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Você nos tem falado a respeito da rendição total ao Mestre, mas com frequência nossas mentes nos mostram mil razões para que

não sigamos as instruções literalmente. Dizemos coisas assim: o Mestre não pode saber que a situação mudou; ou então, o Mestre não compreende que as situações práticas no Ocidente são outras.

Devemos seguir tudo o que o Mestre diz ao pé da letra, ou existem momentos em que devemos usar nosso próprio discernimento?

ocê deve seguir absolutamente, ou não seguir de modo algum. Não assuma nenhum compromisso, porque qualquer coisa pela metade não só é inútil como prejudicial. Qualquer coisa pela metade o divide — e isso não é bom. Você deve continuar a ser uma unidade indivisível.

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Portanto, ou renda-se totalmente... e então não haverá necessidade de pensar nada a respeito; pois estará seguindo cegamente. Enfatizo a palavra cegamente — como se você não tivesse olhos, alguém que os tem o estará guiando. Você permanecerá então uma unidade indivisível. E, integrado, não dividido, você crescerá.

Ou, se você sentir que isto é impossível e que não pode ser feito, então não siga de modo algum. Neste caso, siga a si mesma completamente — e da mesma maneira permanecerá não dividido.

A meta, o objetivo é permanecer integrado. E ambos os caminhos funcionam, o resultado final será o mesmo. Se você puder ficar só, sem um Mestre, se você puder seguir sua própria consciência, onde for que ela o conduza, será a mesma coisa, o resultado será o mesmo. Portanto, depende de você.

Mas a mente sempre diz: Faça as duas coisas. Diz: Siga o Mestre, mas não deixe de pensar — Siga somente aquilo que você achar certo. Assim, o que você estará seguindo? Onde estará a rendição?

Se o juiz é você, e é você quem decide o que deve e o que não deve seguir, onde está a rendição? Onde está a confiança? Neste caso, é melhor seguir a sua própria consciência. Mas não se engane — Pelo menos não deixe que haja engano algum. Do contrário, você continuará seguindo a si mesmo e pensará que está seguindo um Mestre.

Se o fator de decisão é você, se a escolha é sua, se você aceita algumas coisas e rejeita outras, então você está seguindo a si mesmo. Mas pode criar a impressão e enganar a si mesmo que está seguindo um Mestre. Isso não dará em nada. Você não crescerá, porque não pode haver crescimento através do engano,.

E acabará ficando cada vez mais confuso, pois se você decidir o que deve e o que não deve ser feito, se tiver que escolher dentre as orientações de seu Mestre, criará um caos. Seja onde for que seu Mestre o guie, suas orientações são uma unidade orgânica. Cada instrução está relacionada à outra. São um todo compacto. Você não pode descartar umas e seguir outras; porque acabará se transformando num desastre, numa ruína. Mesmo que uma única coisa seja negada, todo o resto será perturbado. Você não sabe o quanto as coisas estão interligadas.

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Portanto, a minha sugestão é esta: Permaneça uma unidade indivisível. Decida. Se é você quem decide, então decida: seguirei a mim mesmo — e então não se renda. Não há necessidade!

Isto é o que Krishnamurti está constantemente dizendo há quarenta, ou cinqüenta anos: Não siga. As pessoas podem chegar sem terem que seguir alguém, mas o caminho será árduo e muito longo, porque então você não estará pronto para aceitar qualquer ajuda que lhe possa ser dado; nenhuma orientação — a qual é possível, a qual pode evitar muitas dificuldades desnecessárias pelo caminho.

Isto é o que Krishnamurti está dizendo e que ninguém tem feito. Este é o problema da mente. Ela pode aceitar isto: Não siga — não porque tenha entendido, mas porque satisfaz muito ao ego não seguir ninguém. Ninguém quer seguir o outro. No fundo, o ego resiste.

Por isso todos os egoístas se reuniram em torno de Krishnamurti. Estão novamente se enganando. Pensam que não estão seguindo ninguém, porque entenderam o quanto é enganoso seguir, entenderam que o caminho deve ser trilhado solitariamente, entenderam que nenhuma ajuda é possível, que ninguém pode ajudá-lo, ninguém pode guiá-lo. Você tem que seguir sozinho. Eles pensam que entenderam isto, é por isso que não estão seguindo ninguém. Mas a verdade não é essa, eles estão se enganando. Não estão seguindo porque seus egos não permitem.

Mas ainda continuam ouvindo Krishnamurti. Estão juntos há anos e continuam indo lá. Se nenhuma ajuda é possível, por que você continua vendo Krishnamurti? Se ninguém pode guiá-lo, por que continua ouvindo o que ele diz? Isso não faz sentido.

E até mesmo essa atitude, de ter que caminhar sozinho, não é descoberta feita por você — ela lhe foi revelada a por Krishnamurti. No fundo ele tornou-se o seu Mestre e você continua dizendo que não segue ninguém. Isso é um engano.

