• Nenhum resultado encontrado

Breve histórico e conceito da responsabilidade civil

2. RESPONSABILIDADE CIVIL

2.1. Breve histórico e conceito da responsabilidade civil

No princípio, a ocorrência de um dano gerava na vítima uma idéia de vingança para com o agressor, ou seja, a justiça era feita pelas próprias mãos, limitava-se a retribuição do mal pelo mal, ou seja, olho por olho, dente por dente.

Esta prática apresentava resultados extremamente negativos, pois acarretava a produção de um outro dano, uma nova lesão, isto é, o dano suportado pelo agressor, após sua punição.

Posteriormente, surge o período da composição a critério da vítima, ainda sem se discutir a culpa do agente causador do dano.

Avançando no tempo, o Estado passa a agir proibindo a vítima de fazer justiça pelas próprias mãos, estabelecendo a obrigatoriedade da composição, a partir de uma indenização pecuniária. Durante esse período, cria-se uma tabela estabelecendo o quantum seria pago pelo dano, apontando de amputação de membro chegando até a morte.

No ano 572 da fundação de Roma, um tribuno do povo, chamado Lúcio Aquílio, propôs e obteve a aprovação e sanção de uma lei de ordem penal, que veio a ficar conhecida como Lei Aquília, que possuía dois objetivos: assegurar o castigo à pessoa que causasse um dano a outrem, obrigando-a a ressarcir os prejuízos dele decorrentes; punir o escravo que causasse algum dano ao cidadão, ou ao gado de outrem, fazendo-o reparar o mal causado.

O direito francês aperfeiçoou as idéias românicas e, a partir dele, foram estabelecidos certos princípios que exerceram influência nos outros povos, tais como: direito à reparação, sempre que houvesse culpa, ainda que leve,

separando-se a responsabilidade civil (perante a vítima) da responsabilidade penal (perante o Estado); a existência de uma culpa contratual (a das pessoas que descumprem as obrigações), e que não se liga nem a crime nem a delito, mas se origina da imperícia, negligência ou imprudência.

Surge o Código de Napoleão, e com ele a distinção entre culpa delitual e contratual. A partir daí, a definição de que a responsabilidade civil se funda na culpa, propagou-se nas legislações de todo o mundo.

Com o advento da Revolução Industrial, multiplicaram-se os danos, e surgiram novas teorias inclinadas sempre a oferecer maior proteção às vítimas.

Sem abandonar a Teoria da Culpa, atualmente vem ganhando terreno a Teoria do Risco, que se baseia na idéia de que o exercício de atividade perigosa é fundamento da responsabilidade civil. Isto significa que a execução de atividade que ofereça perigo possui um risco, o qual deve ser assumido pelo agente, ressarcindo os danos causados a terceiros pelo exercício da atividade perigosa.

Do conceito de Responsabilidade Civil A palavra "responsabilidade", segundo o vocabulário jurídico origina-se do vocábulo responsável, do verbo responder, do latim respondere, que tem o significado de responsabilizar-se, vir garantindo, assegurar, assumir o pagamento do que se obrigou, ou do ato que praticou.

E segundo o vocabulário leigo, responsabilidade significa: qualidade do que é responsável, obrigação de responder pelos seus atos ou pelos de outrem.27

O termo "civil" refere-se ao cidadão, assim considerado nas suas relações com os demais membros da sociedade, diz respeito às relações dos cidadãos entre si, das quais resultam direitos a exigir e obrigações a cumprir.

Diante da etimologia das duas palavras, verifica-se a existência de requisitos essenciais para a apuração da responsabilidade civil, como a ação ou

27BUENO, Francisco da Silveira. Dicionário escolar da língua portuguesa. 9. ed. Rio de Janeiro:

omissão, o dano e o perigo, a culpa ou dolo do agente causador do dano ou perigo e o nexo de causalidade existente entre o ato praticado e o prejuízo dele decorrente.

Segundo Maria Helena Diniz:

“a responsabilidade civil é a aplicação de medidas que obriguem uma pessoa a reparar dano moral ou patrimonial causado a terceiros, em razão de ato por ela mesma praticado, por pessoa por quem ela responde, por alguma coisa a ela pertencente ou de simples imposição legal.”28.

Conforme já mencionado, com a revolução industrial, percursora de um novo modelo produtivo, trouxera com ela conseqüências jurídicas importantes: pela teoria do risco iniciaram-se os debates para responsabilização daqueles que fornecem atividades à coletividade. Verificou-se, a par dessa industrialização, uma maior atividade estatal, bem como a exploração econômica na sociedade massificada, o que justificaria a aplicação daquela teoria emergente.

No direito comparado, a teoria do risco mergulhou no âmbito privado, pela previsão da responsabilidade civil objetiva dos prestadores e fornecedores, por danos causados aos consumidores vulneráveis.

Passou-se a admitir, também, ao lado do dever de indenizar independente de culpa, a tutela coletiva dos prejudicados e a prevenção de danos ao meio social. Sente-se uma nova revolução das relações privadas, com o surgimento de tendências socializantes, abraçadas aos direitos individuais homogêneos, coletivos e difusos.

