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As relações de cooperação jurídica em matéria penal entre Brasil e Estados Unidos da América e suas implicações no âmbito interno

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Academic year: 2017

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Pró-Reitoria de Pós-Graduação e Pesquisa

Stricto Sensu em Direito

AS RELAÇÕES DE COOPERAÇÃO JURÍDICA EM

MATÉRIA PENAL ENTRE BRASIL E ESTADOS

UNIDOS DA AMÉRICA E SUAS IMPLICAÇÕES NO

ÂMBITO INTERNO

Autor: Luís André Ferreira da Cunha

Orientador: Arnaldo Sampaio de Moraes Godoy

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LUIS ANDRÉ FERREIRA DA CUNHA

AS RELAÇÕES DE COOPERAÇÃO JURÍDICA EM MATÉRIA PENAL ENTRE BRASIL E ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA E SUAS IMPLICAÇÕES

NO ÂMBITO INTERNO

Dissertação apresentada ao programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Direito, da Universidade Católica de Brasília, como requisito parcial para obtenção do Título de Mestre em Direito.

Orientador: Arnaldo Sampaio de Moraes Godoy

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Ficha elaborada pela Biblioteca Pós-Graduação da UCB

C972r Cunha, Luis André Ferreira da

As relações de cooperação jurídica em matéria penal entre Brasil e Estados Unidos da América e suas implicações no âmbito interno. / Luis André Ferreira da Cunha – 2011.

122f. ; 30 cm

Dissertação (mestrado) – Universidade Católica de Brasília, 2011. Orientação: Arnaldo Sampaio de Moraes Godoy

1. Cooperação internacional 2. Assistência jurídica. 3. Jurisprudência penal. 4. Direito penal. I. Godoy, Arnaldo Sampaio de Moraes, orient. II. Título.

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Dissertação de autoria de Luís André Ferreira da Cunha, intitulada “AS RELAÇÕES DE COOPERAÇÃO JURÍDICA EM MATÉRIA PENAL ENTRE BRASIL E ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA E SUAS IMPLICAÇÕES NO ÂMBITO INTERNO”, apresentada como requisito parcial para obtenção do grau de

Mestre em Direito da Universidade Católica de Brasília, em 18 de março de 2010, defendida e aprovada pela banca examinadora abaixo assinada:

____________________________________________ Professor Dr Arnaldo Sampaio de Morais Godoy

Orientador

____________________________________________ Professora Dra. Arinda Fernandes

Examinadora interna

____________________________________________ Professor Dr. Luis Carlos Martins Alves Júnior

Examinador externo

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Agradeço e reitero minha sincera e constante alegria em tê-los na minha vida, pai, mãe, irmã, “irmão”, sobrinhos e a todos que, de alguma, forma contribuíram nessa caminhada.

Aos “Costa Rabelo”, Faculdade Atenas, pelo apoio inicial. Ao Dr. Antônio Libânio da Rocha, primeiro e eterno mestre. Aos colegas de Mestrado e das viagens cansativas.

Ao Prof. Antenor Madruga por instigar minha dúvida inicial e, principalmente, ao Prof. Arnaldo Godoy pela disponibilidade na minha orientação e também por despertar em mim um grande interesse pelo Direito Internacional em suas inigualáveis aulas.

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CUNHA, Luís André Ferreira da. As relações de cooperação jurídica em matéria penal entre Brasil e Estados Unidos da América e suas implicações no âmbito interno. 2011. 122 f. Dissertação (Mestrado em Direito) – Universidade Católica de Brasília, Brasília, 2011.

A presente dissertação objetiva que a grande circulação de pessoas, bens, serviços e as novas tecnologias deram novo significado às fronteiras nacionais de cada país e esta realidade foi observada também nas práticas criminosas. O crime deixou de ser um fato social local e passou a ter abrangência internacional. Paralelos a estas mudanças, novos mecanismos foram criados e desenvolvidos no sentido de dar efetividade e celeridade à prevenção e combate a esta nova criminalidade, sendo que a cooperação jurídica internacional é o principal deles. Nesse sentido, foram estreitadas as relações cooperativas entre Brasil e Estados Unidos da América que culminaram na celebração do Acordo bilateral de Assistência Mútua. Por outra senda, há que se ressaltar que o Processo Penal Brasileiro, no decorrer das últimas décadas, passou por umas significativas mudanças no que pertine aos direitos do acusado no processo crime. Princípios que asseguram o total direito de defesa receberam sede constitucional, tais como o devido processo legal, o contraditório, a ampla defesa e, mais recentemente, a

par conditio. Ocorre que a normatização da cooperação jurídica entre Brasil e Estados

Unidos da América, baseada principalmente no Acordo de Assistência Jurídica Internacional em Matéria Penal existente entre ambos, restringe os meios cooperativos no sentido de possibilitar o requerimento somente para órgãos estatais, inviabilizando que o atendimento dos pleitos oriundos da defesa. Tal restrição fere frontalmente os princípios constitucionais inerentes ao processo penal, acima referidos por cercear os meios de defesa do acusado, no sentido de não garantir ao mesmo recursos equivalentes àqueles disponibilizados ao Ministério Público brasileiro. Destarte, reconhece-se a necessidade de uma plena cooperação entre Brasil e Estados Unidos da América em matéria penal, todavia esta deve ser igualmente acessível às partes do processo penal e não somente à acusação, uma vez que as garantias Constitucionais não podem ser subjugadas pelas relações internacionais de assistência mútua.

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ABSTRACT

This dissertation aims at the large movement of people, goods, services and new technologies have given new meaning to the borders of each country and this fact was found on the crime. The crime is no longer a social place and went on to have international reach. Parallel to these changes, new mechanisms were created and developed in order to make effective and timely prevention and combat this new crime, and the international legal cooperation is the main one. In this sense, we narrowed the cooperative relations between Brazil and the United States that culminated in the conclusion of the Bilateral Agreement on Mutual Assistance. In another vein, it is worth noticing that the Brazilian Penal Procedure, during the last decades, has undergone a significant change in pertains to the rights of the accused in criminal proceedings. Principles that ensure the full right of defense received a constitutional, such as due process, the adversarial process, the legal defense and, more recently, the par conditio. It happens that the standardization of legal cooperation between Brazil and the United States of America, based mainly on the International Agreement on Legal Assistance in Criminal Matters between both restricts the cooperative means in order to allow the application only to state organs, preventing the attendance of pleas from the defense. This restriction hurts head on the constitutional principles relating to criminal procedure, above, by curtailing the defenses of the accused, in order not to ensure that resources equivalent to those available to the Public Prosecution Service. Thus, it recognizes the need for full cooperation between Brazil and the United States in criminal matters, but it must also be available to parties in criminal procedure and not just the prosecution, since the Constitutional guarantees can not be subdued by international relations of mutual assistance.

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LISTA DE GRÁFICO

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LISTA DE ABREVITURA E SIGLAS

CF Constituição Federal CPP Código do Processo Penal

DRCI Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação MPF Ministério Público Federal

OEA Organização dos Estados Americanos

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ... 11

2 COOPERAÇÃO JURÍDICA INTERNACIONAL EM MATÉRIA PENAL ... 16

2.1 ORIGEM, EVOLUÇÃO E CONCEITO DE COOPERAÇÃO JURÍDICA INTERNACIONA EM MATÉRIA PENAL ... 16

2.2 DA OFENSA À SOBERANIA A UMA NECESSIDADE INAFASTÁVEL. 20 2.3 POSSIBILIDADES E DIFICULDADES DE SE EFETIVAR A COOPERAÇÃO INTERNACIONAL EM MATÉRIA PENAL ... 21

2.4 FORMAS DE COOPERAÇÃO EM MATÉRIA PENAL ... 23

2.5 A RELAÇÃO EXTRADICIONAL BRASIL E ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA ... 28

2.5.1 Procedimentos extradicionais entre Brasil e Estados Unidos da América. 30 2.6 O AUXÍLIO DIRETO COMO FORMA ALTERNATIVA DE COOPERAÇÃO EM MATÉRIA PENAL ... 32

