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3. RESPONSABILIDADE CIVIL DO EMPREGADOR

3.1. Responsabilidade civil por acidente do trabalho

Outrora, a obrigatoriedade do pagamento do seguro acidentário, hoje pago pelo Instituto Nacional de Previdência Social, sugeria que todos os riscos inerentes ao trabalho estavam cobertos por este valor, sendo que a indenização que o empregador deveria suportar resultaria em reparação de dano pelo mesmo motivo, o que era inconcebível.

Atualmente, a Constituição Federal de 1988 no art.7º, inciso XXVIII assegura a indenização por acidente do trabalho nos casos de dolo ou culpa do empregador, bem como a Lei 8.213 de 24.07.1991 no art.121 prevê que o pagamento pela Previdência Social ao segurado acidentado não exclui a responsabilidade civil da empresa, in verbis:

Constituição Federal/88:

Art.7º - São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

XXVIII - seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa;

Lei 8.213/91

Art.121 - O pagamento, pela Previdência Social, das prestações por acidente do trabalho não exclui a responsabilidade civil da empresa ou de outrem.

Destarte, o acidente do trabalho, bem como a doença ocupacional, podem desencadear lesões de ordem material e moral, de modo que passa a ser devida a respectiva indenização pelo empregador, quando violado direito da personalidade do empregado.

Portanto, é constitucionalmente garantido que todo dano decorrente de acidente do trabalho deve ser reparado, coberto pelo seguro obrigatório a cargo do INSS, sem prejuízo da indenização material ou moral, isso porque o seguro obrigatório não exclui a indenização devida pelo empregador, quando incorrer em dolo ou culpa, grave ou leve.

Haverá responsabilidade civil do empregador, como já dito, quando incorrer em dolo ou culpa, independentemente do grau de culpa, pois o texto constitucional não fez qualquer distinção ao estabelecer a responsabilidade indenizatória, será suficiente a demonstração da culpa de qualquer natureza.

Silvio Rodrigues nos ensina:

“A responsabilidade civil vem definida por Savatier (ob. Cit., n1) como a obrigação que pode incumbir uma pessoa a reparar o prejuízo causado a outra, por fato próprio, ou por fato de pessoas ou coisas que dela dependam.

Realmente o problema em foco é o de saber se o prejuízo experimentado pela vitima deve ou não ser reparado por quem o causou. Se a resposta for afirmativa, cumpre indagar em que condições e de que maneira será tal prejuízo reparado. Esse é o campo que a teoria da responsabilidade civil procura cobrir.”46

O trabalhador segurado que sofrer acidente do trabalho ou que for vítima de doença ocupacional (doença profissional ou do trabalho) tem direito a ação de prestações por acidente do trabalho contra o INSS pela responsabilidade objetiva, excluindo-se desta responsabilidade as situações que o trabalhador agiu com

46RODRIGUES, Silvio. Direito civil: responsabilidade civil. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 1987. v. 4,

p. 4-5. Cf. SAVATIER, Renè. Traité de la responsabilité civile em droit français. 2. ed. Paris: Dalloz, 1951. n. 2 bis.

dolo para que ocorresse o fato gerador da indenização, como por exemplo amputar o braço de propósito para receber a indenização.

O trabalhador também possui direito a ação de indenização civil ou de reparação de danos materiais ou morais contra o empregador, se este incorrer em dolo ou culpa, em razão da responsabilidade subjetiva, na forma dos arts.186,187, 927 e 927 parágrafo único e 932 e seguintes do Código Civil.

Decide nossos tribunais:

“RESPONSABILIDADE CIVIL – ACIDENTE DO TRABALHO – INDENIZAÇÃO – DIREITO COMUM – DOENÇA – CULPA DO EMPREGADOR – CARACTERIZAÇÃO – CABIMENTO – Provada a culpa do empregador pelas lesões por esforços repetitivos adquiridos por empregados, por haver violado diversos dispositivos legais sobre higiene e segurança do trabalho (sobrecarga laborativa abusiva pelas características do trabalho, falta de pausas no serviço repetitivo, uso de mobiliário e equipamentos anti-ergonômicos e falta de orientação quando às posturas adequadas), cabe-lhe o dever de lhes prestar indenização por danos material e moral”.47

Concluindo, o benefício da Previdência Social ao acidentado decorre da teoria do risco em que o empregado está exposto ao executar seu serviço, já a reparação civil decorre da culpa ou dolo do empregador no descumprimento dos deveres legais de segurança, higiene e prevenção atribuídos a este.

