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Características e especificidades da modalidade

2.2 Formação esportiva em ginástica rítmica: as especificidades da modalidade

2.2.1 Características e especificidades da modalidade

A ginástica rítmica é uma modalidade olímpica, que pela regulamentação oficial da Federação Internacional de Ginástica (FIG), compreende apenas atletas do sexo feminino. Caracteriza-se por aliar o trabalho corporal, ao uso da música e ao manuseio de aparelhos de pequeno porte, tais como a corda, a bola, o arco, as maças e a fita (TOLEDO, 2009; BARBOSA- RINALDI, 2009; ZETARUK, et al2006). Seus movimentos corporais compreendem elementos de saltos, equilíbrios e rotações, que exigem das ginastas alto grau de flexibilidade e preparo

físico em geral, para que se alcance a plástica e estética prevista pelas regras do Código de Pontuação oficial da modalidade.

São elementos corporais bastante complexos que se tornam ainda mais difíceis ao aliar o trabalho com os aparelhos e o ritmo da música e sendo assim, o sucesso de qualquer programa de identificação e desenvolvimento de talentos depende do claro entendimento das exigências do esporte (DOUDA, et. al., 2008). Dessa forma, o treinamento na ginástica rítmica é moldado de acordo com os diferentes níveis de competição – em cada nível, as atletas são obrigadas a dominar movimentos cada vez mais difíceis, estabelecidos pelos órgãos reguladores internacionais do esporte (LAW; CÔTÉ; ERICSSON, 2007).

As competições oficiais da categoria adulta de GR preveem um programa individual no qual a ginasta deve executar quatro exercícios, um com cada aparelho previsto pelo regulamento, para que possa concorrer ao concurso do individual geral, que nomeia a ginasta mais completa. A prova de conjuntos é realizada por cinco ginastas em duas apresentações: uma com cinco aparelhos iguais, denominada conjunto simples e outra com aparelhos diferentes (3+2), denominada de conjunto misto. As séries de exercícios têm a duração de 1’15’’ a 1’30’’ para o individual e 2’15’’ a 2’30’’para o conjunto e são apresentadas em um tablado de 13m x13m. As ginastas são avaliadas por uma banca de arbitragem, composta por aproximadamente 20 árbitros, divididos em dois quesitos: Dificuldade e Execução, sendo o primeiro responsável por avaliar o grau de dificuldade dos elementos corporais e do aparelho executados pela ginasta e o segundo por deduzir pontos por faltas artísticas e técnicas (FIG, 2018).

No quesito Dificuldade, a ginasta deve cumprir algumas exigências, como dificuldades corporais de saltos, equilíbrios e rotações, sequências de passos de dança, tudo aliado aos movimentos técnicos dos aparelhos. Além disso, deve realizar movimentos complexos de lançamento e recuperação dos aparelhos, realizando rotações e movimentos pré-acrobáticos durante a fase de voo do aparelho (Elementos Dinâmicos de Rotação), e combinação de manejos extraordinários dos aparelhos, chamados de Dificuldade de Aparelho, para somar mais pontos em sua rotina. No quesito Execução são avaliados os mínimos detalhes do movimento corporal e do aparelho, assim como dos aspectos artísticos, sendo previstas deduções por posicionamento incorreto dos segmentos corporais, movimentos incompletos, manejo incorreto dos aparelhos, desequilíbrios, quedas de ginastas e aparelhos, perda de ritmo, falta de unidade entre os elementos, entre outros, nos mínimos detalhes (FIG, 2018). A Figura 11 apresenta o esquema dos quesitos levados em consideração para a avaliação na ginástica rítmica, segundo o Código de Pontuação (FIG, 2018):

Figura 11. Esquema da avaliação na ginástica rítmica

Fonte: Elaborado pela autora. Adaptado de FIG (2018).

O alto grau de complexidade das tarefas e a exigência da perfeição na execução acaba trazendo a necessidade de um início precoce na modalidade, tendo em vista o longo percurso até a completa aquisição das habilidades necessárias, mesmo que a ginasta já tenha perfil desejado para a modalidade. Assim, a participação na GR geralmente tem seu início por volta de seis anos de idade, para que haja tempo para a aquisição e aprimoramento de habilidades tão específicas e também para o início em competições na primeira categoria prevista oficialmente pela CBG aos nove anos de idade, o pré-infantil. Esse início em baixas idades, muitas vezes ligado à especialização e investimento precoce na carreira esportiva, pode trazer impactos à saúde das ginastas, aumentando sobremaneira o risco de lesões (LAW; CÔTÉ; ERICSSON, 2007).