No Brasil, o aperfeiçoamento destes direitos sociais se dá nos anos 70, com o aumento das atividades privadas e o incremento do movimento consumerista. Em 1985, surge a Lei 7.347, que possibilita a defesa coletiva, intentada por órgãos legitimados, como o Ministério Público. Logo após, a

28DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil. 17. ed. São Paulo:

Constituição de 1988 trouxe em seu bojo todas as tendências socializantes, como a defesa dos consumidores como norma principiológica (artigo 5º, XXXII), a reparação de danos imateriais ou morais (artigo 5º, V e X), o conceito de função social da propriedade (artigo 5º, XXII e XXIII), a proteção do “bem ambiental” (artigo 225), a proteção da dignidade da pessoa humana como preceito fundamental (artigo 1º, III), a solidariedade social como preceito máximo de justiça (art. 3º I) e a isonomia ou igualdade (art. 5º, “caput”).

Depois, em 1990, o Código de Defesa do Consumidor consagra a responsabilidade sem culpa como princípio inerente à defesa dos vulneráveis dessa relação negocial. Com tais acontecimentos, pode-se concluir que houve a consagração da responsabilidade sem culpa também nas relações privadas.

Diante dessa nova realidade, a nova codificação civil não poderia cometer o grave equívoco de não regular a responsabilidade independentemente de culpa, sendo certo que o art. 927, parágrafo único, passou a prever em sentido amplo a responsabilidade independentemente de culpa (objetiva) nos “casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem”.

São vários os casos de responsabilidade independentemente de culpa no novo Código, alguns autores passaram a defender que a objetivação é regra geral de responsabilidade, pela própria adoção do princípio da socialidade, diante da valorização da dignidade da pessoa humana.

De outro lado, pela própria organização do Código Civil, já que a parte geral traz como regra, em seu artigo 186, a responsabilização somente nos casos em que a culpa em sentido amplo estiver presente. Desse modo, para que o agente indenize o prejudicado necessária a prova do elemento culpa, ônus que cabe, regra geral, ao autor da demanda, pelo que prevê o artigo 333, inciso I, do Código de Processo Civil.

Cumpre esclarecer que, de acordo com a ordem natural das coisas, a regra vem sempre antes da exceção. Nesse sentido, percebe-se que o artigo 927, “caput”, traz primeiro a responsabilidade com culpa, estando a responsabilização

objetiva prevista em seu parágrafo único, nos casos ali taxados, justamente nas hipóteses em que não se aplica a primeira regra legal, havendo ainda entendimento de que adotar a responsabilidade objetiva como regra pode trazer abusos, beneficiando inclusive o enriquecimento sem causa, ato unilateral vedado pela nova codificação, entre os artigos 884 a 886.

Pode haver a responsabilidade tanto no plano jurídico como no plano moral. No plano jurídico, talvez ocorra a responsabilidade jurídica na área penal e na área civil, a responsabilidade jurídica vai emergir quando se der um prejuízo, a reação a esse prejuízo se dá na área penal ou na área civil, conforme o ofendido, titular do direito violado, seja a sociedade ou um indivíduo.

Há distinção entre responsabilidade jurídica e responsabilidade moral, porque a primeira exige a existência de dano e a segunda decorre, basicamente, de um “mal pensamento” ou de uma “má ação”. No entanto, é claro que, quase sempre, a responsabilidade jurídica se fundamenta na moral, até porque, como já se sabe, as regras de direito, em geral, apresentam um conteúdo moral. Assim, a responsabilização jurídica certamente tem um conteúdo valorativo.

À saber, resumindo Fernando Noronha29: Obrigações por

Responsabilidade Civil (sentido estrito): o direito vai tutelar a pretensão do credor à reparação de danos sofridos. A causa dessas relações obrigacionais é a prática de atos ilícitos ou a ocorrência de outros atos antijurídicos.

O ilícito penal difere do ilícito civil. Da mesma forma, a responsabilidade penal será diferente da civil. José de Aguiar Dias diz que:

“A diferença entre responsabilidade civil e responsabilidade penal – dizem Mazeaud et Mazeaud – é a distinção entre direito penal e direito civil. Não se cogita, na responsabilidade civil, de verificar se o ato que causou dano ao particular ameaça, ou não, a ordem social.”30

29NORONHA, Fernando. Direito das obrigações. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2013. p.48.

Considera, no entanto, o autor, que o dano causado na ordem civil, ou seja, o dano causado ao particular, afeta sim o equilíbrio social. E, a seu ver, é aí que está situado o fundamento da responsabilidade civil.

O autor argumenta citando Pontes de Miranda, afirmando: “o maior interessado na mantença das situações é a sociedade e não os indivíduos”.

Conclui, assim, José de Aguiar Dias, a respeito da distinção entre direito penal e civil:

“Para efeito de punição ou reparação, isto é, para aplicar uma outra forma de restauração da ordem social, é que se distingue: a sociedade toma à sua conta aquilo que a atinge diretamente, deixando ao particular a ação para restabelecer-se, à custa do ofensor, no status quo anterior à ofensa. Deixa, não porque não se impressione com ele, mas porque o Estado ainda mantém um regime político que justifica a sua não intervenção. Restabelecida a vítima na situação anterior, está desfeito o desequilíbrio experimentado.”31

Em suma, a Responsabilidade Civil tem, como pressuposto absoluto, a existência do dano.