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Brincar para o desenvolvimento na consulta de saúde infantil

No documento Apêndices do Relatório (páginas 110-114)

2.JORNAIS DE APRENDIZAGENS DA UNIDADE DE SAÚDE FAMILIAR

2.5. Brincar para o desenvolvimento na consulta de saúde infantil

Durante as consultas de saúde infantil pude verificar que o brincar é um dos componentes fundamentais na comunicação com a criança e senti que para a criança, o brinquedo não é tido como um mero e banal objeto através do qual podia brincar, mas sim uma

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representação e um objeto de significados, e que muitas delas por vezes até traziam o seu boneco para ser consultado! E cada um deles tinha um significado muito próprio para cada criança dependendo da importância que cada uma lhe atribuía. Na sua maioria penso que os brinquedos que traziam à consulta acabavam por funcionar como objeto de conforto, que se transformavam em objetos de tranquilização e as transportavam para o seu mundo de referências familiares (num ambiente que lhe era desconhecido, potencialmente stressante e ameaçador).

A linguagem não-verbal estava presente, por exemplo, numa interação em que a criança logo à chegada trazia um ursinho e que o tocava e aconchegava com as suas mãos contra o seu corpo, como se agarrado a um objeto que de alguma forma o podia salvar. E é importante o enfermeiro reconhecer a importância destes brinquedos que a criança faz- se acompanhar e transmitir-lhe essa mensagem durante o cuidar, não separando e fomentando e sua presença e incluindo o brinquedo nos cuidados. E quando dei por mim, nesta situação, estava a medir o ursinho, para depois medir a criança. Assim, e como de fato comprovo na pratica, é um elemento tão essencial para o desenvolvimento e bem- estar da criança, que não pode ser eliminado das suas rotinas, que seja no contexto de tratamento de uma doença, quer seja num contexto de promoção de saúde. O que posso aferir é que o brinquedo e o brincar têm realmente uma grande aplicabilidade no cuidar da criança e da família, pelo que o enfermeiro especialista não pode deixar de o priorizar, visto o brincar fazer parte dos direitos da criança.

Na consulta de saúde infantil existiu o respeito pela individualidade de cada criança e família, pelas suas rotinas e hábitos familiares (inclusão do brinquedo durante a avaliação da criança), por outro lado, quando a criança não trazia o seu próprio brinquedo, a consulta decorria com alusão ao mundo infantil, com muita imaginação e com utilização dos recursos existentes da unidade saúde familiar. Deste modo, posso afirmar que, durante o estágio na unidade de saúde familiar, o brincar terapêutico foi uma estratégia que utilizei para proporcionar à criança e família uma intervenção de enfermagem criativa, divertida, aberta, mas que em simultâneo transmitia calma e segurança.

Como enfermeira especialista, não poderei deturpar que o envolvimento familiar alicerça as necessidades da unidade familiar e as necessidades individuais da criança, bem como de todos os outros elementos. Logo, acredito que aumentar a qualidade dos cuidados implica recorrer a um pensamento sistémico da família, incluindo os próprios sistemas de interação da criança, dos seus irmãos, dos pais e de outros elementos que a constituem.

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A concretização de uma parceria aproxima-me da criança e da sua família e, em conjunto, reunimos a ambição de alcançar o mesmo objetivo, através da manutenção de uma relação de respeito e de confiança. E ser parceira é algo que assumo ser e não apenas o que assumo fazer, pois é percorrer um caminho, para atingir os resultados desejados, satisfazendo as necessidades que a criança e a família reconhecem ter. Os resultados, os objetivos e as expetativas nascem da criança e da família e não podem ser fruto das necessidades individuais da equipa que está envolvida no cuidar. Desta forma, é essencial utilizar o instrumento básico da enfermagem, a comunicação, para promover a ligação à criança e à família e fortalecer a relação de empatia que se gera. Apenas com o meu envolvimento poderei fazer com que a família se sinta compreendida nos momentos de fragilidade (provavelmente o pior da sua vida, a doença oncológica no seu filho), criando de fato uma parceria nos cuidados. Por conseguinte, uma vez estabelecida uma parceria sólida e verdadeira, florescem momentos de crescimento, que permitem um desenvolvimento pessoal recíproco.

