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A DOENÇA ONCOLÓGICA NA ADOLESCÊNCIA: UM OLHAR SOBRE O CUDAR NA COMUNIDADE

No documento Apêndices do Relatório (páginas 152-157)

A DOENÇA ONCOLÓGICA NA ADOLESCÊNCIA Um olhar sobre o cuidar na comunidade

1. A DOENÇA ONCOLÓGICA NA ADOLESCÊNCIA: UM OLHAR SOBRE O CUDAR NA COMUNIDADE

Durante o cuidar da criança e família com doença oncológica, com a implementação do enfermeiro de referência no serviço de pediatria oncológica, já tinha conhecimento da existência da equipa de cuidados continuados. A concretização da possibilidade de conhecer e estar presente numa das visitas desta equipa surgiu através de um conversa informal com o enfermeiro orientador sobre a articulação que acontece entre a da unidade de saúde familiar e os serviços de saúde de apoio e integrados na comunidade. A minha disponibilidade foi imediata e a pertinência desta atividade não planeada foi enaltecida, quando tive oportunidade de saber que iria visitar duas crianças, com doença oncológica. Em relação à situação de saúde/doença, estes dois adolescentes, encontram-se numa situação de cronicidade há mais de dez anos, ambos com um diagnóstico inicial de tumor cerebral em idade pré-escolar. Atualmente, estão inseridos na comunidade, com uma adaptação progressiva e constante em curso, que perante as suas limitações usufruem dos apoios sociais e da saúde, que incluem o apoio da equipa de cuidados continuados. Estas duas famílias têm particularidades, no entanto, partilham algumas vivências comuns, em que me irei centrar para dar continuidade a esta reflexão. Ambas as crianças apresentam limitações físicas e cognitivas que induzem a uma total dependência de terceiros, com todas as implicações inerentes a esta dependência. Os dois adolescentes estão inseridos numa estrutura familiar, estruturada em função das suas necessidades, a todos os níveis.

Fez-me refletir sobre as características inerentes à própria adolescência é um período de transição em que os jovens constroem a sua identidade e escolhem o seu caminho profissional, projetando para a sua vida para o futuro. E nestas situações esta questão encontra-se limitada e não se perspetiva, o que emocionalmente é bastante intenso, o lidar com as incertezas que estes jovens enfrentam, com a inviabilidade de não poderem crescer e desenvolver-se com o objetivo de construir algo no amanhã. E até que ponto este dado tem influencia nas famílias, que não perspetivam para o seu filho uma vida na idade adulta. Em ambas as situações me questiono sobre o significado da palavra adolescência, que significa crescer, aumentar e amadurecer. E face a uma total

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dependências, quanto a todas as necessidades básicas de vida, não permite este normal percurso de vida, envolvendo o confronto diário com frustrações e angústias incontornáveis.

O que senti em ambas as situações, perante o seu caracter de grande vulnerabilidade, é que estas crianças são amadas pelas suas famílias, são compreendidas e inseridas num ambiente relacional, em que se encontram forças para continuar a vida (dentro da normalidade, como todas as outras famílias), e é neste entrançado de interações que muitas vezes encontram o apoio necessário para viver a vida, em sintonia como uma sociedade, que se dificulta a si própria na criação de um ambiente de normalidade face a estas situações.

Esta equipa reúne esforços para garantir a qualidade de vida destas crianças e suas famílias (alívio do sofrimento), em que estabelecem uma relação de parceria e as decisões são compartilhadas, em plena articulação, por exemplo, com as escolas onde estão integradas. O enfermeiro que cuida em parceria respeita a família, reforça as suas potencialidades/capacidades e deteta as suas fragilidades no cuidar. Perante estas duas situações pude experienciar que de fato a família são os melhores prestadores de cuidados à criança, pelo que a equipa de saúde deve estar em alerta para sinais de alerta de exaustão dos elementos que constituem o sistema familiar.

Senti algumas dificuldades em lidar com as minhas próprias emoções, pois ambas as crianças representavam visivelmente o que eu no ipo não vejo, que passa para lá dos tratamentos, da cura, fica o depois, e o tempo num tempo que não para em que a criança vive anos e anos com as consequências da doença oncológica. Efetivamente parece-me, quando perco o contato posterior com as famílias, depois de terminarem todos os tratamentos, fica tudo bem e fica mais um caso de sucesso… mas depois as limitações, as necessidades mudam, as adaptações continuam e os apoios não podem deixar de existir… e as crianças e as famílias continuam com a necessidade de ter o apoio de cuidados de saúde. Julgo que estes casos envolvem uma situação emocional muito acentuada

Outro aspeto que de alguma forma me levou a refletir foi a questão da liberdade, pois se por um lado a adolescência incide na procura da liberdade pelo adolescente e pelo desejo que tem em alcançar a sua independência e de sua libertação das restrições impostas pelos pais, nestas situações ocorre exatamente o oposto. Todos os elementos da família

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construíram a sua vida e todos os projetos futuros são construídos em torno da falta de liberdade que lhes é condição de imposição dependência permanente destes adolescentes que é incontornável a curto e a longo prazo.

