução de programas de financiamento aos setores produtivos, em consonância com os respectivos planos regionais de desenvolvimento” (art. 2º). A lei também discrimina as instituições financeiras responsáveis pelos fundos. Segundo o art. 16, cabe ao BNB a administração do FNE. Daí, decorre a característica elementar do BNB como banco do desenvolvimento.

Uma vez que tem a responsabilidade de gerir o FNE, o BNB deve atender, na condução de seus ofícios em busca do desenvolvimento regional, a disposições da Lei nº 7.827/1989, tais como: possibilidade de concessão de financiamento aos setores produtivos (art. 3º, I) e

ações com direito a voto pertençam em sua maioria à União, aos Estados, ao Distrito Federal, aos Municípios ou a entidade da administração indireta” (art. 4º).

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possibilidade de financiamento de empreendimentos de infraestrutura econômica considerados prioritários para a economia (art. 4º, § 1º).

Com base nesses indicativos, portanto, o BNB prestou referido financiamento à concessionária do aeroporto de Fortaleza. A concessionária pode ter resolvido escolher contratar empréstimo junto ao BNB por dois fatores: pela capacidade de oferecer melhores taxas de juros a prazos mais facilitados do que bancos privados e pela quantidade de volumes recolhidos no FNE e que devem ser investidos no desenvolvimento do Nordeste. Prova disso é que, para 2019, há previsão de destinação de R$ 23,7 bilhões de recursos do FNE141.

A quantia de capital necessária pela concessionária também é um indicativo da necessidade do financiamento da concessão via banco público de desenvolvimento, uma vez que se encontram dificuldades em acesso ao levantamento de capital nos países em desenvolvimento, conforme indica Schapiro (2010, p. 80):

One of the main characteristics of developing countries lies in the difficulties encountered by the private financial sector to raise and provide funds for longterm investments: as a rule, their capital and credit markets are deficient and unable to provide the economy with a satisfactory volume of financing, capable of stimulating an investment pattern on par with their economic agents' necessities142.

O BNB, embora seja uma instituição financeira que se remunera com os juros dos empréstimos devolvidos, não deixa de pertencer ao setor público como integrante da Administração Indireta. Quanto ao comportamento empresarial do BNB, Barbosa (1979, p. 79) indica que “o fato de ter sido criado como uma empresa de economia mista convence, desde logo, que não lhe teria sido, como não foi, mais apropriado o comportamento estrito de firma privada – onde a maximização dos lucros, pura e simples, define os objetivos”.

Dessa forma, embora ainda conte com participação acionária de outros interessados que não o Estado – situação possibilitada pelo fato de ser sociedade de economia mista aberta –, ao Estado cabe a gerência e o direcionamento das atividades do BNB. E o Estado, via BNB, escolhe a forma de executar as políticas públicas, possuindo “como fator corretivo de sua busca

141 “Condel aprova R$ 23,7 bilhões do FNE para investimentos em 2019” Site BNB, 11 dez. 2018. Disponível em: shorturl.at/gqxOW. Acesso em: 11 dez. 2018.

142 Tradução livre: “Uma das principais características dos países em desenvolvimento reside nas dificuldades encontradas pelo setor financeiro privado para captar e fornecer fundos para investimentos de longo prazo: em regra, seus mercados de capital e crédito são deficientes e incapazes de fornecer à economia um volume satisfatório de financiamento, capaz de estimular um padrão de investimento a par das necessidades de seus agentes econômicos”.

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de lucro, a obrigação precípua de estimular o aumento de renda e do emprego na região nordestina” (BARBOSA, 1979, p. 79).

Assim, a iniciativa privada, ao tomar emprestado dinheiro do BNB para poder dar andamento às obras e ao serviço comprometidos no contrato de concessão do Aeroporto de Fortaleza, conta com recursos indiretamente públicos. Recursos tais concedidos com melhores condições do que as oferecidas por instituições financeiras puramente privadas.

O que leva a ser perceptível que, embora tenha ocorrido o afastamento do Estado do cuidado com as operações do aeroporto, o Estado indiretamente ainda atua como fomentador da atividade econômica143. É certo que o dinheiro emprestado será devolvido. Mas a atuação

fomentadora aqui disposta é revelada a partir das melhores condições de crédito que um banco estatal oferta em comparação aos bancos privados. Ou seja, a concessionária, além de contar com a presença de uma grande quantia de capital para instrumentalizar suas operações e serviços, também se beneficia com o pagamento de menos juros no decorrer do prazo.

O Estado, embora formalmente distante da administração, ainda continua, por meio de políticas públicas, parceiro do aeroporto de Fortaleza ao fornecer financiamento para a concessionária, o que, indiretamente, trará benefícios para a prestação do serviço aeroportuário na região. E o Estado assim o faz porque enxerga nessa atividade potencial para que atinja aos preceitos constitucionais de redução das desigualdades regionais, sob a forma de financiamento aplicado no setor produtivo. Financiamento este que é proposto que ocorra pela própria CF como forma de atingir o desenvolvimento regional, tanto que os recursos se originam do FNE.

O capítulo seguinte expõe dados operacionais do Aeroporto de Fortaleza e tece análises sobre como a concessão do equipamento e as políticas de incentivos fiscais e financeiros providenciaram, em alguma medida, evolução nos indicadores de atividades aeroportuárias na região, promovendo, portanto o desenvolvimento regional, principalmente a partir da maior quantidade de voos, passageiros e cargas internacionais.

143 Sobre o investimento de recursos estatais em aeroportos, Bryan (1950, p. 567): Investments in airports

through public aids seem to be justified on the basis of the indirect benefits which accrue, if it can be shown that the investment is properly planned”. Tradução livre: “Os investimentos nos aeroportos por meio de auxílios

públicos parecem ser justificados com base nos benefícios indiretos que resultam, se for demonstrado que o investimento está adequadamente planejado”.

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