O mesmo engano pode acontecer do lado inverso. Você vem a mim e pensa que se rendeu. Mas ainda está escolhendo. Se digo algo que lhe serve — isto é, que serve ao seu ego — você segue. Se digo algo que não serve ao seu ego, você começa a racionalizar: Isso não é para mim. Você pensa que se rendeu, mas isso não aconteceu.

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As pessoas que estão com Krishnamurti pensam que não estão seguindo ninguém, mas estão. Vocês que estão aqui pensam que estão me seguindo, mas não estão. A mente é sempre enganadora. Onde quer que você vá, ela poderá enganá-lo — portanto, esteja alerta.

Pare!

u lhe digo: Pode se chegar sem seguir — mas o caminho será muito, muito solitário e muito longo. Tem que ser. Mas pode-se chegar. Não é impossível — alguns chegaram. Eu mesmo cheguei pelo não seguir. Você também pode. Mas lembre-se que não seguir não deve tornar-se uma satisfação do ego — ou então você não chegará nunca.

Ter um Mestre ou não ter um Mestre não é o ponto básico. O ponto básico é o ego, o seu ego. Sem ego, mesmo sem um Mestre, você pode chegar. Com o ego, nem mesmo Buda pode levá-lo. Siga totalmente ou não siga de modo algum, mas seja total. É você quem decide.

Não se deixe enganar pela mente e olhe fundo dentro de você. Tenha consciência do que está fazendo. Se está se rendendo, então renda- se.

Lembro-me de que isto aconteceu certa vez com um grupo na vida de Gurdjieff. Ele trabalhava com alguns discípulos. Era preciso que houvesse rendição absoluta e Gurdjieff instruiu-os de que teriam que seguir tudo o que fosse dito. Ele estava ajudando-os a praticar um determinado exercício, ao qual costumava chamar de "exercício pare". Sempre que dissesse: "Pare!", os discípulos teriam que parar o que estivesse fazendo.

Se você estivesse caminhando, com um pé apenas levantado do chão, e ele dissesse: Pare! , você tinha que parar por ali. Se estivesse conversando e a boca estivesse aberta, e ele dissesse: Pare! , você tinha que parar com a boca aberta. Não podia mudar nada, não foi podia buscar uma postura mais conveniente — pois isso seria um engano. E você não estaria enganando ninguém além de si mesmo.

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Um dia de manhã, quando essas pessoas faziam exercício no campo, algumas estavam atravessando um canal quando de repente ele disse: Pare! — e ele estava dentro de uma barraca — as pessoas pararam. Eram quatro. O canal estava seco, não havia água correndo e elas pararam. Mas, de repente, alguém abriu as comportas e a água começou a chegar.

Os quatro começaram a pensar: O que fazer? — Gurdjieff estava dentro da barraca e não sabia que eles estavam no meio do canal, que agora estava começando a se encher de água. Mas esperaram, porque a mente pode esperar por um pouco.

Quando a água chegou pelo pescoço, um deles saltou para fora. Disse: Isto é demais. Gurdjieff não está sabendo. O canal foi enchendo mais. Outros dois saltaram quando a água chegou apenas pelo nariz, porque agora eles poderiam se afogar. E a racionalização era simples e fácil. Você teria feito a mesma coisa — porque eles iam morrer e o Mestre estava dentro da barraca sem saber o que estava acontecendo!

Apenas um permaneceu. A água corria sobre sua cabeça e ele continuava parado. Então Gurdjieff saiu correndo da sua tenda e o tirou do canal — ele estava quase inconsciente. Tiveram que tirar água de dentro do seu corpo. Estava a ponto de morrer. Mas quando abriu os olhos era um outro homem. O velho havia realmente morrido. Aconteceu uma transformação. Ele estava totalmente diferente.

O que aconteceu naquele momento de morte? O discípulo aceitou o Mestre. Rejeitou sua própria mente e suas racionalizações. Rejeitou a sua própria vida. Rejeitou a sua mais profunda necessidade biológica de viver. Rejeitou tudo. Ele disse: Quando o mestre falou Pare!, eu parei. Nada mais podia me mover.

Deve ter sido muito, muito difícil — quase impossível. Mas quando você faz o impossível, é transformado. Morrendo, ele não permitiu que a mente interferisse. A morte estava presente e ele a aceitou — ao invés de aceitar a sua própria mente e seus julgamentos.

Ele nunca mais voltou a ser o mesmo. Ninguém mais encontrou o velho homem. E então os outros compreenderam que haviam perdido uma grande oportunidade. Os outros três que estavam juntos no canal perderam uma grande oportunidade.

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Isto é rendição total. Não é uma questão de ser atraente ou não à sua mente, dela dizer sim ou não. Quando você se rende, rende também todas as possibilidades de dizer não. Seja qual for a situação, você não diz não. Rendição é o sim total. É difícil! Eis porque a transformação é tão difícil. Não é fácil. Eis porque o nascimento espiritual não é fácil.

Mas não digo que você não possa alcançar sozinho. Você pode alcançar sozinho, pode chegar com um mestre; pode chegar com um grupo ou chegar individualmente. Todas as possibilidades estão abertas. Eu não sou a favor disto ou daquilo. É você quem deve decidir, mas decida sem se enganar.