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Cinema com Carmen Miranda e Arlindo Machado: uma abordagem discursiva

1.1 A LINGUAGEM AUDIOVISUAL DE ARLINDO MACHADO A PARTIR DA

1.1.2 Cinema com Carmen Miranda e Arlindo Machado: uma abordagem discursiva

Nos filmes acima tratados – Serenata Tropical e Uma noite no Rio – podemos perceber as alterações feitas no estilo de vestir dos atores atuais e novas formas de interesse do comércio contemporâneo. Buscamos a cantora Daniela Mercury, em momentos distintos, figura 20 a 22 abaixo, para retratar essa figura atual que busca a imagem antiga de Carmen Miranda para reproduzir uma imagem já consagrada (Carmen Miranda) associada aos novos estilos da personagem (Daniela Mercury) e da música brasileira. Em apresentação atual, a cantora Daniela Mercury (fig. 20-22) usa como tema de Show Musical as vestes, o estilo de dançar, como gestos com os braços, roupas e músicas da atriz e cantora Carmen Miranda para divulgar seu novo disco. O show admite buscar esse entendimento maior já que retrata a imagem de Carmen. De acordo com o Site Carmen.Mirnada19 “a gravação do CD Canibália

de Daniela Mercury, lançado em 2009, busca encontrar Carmen Miranda na década de 1940.

Figuras 20-22: Fotos da cantora Daniela Mercury inspirada na figura de Carmen Miranda

Fonte: Daniela Mercury – site oficial (2012).

Nas décadas de 40 e 50, Carmen Miranda foi um personagem usado para imposição do “poder” do cinema de glamour que, direta ou indiretamente, abriu as portas para revolucionar o imaginário social e a identidade cultural das sociedades latino-americanas. Para fundamentar essa análise estamos ancorados na análise de discurso (doravante AD) de Patrick Charaudeau, que nos permitiu buscar o sentido da análise. Teoria essa que também nos possibilitou trabalhar com algumas técnicas usadas na metodologia da ciência social da hermenêutica de profundidade (doravante HP) de John Thompson, tratando com os conceitos de estruturas e ações que podemos perceber nas vestes (vestidos) e balangandãs (anéis e pulseiras nos braços) da cantora Daniela Mercury inspiradas no sucesso de Carmen Miranda.

Em HP trabalhamos a (re)interpretação o que nos leva a ideologia, logo percebemos nas figuras 20 à 22 os sistemas de ideias inseridas na popularidade de Carmen Miranda (fig.10-19) sendo retratada na figura da atual cantora Daniela Mercury (fig. 20-22). Como a HP busca a análise sócio histórica para verificarmos o que está implícito na imagem de Carmen Miranda e, sobretudo, não foi falado no cinema, logo percebemos a mesma imagem sendo usada na música com estilos diferentes. Carmen cantava samba20 e Daniela canta axé

music 21, ambas são músicas populares entre os brasileiros, porém em períodos distintos. Axé

e samba são vertentes musicais que tiveram seus sucessos em tempos diferentes, mesmo que o samba atual ainda busque o samba cantado por Carmen, fazendo modificações no instrumental ou mesmo perpetrando complementos e mudanças na letra e/ou no ritmo ou, ainda, regravado na voz de novos artistas. A música passa a ser meio de interação da sociedade cultural daquele momento vivido. Percebemos o intuito da cantora Daniela Mercury de fazer com que o espectador lembre-se de Carmen através de gestos (fig.22), o

20 Ainda no século XVIII é criada, no Rio de Janeiro, uma escola de música para filhos de escravos, de onde saíram talentosos músicos instrumentistas e cantores. Dentre eles estava o Padre José Maurício Nunes Garcia (1767-1830). Filho de escravos, músico nato, tocava diversos instrumentos. Compôs inúmeras obras sacras e profanas, de caráter erudito, cujo estilo se assemelhava ao de autores europeus da primeira metade do século XVIII. Desta forma, das melodias curtas, do ritmo bem marcado, onde a palavra e a dança se misturam a vários instrumentos de percussão, surge o “samba”, dança originariamente africana. Com a mistura de diversas tendências musicais, viajando pelo tempo, esta dança veio a se concentrar nas favelas do Rio de Janeiro com características tipicamente brasileiras. Ver: LOUREIRO (2001)

21O termo “Axé Music” foi cunhado em 1987 por um jornalista do sul do país, Hagamenon Brito, como forma pejorativa de classificar a música que emergia em Salvador e se espalhava pelo mundo. Este rótulo também é negado por muitos artistas baianos como Margareth Menezes e Carlinhos Brown, que o consideram extremamente redutor para todo o contexto de produção musical da Bahia. Não se fala em música mineira, carioca ou paulista, mas, numa tentativa de regionalização da música produzida na Bahia, é empregado em grande escala à nomenclatura “música baiana” para designar uma especificidade da MPB, o que faria estremecer os mais conservadores seria a ideia de classificá-la enquanto brasileira. A Axé-music não é considerada um gênero ou um movimento musical, mas uma etiqueta mercadológica usada para classificar uma vertente da música baiana que faz uso de uma fusão de ritmos como caribenhos, africanos e “elétricos” numa roupagem pop- rock, para se constituir como o invólucro do produto Bahia. Ver: PEREIRA (2010)

sorriso no rosto e as semelhanças nas roupas (fig.20). Mas com forte mudança no comprimento da saia (fig.22) e no penteado (20 e 21).

