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2 E-Participação

2.2 Benefícios e barreiras da e-participação

2.2.2 Barreiras

A melhoria da e-participação não é um processo simples, trazendo isso sim um conjunto alargado de desafios que só são ultrapassáveis se forem compreendidas as barreiras que impedem o seu progresso.

No que concerne às barreiras ou desafios associados à e-participação, a literatura não é muito profícua em estudos directamente focados neste ponto. Ainda assim, existem algumas excepções com base nas quais se produziu esta secção.

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No seu estudo acerca do projecto e-consensos no município da Catalunha, Prieto Martin identificou cinco tipos de barreiras à e-participação: (1) legais, (2) organizacionais, (3) políticas, (4) culturais, e (5) tecnológicas. Segundo o autor, grande parte destas barreiras são difíceis de superar, em virtude das alterações de fundo que a e-participação introduz na sociedade e nas próprias instituições políticas [Prieto Martín, 2004]. As alterações culturais são as mais difíceis de concretizar e as que mais tempo de maturação exigem, enquanto as tecnológicas parecem ser as que menos entraves colocam, pese embora mesmo estas coloquem sérios desafios [Prieto Martín, 2004].

Um outro estudo liderado por Norris, que visou fazer o primeiro levantamento de âmbito nacional acerca da e-democracia nos governos locais dos EUA, trouxe um novo contributo relativamente às barreiras na área da e-participação. O estudo identificou doze tipos de problemas, nomeadamente: (1) falta de financiamento, (2) falta de recursos a nível tecnológico, (3) actualizações a nível tecnológico, (4) procura por parte dos cidadãos, (5) procura por parte dos representantes eleitos, (6) questões de segurança, (7) preocupações com o "fosso" digital, (8) questões de privacidade, (9) especialização tecnológica, (10) preocupações com os grupos não representativos, (11) participação e (12) apoio para os representantes eleitos [Norris, 2006].

Já Wimmer sintetizou os estudos anteriormente referidos dividindo os tipos de barreiras em seis subcategorias distintas que vão de encontro às propostas dos estudos precedentes: (1) barreiras político-estratégicas, (2) barreiras organizacionais e políticas, (3) barreiras de definição de valor, (4) barreiras sociais, (5) barreiras tecnológicas, e (6) barreiras de implantação [Wimmer, 2007a]. As duas novidades introduzidas pela autora nesta categorização foram a consideração da categoria barreiras de definição de valor, directamente ligadas às dificuldades de especificação e medição de melhoria do valor esperado, e as barreiras de implantação, inerentes à pouca maturação da área e à consequente falta de orientações padronizadas e de experiência em implementações de grande escala.

Também no âmbito do projecto Demo-net [Coleman et al., 2007] foi efectuado um estudo que envolveu a revisão de vários relatórios do projecto e de vários white papers que abordavam temáticas ligadas a "desafios", "barreiras", "necessidades", ou "problemas", do qual resultou uma classificação das barreiras da e-participação em seis grandes áreas. A primeira dessas áreas é a "complexidade do campo de investigação", que aborda os problemas de um

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campo de investigação muito fragmentado e dos problemas que tal provoca no desenvolvimento de ferramentas e mesmo na integração das várias investigações que vão decorrendo. É assim apontado que a integração multidisciplinar das várias investigações no campo da e-participação é o grande desafio, e isso está directamente ligado à proficuidade do diálogo entre investigadores e outros actores, e à capacidade de reutilizar trabalho. A segunda área é "métodos de investigação", onde as deficiências existentes ao nível das metodologias de investigação utilizadas nos projectos são apontadas como o principal "handicap". A terceira área é designada por "sistema de informação e gestão de informação". Neste caso, aspectos como a importância da acessibilidade à internet, da necessidade de uma concepção sócio-técnica inclusiva e do design das ferramentas de e-participação, são apontados como relevantes para a aceitação do utilizador e, consequentemente, para o sucesso ou fracasso de aplicações na e-participação. Por sua vez, a quarta área, intitulada "Instituições e Partes interessadas" aponta para preocupações institucionais e políticas de resistência ao uso, retardando a introdução de projectos como resposta a pedidos de alargamento da e-participação por parte dos cidadãos. Para além disso, é ainda dada ênfase à problemática da partilha do poder e da perda de importância dos políticos e das instituições perante os cidadãos como factores inibidores de um maior avanço na e-participação. A quinta área denominada "Equidade: técnica, comunicativa, cultural e multi-lingue" descreve um conjunto de problemas, desafios e necessidades que resultam de uma multiplicidade de camadas assimétricas de informações técnicas, políticas, cívicas, culturais, sociais, económicas e cognitivas, e da forma como estas barreiras limitam o acesso à e-participação. Por fim, a sexta área é a de "Teoria", que engloba várias lacunas ao nível conceptual e explicativo que são relevantes para a investigação na área da e-participação. Aqui é evidenciada a necessidade premente de uma discussão de carácter geral relativa aos benefícios da participação no contexto da teoria democrática e, mais concretamente, da relação entre os cidadãos e os órgãos do poder. A grande diferença deste estudo para os restantes é que assume que os vários tipos de barreiras se podem sobrepor em determinados pontos, em contraste com a aparente mutua exclusividade que caracterizava as propostas anteriores.

