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CAPÍTULO 3 CONCEÇÕES E PRÁTICAS DE SUPERVISÃO

3.4. O ciclo da supervisão: fases e tarefas

A supervisão, no contexto da formação inicial de professores, comporta diversas fases, pois é um processo que tem a duração de nove meses. Como referem Alarcão e Tavares, a supervisão “ (…) é uma acção multifacetada, faseada, continuada e cíclica. Digamos que o processo de crescimento profissional se desenrola em movimentos helicoidais” (2003, p.80).

Assim, de acordo com os mesmos autores, a supervisão, independentemente do modelo que segue, comporta quatro fases distintas, sendo conveniente “ (…) proceder-se, de tempos a tempos, à análise e avaliação do processo realizado e dos efeitos obtidos, podendo, portanto,

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considerar-se ainda uma quinta fase, de balanço ou avaliação do próprio processo” (Alarcão & Tavares, 2003, p.80).

1. A primeira fase é o encontro pré-observação:

A pré-observação constitui um momento fundamental neste processo formativo, pois a qualidade da pós-observação depende em grande parte do sucesso da pré-observação.

Este encontro tem muito a ver com “a planificação da aula, com as questões de indisciplina, com a estrutura da disciplina a ensinar” (Alarcão & Tavares, 2003, p.82), onde são tomadas as decisões e definidos os objetivos a atingir na fase seguinte. Desta forma, esta fase representa uma ocasião de intercâmbio entre o supervisor e o estagiário que tem lugar antes da observação da ação do estagiário. É um momento de reflexão conjunta em que o estagiário é levado a declarar os seus pontos de vista quanto a questões de carácter curricular e analisa a adequação do ensino às características pessoais dos alunos e às características contextuais da escola onde desenvolve a prática pedagógica.

Este encontro tem como objetivos “ajudar o professor na análise e tentativa de resolução dos problemas ou inquietações que se lhe deparam e que podem ir desde o modo de preparar uma aula, de disciplinar os alunos, de os encorajar, de estruturar a matéria até qualquer outro assunto que mereça ser analisado, observado, resolvido; e decidir que aspecto(s) vai (ou vão) ser observado(s) (Alarcão & Tavares, 2003, p.81).

Por outro lado, ao supervisor “ (…) cabe identificar os problemas e manifestar as inquietações, devendo o supervisor escolher e utilizar as estratégias que melhor ajudem o professor a consegui-lo” (Alarcão & Tavares, 2003, p.81). Neste sentido, o supervisor deverá encorajar o estagiário a analisar as diferentes componentes da sua planificação, levando-o a prever e a selecionar determinadas tomadas de decisão com vista à resolução de problemas. Aqui é fundamental que “ (…) o supervisor seja bem claro relativamente à sua concepção de supervisão, aos seus objetivos e à sua atitude para com o formando. Imperioso se torna também que as funções de cada um no processo de supervisão sejam inequivocamente definidas. Há como que um contrato a estabelecer, a negociar entre ambas as partes” (Alarcão & Tavares, 2003, p.81).

Além disso, é também importante que as interações afetivo-relacionais se conjugam, no sentido de criar um clima que favoreça a colaboração, a entreajuda entre os atores do núcleo de estágio, de modo a facilitar e a tornar mais eficaz este processo de formação. Como sublinham Alarcão e Tavares o trabalho de colaboração “ajuda a criar uma relação que se aproxime tanto quanto possível da relação que se estabelece entre colegas e a criar o tal

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espírito de comprometimento, de contrato, de experimentação conjunta de que fala Schön” (2003, p.83).

Não podemos deixar de referir, que é importante que este encontro se perspetive como uma atividade de resolução de problemas. Primeiro, porque a atividade docente é essencialmente uma atividade de resolução de problemas. Segundo, porque o estagiário tem de “aprender fazendo”, compreendendo o que faz e agindo de forma a ultrapassar situações que se apresentem mais problemáticas e cujas soluções têm de passar por ele. Terceiro e por último, porque só assim o estagiário terá um papel ativo e poderá libertar-se progressivamente do supervisor e dar garantias de que no futuro continuará o seu desenvolvimento pessoal e profissional sem a presença e ajuda do supervisor.

2. A segunda fase é a observação propriamente dita:

A observação é uma estratégia que se relaciona com o campo educativo, ou seja, é elaborada uma ação estruturada baseada no processo de ensino e aprendizagem, de forma a alcançar os objetivos do ensino.

Na formação inicial de professores, a observação tem sido uma estratégia de formação muito utilizada na medida em que se lhe atribui um papel fundamental no processo de aquisição e desenvolvimento de conhecimentos do futuro professor. Observar o estagiário surge com a intenção de o ajudar a construir as suas práticas como docente e a modificar algumas atitudes com vista ao seu desenvolvimento pessoal e profissional.

Segundo os mesmos autores, o objeto da observação “pode recair num ou noutro aspecto: no aluno, no professor, na interação professor-aluno, no ambiente físico da sala de aula, no ambiente sócio-relacional, na utilização de materiais de ensino, na utilização do espaço ou do tempo, nos conteúdos, nos métodos, nas características dos sujeitos, etc” (Alarcão & Tavares, 2003, p.86).

Ainda para os mesmos autores, a observação compreende duas fases: “registo do que se vê e interpretação do sentido do que se viu” (Alarcão & Tavares, 2003, p.86).

Além disso, a observação e a avaliação são dois conceitos que aparecem muito associados na supervisão: “observar para avaliar é realmente um dos grandes objectivos da supervisão que praticamos na formação inicial” (Alarcão & Tavares, 2003, p.92).

