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4 O PROCESSO PENAL NORTE-AMERICANO

4.3 NOÇÕES DO SISTEMA DE INSTRUÇÃO PROBATÓRIA PENAL

4.3.1 Princípios Constitucionais referentes à instrução processual

4.3.1.6 Cláusulas previstas na 6ª Emenda

Aderindo a grande relevância da 5ª Emenda ao processo penal norte-americano, a emenda subseqüente registra diversas cláusulas que elencam rol de garantias ao acusado da

prática de algum crime. Nesse diapasão, estão as cláusulas do julgamento rápido e do julgado público.140

No que tange ao princípio do julgamento rápido, correto afirmar que o mesmo tem por objetivo garantir ao acusado que sua situação processual seja, o mais breve possível, definida. Eis que esta é uma legítima expectativa.

Inobstante esta premissa, a Suprema corte, em Barker v. Wingo (407 US 514 – 1972), vias do juiz associado Lewis f. Powell, entendeu que o direito constitucional do imputado a um julgamento rápido não pode ser estabelecido como regra imutável. Diante deste precedente, consoante ressaltou Garcez Ramos, a Suprema Corte construiu um conjunto de quatro critérios, chamados de “fatores de Barker” (Barker factors), para estabelecer se algum atraso no transcorrer do processo feriu ou não os direitos do imputado, sendo eles “(a) a duração desse atraso; (b) a razão do atraso; (c) a alegação do imputado a respeito do atraso; e (d) a presença ou a ausência de prejuízo ao imputado decorrente do atraso”. 141

Quanto à previsão do direito a julgamento público, entende-se que em verdade não se trata somente de uma prerrogativa do imputado, mas sim um predicado do próprio sistema processual penal.

Assim, manifestando-se quanto ao tema, no caso In re Oliver, 333 US 257 (1948), a Suprema Corte, através do juiz associado Black manifestou que “sem publicidade, todos os outros controles são insuficientes; em comparação com a publicidade, todos os outros controles são de pouca eficiência”.142

Por conseguinte, estão sediadas na 6º Emenda as cláusulas do júri imparcial e do júri competente. O princípio do júri imparcial relaciona-se à necessidade, própria de todo e qualquer sistema democrático, de garantir a total isenção do órgão julgador. No tocante ao júri isso ainda é mais complicado, haja vista este órgão ser formado por várias pessoas. Nem mesmo a Suprema Corte conseguiu traçar critérios que possam objetivar e efetivar a imposição deste princípio.

Como ocorre no Tribunal do Júri brasileiro, todavia com mais veemência, o júri norte- americano está à mercê, hodiernamente, de questões étnicas. A composição do júri com

140 ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA. Constituição. Emenda Constitucional nº 6, de 25 de setembro de 1789. Disponível em: <http://portal.mj.gov.br/data/Pages>. Acesso em: 4 fev. 2011.

141 GARCEZ RAMOS. op. cit.

142 FINDLAW – FOR LEGAL PROFESSIONALS. Suprema Corte dos EUA: em Oliver RE, 333 EUA 257 (1948) 333 EUA 257. Discutido 11 de dezembro de 1947. Decidido 8 de março de 1948. Disponível em: <http://caselaw.lp.findlaw.com/scripts/getcase.pl?navby=case&court=us&vol=333&page=257>. Acesso em 28 jan. 2011.

pessoas em sua maioria negra ou maioria branca pode ser o pomo principal de qualquer decisão, deixando o cerne da questão analisada, ou seja, as provas, num segundo plano.

Os julgamentos dos imputados negros Rodney King e O. J. Simpson são exemplos desta realidade. No primeiro caso, mesmo com provas evidentes, o júri formado na sua maioria por brancos condenou Rodney. No segundo, numa composição de maioria negra, Simpson foi absolvido com argumentos de perseguições étnicas.

Por outro lado, quando dispõe que em todas as persecuções criminais o acusado terá direito a um julgamento por um júri do Estado-membro e do distrito onde o crime houver sido cometido, distrito esse que será previamente estabelecido por lei, a 6ª Emenda está prevendo a necessidade de se estabelecer uma competência territorial, tendo por base o local onde o crime foi praticado. Deve-se observar, ainda, a anterioridade da lei que cria o distrito e delimita a jurisdição de cada órgão, consoante interpretação da cláusula em análise.

