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Categorias argumentativas: um caminho para compreender e transformar contextos escolares

CANAIS ASSÍNCRONOS

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2.5 Categorias de Análise

2.5.2 Categorias argumentativas: um caminho para compreender e transformar contextos escolares

É pressuposto, como afirmei anteriormente, que as categorias enunciativas, discursivas e linguísticas se realizam em uma relação de interdependência, ocorrendo de forma intimamente conectadas.

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O primeiro desafio no paradigma sócio-histórico-cultural é compreender o sujeito e suas relações com o mundo. Dessa forma, observar o aspecto enunciativo que envolve a atividade em discussão é fundamental, uma vez que, segundo Liberali (2013, p. 63), “as características enunciativas focalizam o contexto em que o evento é realizado, a dialética entre o local, momento, veículo, participantes, objetivos e conteúdos a serem abordados e seus modos concretos de produção e realização”.

Considero, neste estudo, as categorias enunciativas: o momento físico e social da interação; o papel social dos interlocutores; e os objetivos da interação. Com elas pretendo conhecer o contexto de produção das falas e a forma de agir dos sujeitos em seus papéis, seus objetivos nas interações e as relações estabelecidas entre os sujeitos em função desse contexto e de sua transformação.

Categorias Discursivas da Argumentação

Outra forma de analisar a argumentação é por suas características discursivas. Liberali (2013, p. 66) destaca que “as características discursivas são compreendidas a partir de quatro aspectos centrais com relação ao modo como o texto pode ser disposto: o plano organizacional, a organização temática, o foco sequencial e a articulação entre as ideias apresentadas”.

Esta pesquisa trata especificamente a organização temática e a articulação entre as ideias apresentadas. Para tanto, a primeira abordagem baseia-se nos conceitos de

desenvolvimento e pertinência apresentados por Pontecorvo (2005); e a discussão dos

modos de articulação das ideias terá como base os modos de articulação abordados por Liberali (2013) e a categorização de perguntas proposta por Ninin (2013).

Desenvolvimento e Pertinência

Um encontro entre duas ou mais pessoas pode resultar em uma interação muito breve ou se estender por longo diálogo. Podem tratar de um assunto, sem dele se desviar, ou compreender um emaranhado temático em que, muitas vezes, os falantes se perdem sem sequer concluir raciocínios que pareciam primordiais à comunicação do grupo. Os caminhos que este suposto diálogo pode tomar estão relacionados ao que

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Pontecorvo (2005) chamou de desenvolvimento e pertinência de uma discussão de caráter argumentativo em uma interação.

Os conceitos de desenvolvimento e pertinência consideram “a discussão com um raciocínio exteriorizado coletivo, no qual o conhecimento se constrói mediante a concatenação dos argumentos por meio de um pensamento coletivo” (PONTECORVO, 2005, p. 69). Ou seja, é como se iniciássemos a escrita de um texto em um círculo de pessoas que fossem passando seu texto para o colega ao lado para que desse continuidade à história. Ao final, o que vale é o todo. Interessa a verificação da continuidade coerente do todo ou dos seus desvios e suas causas.

O desenvolvimento e o não-desenvolvimento são assim definidos:

Em termos específicos, entendemos por desenvolvimento a dimensão que se manifesta no fato de que o fio condutor do raciocínio se mantém de forma coerente quando passa de um interlocutor para o outro, fazendo avançar e progredir, coletivamente, a análise, bem como a interpretação e a definição do objeto de discurso, mediante a introdução de novos elementos e de novas perspectivas. O não-desenvolvimento verifica-se tipicamente quando o discurso intrinca-se e se encadeia ou quando há uma situação de inércia, de bloqueio do raciocínio coletivo (PONTECORVO, 2005, p. 69).

Já a pertinência recebe a seguinte definição:

A dimensão da pertinência possibilita, ao contrário, distinguir se a progressão (ou não) do discurso coloca-se no tema proposto (geralmente) pelo professor e compartilhado pelos interlocutores, ou se existem desvios mais ou menos importantes do objeto principal: desvios que podem também perfeitamente se caracterizar no plano do desenvolvimento, mas não serem em absoluto pertinentes (PONTECORVO, 2005, p. 69).

