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Bhagwan, porque você não tem barba?

Quando Wakuan viu um retrato de Bodhidharma barbudo,

comentou: Por que esse sujeito tem barba?

Bhagwan, porque você não tem barba?

tradição Zen é realmente muito bonita. Bodhidharma tinha barba e o discípulo perguntou: Por que este homem não tem barba?

É uma bela pergunta, mas só um discípulo zen pode fazê-la — pois a barba pertence ao corpo, não a Bodhidharma. Ele era imberbe, porque o corpo é apenas uma morada.

Aparentemente a pergunta é absurda, mas muito significativa. E perguntas assim têm sido feitas muitas vezes.

Buda falava sem parar — de manhã, à tarde e à noite, numa aldeia e em outra, andando sempre; falou sem parar durante quarenta anos. Um dia, Sariputta perguntou-lhe: Por que permanece em silêncio? Porque não fala conosco? Patentemente absurdo! Buda riu e disse: Você está certo.

E o homem estava falando — ninguém falou tanto quanto Buda. Mas Sariputta estava certo, porque a fala só acontecia na superfície e Buda permanecia em silêncio.

Um monge Zen, Rinzai, costumava dizer: Este homem, Buda, nunca nasceu, ele nunca andou sobre a terra, nunca morreu — ele é apenas um sonho. Mas ia diariamente ao templo ajoelhar-se diante da estátua de Buda!

Então alguém lhe disse: Rinzai, você está louco! Diariamente você continua insistindo em que esse homem nunca nasceu, nunca morreu e nunca andou sobre a terra, e mesmo assim vai ao templo e ajoelha-se diante de sua estátua.

Rinzai disse: Por ele nunca ter nascido, nunca ter andado sobre a terra e nunca ter morrido, é que eu me ajoelho.

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A pessoa insistiu, dizendo: Não podemos segui-lo. Ou você está louco ou nós estamos, mas não podemos entender — o que você quer dizer?

E Rinzai disse: O nascimento desse homem foi apenas um sonho para ele. Caminhar sobre a Terra foi apenas um sonho para ele. Morrer não foi real para ele — foi só o fim de um longo sonho. E esse homem, o centro de seu ser, permaneceu além do nascimento e da morte.

Conta-se que Buda sempre se manteve no sétimo céu. Nunca desceu dele — apenas seu reflexo esteve aqui. E isto é verdade! E também é verdade no que diz respeito a você. Você nunca desceu — é apenas o seu reflexo. Mas você se tornou tão identificado com o seu reflexo que já se esqueceu. Você pensa que desceu. Mas você não pode descer —não há possibilidade de cair do seu ser.

Quando você olha na superfície de um rio, vê o seu reflexo. E torna-se tão identificado com ele que é capaz pensar que você está dentro d'agua. E sofrer por isso; sentir-se sufocado, sentir que pode morrer. Mas você está nunca saiu da margem do rio, nunca entrou na água — você não pode!

Por isso digo a você: Não só Buda, ninguém jamais desceu do sétimo céu. Mas as pessoas ficam obcecadas, identificadas com seus reflexos. A isto os hindus chamam de o mundo de Maya —o mundo dos reflexos. Nós permanecemos em Brahma — permanecemos na realidade suprema — estamos eternamente enraizados nela. Ninguém jamais desce. Mas podemos nos identificar com o reflexo, com o sonho.

Por isso você está certo em me perguntar. Este sujeito também não tem barba. Se você olhar para o meu corpo, não estará olhando para mim. Se você olhar para mim, então entenderá.

A barba não pode crescer por conta própria. Ela só pode crescer no corpo. E esta barba é realmente muito simbólica: a alma está viva, o corpo está meio-morto e meio-vivo, e a barba está quase morta. Os cabelos são a parte morta do corpo. É por isso que você pode cortá-los sem sentir nenhuma dor. Se cortar os dedos, você sentirá dor. Se cortar os cabelos, não sentirá dor alguma. São células mortas do corpo.

Às vezes acontece que nos cemitérios... se você vai a um cemitério muçulmano e desenterra um corpo, mesmo que o homem tenha morrido

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sem barba, agora ele terá... As barbas crescem até em corpos mortos, porque estão mortas, são apenas células mortas.

É bom deixar a barba crescer, quando você estiver diante de um espelho poderá ver todas as suas três camadas: o está completamente morto, o meio-morto, meio-vivo, e o absolutamente vivo.

A barba é material, é matéria. O corpo é o encontro da matéria com o espírito. O encontro é sempre difícil, e o corpo é apenas o ponto onde ambos se encontram. Quando eles se afastam, o equilíbrio é perdido, você está morto — a matéria é reabsorvida pela matéria e o espírito é reabsorvido pelo espírito.

Este sujeito também não tem barba.

Então, esta é a questão: Por que Bodhidharma não é matéria? E a resposta é: porque o Espírito não pode ser matéria.

Mas os discípulos Zen perguntam de uma maneira peculiar. Em nenhum outro lugar fazem-se perguntas assim. Não se pode perguntar a um papa cristão: Por que esse sujeito, Jesus, não tem barba? A própria questão será considerada profana: Não se pode ter tanta intimidade com Jesus. Não se pode chamá-lo de "esse sujeito" ou "esse camarada"; não é considerado sagrado, seu comportamento será insultante. Mas não é assim entre os Zen. Eles dizem: Se você ama seu Mestre, pode rir-se dele, se você o ama, não deve haver temor, nem mesmo o temor que se tem por quem é sagrado. Se você o ama, o medo desaparece.

Por isso, quando pela primeira vez os teólogos cristãos tomaram conhecimento da tradição Zen, não podiam acreditar que uma religião pudesse existir, porque os monges Zen estão sempre rindo de Buda. Às vezes usam cada palavras que você não pode acreditar! Eles podiam dizer para Buda: Esse sujeito estúpido! E se você lhes perguntar por que, eles dirão: Sim, ele era um estúpido — porque tentava dizer algo que não pode ser dito e tentava nos transformar, o que também é impossível. Era um estúpido — estava tentando fazer o impossível!

Os Mestres zen usam termos e palavras que nenhuma outra religião usa. E por isso eu digo que nenhuma outra religião é tão religiosa quanto o Zen. O que é que se tem a temer quando se ama realmente? Você pode brincar, pode rir, e um homem iluminado como Buda rirá junto com você — não há nenhum problema. Não se sentirá ferido. E se sentir-se ferido, não será absolutamente iluminado. Nuca

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dirá: Não use essa linguagem profana — pois para Buda todas as linguagens são profanas, só o silêncio é sagrado. Portanto, se você disser que ele é um sujeito estúpido ou alguém que despertou, para ele será a mesma coisa.

A linguagem em si, é profana. Somente o silêncio é sagrado. Por isso, qualquer coisa que você diga, dá no mesmo.