Ora, para Alarcão e Tavares, um dos problemas que se coloca ao supervisor “é saber como deve observar, que estratégias de observação deve utilizar” (2003, p.86). Por isso nas

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décadas de 60 e 70 “houve a preocupação de construir instrumentos de observação que permitissem uma observação mais objectiva, válida e fiel” (Alarcão & Tavares, 2003, p.86).

Nesta linha de pensamento, uma das características de um bom observador é proceder a uma avaliação adequada e objetiva da realidade observada e posteriormente realizar uma interpretação e controlo dos resultados encontrados.

3. A terceira fase é a análise dos dados:

Como defendem Alarcão e Tavares, “quando o observador acaba a sua tarefa de observação, tem consigo um conjunto de dados que precisa de ordenar e analisar. A análise depende do tipo de abordagem utilizada e pode ser mais ou menos morosa” (2003, p.92).

Nesta fase o objetivo da análise dos dados é sempre o mesmo, independentemente do tipo de observação e dos dados recolhidos: “transformar a complexidade dos dados em bruto numa representação clara, sempre que possível visualizada, dos dados significativos” (Alarcão & Tavares, 2003, p.97).

4. A quarta e última fase é o encontro pós-observação:

Aqui o objetivo do encontro é diferente. Nesta fase, o supervisor e o estagiário, separadamente, analisam os dados recolhidos durante a aula face aos objetivos definidos e procedem a uma sistematização que torne possível a análise e interpretação desses dados, em conjunto, destacando-se as causas ou fatores que originaram a eficácia ou ineficácia da ação.

Como sublinha Alarcão este encontro tem a ver com “a discussão da congruência entre intenções e realizações, focalização no processo de ensino-aprendizagem e distinção entre comportamentos ocasionais e constantes” (1996, p.97). Em idêntica linha de pensamento, para Alarcão e Tavares, nesta fase o professor:

deve reflectir sobre o seu “eu” de professor e sobre o que se passou na sua interacção com os alunos para alterar, se necessário, um ou outro aspecto que não esteja em consonância com a sua função de agente de desenvolvimento e de aprendizagem. Ao fazê-lo, está a ser não apenas agente, mas também sujeito activo (2003, p.98).

Aqui o papel do supervisor consiste em “ajudá-lo a reflectir, a interpretar, a ver a realidade por detrás de números, categorias, incidentes ou descrições” (Alarcão & Tavares, 2003, p.98). O supervisor terá que fazer um esforço para descrever os factos observados de modo objetivo e deverá incutir no estagiário o mesmo espírito. Para isso o supervisor:

utilizará dados que recolheu e analisou, servir-se-á da interpretação que lhes deu, das dúvidas suscitadas a necessitar de esclarecimento por parte do professor, das hipóteses levantadas a discutir também com o

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professor e das estratégias de supervisão que melhor se ajustem à sua função de agente de desenvolvimento e aprendizagem (Alarcão & Tavares, 2003, p.98).

Ora, no encontro pós-observação o supervisor e o estagiário entram numa reflexão interativa sobre a ação realizada pelo estagiário. O objetivo da reflexão conjunta “ (…) visa um programa de acção a levar a cabo fundamentalmente pelo formando, que só resultará se este se sentir comprometido com ele, pelo que esse plano de acção deve brotar, sempre que possível, do próprio formando” (Alarcão & Tavares, 2003, p.99).

Além disso, o questionamento possibilita ao estagiário justificar algumas tomadas de decisão assumidas durante a sua prática pedagógica e a oportunidade de ampliar um leque de conhecimentos e perceções, contribuindo para o seu próprio desenvolvimento pessoal e profissional. O questionamento e a dúvida é a forma mais formativa para refletir sobre a ação do estagiário, pois o diálogo possibilita aprofundar as áreas onde o futuro professor manifesta mais dificuldades e que constituem problemas a serem ultrapassados.

Por outro lado, o uso do "feedback", que surge após a aula do estagiário, quer pelo supervisor, em situações de análise conjunta, quer por autoanálise, quer, ainda, por colegas estagiários, constitui uma das técnicas de formação mais tradicionais e é utilizado de modo sistemático. Convém referir que este “feedback” deverá assumir sempre um aspeto de carácter construtivo e formativo. Segundo Alarcão e Roldão,

O feedback sobressai como essencial ao apoio e à regulação. Já foram feitas referências à importância atribuída pelos alunos ao feedback sobre as suas reflexões escritas e à tentativa de identificar tipos de feedback utilizados: questionamento como pedido de esclarecimento, questionamento crítico ou estimulador, apoio/encorajamento, recomendação, síntese/balanço, esclarecimento conceptual e teórico (2008, p.55).

É ainda importante referir que tal como no encontro pós-observação, para que a supervisão decorra numa perspetiva de resolução de problemas é necessário que o estagiário tenha um papel ativo, que se estabeleça entre o supervisor e o futuro professor uma relação de trabalho isenta de tensões e baseada numa confiança sólida e fiável, pois só deste modo será possível que o professor confie ao supervisor preocupações e dificuldades. É preciso também desmistificar a avaliação sumativa como o aspeto mais importante do processo supervisivo.

Em suma, é importante enfatizar que em todas estas fases do ciclo da supervisão “deverá estar presente uma atitude pedagógico-relacional que visa a construção profissional e que, subjacente a todas estas fases, tem de estar um diálogo interpretativo e construtivo, na lógica de uma supervisão clínica, reflexiva e dialógica” (Alarcão & Tavares, 2003, p.81).

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Fig.3 – Fases do ciclo da supervisão, segundo Alarcão e Tavares (2003)

Encontro pré- observação Observação propriamen te dita Análise dos dados Encontro pós- observação

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