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Reconstituição do ms L fols 113c – 322b

CAPÍTULO DC

Como os filhos del rey dom Sancho, o Mayor, micraron a raynha sua madre por o cavallo que lhe nõ quis dar

Diz a estorya que, despois que este rey dom Sancho ouve quebrantados os muros per muytas batalhas que lhe deu, mãteve sua terra muyto em paz e sem nem hũu mal fazer; e que, en se tornando da hoste onde morrerõ as companhas sobre / [174c] o porco montes, que chegou a Najara.

E elle avya hũu muy nobre cavallo, ẽno qual se elle esforçava tanto como ẽ sua vyda. E, quando se elle partira de Navarra pera hyr em aquella hoste, como dissemos, leixara aquelle cavallo aa raynha que lho fezesse bem guardar e pensar muy bẽ. E, por que em aquelle tempo era a guerra com os mouros assy avyvada que era necessario a todo homẽ, qual quer que fosse, de estar prestes de suas armas e de seu cavallo pera, quando ouvysse algũu arroydo, que se podesse armar seguramente, e por esta razon os reis e

os condes e cavalleiros sempre tiinham conssigo ẽ suas camaras os cavallos de seus corpos. E por esta razon fezera a raynha trager aquelle 247 cavallo que lhe el rey assy ẽcomendara a seu paaço e penssava del muy bem em todallas cousas que ao cavalo compryã.

E, en todo esto, o iffante dõ Garcia, depois que vyo que seu padre era hydo, demandou aquelle cavallo a sua madre muyto afficadamẽte. E ella, quando vyo que lho assy demandava de coraçon, disse que lho darya. Mas hũu cavalleiro que servya em casa da raynha disselhe que lho nõ desse, ca poderya por ello cayr em sanha del rey. E ella, quando ouvyo aquello, entendeo que podya seer o que o cavalleiro dizia; e por esto nõ quis dar o cavallo ao filho.

E o iffante, que aquello ouvyo, foy muy sanhudo da raynha. E ouve consselho com seu irmãao, o iffante dom Fernando, ẽ qual maneira a mizcrassem com el rey. E o consselho foy este: que lhe posessem que avya amizade com aquelle cavalleiro que a consselhara nõ dar o cavallo. E o ifante dom Fernãdo disse ao irmãao que elle bem lhe cõsyntiria o que el dissesse. E o iffante dom Garcia, com sanha e maa võotade que avya a sua madre, emfamouha per ante el rey cõ aquele / [174d] cavalleiro, nõ esguardando nẽ hũa boa razon e dizendo a el rey que desta cousa o farya certo com dom Fernando, seu irmãao.

Quando el rey ouvyo o que lhe seu filho dizia e como o provava cõ seu irmãao, creuho logo e mandou prender a raynha e o cavalleiro e metellos no castello de Najara.

E, despois que esto assy ouve feito, fez cortes e prepos em ellas per ante todos este feito; e foy determynado e achado per dereito que ella se salvasse – e esto per reto, cõvem a saber: dando ella hũu cavalleiro que entrasse ẽ campo com o iffante dom Garcia e dom Fernando. E esta sentença foy dada ennas cortes em presença de todos seus ricos homẽes. Empero nõ ouve hy nẽ hũu que por a raynha tal aventuira quisesse tomar.

Quãdo esto vyo dom Ramiro, que era filho del rey bastardo, que nẽ hũu nõ querya cõ os iffantes entrar no campo por salvar a raynha, disse a el rey, per dante todos os que estavõ ennas cortes, que elle queria por ella tomar 248 aquelle campo e poer o corpo aos irmãaos. E, quando el rey esto vyo, julgou o reto. E este dõ Ramiro era homen muy fremoso e muy esforçado em armas. E, quando os iffantes virõ que lhes cõviinha entrar ẽ campo com dom Ramiro, foronsse a hũu moesteiro e confessaronsse a hũu santo homẽ de boa vida e contaronlhe toda a razon e como avyã aquello dicto contra sua madre con grande falssidade, nõ cuydando que hi ouvesse o reto; e contarõlhe todo o engano como e por que fora cuydado.

E o santo homẽ, logo que os ouve ouvydos em sua confisson, foisse logo a el rey e contoulhe todo o ẽgano como a raynha era acusada cõ grande falssydade e que perdoasse aos iffantes e mandasse soltar a raynha. / [175a] E el rey creo ao homẽ bõo e soltoua logo. E o reto foy partido. E per esta guisa foy a raynha dona Elvira livre de tal perigoo per dom Ramiro, seu enteado.

E, estando el rey muy alegre por este feito aver tam boa fym, veeo ante elle a raynha com sua pelle vestida, segundo o custume daquelle tempo, e disse:

– Senhor, o iffante dom Garcia, meu filho, o qual devera de aguardar e requerer toda mynha honrra e proveito a todo seu poder, assacoume testemunho falsso per que morresse a traiçom. E, por esto, eu o desherdo do reyno de Castella e d’Aragõ, que som meus, pera todo sempre, e outrossy das mynhas arras em toda minha vida.

E entom chamou dom Ramiro e disselhe:

– Dom Ramiro, vos sodes meu enteado e, segundo razon, mais me deverades buscar dampno que prol. E, por a vossa bondade, me livrastes de morte. E por esto vos tomo por filho e vos herdo pera todo sempre ẽno reyno d’Aragon, vos e todollos que de vos veherem, e outrossi das mynhas arras; e esto meesmo vos farya de Navarra, se meu fosse.

Entõ o tomou e meteo per hũa manga da pelle e sacouho pella outra, segundo era custume daquelle tempo de tomar os filhos adoctivos. E, vẽedo el rey ẽ como a raynha era sanhuda de seus filhos, rogouha que lhes perdoasse aquelle erro que lhe fezeron. E ella, veendo como a el rogava, 249 ouvelhes de perdoar, pero cõ tal preito e condiçon que dom Garcia, seu filho, nõ herdasse em Castella.

E assi aconteceu despois, que quando el rey dom Sancho partio aos filhos, teve por bem de dar a dõ Garcia, que era o filho mayor, o reyno de Navarra con o ducado de Cantabrya, e a dõ Fernãdo, o de Castela, e a dõ Ramyro, o reyno d’Aragõ. / [175b] E este partimẽto fez el rey despois per consselho e mandado da raynha, que nõ quis que os reynos fossem partidos em outra guysa.

E, em aquelle tempo, era Aragom muy pequena terra. Mas os reis o foron despois acrecentando do que tomaron aos mouros. E, por que este dom Ramyro foy o primeiro rey d’Aragon, porẽ leixaremos agora de fallar delle, ca despois tornaremos a elle e o seu linhagẽ, e tornaremos a seu padre el rey dom Sancho de Navarra.

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