3 O DIREITO PROCESSUAL PENAL BRASILEIRO ... 36

3.1 O PROCESSO PENAL CONSTITUCIONAL ... 38

3.2 A EFETIVIDADE DOS DIREITOS E GARANTIAS CONSTITUCIONAIS CONSUBSTANCIADAS NO PRINCÍPIO DO DEVIDO PROCESSO LEGAL E SEUS COROLÁRIOS ... 42

3.2.1 Devido processo legal ... 43

3.2.2 Contraditório ... 46

3.2.3 Ampla defesa ... 49

3.2.4 Par conditio ... 51

3.3 TEORIA GERAL DAS PROVAS NO PROCESSO PENAL ... 53

3.3.1 Conceito de prova ... 53

3.3.2 Objeto da prova ... 54

3.3.3 Princípios da prova... 55

3.3.4 Meios de prova... 55

3.3.5 Prova emprestada... 56

3.3.6 Provas inadmissíveis... 56

3.3.7 Procedimento para produção probatória... 57

3.3.8 Ônus da prova ... 58

3.3.9 Sistemas de apreciação da prova ... 60

4 O PROCESSO PENAL NORTE-AMERICANO ... 62

4.1 NOÇÕES DO SISTEMA COMMON LAW DO DIREITO NORTE-AMERICANO ... 63

4.2 ORGANIZAÇÃO JUDICIÁRIA NORTE-AMERICANA ... 66

4.2.1 A Suprema Corte ... 68

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4.2.3 Organização judiciária dos Estados-membros ... 72

4.3 NOÇÕES DO SISTEMA DE INSTRUÇÃO PROBATÓRIA PENAL NORTE-AMERICANO ... 74

4.3.1 Princípios Constitucionais referentes à instrução processual ... 74

4.3.1.1 Cláusula do julgamento pelo pequeno júri ... 74

4.3.1.2 Cláusula da suficiência da confissão ... 75

4.3.1.3 Cláusula da vedação de testemunho-de-ouvir-dizer ... 76

4.3.1.4 Cláusulas da razoabilidade e mandado de busca e apreensão ... 77

4.3.1.5 Cláusulas previstas na 5ª Emenda ... 80

4.3.1.6 Cláusulas previstas na 6ª Emenda... 83

4.3.2 Procedimento penal norte-americano ... 87

4.3.2.1 Fase investigatória ... 87

4.3.2.2 Fase de adjudicação ... 90

4.3.2.3 Fase de judicial ... 93

5 A COOPERAÇÃO JURÍDICA INTERNACIONAL EM MATÉRIA PENAL ENTRE BRASIL E ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA... 95

5.1 TRATADOS E ACORDOS DE COOPERAÇÃO ENTRE BRASIL E ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA EM MATÉRIA PENAL ... 97

5.2 PRINCIPAIS DIFERENÇAS ENTRE OS SISTEMAS PROCESSUAIS DO BRASIL E ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA ... 99

5.3 VISÃO DA COOPERAÇÃO INTERNACIONAL ... 101

5.3.1 Nos Estados Unidos ... 102

5.3.2 No Brasil ... 103

5.4 RESTRIÇÕES À COOPERAÇÃO ENTRE BRASIL E ESTADOS UNIDOS ANTE A DIFERENÇA DOS SISTEMAS PROCESSUAIS ... 105

5.5 A OFENSA A PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS BASILARES DO PROCESSO PENAL, RESULTANTES DAS RESTRIÇÕES, PARA A DEFESA, DE ACESSO ÀS FORMAS DE COOPERAÇÃO ENTRE BRASIL E ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA EM MATÉRIA PENAL. 108 6 CONCLUSÃO ... 114

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1 INTRODUÇÃO

No desenvolvimento do presente estudo objetiva-se analisar a viabilidade de coexistência dos atuais mecanismos de cooperação jurídica internacional em matéria penal entre Brasil e Estados Unidos da América, uma vez que as práticas assistências entre os dois países ofendem abruptamente os princípios constitucionais atinentes ao processo penal, mormente o devido processo e seus corolários.

Nesse intuito, há que se analisar a origem, evolução e atual estágio destes princípios. Assim, oportuno ressaltar que desde o ano de 1215, através da Carta Magna Inglesa onde encontramos o by the law of land, foi desenvolvida a primeira forma que se tem notícia do

que hoje chamamos de devido processo legal. Desde então, com evoluções e retrocessos, as legislações dos países considerados democráticos, vêm trazendo previsões no sentido de proporcionar aos cidadãos, direitos e garantias individuais relacionados aos processos penais.

No Brasil, após a promulgação da Constituição de 1988, tais garantias mereceram de nossos legisladores, mormente o constituinte, uma atenção especial, sendo que o princípio do Devido Processo Legal está consignado expressamente no art. 5º, inciso LIV da Constituição Federal do Brasil, dispondo que: “ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”.

Avançando na tratativa principiológica do processo penal Brasileiro, o Constituinte de 1988 trouxe expressamente mais alguns princípios que vigem de forma harmônica e complementar, na busca por um devido processo legal.

Dentre estes devem ser ressaltados e analisados os princípios da ampla defesa e do contraditório e, ademais, de origem mais recente, o princípio da par conditio. Esse último é,

ainda, pouco conhecido na prática forense é doutrinariamente entendido como exigência de se assegurar às partes o pleno exercício do direito à ação e contraditório.

O sistema deve possibilitar às partes as mesmas garantias processuais, mormente, no que tange à produção probatória. Consoante será analisado no decorrer do presente, da forma em que está previsto e regulamento hoje, o auxílio direto, como hipótese de cooperação jurídica internacional, não garante à defesa o direito de requerer e ser atendido plenamente na produção de provas nos Estados Unidos da América.

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Democrático de Direito, vez que aquele é o expoente jurídico maior das garantias democráticas.

Por outra senda, analisar-se-á a origem e desenvolvimento das práticas assistenciais mútuas entre os países como forma de combate à criminalidade organizada transnacional. Não se pretende renegar a necessidade e utilidade de se intensificar as relações cooperativas internacionais, todavia advoga-se a coexistência desta com as garantias individuais inerentes ao processo penal.

A presente pesquisa justifica-se pela relevância e discordância existente em torno do tema proposto. Conforme alhures analisado, a necessidade de um sistema normativo que regulamente a cooperação jurídica internacional penal é inegável. Da mesma forma, também inafastável a necessidade de que este sistema normativo esteja sempre em consonância com os princípios que norteiam o processo penal pátrio.

Em recente encontro sobre Cooperação Jurídica Internacional, realizado no dia 29 de agosto de 2008 na Procuradoria Geral da República, onde estavam presentes autoridades nacionais e estrangeiras, dentre elas os Professores Antenor Madruga e Nádia de Araújo, o tema foi amplamente debatido, todavia, algumas respostas não foram alcançadas, a principal delas o pomo da presente análise.

É cediço que a preocupação com o combate ao crime é premente e anterior à preocupação em se criar um sistema que garanta tal intuito. Somente no decorrer desta empreitada contra a delinqüência é que os operadores do direito e juristas depararam-se com os impasses, muitos deles insolúveis, entre as regras internacionais de cooperação e as normas processuais de direito interno.

Assim, é importante o debate acadêmico para estabelecer e definir critérios e mecanismos que possibilitem às partes envolvidas no processo penal a mesma garantia aos benefícios da cooperação jurídica internacional. Tal debate, sob o prisma da necessidade de combate a criminalidade, não pode sobrepor-se aos imaculados princípios do devido processo e corolários, duramente alcançados através da Carta da República de 1988.

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Nesse sentido, nem mesmo o Ministério da Justiça consegue apontar soluções à questão ora analisada, pois, consoante consta do Manual de Cooperação Jurídica Internacional e Recuperação de Ativos, elaborado por referido órgão:

o governo norte-americano não concorda em utilizar bens e esforços públicos para custear a oitiva de testemunhas arroladas pela defesa, a não ser que exista, concomitantemente, interesse específico por parte do juiz ou da acusação nesta diligência. A existência de tal interesse revela-se suficiente para habilitar a execução da referida solicitação, que, neste caso, dar-se-ia em benefício não somente da defesa como também do juízo ou da acusação.1

Assim, visa-se contribuir para o debate acerca da necessidade de se encontrar meios e procedimentos de uso equânime entre as partes também no acesso às várias formas de cooperação jurídica internacional em matéria penal.

