• Nenhum resultado encontrado

4 CAMPO DE EMERGÊNCIA DE TEORIAS – ANTINOMIA ENTRE PROPOSIÇÕES

4.2 No Campo das Teorias Organizacionais

Não se pretende deter na análise histórica da teorização organizacional, mas é necessário estabelecer um grande painel para melhor compreender o fenômeno estudado no campo das Teorias Organizacionais.

Recorrer-se-á primeiramente a Reed, analisado em Stewart & Clegg (1999), que aborda as “narrativas analíticas em análise organizacional”. O quadro que o autor estabeleceu em forma de uma matriz articula e legitima as diferentes concepções sobre as organizações, mostrando suas visões pluralísticas, identificando o modelo básico, a problemática principal e algumas ilustrações de sua aplicação. O Quadro 1 evidencia os conflitos históricos que perpassaram a análise organizacional nos últimos cem anos, fornecendo a gramática pelas quais as narrativas puderam ser construídas, e ainda a relação dialética em processos sociais e históricos.

Modelo de metanarrativa interpretativa

Problemática

principal Perspectivas ilustrativas / exemplos contextuais Transições

Racionalidade Ordem Teoria das Organizações clássica, administração científica, teoria da decisão. (TAYLOR, FAYOL, SIMON)

De Estado guarda-noturno a Estado industrial

Integração Consenso Relações Humanas, neo-RH, funcionalismo, teoria da contingência/sistêmica, cultura corporativa (DURKHEIM, BARNARD, MAYO, PARSONS).

De capitalismo empresarial a capitalismo do bem-estar

Mercado Liberdade

Teoria da firma, economia institucional, custos de transação, teoria da atuação, dependência de recursos, ecologia populacional, teoria organizacional liberal.

De capitalismo gerencial a capitalismo neoliberal

Poder Dominação Weberianos neo-radicais, marxismo crítico-estrutural, processo de trabalho, teoria institucional (WEBER, MARX)

De coletivismo liberal a corporativismo negociado

Conhecimento Controle

Etnométodo, símbolo/cultura organizacional, pós- estruturalista, pós-industrialista, pós-fordista/moderno. (FOUCAULT, GARFINKEL, teoria do ator-rede).

De industrialismo/ modernidade a pós- industrialismo / pós-modernidade Justiça Participação

Ética de negócios, moralidade e OB, democracia industrial, teoria participativa, teoria crítica, (HABERMAS).

De democracia repressiva a democracia participativa Quadro 1: Narrativas analíticas em análise organizacional63

Fonte: REED, Michael, 1999.

Pode-se afirmar, a partir de Reed (1999) e ainda de outros autores, que o Racionalismo64 exerceu profunda influência no desenvolvimento histórico e conceitual da análise organizacional.

(O Racionalismo)... Estabelece um modelo cognitivo e uma pauta de pesquisas que não puderam ser ignoradas, mesmo por aqueles que quiseram adotar uma linha radicalmente diferente. Além disso, tal corrente repercutiu ideologicamente no desenvolvimento político de instituições e estruturas econômicas durante o princípio e meados do século XX, tornando as corporações e o estado político alcançáveis pelo conhecimento. O racionalismo forneceu uma representação de formas organizacionais emergentes que legitimaram seu crescente poderio e sua influência como características inevitáveis em uma trajetória histórica de longo prazo, por meio de discursos acerca da administração e gerência tecnológica racional. Ademais, ele elevou a teoria e a prática da administração organizacional de uma arte intuitiva para um corpo de conhecimentos codificados e analisáveis, tornando possível, inclusive, transações com o poderosíssimo capital cultural e com o simbolismo da ciência. (REED. In: STEWART & CLEGG, 1999: 68).

63 Embora pareça pleonástico o título do quadro, preferiu-se manter tal como foi feita a tradução no Handbook

de Estudos Organizacionais, volume 1, 1999.

64 Racionalismo, enquanto concepção, também versa sobre uma visão que se pretende científica, tem a ver com

a estrutura de coordenação imposta sobre as unidades de divisão de trabalho de uma empresa. A divisão de trabalho é o alicerce da organização, tem a ver com a sua funcionalidade, e, assim, equiparam-se a Abordagem Modernizante dos Sistemas Educacionais. REED, In: STEWART & CLEGG, 1999).