Finalmente, consta ainda na 6ª Emenda algumas cláusulas diretamente ligadas ao direito de defesa do imputado, sendo elas do direito à informação, do direito à confrontação, da compulsoriedade processual e do direito ao aconselhamento técnico de um advogado.

Encontra-se consignada na referida Emenda Constitucional norte-americana que em todas as persecuções criminais, o acusado terá direito de ser informado sobre a natureza e a causa da acusação e de ser confrontado com as testemunhas de acusação. O direito à informação, prima facie, teria por finalidade garantir ao acusado total conhecimento da acusação e provas contra si existentes. Entretanto na prática ao princípio, mesmo existindo considerável crítica da doutrina local, não tem sido reconhecida toda esta abrangência. No escólio de Garcez Ramos:

Esse princípio da informação (information clause) pode ser encarado restritivamente, e só determinar o dever das autoridades de revelar a natureza jurídica da acusação e sua causa imediata, como, por exemplo, as provas de autoria e de materialidade e o nome das testemunhas. 143

Já no que tange ao direito de confrontação, o princípio estabelece ser direito do imputado o de confrontar ou ser confrontado com as testemunhas arroladas pela acusação. Certo que não se trata de um direito de conteúdo meramente formal, mas garantido do direito de contestar a real condição da testemunha, sua identidade, seus motivos e suas versões.

Esta garantia possui forte precedente em Illinois v. Allen (397 US 337 – 1970), quando o juiz associado Black manifestou que “um dos mais básicos direitos contidos na cláusula de confrontação é o do acusado estar presente na sala durante cada um dos momentos processuais de seu julgamento.144

Na mesma linha, visando garantir ao imputado o exercício de defesa, o princípio da compulsoriedade estabelece o direito de fazer coercitivamente, caso necessário, com que testemunhas prestem os informes que possa beneficiar-lhe. No escólio de Garcez Ramos:

O estado tem o direito, inclusive, de compelir pessoas a darem seu testemunho sobre casos que as podem incriminar (...). Por tal razão – e para equilibrar o processo penal a partir dessa perspectiva, na medida em que o Estado tem, e o acusado não tem, meios e modos de providenciar testemunhas em favor de causas de seu interesse – é que a 6ª emenda estendeu esse direito ao imputado em processo penal. Com o princípio, fica garantido também ao imputado o direito de obter colaboração do poder coercitivo do Estado para a obtenção de testemunhos em seu favor.145

Por conseguinte, há que se aclarar que o direito do imputado não é absoluto, eis que se limita compulsoriedade processual para a oitiva, e conseqüente produção de prova relevante, não se prestando simplesmente como forma de chegar a oitiva de alguma testemunha que não preste informações que acresçam ao processo.

Em análise derradeira, o direito ao aconselhamento técnico de advogado pode parecer com a obrigatoriedade da defesa técnica, como ocorre no direito processual penal brasileiro, entrementes está não é a realidade. O processo penal norte-americano permite a autodefesa do imputado, resguardando-se apenas no dever de indicar um advogado (stand-by counset) que, no decorrer dos atos processuais, permanecerá ao seu lado, para atuar quando aquele entender importante sua intervenção.

Através do precedente da Suprema Corte em Faretta v. Califórnia (422 US 806 – 1975), na manifestação do juiz associado Stewart, firmou entendimento que:

144 FINDLAW – FOR LEGAL PROFESSIONALS. Suprema Corte dos EUA. Illinois v. Allen, 397 EUA 337 (1970) 397 EUA 337. Estado de Illinois, peticionário, v. William Allen. n. 606. Discutido 24 de fevereiro de 1970. Decidido 31 março de 1970. Disponível em:

<http://caselaw.lp.findlaw.com/scripts/getcase.pl?navby=case&court=us&vol=397&page=337>. Acesso em 28 jan. 2011.

a Sexta Emenda, feita aplicável aos estados aos Estados-membros pela Décima Quarta Emenda, garante que um acusado em uma corte estadual tem um direito constitucional à auto-representação e que pode conduzir a própria defesa se voluntária e inteligentemente optar por agir assim; e, neste caso, erram as cortes estaduais ao forçarem-no, contra sua vontade, a aceitar um defensor dativo e ao denegarem-lhe seu pedido para conduzir a própria defesa.146

Destarte, a previsão da 6ª Emenda no tocante ao direito de aconselhamento com advogado pode ser relativizado por manifestação de vontade do próprio imputado, já que no processo penal norte-americano a defesa por excelência é aquela exercida pelo acusado.