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6 ANÁLISE DE DADOS: O ETHOS NOS BLOGS

B) Limparei minha casinha ou apartamentinho ou kitinet, como você quiser e ninguém vai sujar e desvalorizar meus serviços; já que eu tenho

07. Fazer pacote com bolo e brigadeiro para entregar na

6.2.5 O Blog da Naneh

A imagem a seguir mostra a capa do blog da Naneh, uma jovem universitária que mora no Rio de Janeiro e que escreve um blog para compartilhar alegrias e tristezas com seus amigos. Vale ressaltar que tal imagem reflete a capa do blog que possui as postagens mais recentes, uma vez que as mais antigas são armazenadas em links, organizados em ordem cronológica.

Figura 16: Capa do blog da Naneh

No campo do ethos pré-discursivo, pode-se dizer que o blog da Naneh, à primeira vista, apresenta-se com uma cenografia com elementos sóbrios, sendo um blog simples, sem muitos ícones semióticos, como emoticons, mas com fotos da enunciadora e também de seus

amigos. Quando se entra em contato com tal blog, tem-se a imagem de uma fiadora mais amadurecida e não de uma adolescente. A foto da enunciadora, postada no blog, dirige a construção de uma imagem pré-discursiva e da imagem da fiadora, uma vez que os atributos físicos, revestidos na corporalidade da enunciadora, são observados, a partir dos parâmetros apontados pela foto e não são completamente livres, como no caso dos textos escritos que não possuem fotos dos enunciadores. Trata-se de um blog que pretende ser o espaço no qual a escrevente expõe suas idéias, sem, no entanto, escancarar sua intimidade.

No campo discursivo, há a manutenção da idéia inicial postulada pelo ethos pré- discursivo (que postula a imagem de uma garota madura), visto que tal imagem é ratificada quando as postagens do blog mostram a figura de uma estudante pré-universitária, que demonstra uma preocupação com o uso da linguagem mais formal, refuta o uso do internetês e o uso de muitos ícones semióticos, revelando, em seus posts, como ocorreu em outros blogs já analisados, questões que levam à reflexão sobre a vida, conforme se pode observar no exemplo a seguir:

Exemplo 38:

01 Pois bem falarei do que quero, são tantos conflitos que passamos, coisas bobas, coisas não tão bobas, prometi que não faria mais pergunta alguma e mesmo que, como ontem, meus dedos e língua cocem, vou cumprir

Algo que chama a atenção, inicialmente, na análise desse blog é a frase de chamada, estampada logo na página principal do mesmo, que diz: “isso aqui é meu, de quem eu quero q leia e do meu público imaginário que tem passagem livre.”

Nessa frase de chamada, a blogueira indica o grupo particular para o qual dirige seu discurso: ela pretende que o blog seja lido por algumas pessoas (“quem ela quer que leia”) e também pelo que chama de “público imaginário”, que é composto por pessoas conhecidas, por amigos dos amigos etc., para os quais as mensagens do blog serão dirigidas.

Naneh é uma garota muito religiosa. Em alguns posts do seu blog, há referência à igreja da qual faz parte. Ela fala das missas, dos encontros e retiros espirituais dos quais participa, juntamente com o grupo de jovens ao qual pertence.

Assim sendo, nesse blog, pode-se ver que, além do estereótipo da estudante universitária, há outro estereótipo que regulará as expectativas dos co-enunciadores em relação ao discurso da escrevente, no que diz respeito à criação de uma imagem de si: o de uma garota religiosa. O estereótipo que circula, socialmente, sobre as pessoas religiosas

postula a idéia de que as mesmas devem seguir determinadas normas e regras, para que sejam assim reconhecidas. Portanto, uma garota religiosa deve se comportar em concordância com a doutrina de sua religião, seguindo as normas e as leis de sua Igreja. A escrevente é católica e pratica o catolicismo assiduamente. Esse fato cria uma expectativa nos leitores de seu blog e é nesse ponto que repousa o funcionamento da construção do ethos discursivo: o estereótipo dirige a formação de uma auto-imagem, através da relação entre o ethos dito e mostrado.

