• Nenhum resultado encontrado

Categoria 3 – Quando consigo ser atendido, sou bem atendido

4. TRAJETÓRIA METODOLÓGICA

4.8 Desfechos primário e secundário

5.2.1 Entrevista em profundidade com idosos do Dendê

5.2.1.3 Categoria 3 – Quando consigo ser atendido, sou bem atendido

O SUS realiza anualmente 531 milhões de consultas médicas, segundo dados do Ministério da Saúde (BRASIL, 2013). Portanto, o ato de se consultar com um médico passou a ser uma ocorrência mais comum entre boa parte da população brasileira. No livro A Nova Consulta, Pendleton et al. (2011, p. 53) tratam de elementos que afetam o conteúdo e/ou os seus resultados das consultas. Na perspectiva do paciente, temos várias dimensões: física (como o paciente se sente); psicológica (percepção e entendimento do mundo frente a uma complexa teia de ideias, crenças, emoções, expectativas) e social (influência da família, comunidade, religiosa, demográfica). Em relação aos resultados imediatos da consulta, há evidências de correlações significativamente positivas entre a satisfação do paciente e três aspectos do comportamento médico: prestar informação, estabelecimento de uma parceria e a fala positiva.

[...] O atendimento do posto, pra mim aqui, como já disseram uma vez aqui, foi ótimo, lá que eu me curei, só não fiquei foi bom, mas me curei. Fiquei curado, bem dizer por completo. Problema de cigarro, os doutô foi muito bom (OLAVO, 75 anos, homem) [...] A dotora dessa rua aqui é boa, consuta bem, mas qualquer coisa que chegar lá ela me atende bem. Agora não tinha como nossa Unifor, sinto muita falta, gostava mesmo era do Nami. Eu tive muito doente e as pessoas ali me ajudaram tanto, só Deus pra dá a elas o que eu não posso arecompensar. (ADÉLIA, 72 anos, mulher) [...] não, as vez que consegui, por né fácil, o dotô me recebe bem, me ouve, passa meus remédios. Nada pra falar dela. (CORA, 61 anos, mulher).

O levantamento suplementar de saúde da PNAD 2008 demonstra que 67,7% da população residente brasileira realizam consultas médicas nos 12 meses anteriores à data da entrevista. Em relação às pessoas idosas de 65 anos ou mais, o percentual foi de 82,3%. Quanto à avaliação do atendimento, 86,4% avaliaram como “muito bom ou bom”, sendo que, de todos os atendimentos, 58,6% foram realizados em instituições públicas (IBGE, 2010). Para Hollanda et al. (2012), citados por Mendes et al (2013), a baixa expectativa em relação ao serviço pode conduzir a maior satisfação, como elevado grau de exigência pode levar a menor satisfação com o serviço. Segundo esses autores, a literatura revela uma satisfação elevada de usuários, sobretudo entre os médicos e enfermeiros.

Os idosos do Dendê, quando atendidos se mostram satisfeitos com o atendimento prestado no Centro de Saúde. No Brasil, de acordo com a PNAD 2008, o posto ou centro de saúde foi o local mais declarado como normalmente procurado e, deste, os principais usuários são pessoas pertencentes às classes de rendimento mensal domiciliar per capita mais baixas. Nos domicílios com rendimento per capita de até ¼ do salário-mínimo, 77,2% das pessoas procuravam regularmente o posto (IBGE, 2010). Os idosos do Dendê, como referido anteriormente, possuem baixo poder aquisitivo, ínfima ou nenhuma escolaridade, vivem em moradias simples, sem saneamento básico.

Com a dura realidade vivida pelos longevos entrevistados, nesse momento, é possível supor que a garantia do atendimento médico está ligada à satisfação do usuário. De acordo com Fitton e Acheson (1979), citados por Pendleton et al (2011, p. 46), os pacientes não parecem fazer grandes esforços para procurar médicos específicos e a maioria parece relativamente satisfeita com seus médicos. Para esses autores, os pacientes parecem racionalizar a ideia de que o tipo de médico que querem é o tipo de médico que têm.

[...] O que eu acho aí é o seguinte, só há um negócio errado aí, é o seguinte. Aí, tudo até, eu até fui bem atendido aí pelo dotô, graças a Deus num fui mal atendido. Eu só acho ruim aí é você quer fazer o um exame fica na fila de espera (MÁRIO, 69 anos, homem) [...] óia, se a gente tenta, tenta vê o doutô é porque precisa, ou você acha que quero tá dentro do posto toda hora? Nas necessidade eu brigo pra ser atendida. O doutô já sabe (risos). As vez, reclama, mas num deixa de atender. Nóis tudo fala bem dele.

(CECÍLIA, 64 anos, mulher). [...] Vez em quando as autoridades fala, não

porque tem que ter a proteção ao idoso, porque num sei que, o idoso já trabalhou muito, porque num sei que, quando a gente chega nos canto, a única prioridade que você tem é receber uma senha de prioridade. Num tô, reclamo nem do posto, porque do atendimento, nem nada, tô falando é não tinha o atendimento, quando ela atendia, tudo bem, as pessoas daí são gente boa, tá entendendo? O atendimento do médico é bom! (CARLOS, 65 anos,

homem).

Em outra perspectiva, de acesso à informação e reconhecimentos dos seus direitos, a avaliação de satisfação realizada pelos usuários idosos pode contribuem no sentido de monitorar a qualidade dos serviços de saúde e de avaliar a eficácia das medidas a serem implementadas, tornando-se, pois, um instrumento de aperfeiçoamento de estratégias da gestão. A satisfação dos usuários pode ocorrer quando as suas necessidades e expectativas são satisfeitas, levando a percepções mais positivas e no alcance dos resultados esperados (CRUZ e MELLEIRO, 2010, citado por MENDES et al, 2013). A participação dos usuários na avaliação dos serviços de saúde torna-se a cada dia mais essencial, pois há contribuições realistas e pertinentes na trilha da melhoria dos cuidados de saúde.

Na segunda fase – discursiva, o hermeneuta deve voltar a visão para os aspectos internos da forma simbólica. Desta maneira, buscamos, por meio da interpretação das entrevistas em profundidade, trabalhar as falas gravadas, bem como as expressões, gestos e risos registrados no diário de campo, realizando uma análise diferenciada na identificação de padrões de relações contidos nessas formas simbólicas. Nesse processo, o contexto sócio- histórico não foi esquecido, havendo um esforço de tentar relacionar com as formas simbólicas, interpretando e reinterpretando.

Dessa análise qualitativa foram identificadas três categorias de análise, versando sobre: a dificuldade de acesso ao serviço de saúde; dificuldade de consulta com o médico; e a satisfação com o atendimento prestado pelos médicos. Sabemos que essas categorias estão longe de privilegiar vários assuntos relevantes relatados pelos os idosos, porém, esses foram os assuntos que se destacaram em praticamente todas as entrevistas. Por outro lado, as duas

fases da Hermenêutica da Profundidade já discutidas, com seus enfoques quantitativo e qualitativo, são complementares. Por vezes, identificamos numericamente os fenômenos, como quando identificamos o fato de que cerca de dois terços dos idosos tinham a dificuldade para se conseguir uma consulta médica ou agendar uma consulta de revisão, e, ao mesmo tempo, vimos esse tema se transformar em uma categoria e ser aprofundado em seus significados mais essenciais.