Algumas perguntas merecem uma maior reflexão. Destarte, a cooperação jurídica internacional em matéria penal, na modalidade de auxílio direto, nos moldes em que vem sendo praticada entre Brasil e Estados Unidos da América fere o princípio do devido processo, mormente no que tange ao contraditório e igualdade das partes? A regulamentação hoje existente permite à defesa fazer jus à cooperação jurídica com a mesma facilidade e constância permitida à acusação? A impossibilidade de produzir uma prova fora do território brasileiro, para um processo penal que tramite aqui, retrata cerceamento de defesa?

Essas questões iniciais pretendem apresentar as nuances do problema ora abordado que, às vezes, vem sendo postergado sob o argumento de que o aumento da criminalidade transnacional justificaria um tratamento mais rígido. Todavia, o direito não pode ser analisado somente através de um único pólo, eis que estamos diante de um sistema jurídico, no qual não se permite a acuidade parcial dos institutos.

A priori, insta salientar que a necessidade de se efetivar uma cooperação jurídica

internacional penal, como forma de combate à criminalidade transnacional organizada e dar maior efetivada aos processos criminais, é uma realidade inafastável, vez que a atividade criminosa não se limita às fronteiras nacionais de cada país.

Nesse diapasão, através de acordos e tratados bi e multilaterais os países buscam criar mecanismos que possibilitem a colaboração entre si quando a investigação ou processamento de uma conduta delitiva exija diligências em territórios soberanos distintos. Inobstante esta

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necessidade premente, a divergência de princípios e procedimentos que regulam o processo penal nos países que buscam cooperação jurídica penal, dificulta, ou até mesmo inviabiliza sua efetivação, sem desrespeitar o princípio do devido processo legal e seus corolários.

A falta de legislação específica acerca da cooperação jurídica internacional penal, bem como a ausência de meios concretos para sua realização, poderá ameaçar sua existência, ou colocá-la à margem da legalidade o que certamente provocará a reação da comunidade jurídica. No que tange à realidade pátria, a diferença dos modelos probatórios adotados no Brasil e nos Estados Unidos da América propicia a ofensa a princípios norteadores do processo penal, devidamente consignados na Constituição Federal da República, os quais não podem ser subjugados às regras internacionais, nem tão pouco ao procedimento daquele país.

Busca-se elaborar um estudo no qual se demonstre que a existência de acordo de cooperação entre Brasil e Estados Unidos da América, bem como a divergência das legislações e procedimentos processuais penais nesses países, macula o processo penal onde sejam realizadas, haja vista a ofensa aos princípios constitucionais, mormente da paridade de armas.

Pretende-se, ainda, descrever o nascimento e desenvolvimento de alguns princípios aplicáveis ao processo penal, do devido processo legal a par conditio, bem como a sua

importância dentro do atual sistema processual penal e constitucional vigente em nosso país, para tanto, bem como verificar-se-á as normas e as regras vigentes em nosso sistema jurídico aplicáveis à cooperação jurídica em matéria penal e àquelas que existem em tratados e convenções internacionais e também analisar as consequências jurídicas, caso se mantenha o confronto entre o princípio da paridade de armas e as regras que orientam a cooperação jurídica internacional penal através do auxílio direto, sem propiciar às partes as mesmas condições para a garantia da defesa e acusação.

Como marco teórico, instrumentam a pesquisa as doutrinas de Fernando da Costa Tourinho Filho, Guilherme de Sousa Nucci, Eugênio Pacelli de Oliveira e Aury Lopes Júnior, em suas obras que tratam do Direito Processual Penal Brasileiro, onde busca-se um estudo aprofundado das origens, evoluções e relevância que os princípios que norteiam o processo penal possuem no atual Estado Democrático de Direito, externada na atual Constituição Federal da República.

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cooperação, haja vista a comprovada e constante necessidade de estreitamento das relações entre os países no combate ao crime transnacional.

Numa abordagem paralela, baseada nas obras de João Gualberto Garcez Ramos, Thomas M. Cooley, Arnaldo Sampaio de Moraes Godoy, José Carlos Souto e o Manual de cooperação jurídica internacional do Ministério da Justiça, buscou-se demonstrar que as limitações à produção probatória existentes no Direito Norte-Americano, bem como a inexistência de acordo entre Brasil e Estados Unidos que possibilite a cooperação através de requerimento da defesa, fere o princípio da paridade de armas e, assim, do devido processo legal.

Por tratar-se de uma pesquisa bibliográfica, além das obras acima mencionadas que se mostram como base principal, várias outras, de forma complementar, foram usadas no intuito de analisar de forma aprofundada o tema proposto.

Recorreu-se ao uso do método hipótese-dedutivo, partindo da percepção das lacunas existentes na normatização da cooperação jurídica internacional em matéria penal, bem como na apresentação de hipóteses possíveis desta relação e, consequentemente, análise das lesões ao sistema jurídico penal que nosso ordenamento poderá sofrer.

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2 COOPERAÇÃO JURÍDICA INTERNACIONAL EM MATÉRIA PENAL

2.1 ORIGEM, EVOLUÇÃO E CONCEITO DE COOPERAÇÃO JURÍDICA INTERNACIONAL EM MATÉRIA PENAL

As transformações que varreram o cenário internacional nos últimos anos do século XX trouxeram uma nova agenda ao debate público em todo o mundo. O fim das dicotomias que marcaram a ordem bipolar deixou um panorama desafiador para todas as instituições multilaterais que nasceram e evoluíram no clima vigente desde o fim da II Guerra Mundial, em 1945, e a implosão do império soviético, em 1989 2.

A realidade do cenário mundial é, hoje, muito mais complexa do que a das décadas anteriores. As aspirações dos povos e dos países, mesmo os mais pobres, correm no sentido de superar as dependências, de ampliar a faixa de opções políticas e de buscar padrões eqüitativos de comércio internacional e de desenvolvimento econômico e tecnológico.

Tarefa árdua é sobrepor-se ao medo e tensões inerentes ao relacionamento entre os países, vez que o exercício da dominação não se aparta tão facilmente dos homens, levando-os à prática de atitudes repugnáveis.

De acordo com Deutsch3, os governos modernos, em comparação com os de séculos passados, têm aumentado consideravelmente o peso de seu poder sobre suas próprias populações. Cobram-se impostos, recrutam-se soldados, aplicam-se leis, prendem-se infratores, tudo isso com um grau de probabilidade muito maior do que jamais poderiam ter sonhado os soberanos medievais. Por outro lado, a redução das barreiras internacionais e a conseqüente necessidade de auxílio mútuo entre as nações, fez com que fossem estreitadas as relações internacionais.

Nesse sentido, a cooperação jurídica internacional, que já foi entendida como uma ofensa à soberania exerce imprescindível atuação no combate à criminalidade organizada transnacional.

Inobstante encontrarmos hodiernamente o ápice da Cooperação Jurídica Internacional, o tema não é assim tão recente. Ao contrário, segundo noticia-se “os primeiros aportes

2 UNESCO Brasil. Novos marcos de ação. Brasília: UNESCO, 2001.

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clássicos ao tema já podem encontrar-se incidentalmente em Bartolo e, de forma mais precisa, na Escola Holandesa, na obra de Grocio e seus seguidores Puffendorf e Wolff”.4

Reportando às origens, entendido como o primeiro precedente, tem-se o caso histórico do tratado de paz celebrado entre Ramsés II e Hatussilli, reis dos Hititas, em 1280 a. C., que é considerado o tratado mais antigo da humanidade5.

A partir deste relato histórico outros sucederam-se, todavia, a maior intensidade das relações entre as nações teve um mote propulsor nas intensas alterações provocadas pela crescente internacionalização das sociedades e instituições. Tal fato refletiu, por óbvio, nas relações jurídicas, em especial no auxílio interestático em matéria penal.