Exemplo 39:

Postado em 16 de março de 2008

Missa de Ramos

01 Acordei completamente morgada e obviamente me atrasei para missa,

mas foi bem pouquinho, a celebração foi incrivel, encontrei as meninas [Nany e Ju] apertei, abraçei só não me despedi porque não as vi indo embora [=/]...

Exemplo 40:

Postado em 14 de novembro de 2008

01 Retiro, ontem foi um dia ruim, pelo menos consigi chegar a tempo da

Adoração, que estava precisando muito! Foi tudo complicado em relaçãoao

retiro, na verdade está sendo, queria passar no mercado ainda, masacho q vou levar dinheiro mesmo, sem condição de levar compras...

Os posts que citam eventos religiosos dos quais a escrevente participou mostram que esses são, para ela, mais do que um momento para expressar a fé em Deus, pois são momentos para compartilhar amizades e encontrar o próprio grupo de jovens que freqüenta a mesma Igreja. Há aí um momento de conflito entre o pré-construído, instaurado no estereótipo, e aquilo que se manifesta, concretamente, no discurso, contradizendo, em alguns aspectos, o estereótipo da garota religiosa, uma vez que tal estereótipo postula a idéia pré- concebida de que religião não combina com encontros festivos. Essa contradição está ainda melhor explicitada no exemplo a seguir:

Exemplo 41:

Postado em 10 de março de 2008

01 (...) voltando a festa, comida, risadas, algumas boas músicas, depois galerão

na praça tomandogelada [2º dia bebendo as custas dos outros, tsc tsc,...]

O post anterior mostra que a escrevente possui um grupo de amigos, com o qual compartilha festas, músicas e bebida. Esse fato vai de encontro ao estereótipo da garota

religiosa, representando uma contradição entre o ethos pré-discursivo e o discursivo. Os leitores do blog que conhecem a enunciadora esperam ler coisas ditas sob a voz de uma garota religiosa, cujo estereótipo se distancia do gosto por festas. Os que não a conhecem, mas lêem, no seu blog, os posts sobre a Igreja e as festas religiosas das quais participa, terminam por criar também a mesma expectativa.

Exemplo 42:

Postado em15 de março de 2008

01 [...] é impressionante como até emcoisa de igreja temos que aturar cantadas: "Colega isso tudo é seu oumaribondo te mordeu?" admito essa me fez rir,

No trecho do post do dia 15 de março de 2008, a escrevente afirma: “é impressionante como até em coisa de igreja temos que aturar cantadas”. O seu discurso mobiliza elementos da memória discursiva dos co-enunciadores, nos quais se destacam o que, legitimamente, pode ocorrer dentro de uma igreja. Neste caso, a cena de fala pressupõe a existência de determinadas características que se ligam à Igreja e aos religiosos: celebração de missa, de ritos religiosos em geral etc. Cantadas não fazem parte do mundo ético dos religiosos e, se colocando na posição de uma garota religiosa que compartilha dos dogmas e das regras comportamentais da igreja, a escrevente estranha que tenha recebido uma cantada na Igreja.

Entretanto, como se vê no post anterior, a escrevente não se furta a construir uma imagem de si, tendo em vista a representação de um comportamento comum à maioria dos estudantes universitários, ou seja, comida, risada, músicas e bebida fazem parte do ethos dito e se refletem no ethos mostrado, a partir da representação da imagem da escrevente, materializados na maneira de se vestir e de se apresentar, fisicamente, perante seus amigos.

No post a seguir, no exemplo 43, a escrevente revela-se triste e amargurada, mas não compartilha com seus co-enunciadores o motivo de tal tristeza. A figura de uma fiadora, marcada pela decepção e angústia, desenha-se neste post, que é recheado de enunciados, indicando a existência de coisas que não podem ser reveladas no post, nem no blog da escrevente, como se vê nos enunciados: “[...] o sonho acabou e com ele a minha crença na minha própria capacidade, [...] dentro de mim as coisas poucam mudaram e eu não sei quanto tempo vou demorar para me recuperar por completo, [...] só queria que as coisas fossem menos doídas, [...]”.

