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1.2 DISCURSO PUBLICITÁRIO NO CINEMA: CARMEN MIRANDA E OS FILMES

1.2.4 Discurso cinematográfico com Carmen Miranda

Pensando o discurso como meio promocional de uma imagem, abordamos o cinema hollywoodiano que soube fazer, em seus filmes, um discurso adequado para o mundo. Tratamos novamente a imagem de Carmen Miranda, já que foi a figura usada por Hollywood que melhor conseguiu discursar com o Brasil através da música, dança e figurino. Mendonça (1999) exemplifica o discurso no cinema citando a atriz e cantora Carmen Miranda, que por já admirar o cinema estrangeiro, especialmente o cinema hollywoodiano, facilitou sua submissão aos norte-americanos.

A atriz, mesmo nascida em Portugal, considerava-se brasileira e torcia para que o cinema brasileiro ascendesse. Carmen Miranda já era envolvida pelo discurso americano de que os EUA eram a melhor opção para um artista. Para Mendonça (1999), era “tão maciça a presença norte-americana em nossas telas que somente sua linguagem era considerada apropriada. Não passava pelos expedientes narrativos o debate acerca da identidade nacional no cinema Brasileiro, limitando-se aos temas.” (p.32). A “respeitável” Nação Americana conquistou Carmen Miranda, afirmando-se como país superior, logo a atriz ajudou os EUA a convencer os brasileiros do mesmo.

As atividades cinematográficas brasileiras eram instigadas por recursos modernos, como o estúdio Cinédia que foi uma das facilidades de inspiração que Hollywood proporcionou ao Brasil com interesse de transmitir seus filmes com maquinaria sofisticada e técnicas que alavancavam o setor da indústria cinematográfica. Mendonça (1999) afirma que Carmem Miranda tinha o discurso de representar o Brasil, os filmes carnavalescos logo teriam sua figura como obrigatória, tanto nos filmes nacionais como internacionais. A atriz e cantora virou símbolo brasileiro, discurso imposto pelo cinema.

Mas, devemos levar em conta outros acontecimentos e intenções. No Brasil, Carmen representava o samba do Rio nas telas do cinema, já tinha grande receptividade nas rádios com muitos discos vendidos. Em Hollywood, passou a ser rememorada como uma cantora

61 Nota: Questionando as origens de ritmos e instrumentos, não devemos esquecer que a mão que segura o pandeiro toca um instrumento que veio de Portugal para o Brasil e que passou a fazer parte do samba brasileiro. O pandeiro nesta animação do curta foi inserido na intenção de relacionar o ritmo musical apenas ao ritmo brasileiro, como se fosse um instrumento apenas em destaque das raízes brasileira. Instrumento que independente de sua origem foi associado ao samba brasileiro pelo filme da Disney.

popular entre os brasileiros e também como atriz. Assim, uniram a voz popular no Brasil e a imagem criada para os filmes de Hollywood com o objetivo maior de usar dessa figura para mediar relações da Política de Boa Vizinhança.

O discurso era formado de acordo com os interesses políticos, pois os americanos buscavam conquistar aliados para Segunda Guerra e, em consequência, viram um novo mercado para comercialização de seus filmes. O discurso era um e as intenções, outras. A falta de informação e a imaginação de um dia ser como a população americana fez com que os brasileiros se deixassem levar pelo discurso. Carmen teve sua figura valorizada no ritmo da moeda internacional, fez vários filmes em Hollywood, sendo sucesso não apenas nos EUA, mas também em diversos países.

Voltando ao estudo de Mendonça (1999), ele garante que a mensagem de Hollywood consistia em uma Carmen brasileira americanizada, para ser bem recebida pela população dos norte-americanos. Afirma que o discurso usado pelos EUA com o Brasil nem sempre funcionou, uma vez que os brasileiros queriam a divulgação da sua música no exterior, mas o país era conhecido pelo café. Inicialmente a americanização não foi aceita pelos brasileiros, o que fez Hollywood mudar o discurso de seus filmes no uso da imagem promocional de Carmen Miranda.

A própria Carmen Miranda cantou para os norte-americanos em crítica a sua americanização com a música “Good-bye, good-bye boy” em “adeus menino”, em seguida, um ano depois, cantou “Look, look para mim e vê como eu estou fagueira”. Hollywood passou a colocar nos filmes Carmen Miranda cantando em português e inglês, para fazer referência a ambos os países. Assim, começam a usar imagens do Brasil associadas à imagem de Carmen Miranda. Mendonça (1999) assegura que os questionamentos sobre influências culturais ainda eram em grande número pelos brasileiros. Independente se Carmen Miranda cantava inglês ou português o público norte-americano aplaudia, fosse nos palcos ou no cinema. A mesma “imagem-samba” não agradava a todos, pois na América Latina, que era o alvo, estava muito mais custosa à aceitação da imagem da atriz.

Existiu rejeição inicial, porém não podemos deixar de valorizar a luta estratégica dos governos que fizeram de Carmen Miranda um mito em sua propagação através da linguagem usada pelo cinema hollywoodiano. Nos EUA ela consagrou-se como musa da política de Boa Vizinhança. Os brasileiros gostaram de ver sua terra apresentada e vista pelos EUA. Para Mendonça (1999), os trajes de baiana e o samba criaram uma linguagem única para lembrança de sua imagem e, por isso, ela teve sua carreira reconhecida internacionalmente. Para o país,

as “expectativas de representação teriam de levar em conta todo o imaginário norte- americano, não apenas para o Brasil, mas para toda a América Latina.” (p.65).

Sendo assim, percebemos que o cinema hollywoodiano aproveitou-se do desejo dos brasileiros de parecer com os americanos. Tal atitude foi promovida através de cartazes, panfletos, jornais, rádios e cinema. A mídia contribuiu na divulgação da imagem de Carmen Miranda no cinema junto aos brasileiros e americanos. Não podemos deixar passar que Hollywood utilizou práticas do discurso publicitário em cartazes e nos poucos aparelhos televisivos da época – estamos falando de um período em que a TV ainda era usada em pontos comerciais, de modo que vários brasileiros pudessem assistir a um mesmo programa em um único aparelho de TV.

Os EUA conseguiram reforçar para população do Brasil que reconheciam a baiana e mostraram a possibilidade de os brasileiros fazerem parte daquele mundo americano. Buscando as teorias de Patrick Charaudeau podemos atribuir a posição do dever crer em Carmen Miranda como um laço de fazer crer que Brasil e EUA estavam juntos. Mas, refletimos que não seja apenas a influência do dever crer de fazer crer; o fato de ser uma população de terceiro mundo encantada por um país de primeiro mundo também influencia. O povo brasileiro permitiu-se acreditar que formar parceria com os americanos era algo lucrativo, deixou-se dominar por uma cultura que lhe parecia mais vantajosa que a sua. Podemos dizer que seja um deixar crer para um possível futuro de saber crer. De modo geral, a população deixou-se levar pelo fazer crer. Os próprios brasileiros ignoravam a “realidade” – parte da imprensa noticiava as verdadeiras intenções dos EUA – e imaginavam fazer parte de algo que sabiam que não fariam parte. Preferiram viver aquele momento de sonho ou podemos dizer até de ilusão.