De acordo com Tsukamoto e Nunomura (2005), existe uma tendência em antecipar cada vez mais o início em modalidades esportivas, a fim de alcançar rapidamente o sucesso,

porém as autoras apontam que essa atitude é contrária às necessidades das crianças, principalmente por desconsiderar a importância da variedade de experiências nessa fase. Antualpa (2011) afirma que mesmo na iniciação esportiva na GR, o objetivo dos trabalhos tem sido voltado para o treinamento de futuras atletas, selecionando apenas as crianças que têm aptidão para a prática competitiva. Esse pensamento é justificado por Lanaro Filho e Bohme (2001) pela necessidade do aproveitamento das fases para obtenção de determinados domínios motores ou melhoria de alguma capacidades físicas como, por exemplo, o alto grau de flexibilidade nas articulações, o que segundo os autores só é possível por volta dos seis aos nove anos de idade.

Assim, ao pensarmos a iniciação esportiva na GR, notamos que as características próprias do esporte nos levam a trabalhar com crianças muito novas e, justamente por isso, mais do que pensar a evolução da ginasta, devemos pensar o seu crescimento e desenvolvimento como ser humano. Normalmente ginastas que alcançam o nível internacional, se envolvem desde cedo apenas em poucas atividades antes de se especializarem na ginástica rítmica, e mesmo assim, elas são relacionadas de alguma forma à modalidade, como ballet ou música (LAW; CÔTÉ; ERICSSON, 2007).

Ao reproduzir as exigências das competições da categoria adulta para as ginastas iniciantes, acreditamos que não se esteja contribuindo para uma formação esportiva que leve em consideração os diferentes aspectos do desenvolvimento da criança, pensando em uma formação em longo prazo. Para tanto, é comum em algumas modalidades, inclusive na ginástica, a utilização de festivais esportivos, com diferentes denominações (copas, torneios, festivais, troféu, etc.), que promovem alguns ajustes na estrutura e regras buscando a adequação ao público.

Arena e Böhme (2004) já apontavam para esse caminho na ginástica, nas categorias de base da GR previstas pela Confederação Brasileira de Ginástica (pré-infantil e infantil). Nessas categorias, segundo os autores, em sua pesquisa em federações esportivas, nos regulamentos da CBG, existe a inserção da série de mãos livres, ou seja, sem aparelhos e, a execução de apenas duas provas, com regulamentos adaptados para a idade. Os mesmos aspectos foram encontrados na pesquisa semelhante, que investigou as alterações propostas para as competições de base pelas federações de diversos esportes no Paraná, e na ginástica encontrou, juntamente com o handebol e basquetebol, as maiores mudanças estruturais (MILISTETD, et al, 2014).

Apesar disso, uma análise sobre o sistema competitivo da ginástica artística feminina no Brasil, com foco nas categorias de base, observou que apesar das diversas adequações feitas nas competições para crianças, estas se mostraram insuficientes para atender tanto as

necessidades de formação técnica, quanto às capacidades e interesses das atletas. Além disso, o formato das competições analisadas se mostrou muito próximo ao adotado nas competições adultas (KUMAKURA, 2018). Apesar de não se tratar da mesma modalidade, a estrutura das competições nacionais da modalidade é semelhante à da GR.

As federações estaduais normalmente seguem os regulamentos previstos pela CBG (do pré-infantil ao adulto)centro, para que haja a possibilidade de participação de suas equipes em eventos nacionais, porém, como a entidade não apresenta nenhum indicativo ou orientação sobre como devem acontecer os eventos para as idades anteriores ao pré-infantil, percebemos que até mesmo a nomenclatura dessas categorias – mirim, estreante, iniciante, pré-equipe – é bastante divergente, de estado para estado.

Assim, consideramos importante que haja uma orientação para evitar que o esporte adulto seja reproduzido nos eventos desde a iniciação, a fim de proporcionar às crianças envolvidas uma formação esportiva de qualidade, que respeite as etapas de seu desenvolvimento, nos mais diferentes aspectos relacionados ao esporte; que a criança seja estimulada a participar dos eventos, sem cobranças excessivas de resultados e com premiações incentivadoras da prática; que ela possa se divertir e se sentir valorizada no que é capaz de aprender em cada fase de sua vida; que a participação nos eventos possam estimular o prazer pela prática e a vida ativa no futuro, além de proporcionar o desenvolvimento das habilidades técnicas.

Dessa forma, julgamos necessário compreender quais são as características dos eventos de ginástica rítmica no Brasil, para que possamos refletir sobre essas estruturas e as reais necessidades de ajustes para as categorias de base da modalidade.