No final do post, há um enunciado que evidencia a preocupação da escrevente com a sua imagem de estudante universitária: “[desculpem os erros ortográficos, e as repetições,

minha cabeça não está boa]”. Percebe-se aí a influência do estereótipo da estudante universitária que, para ser reconhecida como tal, precisa dominar a língua padrão.

Exemplo 43:

Postado em 11 de março de 2008 01

05

10

Ontem não estava em condição de escrever nada, o dia esperançoso se transformou num dos mais fatídicos dias que eu poderia ter tido, o sonho acabou e com ele a minha crença na minha própria capacidade, eu me transformei em um mar de tristezas e consegui emitir alguns poucos sorrisos apenas a noite, o que na verdade é um grande disfarce porque dentro de mim as coisas poucam mudaram e eu não sei quanto tempo vou demorar para me recuperar por completo, mas o mundo não para e eu preciso tirar forças de algum lugar, afinal sempre fui guerreira, e agora preciso mais do que nunca disso. A minha vida prossegue embora eu não saiba o que fazer daqui pra frente, quem sabe um dia eu descubro...mas as vezes só queria que as coisas fossem menos doídas, como exemplo eu podia ter perdido minha chance de primeira e evitado essa esperança e agonia que no fim acabaram me fazendo desacreditar em mim mesma.

[desculpem os erros ortográficos, e as repetições, minha cabeça não está boa]

Na linha 09, no enunciado “A minha vida prossegue embora eu não saiba o que fazer daqui pra frente”, a conjunção adversativa embora, reforça a imagem de uma fiadora que se encontra perdida, desolada e triste.

O uso da língua também é fundamental para a construção do ethos da escrevente, já que a mesma modifica a linguagem que utiliza em função da proximidade do vestibular. A condição de pré-universitária, em 2006, e de universitária, em 2008, vai, portanto influenciar na formalidade ou informalidade no uso da língua.

Lança-se mão do exemplo a seguir para esclarecer tal questão:

Exemplo 44:

Postado em 30 de novembro de 2006 01

05

sabe qdo a insonia e a preocupação viram extase??? uhahuahua...é bomd+,

to felizona...kkkkkkkacho q naum tirei uma nota super hiper alta na prova d

hj, + passar eu

passei, e o pior é ter absoluta certeza d q se eu tivesse me esforçado um pouquinho eu teria passado, isso q dá querer vagabundear o ano inteiro,+

quem sabe eu aprendo a lição...rsrsrs depois shopps, só p/ acompanhar

mamis na sessão d quimi..., + acabou q saí d lá c/ um belo vestido e um tenis + bonito ainda...rsrsrs...

No post do dia 30 de novembro de 2006, há o uso constante do internetês. A escrevente utiliza muitas palavras abreviadas e uma escrita com tendência a reproduzir a forma como se fala, característica própria da linguagem utilizada na Internet. Direcionado pela necessidade de se escrever rapidamente, uma vez que, na Internet, ocorre a publicação instantânea das mensagens escritas, o internetês é marcado por uma enorme quantidade de abreviaturas e as palavras são escritas, tendo como base suas características fonéticas, dentre outros. Os itens do exemplo anterior, destacados em negrito, mostram que a escrevente usa o internetês, com naturalidade, em seu blog e domina bem esse tipo de linguagem, mas a evita, quando passa a ser pré-universitária.

Apesar dessa preocupação que passa pelo uso da língua, a escrevente, mesmo tendo passado no vestibular de pedagogia, compartilha nas postagens mais novas, de elementos próprios do internetês, mas não os utiliza com muita freqüência. Assim, elementos semióticos específicos de tal linguagem são utilizados nesse blog, preenchendo diversas funções comunicativas, como se pode observar nos itens semióticos a seguir, usados pela escrevente:

Ícones semióticos Significado

[=/] ou =/ Tristeza

[\o/] ou \o/ Sorriso

=) Alegria

Quadro 5: Ícones semióticos usados por Naneh, em seu blog, com seus respectivos significados.