Em forma de síntese, apresenta-se na Tabela 2 os vários tipos de barreiras encontrados na literatura.

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Tabela 2 - Principais tipos de barreiras da e-participação Principais

Barreiras Descrição

Barreiras político-estratégicas

Falta de confiança dos cidadãos nas instituições políticas;

Falta de confiança que as contribuições dos cidadãos sejam realmente utilizadas na formulação das políticas;

Ausência de um compromisso explícito por parte dos políticos e administração pública de interagirem com os cidadãos através das TIC;

Falta de vontade ao nível político para alterar os processos da democracia representativa, de forma a tomar em conta mais facilmente os contributos da participação cidadã;

Percepção da perda de poder por parte dos políticos e instituições, com a instauração de processos mais abertos à participação.

Barreiras organizacionais e

jurídicas

Dificuldades em mudar a estrutura de decisão nas instituições governamentais de forma a englobar os meios electrónicos;

Limitações na cooperação institucional e carência tanto ao nível de habilidades como de recursos;

Restrições levantadas pelo quadro legal vigente na maioria dos países, que está mal enquadrado para acomodar a e-participação.

Barreiras de definição de valor

Dificuldades em definir o papel da e-participação na criação de valor ao nível da governação (económica, social, ambiental, ...), e de definir áreas prioritárias;

Dificuldade de especificação e medição de melhoria do valor esperado;

Ausência de modelos (por ex: modelos de negócio ou cadeias de valor), que estejam por de trás das iniciativas de e-participação.

Barreiras sociais

Diferentes atitudes, padrões culturais, situações económicas, políticas e sociais dificultam o engajamento entre os cidadãos;

O acesso à alfabetização tecnológica e à tecnologia é desigual; Falta de compromisso político entre os jovens;

Aceitação dos utilizadores determina por norma o sucesso ou insucesso de uma implementação de e-participação;

Preocupações com grupos não representativos.

Barreiras tecnológicas

Problemas ao nível da infra-estrutura (por ex: acesso à internet); Falta de experiencia no design das ferramentas;

Insuficiências ao nível do desenvolvimento das tecnologias chave (problemas de escalabilidade para altos volumes de participação e recuperação);

Problemas de segurança e privacidade;

Falta de recursos humanos com competências tecnológicas; Actualizações tecnológicas;

Especialização tecnológica. Barreiras de

implantação

Campo de investigação fragmentado;

Troca de conhecimentos entre a pesquisa e a prática insuficiente e incipiente;

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em implementações de grande escala.

Barreiras de cariz económico-financeiro

Falta de financiamento;

Adiamento ou mesmo cessação da aposta em projectos de e-participação em virtude da definição de prioridades em contexto de crise económica (por ex: pelo aproveitamento de tecnologias já existentes que tragam menos custos mas que por norma não estão completamente vocacionadas para o suporte da e-participação).

Barreiras teóricas e metodológicas

Existência de várias lacunas conceptuais e explicativas relevantes para a investigação da e-participação;

Ausência de discussões de âmbito alargado acerca da importância da participação no contexto da teoria democrática;

Deficiências metodológicas na investigação;

Investigação tende invariavelmente a incidir sobre as instituições públicas e a desprezar o potencial de formas de participação espontânea (por ex: através da internet).

Embora a base para a elaboração da tabela assente no resultado proposto por Wimmer [Wimmer, 2007a], procurou-se englobar em cada uma das áreas definidas por esta autora, os contributos dos outros estudos, tendo sido criadas novas áreas para classificar barreiras que não se enquadrassem em nenhuma das áreas já definidas.

2.3 Caracterização da área da e-participação