A indenização civil nada tem a ver com os benefícios acidentários, conforme os seguintes fundamentos da Turma Especial da 1º Seção Civil (Ap. 38.705-1, São Paulo, Turma Especial da 1ª Seção Civil, j. 19.10.1984, Rel. Desembargador Alves Braga):

“Houve, sem dúvida, uma socialização do risco por acidentes do trabalho, embora com a participação maior do empregador. E nessa socialização, também o próprio acidentado participa do rateio do respectivo custeio... O que é exclusivo do empregador é apenas o acréscimo necessário para cobertura dos danos,

4720 TACSP – Ap.c. Rev . N0 603.804-007-5aC – Rel. juiz Dyrceu Cintra – DOESP 17.08.2001, in

segundo os cálculos atuariais. E de todos os empregadores do pais, e não apenas daquele cujo empregado vier a sofrer acidente. Entram na composição do montante necessário para custear os encargos respeitantes aos acidentes do trabalho, como é clara a disposição legal, também as contribuições previdenciárias a cargo da União (coletividade), da empresa (todos os empregados) e do segurado (de todos os segurados e não apenas do acidentado), o que dá bem a idéia da socialização do risco. Os benefícios cobertos com participação tão ampla não podem ser invocados pelo empregador quando de sua eventual responsabilidade civil perante o acidentado”.

Do exposto acima extrai-se que havendo dolo ou culpa na ocorrência da infortunística, pode o acidentado, ou seus beneficiários, receber as duas reparações. São direitos autônomos, onde a indenização pela responsabilidade objetiva é amparada pela Previdência Social, e a indenização do direito comum, que é custeado pelo empregador que agiu com dolo ou culpa.

Via de regra, o contrato de trabalho faz nascer, entre o empregador e o empregado, uma relação jurídica obrigacional, onde os direitos e deveres de ambos estão previamente ajustados, segundo normas de interesse público e de interesse privado.

Daí porque há certas regras passíveis de pactuação, com plena liberdade de disposição pelas partes e, outras, cuja disciplina legal estabelece contornos obrigatórios, gravando-as com a condição de indisponibilidade, por comporem o rol das normas jurídicas de interesse público.

Os conceitos de empregador e empregado vêm descritos nos artigos 2º e 3º da CLT, que assim prevêem:

Art. 2º Considera-se empregador a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviço.

Art. 3º Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário.

Como empregadores, além da empresa, são ainda considerados, por equiparação, os profissionais liberais, as instituições de beneficência, as associações recreativas ou outras instituições sem fins lucrativos, desde que admitam trabalhadores como empregados, consoante a dicção do §1º, do artigo 2º da CLT.

Os requisitos da relação de emprego se destacam dos conceitos de empregado e empregador. Nesse sentido, é sabido que quatro elementos são simultaneamente indispensáveis, são eles:

Pessoalidade: o contrato de emprego é estabelecido intuito personae, havendo sua descaracterização quando o empregado puder se fazer substituir por outro, independentemente da manifestação de vontade da parte contrária;

Onerosidade: o contrato de trabalho subordinado não é gratuito, devendo haver sempre uma contra-prestação pelo labor desenvolvido. A ausência de tal retribuição, quando não for a hipótese de inadimplemento contratual, inferirá algum outro tipo de contrato, por exemplo, o trabalho voluntário;

Permanência ou não-eventualidade: nesse requisito, entenda-se a idéia de habitualidade na prestação laboral. Para a presença desse elemento, não se exige o trabalho em todos os dias da semana, mas com uma periodicidade razoável. O trabalho episódico não implica em reconhecimento de vínculo empregatício;

Subordinação: trata-se do estado em que se coloca o empregado perante o empregador, quando por força do contrato individual, põe sua energia pessoal à disposição da empresa para a execução dos serviços necessários aos seus fins. A vinculação contratual da relação de emprego é absoluta.

Corresponde a um estado assumido pelo empregado, em razão da celebração do contrato e independentemente de prestar ou não o trabalho, é que a doutrina se fixou na qualificação de jurídica para explicar sua natureza, ressaltando-se que a ausência de subordinação econômica ou técnica é irrelevante, por si só, para afastar o vínculo empregatício, como por exemplo, no caso do

professor universitário, que não depende do salário da instituição de ensino para sobreviver, nem precisa de seu empregador para aprender o seu ofício.

Além desses quatro elementos, há outros dois que embora não imprescindíveis para a caracterização da relação de emprego, auxiliam na sua diagnose, por permitir que se infira a presença dos elementos essenciais, vejamos:

Continuidade: trata-se da permanência levada a grau absoluto, ou seja, não somente o trabalho com habitualidade, mas também em todos os dias da semana, observados os repousos obrigatórios. Embora muitas vezes presente, não é essencial, como visto, para o reconhecimento da relação contratual prevista na Consolidação das Leis do Trabalho;

Exclusividade: embora nada impeça a existência de múltiplos e simultâneos contratos de trabalho, não há como se negar que a prestação exclusiva auxilia nos elementos pessoalidade e subordinação jurídica para a caracterização do vínculo empregatício.

Como se percebe, há uma relação jurídica entre empregado e empregador, por meio da qual um deles presta serviço e o outro remunera a atividade. Ao exercer a atividade lucrativa, assume o empregador os riscos do empreendimento e contribui para a Previdência Social, para resguardar-se dos efeitos patrimoniais do acidente do trabalho.

Tendo em vista que empregador assume os riscos da atividade, portanto, em tal ocasião inclui-se também o risco pelo acidente do trabalho ocorrido com o empregado, entendendo-se como acidente a sua forma genérica, isto é, tanto o acidente propriamente dito como a doença ocupacional.