A força do Racionalismo é de tal ordem que se pode falar de sua influência, após tantos anos, com outras denominações. Evidentemente, críticas sobre a incapacidade da organização racionalística em resolver problemas de integração social apontavam a necessidade prática e teórica de uma base alternativa, o que veio a acontecer com o Movimento da Escola de Relações Humanas.

Toda força da Escola de Relações Humanas vem da identificação do isolamento social e dos conflitos como sintomas de uma patologia social. A “boa” sociedade e organização eficaz são aquelas capazes de facilitar e sustentar a realidade sociopsicológica de cooperação espontânea e estabilidade social em face de mudanças econômicas, políticas e tecnológicas que ameaçam a integração do indivíduo e do grupo dentro de uma comunidade mais ampla”. REED. In: STEWART & CLEGG, 1999: 68: 70)

Nessa linha narrativa, pode-se incluir o Funcionalismo Estrutural e a Teoria de Sistemas, que procuram fazer uma adaptação adequada entre a organização e o seu ambiente.

A concepção sistêmica da organização ampliou-se com a inclusão da discussão econômica, do papel do mercado, tendo sido concebidas várias teorias e modos de se lidar com novas realidades do contexto político e ideológico da época, na tentativa de ajudar as organizações dentro do princípio de sobrevivência dos mais aptos.

As duas últimas “narrativas” de Reed (1999) do quadro analisado – “Conhecimento” e “Justiça” – enfatizam o uso dos conhecimentos estratégicos para a mobilização e regulação do comportamento social dentro das organizações. A discussão sai do nível macro e se dirige para o nível micro de análise de processos e práticas. A complementação inaugurada com a democracia participativa traz a questão da justiça, instigando as organizações a repensarem o relacionamento entre o indivíduo, a comunidade, os grupos de interesse, a sociedade civil e diversas cadeias associativas de controle social e econômico.

O objeto de estudo – a Teoria Organizacional – é visto e analisado sob diferentes prismas e paradigmas, chegando a se configurar como uma Torre de Babel, segundo Burrel & Morgan (1979). Outros autores, em análises críticas, mostram que é muito difícil permanecer em paradigmas organizacionais de forma ortodoxa65.

65 Há dificuldade de se permanecer fiel em paradigmas no Brasil: isso se deve, nas palavras de VERGARA

(1999), à existência de um quase “supermercado de idéias”, facilitando adesões aos modismos funcionalistas de forma simplificada e perigosa.

Burrell (1999) organiza um painel compreensivo de paradigmas sociológicos sobre as diferentes perspectivas de estudos organizacionais:

Figura 2: Os quatro paradigmas sociológicos

Fonte: BURREL, 1999.

Nessa figura, Burrell (1999) busca estabelecer um diálogo entre quatro paradigmas66, no sentido de “leis clássicas” e “modos de vida comunitária”.

Deve ser dito que paradigmas definem, em um senso acordado e profundamente assentado, uma forma de ver o mundo e como este deveria ser estudado, e que este ponto de vista é compartilhado por um grupo de cientistas que vivem em uma comunidade marcada por uma linguagem conceitual comum, que buscam fundar um edifício conceitual comum, e que são possuídos por uma postura política muito defensiva em relação aos de fora. (BURRELL, In: STEWART & CLEGG, 1999: 447)

O autor complementa a análise estabelecendo o confronto entre a visão subjetiva da Ciência Social e a visão objetivista de Ciência Social, como se vê na FIG 3.

66 A noção de “paradigma” na análise organizacional tem recebido muita atenção nos últimos quinze anos.

Costuma-se creditar a Kuhn vinte sentidos diferentes para o uso do termo, em sua análise do colapso da física newtoniana (STEWART & CLEGG, 1999)

Figura 3: Um esquema para analisar afirmações sobre a natureza da Ciência Social

Fonte: REED, 1999.

Essa figura aponta claramente as antinomias entre as dimensões subjetiva e objetiva da Ciência Social, em seus aspectos ontológicos, epistemológicos, metodológicos e da natureza humana.67