Nesse sentido, oportuno relatar, nas lições de Cervini e Tavares, citando J. Giullermo Fierro, que:

Estes temas iriam constituir o foco dos debates no Primeiro Congresso Penitenciário celebrado em Londres, em 1872, e nos posteriores (Roma, 1885; Paris, 1895), donde se chegou a propugnar a urgente necessidade de lograr uma união entre as polícias dos diferentes Estados com o propósito de facilitar a detenção dos criminosos fugitivos e uma racional conexão entre os Juízes da Europa com objetivos de enfrentar este problema.6

Já no século 20, um dos marcos relacionados ao tema, ocorreu em abril de 1916, quando Alberto I de Mônaco, convocou o Primeiro congresso de Polícia Judicial, evento ao qual acorreram policiais e juristas de 14 países para discutir estratégias comuns frente ao delito internacional e fixar bases da futura Organização Internacional de Polícia Criminal (OIPC – Interpol).7

Em paralelo com essa mencionada atividade prática, na busca de arquitetura de uma cooperação internacional, no campo teórico, é de inigualável grandeza a contribuição de Roux que, em 1932, descreveu com premonitoriamente, a importância do tema. Citado por Cervini e Tavares, Jean-André Roux expressou:

4CERVINI, Raul; TAVARES, Juarez. Princípios de cooperação judicial penal internacional no protocolo do Mercosul. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000. p. 48

5 ARAÚJO JÚNIOR. João Marcello de. Extradição: alguns aspectos fundamentais. Revista Forense, v. 90, n. 326, p. 61.

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A cooperação internacional em matéria penal havia nascido como consequência da necessidade de formular uma resposta suficiente ante o fato tangível de que, enquanto a defesa social em matéria penal se exercia primordialmente em âmbitos circunscritos, limitados (princípio da territorialidade), a delinqüência já se internacionalizava, seja para operar desse modo (organizações dedicadas ao tráfico de entorpecentes, de pessoas etc.), seja em razão da modalidade específica do delito cometido (apoderamento ilícito de aeronaves em vôo), ou inclusive para afastar a ação da justiça penal estatal. Negar esta realidade, afirmava, equivaleria a tolerar que “lês gendarmos ne devainet pás continuer a aller a pied quand lês voleurs courraient a bicyclette”. Anos mais tarde, Quintano Ripolles retoma o argumento e moderniza a imagem dizendo que seria igual a “tolerar que os criminosos se movimentem de avião e o Juiz e a polícia de carregam”.8

Outro marco histórico que impulsionou sobremaneira as relações internacionais foi o fim da Segunda Guerra Mundial. Tal ocorrência pode ser entendida como consequência do surgimento de uma consciência dos Estados quanto ao fato de que não são auto-suficientes e que a formação de uma nação isolada seria um retrocesso que cercearia o seu próprio crescimento e esse, por questões naturais, está vinculado à cooperação. Por outro lado, e sendo consequência do primeiro, a necessidade de coexistência de múltiplos Estados independentes.

Nesse sentido, ao elaborar o Manual de Cooperação Jurídica Internacional e Recuperação de Ativos e referindo-se à obra de Guido Fernando Silva Soares, o Ministério da Justiça fez constar:

Não obstante, a complexidade crescente das relações internacionais e, em especial, dos desafios impostos à comunidade das nações a partir do século XX, sobretudo após a Segunda Guerra Mundial, levou os Estados a privilegiarem, cada vez mais, soluções multilaterais para problemas globais. Esse fenômeno tem implicações na dogmática jurídica. Leva, por exemplo, à necessidade de releitura das fontes de Direito Inter Gentes, enfatizando-se o dever de cooperação contido nas normas internacionais, contrapondo-se, assim, à feição de direito de manutenção do status quo.9

Destarte, com base nesse pensamento, o pós-guerra trouxe o desenvolvimento de novos mecanismos de interlocução entre os Estados no âmbito externo, visando garantir a efetividade dos princípios da justiça cosmopolita e da efetividade da Justiça.

As décadas que sucederam o fim da Segunda grande Guerra foram marcadas pela celebração de inúmeros tratados e acordos bi e multilaterais que visavam dar base jurídica à persuasão, atualmente vigente, na comunidade internacional, da necessidade de cooperar, como forma de opor à crescente organização da criminalidade. Tal convicção fez com que os

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atores internacionais passassem a enxergar a cooperação não somente como gentileza internacional, mas sim como obrigação jurídica.

Assim, o crescente fluxo de riquezas e o uso de tecnologias avançadas propiciaram o incremento das questões que envolvem interesses transnacionais, ensejando acordos e entendimentos mútuos referentes à colaboração entre nações, ativa ou passivamente, que vão desde as simples trocas de informações, documentos, dados e elementos de pessoas investigadas tanto pelo fisco, como pela Polícia Judiciária e Ministério Público, até a solicitação de atos em matéria processual civil, comercial, internacional, trabalhista, tributária e penal.10

No decorrer da criação, desenvolvimento e confirmação da cooperação jurídica internacional, vários foram os conceitos que se pretendeu atribuir ao instituto. De acordo com o entendimento acerca da abrangência, bem como natureza jurídica do tema, foram criando nomenclaturas diferentes e, outrossim, conceitos diversos.

Segundo Nádia de Araújo, cooperação jurídica internacional significa o intercâmbio internacional para o cumprimento extraterritorial de medidas processuais do Poder Judiciário de um outro Estado.11

Tendo por base a atual conotação e relevância que se destinou à cooperação, aqui penal, oportuna colagem do conceito de Cervini e Tavares para quem ela deve ser conceituada como:

Uma das variedades da Entreajuda Penal Internacional, a cooperação judicial penal internacional se concretiza quando o aparato judicial de um Estado, que não tem poder de império senão dentro de seu território, recorre ao auxílio, à assistência que lhe podem prestar outros Estados, por meio de suas atividades jurisdicionais.12

No mesmo contexto, referidos autores, citando Sosa Aguirre, acrescem:

Processo constitui um complexo de atos diversos que se sucedem em um período mais ou menos extenso, considerados como uma unidade em vista ao fim que os une – a aplicação da lei penal. Normalmente estes atos se desenvolvem dentro do âmbito de competência da autoridade judicial em que tem lugar no processo, porém outros devem ser cumpridos em lugares distintos, dentro ou fora do Estado onde se instrui a causa. Precisamente, quando sob essas condições o órgão jurisdicional de um Estado solicita auxílio de um órgão jurisdicional de outro Estado diferente, estamos diante do que se chama de cooperação judicial penal internacional.13

10 PINTO. Edson. Lavagem de capitais e paraísos fiscais. São Paulo: Atlas, 2007. p. 187.

11 ARAÚJO, Nádia. Direito Internacional Privado: teoria e prática brasileira. 2 ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2004.

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Nesse diapasão, é possível perceber que não se pode admitir a existência de uma efetividade judicial, em tempos atuais, sem o envolvimento e colaboração dos Estados, eis que a criminalidade transnacional é uma realidade inegável em nosso cotidiano.

2.2 DA OFENSA À SOBERANIA A UMA NECESSIDADE INAFASTÁVEL

Consoante alhures consignado, a cooperação já foi entendida como ofensa à soberania do país que necessitasse de tal colaboração.

De acordo com Rodrigo Otávio14 referia-se à cooperação entre os Estados como algo baseado em mais do que o sentimento de cortesia internacional, também conhecida como

comitas gentium. Segundo ele, cortesia, convivência, condescendência eram sentimentos

arbitrários, que o Estado pode fazer hoje e não mais amanhã. Conforme seu entendimento, havia uma obrigação entre as nações, e não mera faculdade. Esta era resultante de uma obrigação moral cujo descumprimento impunha ao Estado uma perda de prestígio no convívio internacional de todo indesejável. Traduzia-se em uma limitação à soberania do Estado, pelo próprio Estado, com a finalidade de respeitar o direito internacional e melhorar o relacionamento no plano da comunidade internacional.

Nesse sentido, há que se ressaltar que cada Estado possui a sua própria atividade jurisdicional e é capaz de prestá-la somente nos seus limites territoriais. Todavia, quando qualquer Estado necessidade praticar um ato processual fora do seu respectivo território fica limitado pela soberania deste e, assim, nasce a imprescindível necessidade da cooperação jurídica internacional, que não pode ser entendida, a priori, como ofensa à soberania. Negar esta assistência pode acarretar a inviabilidade do próprio processo e, por conseguinte, a pretensão das partes envolvidas, inviabilizando ou, até mesmo, impedindo a prestação jurisdicional.