Tanto a AD quanto HP implicam recursos metodológicos, campo do saber, para avaliar experiências sociais, concepções discursivas e textuais. Mesmo sendo distintas, de alguma forma, estão relacionadas, pois trabalham a linguagem interpretativa. Já que a interpretação é a busca de produção de sentidos em um processo inacabado. O espectador atual fica livre para julgar as (de)igualdades entre as cantoras, no caso da referência de Carmen Miranda na apresentação de Daniela Mercury. Ainda, podemos tratar a (re)interpretação que busca o verdadeiro sentido do discurso associado à imagem da atriz. Simbolicamente Daniela representa, na atualidade, todo o contexto sócio histórico de Carmen. Vestes e gestos que representam a própria linguagem simbólica associada à imagem de Carmen Miranda dentro de um ritmo musical popular (axé) que combina com roupas, sinais e acessórios. A música baiana está diretamente relacionada com a figura de Carmen.

Trazendo novamente Arlindo Machado, a técnica da linguagem é usada para mobilizar o atual espectador de Daniela Mercury através da vídeoarte. Os seus shows ao vivo (fig. 20) são reproduzidos em DVD’s com técnicas desta nova geração dos videomakers. Indivíduos que acrescentam e modificam imagens de shows ao vivo sem realmente distinguir o “outro”, o que importa é dar sentido a obra através dos novos vidográficos para que alcance a legibilidade. Consequentemente, para sustentar a ideia das alterações dos vídeos pós- filmagem complementando o canto e dança de Daniela Mercury ao vivo com acréscimo de textos e outros vídeos e imagens que possibilitam contar e associar o contexto sócio histórico passado com o atual. Os espectadores brasileiros estão diretamente relacionados a essa identidade cultural, trabalham tanto a realidade quanto o imaginário cinematográfico (figura de Carmen Miranda), possibilitando retratar o passado com o atual. Atores, como Daniela Mercury, têm o seu papel de entretenimento (diversão) e cultura (música, roupas e bailarinos) ao buscar a folia trazendo histórias passadas (Carmen Miranda) retratadas nos shows.

Ao usarmos a AD buscamos essas três técnicas da HP complementarmente, já que expressões e fatos simbólicos na língua e na história de diferentes países são trabalhados na análise do período em que Carmen Miranda teve sua imagem fortemente veiculada pelo cinema. Para complementar e ajudar na analisa dos conflitos e das controvérsias que surgiram em torno desta temática, mito e poder, subcategorias metodológicas, foram trabalhados para fazer a desconstrução do discurso. Não há como afirmar, de acordo com as ideias de Patrick Charaudeau, que os indivíduos atuais ao ouvirem Daniela Mercury busquem a história de Carmen. No site oficial da cantora Daniela Mercury é postada lembranças de sua homenagem

ao centenário de Carmen Miranda em um de seus shows com roupas e canções inspiradas na atriz, desde a construção da base estética a gestual.

As produções atuais fazem uma nova linguística da imagem de Carmen e valorizam esta imagem representada através da cantora Daniela. Arlindo Machado (1988) considera que a pluralidade entre os meios sociais está representada na imagem. Podemos afirmar que o conhecimento de cada espectador influenciará na compreensão e valorização das vestes de Carmen em Daniela. Para alguns sujeitos mais marcados pela “Era de Ouro” a referência será a Carmen do rádio brasileiro e para outros indivíduos a Carmen do cinema de Hollywood conhecida por suas vestes de baiana.

Também há o fator da criatividade do “vídeo independente” no Brasil que surge na década de 80 – conforme citamos anteriormente Arlindo Machado – e consideramos que continua ganhando força nos anos 2000, mesmo não sendo uniforme e linear. Podemos notar na própria figura 20 e 22 que foi postada no site oficial da cantora Daniela Mercury na internet, mas registrada por indivíduos que não fazem parte do diversos ciclos profissionais de imprensa ou da própria cantora. Depois, as mesmas fotos são aproveitadas por outros amadores, em blogs, ou mesmo na própria mídia, para complementar um contexto de filmagens ou de documentários da cantora em sites de fãs ou de “fofocas”. Assim, o espectador passa a criar seus próprios vídeos. Com a queda do custo e o aumento da versatilidade na mídia eletrônica no Brasil, os fãs, curiosos e imprensa utilizam da internet como meio de interação e de ganho financeiro com outros sujeitos que tratem do mesmo tema.