Os apoios que a família recebe são extremamente importantes. Por exemplo, o grupo de amigos que são uma das bases essenciais na manutenção das relações sociais. Neste contexto, a escola constitui um meio primordial para o estabelecimento e aprofundamento dessas mesmas relações, bem como para o seu desenvolvimento pessoal de auto confiança e autoestima.

O confronto com esta situação leva-me a refletir também em algumas questões existenciais relacionadas com o próprio sentido e valorização da vida, com aceitação da nossa própria finitude. Apesar da instalação de um quadro de cronicidade, como em qualquer outra patologia grave, o diagnóstico de cancro suscita no adolescente e respetiva família, o confronto constante com a possibilidade de morte, em que este sentimento causa profundas alterações nas suas vidas, exigindo constantes readaptações por parte de todos.

Pessoalmente, considero fundamental seguir uma filosofia de cuidados que reconheça a importância dos pais no cuidar da criança doente, contribuindo para o fortalecimento do seu papel parental. Muitas vezes, os pais verbalizam, que quando participam nos cuidados, conseguem obter uma sensação de maior bem-estar emocional e de controlo da situação que estão a viver, o que tem claras repercussões no bem-estar físico e emocional da criança. A intervenção ativa dos pais nos cuidados permite-lhes aliviar e controlar os seus medos e ansiedades, pois nos cuidados são incorporados as suas preferências, crenças e valores. Além do mais, a participação dos pais na tomada de decisão proporciona-lhes uma sensação de satisfação e um pequeno grau de poder. O enfermeiro deve promover a participação de todas as crianças na gestão e organização de sua própria saúde, incluindo a criança na tomada de decisões, tanto quanto possível, para que sinta algum controle e participação no processo terapêutico. O desenvolvimento de jogos, adequados ao desenvolvimento e idade da criança, permite-lhe, por exemplo, expressar seus medos e frustrações através da brincadeira. Neste sentido, os pais devem também ser estimulados a desenvolver com a criança atividades, que na ausência de doença seriam habituais e frequentes, de acordo com a sua condição. O enfermeiro terá um papel primordial nesta área, pois pela minha experiência muitas das vezes sentem-se

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retraídos a ter esta autonomia, pelo receio de provocarem algum dano à criança. Mesmo que existam limitações, por imposição da gravidade da doença, a família não deixa de ser o meio natural para o crescimento e bem-estar da criança, pelo que deve receber a devida proteção e a assistência necessária. Desta forma, a criança consegue ter um desenvolvimento harmonioso da sua personalidade e crescer num ambiente de felicidade, de amor e compreensão.

A participação dos pais leva a que tenham necessidades de aprendizagem para lidar com a situação, e devem ser conhecedores que a equipa de enfermagem estará disponível para capacitá-los a atingir esse objetivo. Além disso, o enfermeiro deve estar atento aos sinais de exaustão, por parte dos principais cuidadores da criança, pois poderá ser necessário o enfermeiro articular com outros elementos da família, para que os principais cuidadores façam usufruto de um tempo só para si. É importante que os pais cuidem deles, para estarem emocionalmente equilibrados. Assim, podem transmitir à criança toda a tranquilidade, segurança e amor que ela necessita, perante todas as adversidades que a doença oncológica acarreta e todos os procedimentos invasivos, que são bem frequentes.

Todas as intervenções no cuidar da criança e da família devem ser realizadas com a preocupação da defesa da liberdade e da dignidade da pessoa humana, respeitando a sua integridade biopsicossocial, cultural e espiritual. Logo, o enfermeiro tem o dever de estar atento a todas as situações que possam de alguma forma desrespeitar estes princípios. E para que os direitos da criança sejam uma realidade, tem de existir a necessidade de a proteger juridicamente antes e após o seu nascimento. Importa preparar a criança para uma vida em sociedade, baseando a sua educação num espírito de paz, dignidade, tolerância, liberdade e solidariedade.

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2. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Barros, S. (2008). O Contributo do Enfermeiro no Processo Adaptativo do Adolescente a uma Doença Oncológica. Dissertação para a obtenção de grau de mestre em Ciências de Enfermagem, Universidade do Porto, Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar, Porto.

Braconnier, A. (2002). Guia da Adolescência. (Teresa Alves Correia, trad.). Lisboa: Prefácio. (Obra original publicada em 1999).

Ferreira, M. & Nelas, P. (2006). Adolescências… Adolescentes… Revista Millenium, n.º 32.

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3º CURSO DE MESTRADO EM ENFERMAGEM NA ÁREA DE

ESPECIALIZAÇÃO DE ENFERMAGEM DE SAÚDE INFANTIL E PEDIATRIA

GUIA DE BOAS PRÁTICAS

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