Assim, nas lições de Nádia de Araújo15, a cada dia aumenta a dependência entre os Estados e o inter-relacionamento de toda ordem, comercial e pessoal entre os cidadãos. Isso resulta em ações no poder Judiciário de cunho transnacional, com reflexos em mais de um país. Deixar de considerar os requerimentos de outras nações implicará, forçosamente, a mesma atitude por parte destas ante os pedidos.

(23)

Destarte, consoante ressaltou o então Ministro da Justiça no Manual de Cooperação Jurídica Internacional:

Um ato de cooperação, que tradicionalmente poderia ser visto como uma violação da soberania de Estados, hoje em dia, pode ser reconhecido como uma forma de manutenção de um novo conceito de soberania, estabelecido pelas atuais relações entre Estados. Assim, o direito e o dever de um Estado soberano na manutenção de sua Justiça restariam resguardados.16

Reconhece-se como retrogrado qualquer pensamento no sentido de ofensa à soberania, uma adesão à prática cooperativa pelos Estados, haja vista ser uma premente necessidade e, ademais, a única forma de se garantir a efetividade da prestação jurisdicional.

2.3 POSSIBILIDADES E DIFICULDADES DE SE EFETIVAR A COOPERAÇÃO INTERNACIONAL EM MATÉRIA PENAL

Em via paralela ao desenvolvimento dos direitos e garantais individuais, mormente no decorrer do século próximo passado, teve origem e se desenvolveram as relações entre os países. Tal ocorrência é mais um reflexo da inegável interdependência existente entre os países e que é fruto da globalização.

Conforme anteriormente analisado, esta realidade pode ser sentida em todos os meios, tais como economia, cultura, política e, certamente, jurídico. O estreitamento das relações internacionais, tanto pelos Estados, como pelos particulares, levou à transnacionalidade dos crimes e, consequentemente, da necessidade de colaboração mútua dos países para a repressão e prevenção de tal fenômeno.

Nesse contexto, como as fases da prática de um crime podem ter ocorrido em mais de um país ou, até mesmo, este foi praticado por pessoas de diversas nacionalidades, para que efetivamente haja possibilidade do mesmo ser devidamente apurado e os responsáveis punidos, pode ser necessária a cooperação dos países que estejam ligados, de uma forma ou de outra, por esta prática.

Todavia, inobstante esta inegável e reconhecida necessidade, a sua prática não está sendo assim tão simples e o principal impasse pode ser creditado à ausência de consenso entre as legislações penais e processuais penais dos países. Ademais, a ausência de uma legislação

(24)

própria em âmbito internacional, em consonância com os princípios básicos de cada legislação, dificulta ou, até mesmo inviabiliza a cooperação jurídica internacional.

Nesse contexto, hodiernamente, não é possível imaginarmos as ações internacionais de combate aos crimes transnacionais sem um sistema efetivo que possibilite a cooperação jurídica internacional em matéria penal, vez que esta é necessidade premente. Entrementes, mesmo sendo uma necessidade urgente, não se pode admitir que as formas de cooperação, necessárias, repita-se, sobreponha-se aos direitos e garantais fundamentais relacionadas ao processo, externada principalmente através do princípio do devido processo legal e seus corolários.

Assim, conforme sábias lições Fernando Tourinho:

O processo Penal é regido por uma série de princípios e regras que outra coisa não representam senão postulados fundamentais da política processual penal de um Estado. Quanto mais democrático for o regime, o processo penal mais se apresenta como um notável instrumento a serviço da liberdade individual.17

Nesse prisma, correlacionando-se com a necessidade de adequação dos princípios norteadores do processo penal à cooperação jurídica internacional, leciona Solange Mendes de Souza:

Somente no bojo de um processo penal verdadeiramente constitucional pode-se procurar inverter sua condição de instrumento de dominação da elite como denunciado por Zafaroni, para que exsurja sua verdadeira vocação, a busca da segurança e da paz social. (...) Em razão deste campo mais amplo de atuação da cooperação, uma nova conformação dos vetores que orientam o auxílio penal mútuo mostrou-se obrigatória.18

Vislumbra-se, destarte, a necessidade de coexistência do respeito ao devido processo legal e seus corolários com as normas que garantam a efetividade da cooperação jurídica internacional em matéria penal.

Analisando o exposto, a cooperação internacional é essencial à medida que, proporcionando o estreitamento das relações entre os países, por meio da intensificação da assinatura de tratados, convenções e protocolos, fundamentados no auxílio mútuo facilita o intercâmbio de soluções para problemas estatais quando o aparato judicial/administrativo de

17 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de Processo Penal. 8. ed. rev. atual. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 15.

(25)

um determinado Estado mostra-se insuficiente para solucionar a controvérsia, necessitando recorrer ao auxílio que lhe possam prestar outras nações19.

Como meio de promover maior segurança à cooperação, acordos internacionais são elaborados a partir da vontade soberana das partes, vontade esta restringida, pois após a celebração do respectivo tratado internacional a intenção autônoma se consolida em obrigação jurídica regulada pelo direito internacional e, assim, não podem atentar contra as garantias constitucional de cada Estado.

Tão somente a coordenação dos esforços dos Estados pode garantir a realização de um mundo dividido em unidades políticas soberanas, pois se as fronteiras como expressão da soberania forem utilizadas, como forma de evasão à lei, a própria legitimidade dos Estados estará comprometida na medida em que a legitimidade caminha de mãos dadas com a eficácia.

2.4 FORMAS DE COOPERAÇÃO EM MATÉRIA PENAL

Com o passar do tempo, o progresso dos meios de transporte e a evolução da técnica, intensificam-se os contatos entre os povos, desenvolvendo-se o comércio internacional, no sentido amplo da expressão, que abrange, não só as relações meramente econômicas e mercantis, como, também, as sociais, políticas, culturais e científicas.

Por esse ângulo, imprescindível é que se intensifique, igualmente, a cooperação mútua que a solidariedade e a fraternidade impõem aos Estados.

Russomano20, advoga que:

Essa cooperação se pode efetivar por diversas maneiras, segundo os objetivos visados, manifestando-se através de medidas e providências tomadas em comum para a proteção da saúde, impedindo a propagação de enfermidades; no abrigo concedido, em portos nacionais, a navios estrangeiros que aí procurem refúgio contra tempestades ou por necessitarem de reparar avarias; nos salvamentos marítimos, etc.

19

BRASIL. 2008, op. cit.

(26)

É importante frisar que o aspecto mais relevante da ajuda recíproca entre os Estados é, indubitavelmente, representado pela cooperação que entre eles se deve efetivar para a administração eficaz da justiça.

Em virtude dessas considerações, não se pode deixar de citar o jurista uruguaio Quintin Alfonsin esclarecendo que a cooperação internacional, abrange, amplamente, três capítulos distintos, quais sejam:

a) A atribuição ou distribuição da competência internacional entre os diversos Estados; b) O cumprimento extraterritorial de medidas processuais emanadas de um Estado; c) O reconhecimento e a execução extraterritorial da sentença pronunciada pelos órgãos judiciais de um país.

É importante observar que a doutrina mais recente denomina-se, especificamente, cooperação judicial internacional, no tocante ao segundo dos três problemas apresentados, isto é, para o cumprimento extraterritorial de medidas processuais ditadas por um estado21.

Tal cooperação, conforme atesta Russomano22 pode manifestar-se tanto na esfera civil, como na esfera criminal. Em ambos os casos, mais comumente, a cooperação judicial se efetiva e manifesta por intermédio das cartas rogatórias23.

A Carta rogatória mostra-se como sendo um dos mais remotos meios de se atender solicitações entre Estados. Seu proceder está diretamente ligado às vias diplomáticas, existindo em cada Estado uma Autoridade Central que é a responsável pelo recebimento e encaminhamento dos pedidos por Carta Rogatória.

No Brasil, por força da Emenda Constitucional 45, de 2004, competente ao Superior Tribunal de Justiça avaliar os pedidos de assistência através de Carta rogatória oriunda de Estado estrangeiro e, caso a medida solicitada atenda aos requisitos previstos nas legislações internas, conceder o exequatur e, assim, determinar o seu cumprimento pelo órgão

jurisdicional competente.

