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Você disse que o ego pode cair de um momento para o outro O ego pode ser abandonado progressivamente também?

queda sempre acontece num só momento, e sempre neste momento. Para ela não há progressão nem processo gradual. Não pode haver. O acontecimento é momentâneo.

Você não pode se aprontar para ele, não pode se preparar, porque qualquer coisa que faça — e eu digo qualquer coisa — fortalecerá o ego.

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Qualquer processo gradual será um esforço, alguma coisa feita por você. Assim, você será fortalecido cada vez mais por ele. Tornar-se-á mais forte. Todas as coisas auxiliam o ego.

Apenas algo absolutamente não-gradual, algo como um salto, não como um processo, algo descontínuo com o passado, e não em continuidade a ele — faz o ego cair.

O problema surge porque não podemos compreender o que este ego é.

O ego é o passado, a continuidade, tudo o que você fez, tudo o que acumulou, todos os karmas, todos os condicionamentos, todos os desejos, todos os sonhos do passado. Todo esse passado é o ego. E se você pensar em termos de processo gradual, trará o passado junto.

A queda não é gradual, é repentina. É uma descontinuidade — o passado não existe mais, o futuro também não. Você é deixado sozinho aqui e agora. Então, o ego não pode existir.

O ego só pode existir através da memória: quem é você, de onde veio, a família, a tradição, e todas as mágoas, feridas, prazeres — tudo o que aconteceu no passado. Tudo o que aconteceu é o ego. E você é aquele para quem tudo isso aconteceu.

Esta distinção tem de ser compreendida: você é aquele para quem tudo aconteceu, e o ego é o que aconteceu. O ego está ao seu redor. E você está no centro, sem ego.

Uma criança nasce completamente nova e virgem — sem passado, sem ego. Eis porque as crianças são tão belas. Elas não têm nenhum passado. São novas e virgens. Não podem dizer 'eu', porque de onde trarão o eu? O eu tem de desenvolver-se gradualmente. As crianças serão educadas, recompensadas, punidas, serão apreciadas, condenadas — e o eu virá.

A criança é bela porque não tem ego. Um homem velho fica feio, não por causa da velhice, mas porque tem muito passado, ego demais. Um homem velho também pode tornar-se belo novamente, e até mais bonito do que uma criança, se conseguir abandonar o ego. Então terá uma segunda infância, um renascimento.

Este é o significado da ressurreição de Jesus. Não é um fato histórico, é uma parábola. Jesus é crucificado e ressuscita. O homem que foi crucificado não existe mais — aquele era Jesus, o filho do carpinteiro.

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Agora, Jesus está morto, crucificado. Uma nova entidade surge a partir desse momento. A partir dessa morte, uma nova vida nasce. Este é o Cristo — não o filho de um certo carpinteiro de Belém, não o judeu, não o homem. Este é Cristo — algo novo, sem ego.

E o mesmo acontecerá a você quando seu ego for crucificado. Quando seu ego for crucificado, haverá uma ressurreição, um renascimento. Você renascerá. E esta infância será eterna, porque este é um renascimento do espírito, não do corpo.

Depois disso, nunca mais será velho. Será sempre e sempre novo, virgem — tão virgem quanto a gota de orvalho da manhã, tão virgem quanto a primeira estrela da noite. Permanecerá sempre virgem, novo, uma criança inocente — porque esta será uma ressurreição do espírito.

Isto sempre acontece num só momento.

Ego é tempo — quanto mais tempo, mais ego. O ego necessita de tempo. Se você penetrar profundamente nisto poderá ser até capaz de perceber que o tempo existe apenas por causa do ego.

O tempo não faz parte do mundo físico ao seu redor, faz parte do seu mundo psíquico, do mundo-mente. O tempo existe apenas como um espaço para o ego desenvolver-se e crescer. Espaço é necessário — e o tempo dá espaço. Se alguém lhe disser que este é o último momento da sua vida, que no próximo momento receberá um tiro mortal, de repente, o tempo desaparecerá. Você se sentirá inquieto. Ainda estará vivo, mas, de repente, sentirá como se estivesse morrendo. E não poderá pensar no que fazer. Até pensar será difícil, porque até para pensar o tempo é necessário, o futuro é necessário.

O amanhã não existirá, assim, sobre onde pensar, como desejar, como esperar? Não haverá tempo. O tempo terá acabado.

A maior agonia que um homem pode sentir acontece quando sua morte é fixada e ele não pode impedi-la; ela é certa. Alguém sentenciado, aprisionado, esperando pela morte, não pode fazer nada — a morte está fixada, após um determinado período ele morrerá. Além desse tempo, não haverá nenhum amanhã para ele. Assim, não pode desejar, não pode pensar, não pode planejar, não pode nem sonhar. A barreira está sempre lá.

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Muita agonia acontece. Essa agonia é pelo ego, porque o ego não pode existir sem o tempo. O ego respira tempo. O tempo é a respiração do ego. Portanto, quanto mais tempo, mais possibilidade para o ego.

No Oriente, muito tem sido elaborado, muito tem sido feito para a compreensão do que é o ego, muitas investigações têm sido feitas. E um dos achados foi que, a não ser que o tempo desapareça para você, o ego não cairá.

Se o amanhã existir, o ego existirá. Se não houver amanhã, como você poderá vestir o ego? Será exatamente como remar numa canoa fora do rio. Será pesado. Um rio é necessário para que a canoa possa funcionar.

O rio do tempo é necessário para o ego. Eis porque o ego sempre pensa em termos de graduação, em termos de degraus. O ego diz: Está bem, a iluminação é possível — mas é necessário tempo porque você terá de trabalhar, de preparar-se, de estar pronto.

E isto é uma coisa lógica! Para tudo é necessário tempo. Quando você planta uma semente, tempo é necessário para que a árvore cresça. Para uma criança nascer, para ser criada, tempo é necessário. O útero precisa de tempo. A criança tem de crescer. Tudo cresce ao seu redor. E, para crescer, o tempo é necessário. Assim, parece lógico que o crescimento espiritual precise de tempo também.

Contudo, este é o ponto a ser compreendido: o crescimento espiritual não é, na realidade, igual ao de uma semente. A semente tem de crescer para tornar-se uma árvore. Entre a semente e a árvore, existe um intervalo. Este intervalo tem de ser percorrido, há uma distância. Mas você não cresce como uma semente. Você já é o crescimento. Basta uma revelação. Não existe nenhuma distância entre o que você é e o que será. Não existe nenhuma distância! O ideal, o perfeito, já está aí.

Portanto, esta não é, de fato, uma questão de crescimento, mas apenas de revelação. É uma descoberta. Algo está oculto — você afasta a cortina, a aí está. É como se você estivesse sentado com os olhos fechados, o sol está lá no horizonte, mas você está no escuro. De repente, abre os olhos e é dia, há luz.

O crescimento espiritual não é um crescimento de fato. A palavra é errônea. O crescimento espiritual é uma revelação. Algo que estava oculto torna-se visível. Algo que já existia é percebido, está aí. Algo que

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você nunca perdeu, simplesmente esqueceu, é lembrado. Eis porque os místicos continuam usando a palavra 'recordação'. Eles dizem que o divino não é um achado, é simplesmente uma recordação. Algo que estava esquecido é lembrado.

Na realidade, nenhum tempo é necessário. Mas a mente diz, o ego diz que para tudo é necessário tempo, que para crescer o tempo é necessário. Mas se você se tornar uma vítima desse pensamento lógico, nunca chegará. Continuará adiando. Dirá amanhã, amanhã, sempre amanhã. E nunca chegará, porque o amanhã nunca vem.