O envolvimento da família passa também por promover a sua autonomia, enfatizando-se as interações entre a criança e os outros elementos da família, pois desta forma tomam decisões em conjunto, durante o processo de doença, ou até mesmo na saúde, criando- se um conceito de família saudável. Pela minha experiência verifico que existem vários tipos de famílias, sendo bastante desadequado, por parte de alguns profissionais rotularem as famílias de “difíceis”, pois quando isto acontece, normalmente, deve-se às dificuldades que estes profissionais sentem em estabelecer uma relação, essencial no cuidar, devido à insegurança que sentem perante a família. Não existem propriamente famílias difíceis ou inadequadas, como muitas das vezes se ouve na prática… Todas elas são, simplesmente, diferentes e é o reconhecimento dessa diferença, que permite a individualização dos cuidados, e cuidar desse conjunto de pessoas, como únicas. Estrategicamente, há que estimular o desenvolvimento dos pontos fortes de cada um dos membros da família, promovendo o crescimento do todo e a sua transformação.

A forma como a criança cresce a brincar, como brincar em casa, na escola, influencia a forma como brinca depois num contexto que habitualmente não é o seu, seja o centro de saúde ou o hospital. Durante as consultas tive oportunidade de alertar os pais para a importância do brincar, pois atualmente as sociedades tendem a subjugar as atividades lúdicas e recreativas, que contribuem para o desenvolvimento saudável da criança. O que me fez sentir de alguma forma impotente foi o fato de os pais até estarem motivados

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verbalizarem a o desejo de apostarem e envolverem-se nas atividades com dos seus filhos, mesmo de lazer, porque estas contribuem para o bem-estar comum da família… e devido a inúmeros fatores, mas cada vez mais frequente o flagelo de família em que o desemprego reina e a falta de recursos económicos não lhes permite realizar algumas atividades básicas.

O que eu gostei de intervir foi transmitir alguns jogos que ocupam e distraem a criança e que permitem o seu desenvolvimento sensorial, cognitivo e emocional, mas que não implicam custos adicionais para o orçamento das famílias, mas que fomentam a união, a proximidade e o convívio entre os vários elementos da família. Deste modo, surge assim um paradoxo entre a existência de mais tempo da família, por situações de precariedade e desemprego, mas menor qualidade de vida e de aproveitamento do tempo em que passam juntos. Numa situação durante a consulta de saúde infantil, uma mãe desempregada, que passava os dias com a sua filha, referia a dificuldade em arranjar motivação, imaginação e criatividade para desenvolver atividades com a sua filha de forma a garantir o seu crescimento e desenvolvimento saudável. O que me leva a pensar sobre que estratégias podem os enfermeiros surgir para que exista um melhor aproveitamento do tempo que antes já fora escasso (e que em muitas situações ainda o é e se opõe a estas questões).

As soluções que têm de ser procuradas têm de considerar os contextos culturais específicos da vida de cada criança e sua família. Por outro lado, esta falta de competências para o brincar em casa pode levar, considero eu, para uma tendência para a institucionalização das atividades de tempo livre das crianças e jovens. A mãe preocupa-se sobretudo como a sua incapacidade para manter a filha intelectualmente ativa e ao mesmo tempo corporalmente dinâmica, o que de fato exigia dela a aquisição de novos conhecimentos. Estive disponível para ouvir a sua exposição acerca dos recursos materiais que apresentava em casa e com eles desenvolver então alguns jogos e brincadeiras. Ainda assim alertei a mãe para a necessidade de atividade física e do jogo espontâneo e não programado nesta fase de desenvolvimento, sendo crucial e decisivo na delimitação e aquisição de hábitos saudáveis para uma vida futura ativa.

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2.6. Participação na reunião de equipa do Núcleo de Apoio a Crianças e Jovens em

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