21 ALFONSIN, Quintin. Cooperación judicial internacional, nas jornadas latinoamericanas de Derecho Procesal. Revista de la Facultad de Derecho y C. Sociales, de Montevidéu, jan./mar. 1985, p. 165-166. 22 RUSSOMANO. op. cit. p. 31.

(27)

A Carta Rogatória é utilizada, consoante Luis César Ramos, citado pelo então Advogado-Geral da União José Antônio Dias Tóffoli no Manual de Cooperação Jurídica Internacional:

quando se faz mister o acionamento da autoridade judiciária estrangeira a praticar diligências solicitadas por autoridades jurídicas domésticas (ou vice-versa), no sentido de auxiliar a instrução processual, angariando provas ou efetuando outros termos processuais (citações, notificações, etc.).24

Internamente, a regulamentação acerca da Carta Rogatória encontra-se normatizada na Lei de Introdução ao Código Civil, art. 12; na resolução nº 9 do Superior Tribunal de Justiça, em seu artigo 6º. Tais previsões dispõem que o cumprimento das diligências a serem realizadas internamente e requeridas por autoridades estrangeiras somente serão autorizadas através do exequatur caso não atente contra a soberania ou a ordem pública nacionais.

Questão que sempre trouxe grande desconforto para o Brasil no cenário cooperativo mundial era o posicionamento do Supremo Tribunal Federal que entendia ser inadimissível no Brasil atender qualquer pedido, através de Carta Rogatória, que tivesse conteúdo executório. Durante décadas a Suprema Corte entendeu e decidiu por esta impossibilidade. Conteúdo, com a transferência da competência para apreciar pedidos de Estados estrangeiros através de Carta Rogatória para o Superior Tribunal de Justiça, este quadro modificou-se sensivelmente, pois este Tribunal Superior, através da Resolução n.º 9, art. 7º passou a admitir que as “Cartas Rogatórias podem ter por objeto atos decisórios e não decisórios”.

Ilustrando esta evolução de pensamento a professora Nádia de Araújo fez constar:

Um caso paradigmático recente é a decisão da carta rogatória n.º 438, em que, entre outras diligências, era requerida a quebra de sigilo bancário para apuração de crime de lavagem de dinheiro. Ao conceder o exequatur, o Ministro Luiz Fux foi sensível

às modificações que a EC n.º 45/2004 promovera, e à necessidade de que o STJ assumisse posição mais alinhada ao combate do crime organizado transnacional. Deu, prevalência, portanto, ao princípio da afetividade do poder jurisdicional no novo cenário da cooperação internacional.25

Assim, no que tange à cooperação jurídica internacional, por via de Carta rogatória, o Brasil vive um novo momento, ante a visão e posição menos formalista adotada pelo Superior Tribunal de Justiça.

(28)

Somando-se ao rol de modalidades de cooperação jurídica encontra-se a Homologação de Sentença Estrangeira. Trata-se de procedimento onde busca assegurar eficácia, em território nacional, a decisões de esfera judicial proferidas em território e por autoridades estrangeiras.

No âmbito penal, conforme depreende do art. 9º do Código Penal Brasileiro:

A sentença estrangeira, quando a aplicação da lei brasileira produz na espécies as mesmas consequências, pode ser homologada no Brasil para:

I – obrigar o condenado à reparação do dano, a restituição e a outros efeitos civis; II – sujeitá-la a medida de segurança.26

Ademais, o art. 15 da Lei de Introdução ao Código Civil trás expresso os requisitos para que uma sentença estrangeira possa passar por homologação em território brasileiro, sendo eles: haver sido proferida por juiz competente; terem sido as partes citadas ou haver-se legalmente verificado a revelia; ter passado em julgado e estar revestida das formalidades necessárias para a execução no lugar em que foi proferida; estar traduzida por intérprete autorizado; e ter sido homologada pelo Supremo Tribunal Federal.

Inobstante estar previsto naquele dispositivo que a homologação será do Supremo Tribunal Federal, após a Emenda Constitucional n.º 45, de 2004, é competente o Superior Tribunal de Justiça para tal prática.

Ademais, particularmente no campo do processo penal, considera-se relevante o instituto da extradição bem como o comportamento que, em relação a ele, os Estados modernos vêm adotando.

Tenha-se presente que, por razões de ordem prática, aconselham que o delinqüente seja julgado e punido no Estado dentro de cujas fronteiras atentou contra as leis penais.

A extradição deve ser vista como consequência da cooperação entre os países no sentido de obter a melhor execução das leis criminais, pois este instituto representa para os Estados um verdadeiro dever internacional, não obstante sua execução que nem sempre possa ser exigida coativamente.

Conforme esclarece Goraieb27, a extradição é regida por dois princípios que visam a dar maior proteção ao individuo extraditado: o Princípio da Especialidade e o Princípio da Dupla Incriminação. Pode-se dizer, de forma simplificada, que o princípio da especialidade se

26 BRASIL. Código penal. Organização Editora Saraiva com a colaboração de Antônio Luiz de Toledo Pinto, Márcia Cristina Vaz dos Santos Windt e Lívia Céspedes. São Paulo: Saraiva, 2011.

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caracteriza por impedir que o extraditado seja julgado por crime diferente do que fundamentou o pedido de extradição.

Já o princípio da dupla incriminação fundamenta-se na necessidade de o crime estar previsto tanto na legislação penal do país que a requer, quanto na do país requerido. Assim, é uma garantia essencial ao direito de liberdade. Mas isso não significa que os crimes devam ser definidos em ambas as legislações com as mesmas palavras. O importante não é a identidade formal entre os tipos penais, mas a verificação de ser considerada criminosa, em ambos os países, a conduta atribuída ao extraditando.

Cumpre observar que um país não pode, arbitrariamente, entregar (ou deixar de fazê-lo) os criminosos que, dentro de suas fronteiras, se refugiaram.

Russomano pondera que:

O Estado é soberano, mas sua soberania não é absoluta; e, no exercício dela, não deve nunca esquecer os direitos e os interesses dos demais. Quando da extradição se trata, é necessário que ele considere, de maneira especial, o direito que tem o Estado requerente de julgar os indivíduos acusados de atos criminosos, praticados em seu território, ou de lhes aplicar a pena que, por seu delito, lhes foi cominada. Por outro lado, porém, cumpre não recair no excesso de afirmar que, em nome da solidariedade internacional, o Estado deve ser, sempre, obrigado a aquiescer aos pedidos de extradição que lhe forem feitos. Ele conserva, essencialmente, o direito de responder, de modo negativo, àquelas solicitações, sempre que as julgar mal fundamentadas ou injustificadas.28

Pelo exposto, depreende que o país onde refugiou o delinqüente deve considerar que o poder de decisão não está somente em suas mãos, com isso, deve respeitar o direito do outro de julgar e aplicar a pena cabível. Afinal de contas o indivíduo cometeu um crime e precisa responder por ele. A autora faz críticas afirmando que mesmo em face de acordos e tratados de cooperação, a solidariedade deve ser comedida, pois acima dela está a observação aos direitos humanos.

Acordos de proteção e cooperação penal internacional têm sido discutidos de forma mais imperativa, vez que a comunidade internacional tem buscado meios que possam garantir a paz mundial e a harmonia entre os povos. Dessa forma, o instituto da extradição está cada vez mais presente nos acordos de cooperação entre os países, tendo em vista ser esse um procedimento que possibilita que o indivíduo acusado de delito ou condenado como criminoso ser punido pelo Estado competente.

(30)

A princípio, faz-se imperioso a existência de um tratado de compromisso de extradição entre o país requerido e o requerente para que a medida concretize-se. Todavia, são comuns pedidos de extradição entre Estados que não possuam tratados, baseados no princípio da reciprocidade. No Brasil a Lei nº 6.815 de 1980, conhecida por Estatuto do Estrangeiro, regulamenta a extradição.

Em linhas gerais, a extradição é um dos procedimentos que os Estados utilizam para retirar um estrangeiro do seu território e tem como fundamento a cooperação entre os países que buscam, no âmbito internacional, a inibição do crime que, cada vez mais, tem-se especializado com o advento do processo de globalização. As ações terroristas têm-se disseminado pelo mundo e ultrapassado as fronteiras estatais.