A autora aponta como categorias que marcam o desenvolvimento: trazer elementos novos, relacionar, delimitar, contrapor-se argumentando, compor relações de nível mais alto, generalizar, problematizar, reestruturar. E como categorias que marcam o não-desenvolvimento: repetir, confirmar, referir-se a uma experiência pessoal (PONTECORVO, 2005, p. 70). Santiago (2013, p. 110) complementa as categorias que demarcam o não-desenvolvimento, inserindo: dar réplicas simples, não sustentar um ponto de vista, interromper o raciocínio coletivo.

Santiago (2013, p. 110) define pertinência como a “dimensão que se manifesta quando há progressão no tema do discurso proposto” e tem como característica “fazer comentários e questionamentos que se mantenham no tema proposto”. E considera que a não-pertinência “manifesta-se quando não há progressão do tema; quando há desvios

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do objeto principal” e é caracterizada por “fazer comentários e questionamentos que resultem em desvio do tema principal”.

Assim, o desenvolvimento permite considerar que a temática avança e progride coletivamente, enquanto o não-desenvolvimento refere-se a uma situação de inércia na elaboração temática. Já a dimensão de pertinência indica se o tema proposto foi seguido ou desviado, comprometendo assim a progressão (ou não) do discurso (LIBERALI, 2013, p. 67).

Modos de Articulação Discursiva

O processo de construção do discurso é complexo e carrega muitas marcas de quem o produz e de quem influencia essa produção. Poderíamos dizer, em síntese, que a enunciação mantém marcas do locutor e do interlocutor, e que compreendê-las no discurso pode aproximar os sujeitos da compreensão dos sentidos de cada um. Orsolini (2005, p. 126) considera que “os enunciados na conversação projetam um possível (e provável) desenvolvimento do discurso”, daí a importância de sua compreensão. Liberali (2013, p. 68), por sua vez, aponta que “na construção do discurso, um aspecto central da argumentação é a forma como ideias, posições, pontos de vista são apresentados, contrastados, sustentados, acordados”.

Quanto à análise dos modos de articulação do discurso, Orsolini (2005) indica que seja feita em dois momentos: na primeira análise deve-se observar se os modos de articulação se estruturam de forma simples (com breves respostas ou colocações) ou elaboradas (de forma mais complexas e longas). Na sequência deve-se considerar a função que ocupam na articulação discursiva. Liberali (2013, p. 68-71) reúne alguns modos de articulação que permitem ver o entrelaçamento das vozes dos participantes no discurso, os quais transcrevo no quadro abaixo:

QUADRO 17: Modos de articulação do discurso

MODO DE

ARTICULAÇÃO DEFINIÇÃO

Exórdio Abertura do tema ou introdução e estabelecimento de contrato com os interlocutores. Questão controversa Questão que cria possibilidade de respostas com perspectivas diversas e permite aos interlocutores assumirem posicionamento. Apresentação de ponto

177 Espelhamento Recolocação do que foi apresentado por outro interlocutor de forma parafraseada ou reproduzida. Espelhamento com

pedido de dis/concordância

Uso de espelhamento como forma de recolocação da questão controversa, porém com solicitação do posicionamento de outro interlocutor.

Concordância com ponto de vista

Aceitação da ideia apresentada com/sem acréscimo de novas possibilidades de interpretação do tema.

Discordância/contestação

do ponto de vista Apresentação de oposição ao ponto de vista expresso, sem necessariamente expandir em um novo posicionamento. Negação/refutação de

argumento

Não aceitação de suporte apresentado para o ponto de vista, mesmo que o posicionamento do enunciador seja o mesmo daquele de quem nega o argumento.

Acordo ou síntese Tentativa de encontrar nova posição que agregue diferentes posicionamentos a partir de concessões. Pedido/apresentação de

contra-argumento

Solicitação ou apresentação de posição distinta da que está sendo discutida ou da que foi proposta por outro interlocutor.

Questões para

entrelaçamento de falas Modos de questionar que contribuem para que os interlocutores percebam ou criem relações entre suas falas e de outros participantes do evento. Pedido/apresentação de

sustentação Pode ocorrer com a reprodução de uma voz de autoridade.

Fonte: Adaptado de Liberali (2013, p. 68-71)