Como remate, é importante frisar que a comunidade internacional utiliza-se do instituto da extradição para a manutenção da paz. No Brasil, o número dos processos de extradição julgados pelo Supremo Tribunal Federal tem aumentado a cada ano. As estatísticas demonstram que a extradição é um instrumento capaz de promover a repressão ao crime e punir os criminosos que migram para outras jurisdições, na tentativa de fugir da penalidade.

Por derradeiro, cumpre dizer que os países devem buscar meios que permitam a repressão ao crime e a manutenção da paz. Para isso, é fundamental a utilização de instrumentos que promovam a cooperação entre os países. Consoante será analisado adiante, existem outras formas de cooperação, dentre elas, o auxílio direto que é o objeto de subitem específico.

2.5 A RELAÇÃO EXTRADICIONAL BRASIL E ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA

Dentre todos os atos bilaterais em vigência, convém notar que aquele mantido com os Estados Unidos da América, assinado em 13 de janeiro de 1961 por Horácio Lafer e John Moors Cabot, destaca-se pela forma diferenciada com que foi realizado.

Logo após a sua conclusão29, verificou-se a necessidade de se promover a assinatura de um Protocolo Adicional, por San Tiago Dantas e Lincoln Gordon em 18 de junho de 1962, com a finalidade única de reescrever o artigo 7º, que versava sobre a desobrigação da

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extradição de nacionais, para permitir a aplicação desta, com a adição da expressão “se os preceitos constitucionais e as leis do Estado requerido não o proibirem”.

Acquarone30 delata que o Tratado foi dividido em 23 artigos e começa por não adotar a fórmula consagrada pela maioria dos acordos celebrados pelo Brasil, pela qual as Partes Contratantes “obrigam-se” a extraditar, tendo seus negociadores preferidos grafar “concordam” em entregar pessoa reclamada. Embora a mesma expressão tenha sido empregada nos atos assinados posteriormente com os australianos, os canadenses e os sul-coreanos, de nenhum destes salta, como do texto com os norte-americanos, certa apreensão com o caráter mais flexível do verbo adotado, dadas as experiências negativas que determinados parceiros registraram em seu relacionamento extradicional com Washington.

Com o intuito de evitar repetição de incidentes conforme o que ocorrera no México, com o “caso Alvarez Machain”31, seria aconselhável que fizessem os países em vias de concluir acordos de extradição com os Estados Unidos incluir em suas propostas de texto em artigo específico, em que a legislação da parte requerida seria a única aplicável aos procedimentos de prisão preventiva, de extradição e de trânsito, a serem executados pelas suas próprias autoridades, exceto em casos específicos autorizados por essa mesma parte. Assim, a cláusula objetivaria evitar o seqüestro internacional resultante da apreensão direta de indivíduos em territórios estrangeiros e sua posterior remoção forçada por agentes norte-americanos para os Estados Unidos.

Cumpre ressaltar que o vigente Tratado de Extradição entre o Brasil e os Estados Unidos não apresenta dispositivo semelhante.

De igual forma, outros pontos do acordo firmado com os Estados Unidos também merecem reflexão, tais como: o tratamento dado à via de encaminhamento de solicitações extradicionais; a possibilidade de serem os pedidos interpostos por agentes consulares à falta de representantes diplomáticos, calando quanto à alternativa clássica do entendimento direto entre governos; e a hipótese de pagamento, pelo Estado requerente, aos funcionários da justiça

30 ACQUARONE, 2003, op. cit.

(32)

da parte requerida que não receberem salário ou compensação alguma além da retribuição específica por serviços prestados32.

Entretanto, a extensa lista de crimes que justificariam pedidos de extradição transcrita em seu artigo 2º é o que mais o distingue dos demais atos adotados pelo Brasil. Discriminados em 34 itens, chega a detalhamentos tais como a inclusão de parricídio e infanticídio no segmento correspondente a homicídio dolos, quando previstos como figuras delituosas autônomas; dano doloso e ilegal em estradas de ferro ou pontes, falsificação de sinetes e cunhos; crimes e delitos contra as leis de ambos os países para supressão de escravidão ou do tráfico de escravos; manufatura de “cannabis”, etc. Tal sofisticação de detalhamento – o crime de rapto mereceu dois itens descritivos distintos e três, o de falsificação – pode levar a uma maior área de interpretação no estudo da tipificação do delito centralizador.

2.5.1 Procedimentos extradicionais entre Brasil e Estados Unidos da América

Cabe, aqui, citar o “Caso Pang”, de extradição solicitada por Washington – Martin Pang, cidadão norte-americano condenado em Seattle pela morte de dois bombeiros em incêndio por ele dolosamente provocado, evadiu-se do território dos Estados Unidos e se refugiou clandestinamente no Brasil33.

Ressalta-se que tal caso repercutiu negativamente e trouxe para o terreno da prática os problemas teóricos decorrentes da opção dos negociadores dos dois países pela enumeração de infrações passíveis de pedidos de extradição no texto do instrumento bilateral. Da inexatidão da correspondência entre as tipologias brasileira e norte-americana dos delitos arrolados resultou impasse na interação extradicional, com base no pedido centralizado nos crimes de homicídio em primeiro grau e incêndio, ambos constantes do rol de crimes do Tratado de 1961. O Supremo Tribunal Federal34 decidiu deferir parcialmente, entendendo que os delitos tais como descritos na solicitação norte-americana corresponderiam, no Brasil, ao crime único dos artigos 250, caput, e 258 do Código Penal, tendo desse modo excluído do

32 ACQUARONE, op. cit.

33 Ibid.

34BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Tribunal Pleno. Extradição n. 654-1. Relator: Ministro Néri da Silveira.

Requerente: Governo dos Estados Unidos da América. Extraditado: Martin Shauw Pang. Julgamento: 18 de dez. 1995. Disponível em:

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deferimento as imputações de homicídio em primeiro grau; ainda no texto da decisão do Supremo Tribunal, foi repelida a necessidade de condicionar a entrega do extraditando a compromisso de comutação de eventual pena de prisão perpétua em privação de liberdade por trinta anos.

Tendo em vista que o Governo norte-americano não concordou com tal decisão, interpôs, cerca de três meses após a pronúncia do STF, embargo de declaração com vistas a contornar o que entendeu por obscuridade na redação do acórdão correspondente, recurso que foi rejeitado por unanimidade35. Além disso, o Presidente Bill Clinton enviou carta pessoal ao Presidente Fernando Henrique Cardoso na qual solicitava o empenho do Governo brasileiro em não deixar impunes todos os crimes pelos quais Martin Pang fora condenado pela Justiça do Estado de Washington.

Não obstante o ocorrido, houve outra tentativa de negociação por parte dos Estados Unidos. Em janeiro de 1996, o Embaixador Melvin Lewitski, juntamente com o promotor-chefe da Cidade de Seattle, Thimoty Bradshaw, foi à Brasília, e recebidos pelo Ministro Nelson Jobim, apresentaram outra mensagem do mesmo teor, desta vez da Secretaria de Justiça dos Estados Unidos, Janet Reno, ao seu correspondente brasileiro. O Ministro Jobim limitou-se a ouvir os interesses norte-americanos e a explicar as peculiaridades da decisão da Corte brasileira36.

Nesta esteira, notam-se os efeitos negativos da redação dada ao Tratado de 1961. Se as partes negociadoras tivessem acordado em selecionar pela duração da pena imputada os crimes justificadores do nexo extradicional, em vez de optarem pela discriminação de delitos, com certeza teriam obtido maior objetividade e menor possibilidade de exposição política no processo bilateral.

Por tais razões é que o Tratado de Extradição entre o Brasil e os Estados Unidos, vigente desde 17 de dezembro de 1964, precisa urgentemente candidatar-se a um processo revisor, com o propósito de atualizá-lo.

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2.6 O AUXÍLIO DIRETO COMO FORMA ALTERNATIVA DE COOPERAÇÃO EM MATÉRIA PENAL

Os mecanismos do procedimento prévio de admissibilidade, necessários quando se trata de cartas rogatórias e sentenças estrangeiras, estão sob fogo cerrado em todo o mundo, ante a necessidade de respostas mais rápidas aos pedidos formulados. Por isso, há o crescimento de outras modalidades de cooperação, especialmente algumas iniciativas que procuram efetuá-la de forma mais direta. Essa nova modalidade chama-se auxílio direto, ou assistência direta37.

Quando atuava como Coordenadora de Tratados e Foros, no Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional, Maria Rosa Guimarães Loula38 deixou claro que:

A assistência direta é um novo mecanismo de cooperação jurídica internacional que não se confunde com a carta rogatória e nem com a homologação de sentença estrangeira. Trata-se de um procedimento inteiramente nacional, que começa com uma solicitação de ente estrangeiro para que um juiz nacional conheça de seu pedido como se o procedimento fosse interno. Ou seja, a autoridade ou parte estrangeira fornece os elementos de prova para a autoridade central que encaminha o caso para o MPF (penal) ou AGU (civil) propor a demanda desde o início. Por isso a assistência direta difere da carta rogatória. Na carta rogatória passiva há uma ação no estrangeiro e o juiz estrangeiro solicita que juiz nacional pratique certo ato (e já diz qual é o ato. O juiz nacional só pode praticar aquele ato ou negar aplicação (no caso de ofensa à ordem pública). A assistência direta começou nos países de Common Law e nestes ele não difere muito da carta rogatória. Este procedimento começou a ser utilizado no Brasil para resolver o impasse criado pela jurisprudência do STF sobre cartas rogatórias executórias. Esse procedimento está bem escrito no acordo bilateral Brasil-Estados Unidos e no Protocolo de São Luís Mercosul (assistência judicial em matéria penal.

Pelo exposto, pode se dizer que a assistência direta ou auxílio direto é mais uma alternativa na qual configura a cooperação jurídica internacional. Isso não quer dizer que a carta rogatória está com os seus dias contados, ocorre que, no Brasil, o auxílio direto foi uma opção na tentativa de conciliar a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal acerca de carta rogatória executória.

Pelo auxílio direto, não há um pedido de cooperação de um juízo para outro, mas a busca de uma decisão genuinamente estrangeira que se refira a um litígio interno.

37 ARAUJO, op. cit.

(35)

Internamente o auxílio direto tem origens e regulações na Resolução n.º 9, de 04 de maio de 2005, do Superior Tribunal de Justiça onde no art.7º, parágrafo único, foi consignado que os pedidos de cooperação judiciária “stricto sensu” não serão por ele cumpridos, devendo

ser levados, quando impliquem a necessária intervenção do Poder Judiciário, ao conhecimento do primeiro grau de jurisdição.

Para dar instrumentalidade aos pedidos de auxílio direto, já que este não passa pelo juízo de delibação de nenhum Tribunal Superior, existe no Brasil, assim como nos demais Estados, uma autoridade central. Registre-se ainda que a utilização de autoridades centrais constitui outra novidade cada dia mais freqüente. Foi criada na Conferência de Haia para o Direito Internacional Privado, e se difundiu pelas convenções mais modernas e busca assegurar que o intercâmbio se faça de modo rápido. No Brasil, amiúdes vezes, o Ministério da Justiça tem exercido esse papel.

No Brasil, foi designado para exercer o papel de Autoridade Central em cooperação jurídica internacional a Secretaria Nacional de Justiça, por meio do Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional (DRCI), criado pelo Decreto nº 4.991, de 18 de fevereiro de 2004.

No auxílio direto, o papel das Autoridades Centrais é ainda mais importante, no sentido de auxiliar o interessado a propor sua demanda da melhor maneira possível, valendo-se da utilização dos órgãos nacionais do Estado, onde é devalendo-sejada a obtenção de algum provimento judicial. A figura da autoridade central, prevista nos ajustes internacionais da matéria, é órgão designado pelo Estado para efetuar o trâmite de pedidos, tanto na modalidade ativa quanto na passiva. Caberá a ela encaminhar os casos às autoridades competentes para pleitear as medidas cabíveis perante o juízo de primeiro grau.

Consoante orientação do Ministério da Justiça, em regra, os pedidos de auxílio direto são alicerçados em tratados ou acordos bilaterais (os chamados Mutual Legal Assistance Treaties ou MLATs). Caso não exista ajuste expresso entre os dois Estados, a assistência

poderá ser realizada baseando-se na garantia de reciprocidade do requerente. É possível cooperar nos mais diversos temas, como tributário, trabalhista e previdenciário. No entanto, os tratados mais frequentes no cenário internacional versam sobre matéria penal e civil.

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encaminhará o pedido ao juiz respectivo, tornando o trâmite mais ágil do que as cartas rogatórias.39

Desta forma, o auxílio direto de caráter penal é utilizado, em regra, quando um Estado, a fim de subsidiar procedimento em trâmite em seu próprio território, necessita de providência judicial a ser obtida em outra jurisdição. Crimes de lavagem de dinheiro e tráfico de drogas, por exemplo, freqüentemente, ao serem processados e julgados em um país, precisam de produção de provas testemunhais ou documentais em outros países. Em virtude da natureza muitas vezes fluida da prova, a rapidez em sua obtenção é indispensável, o que faz com que o auxílio direto seja o instituto mais adequado para a consecução do pedido.40.

Além disso, quando estabelecida em tratado, a cooperação por meio de Autoridades Centrais pode trazer ao ordenamento jurídico brasileiro algumas regras que tornam a cooperação mais célere, como a dispensa de legalização e autenticação de documentos, a dispensa de tradução juramentada, o provimento de assistência jurídica gratuita, a estipulação legal de prioridade em favor do procedimento, a comunicação direta entre Autoridades Centrais, etc.

No intuito de enfatizar essa nova modalidade de cooperação, Nadia de Araújo41, deixa dois exemplos consideráveis no âmbito do direito de família: O primeiro resulta da Convenção de Nova York sobre execução e reconhecimento de obrigações alimentares42. Nesse caso, a autoridade central é o Ministério Público Federal, e os pedidos vindos do exterior são a ele endereçados. Em seguida, o pedido de alimentos, promovido pelo MPF, é feito diretamente a um juiz federal. O segundo exemplo é a Convenção de Haia sobre os aspectos civis do seqüestro internacional de crianças43. O pedido do exterior é enviado à autoridade central, que poderá dar início a um procedimento requerendo a volta do menor, também diretamente ao juiz federal do local onde este se encontra. Em ambos os pedidos, o requerimento é feito de forma direta, ao juiz local, pela autoridade central encarregada da Convenção no Brasil.

Outro moderno mecanismo de cooperação jurídica internacional é a transferência de processos. Previsto em alguns diplomas internacionais, esse instrumento de colaboração

39 MENDRONI. Marcelo Batlouni. Crime de lavagem de dinheiro. São Paulo: Atlas: 2008. p. 28. 40

BRASIL. 2008. op. cit. 41 ARAÚJO, op. cit.

42 Aprovada pelo Decreto n. 10, de 1958, e promulgada pelo Decreto Executivo n. 56.826, conforme ARAÚJO, op. cit.

(37)

viabiliza o deslocamento de um procedimento penal, já instaurado na jurisdição de um Estado, para outro Estado também competente para processar e julgar aquele ato (hipóteses comuns em crimes transnacionais) sempre que o traslado for benéfico ao trâmite do processo. Importante lembrar que não há disposição específica sobre o instituto na legislação interna brasileira44.

Oportuno se torna dizer o quão notório é o crescimento da cooperação internacional desenvolvida no Estado brasileiro. É visível, também, o largo campo de atuação ainda inexplorado, de maneira que o desenvolvimento da cooperação jurídica internacional é algo inevitável.

Não é enfático reafirmar que tudo isso tende a colocar o Brasil em posição de destaque no cenário internacional, para que se assegure ao nosso país o papel, que já lhe pertence, de protagonista na cooperação jurídica desenvolvida em nível mundial.

44BRASIL. 2008. op. cit.

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Gráfico 1 - Porcentagem dos pedidos de cooperação em matéria penal considerando o país estrangeiro  (destinatário ou remetente) - Período: 2004 a 2009

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