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Colaboração e dissenso marcam as relações entre IBAMA e Museu Goeldi IBAMA e Museu Paraense Emílio Goeldi tiveram suas relações

A INVENÇÃO DA ESTAÇÃO CIENTÍFICA NA FLORESTA NACIONAL DE CAXIUANÃ

1.3 A saga de uma estação científica

1.3.2 A construção da base da Estação Científica

1.3.2.1 Colaboração e dissenso marcam as relações entre IBAMA e Museu Goeldi IBAMA e Museu Paraense Emílio Goeldi tiveram suas relações

estreitadas a partir da decisão do governo federal de assinar um Termo de Ajuste Complementar para a instalação de uma base de pesquisas do MPEG na Floresta

Nacional de Caxiuanã. A julgar pelo depoimento do Dr. Guilherme Maia, diretor de pesquisas do Museu, à época, e diretor do Museu no período da construção da base e inauguração da Estação, a relação era cordial:

Para a implementação da Estação nós não tivemos absolutamente nenhum problema com o IBAMA, muito pelo contrário, houve uma aproximação muito grande naquele momento, foi muito fácil conduzir a questão inicialmente pelo Doutor Guilherme de La Penha e o jornalista Fernando Mesquita que tinha muita sensibilidade.... Foi muito fácil esse contato com o Mesquita. Posteriormente, mesmo em nível local, também não tivemos nenhum problema porque na época diretores do IBAMA presentes aqui eram pessoas de largo trânsito com o Museu Goeldi como por exemplo, o Curi, pessoa que incentivou muito. Até mesmo os fiscais do IBAMA naquela região eram pessoas de fácil contato, de fácil trânsito, de relacionamento muito bom. Não tivemos absolutamente nenhum problema com o IBAMA nenhum problema de relacionamento, nenhum problema de impedimento para que essa Estação pudesse ser implementada dentro de uma floresta nacional como a Floresta de Caxiuanã”.

A versão da Dra. Ima Vieira, atual diretora do MPEG e que à época da implantação do projeto Caxiuanã foi uma das pessoas responsáveis pela escolha da área junto com o pesquisador Rafael Salomão, ambos do então departamento de Botânica do MPEG, liderados pelo renomado botânico João Murça Pires, sugere uma tranqüilidade aparente. Segundo ela, a decisão de ceder os 33 mil hectares ao Museu Goeldi foi unilateral e se deveu em muito à influência do diretor do Museu Goeldi, no momento da negociação, o Dr. Guilherme de La Penha28. Essa divergência de opiniões sobre o assunto dentro do IBAMA teria provocado inclusive o afastamento do Dr. Deusdará29 que discordava do tratamento dispensado ao Museu pelo então Presidente Dr. Fernando Mesquita. Por conta desse problema interno no IBAMA o convênio firmado à época autorizando a cessão em comodato de 33 mil hectares pelo prazo de 30 anos, prorrogáveis, nunca foi publicado no Diário Oficial. Este convênio, sem amparo legal, poderia ter sido rescindido a qualquer momento, trazendo sérios prejuízos ao Museu Goeldi. Felizmente a Estação se consolidou e tal fato não aconteceu. Mais recentemente, na gestão do Dr. Peter Toledo30 um técnico do IBAMA remanescente do grupo que era contrário à implantação da Estação na FLONA Caxiuanã, trouxe o assunto à tona. Foram realizadas varias reuniões com o Dr. Antonio Hummel, diretor de Florestas Nacionais, para resolver o que era possível fazer diante da “ilegalidade” do convênio que segundo este técnico só teria validade por cinco anos, caso em que as

28 O matemático Guilherme Maurício Souza Marcos de La Penha, PhD, foi diretor do MPEG no período de 1986 a1990. Por ter residido longo período em Brasília e ocupado a Vice-Presidência do CNPq, tinha importantes contatos no meio político.

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Um dos diretores do Ibama/Brasília, à época das negociações

atividades científicas desenvolvidas na Estação Científica Ferreira Penna/Museu Goeldi não teriam qualquer amparo legal. Segundo Ima Vieira, que no momento desta negociação era vice-diretora do Museu Goeldi e coordenadora de pesquisas, “foi um sufoco enorme e a primeira redação do novo convênio contrariava as nossas expectativas de pesquisa, um horror”. Ima diz ainda que em conversa direta com o Dr. Hummel repassando a história da implantação da Estação, o mesmo reafirmou que ainda havia no IBAMA um grupo contra a implantação da Estação Científica do Museu Goeldi na FLONA Caxiuanã. Foi o próprio Dr. Hummel quem reviu o convênio, agora com as sugestões levadas pelos diretores do MPEG e recomendou ampliar a atuação do Museu para toda a FLONA, tal como ocorre atualmente.

O IBAMA tem assento no Conselho da Estação Científica, desde a criação do primeiro Conselho em 1994. Desta forma, o MPEG procura dar a conhecer toda a sua programação de pesquisa para Caxiuanã e resolver questões internas como demora ou dificuldade na análise de projetos que demandem expedição de licenças de coleta, utilização de embarcações, já que a base do IBAMA, em Caxiuanã, fica a apenas uma hora de barco da base da Estação.

A Dra. Ima Vieira cita “problemas de diversas ordens” para a expedição das licenças de coleta por parte do IBAMA. As licenças de coleta assim como o relacionamento IBAMA/pesquisadores tem sido objeto de debate por parte das sociedades científicas inclusive da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC).

Com o advento da convenção da biodiversidade, as regras passaram a ser mais rígidas, e o controle do IBAMA mais efetivo sobre as expedições para Caxiuanã. Os pesquisadores do Museu reclamam que às vezes são tratados como “puxadores” de madeira da floresta de forma ilegal, especialmente depois que as “apreensões” do IBAMA passaram a ser objeto de exposição na mídia nacional e até internacional. Para resguardar a Instituição e seus pesquisadores há uma recomendação explícita da direção do Museu para que nenhum pesquisador saia para atividade de campo que implique em coleta de material biológico, sem a autorização de coleta dada por aquele órgão. Esta recomendação, foi reforçada depois que expedições associadas ao nome do Museu Goeldi tiveram pesquisadores detidos e material interditado. Uma dessas expedições era dirigida por pesquisador da USP que coletou plantas medicinais em Caxiuanã. O material foi apreendido no aeroporto porque os fiscais do IBAMA não consideraram a

autorização de coleta do “partner” da UFPA no projeto, que estava em poder do cientista da Universidade de São Paulo, suficiente. Estes fatos chamaram atenção da imprensa e tiveram repercussão em veículos nacionais e no Jornal da Ciência31, trazendo desgaste para a direção do Museu Goeldi e irritação aos pesquisadores.

Em excursão realizada à FLONA de Caxiuanã em janeiro de 2007, tivemos a oportunidade de encontrar o Dr. Alexandre Luiz Padovan Aleixo, ornitólogo, no acampamento do PPBIO e este nos relatou que o IBAMA deu uma “incerta” no local motivado por uma denúncia de que a coleta estava sendo feita por estrangeiros sem licença. Os estrangeiros eram dois pesquisadores do Field Museum de Chicago32. Um deles, curador da coleção de ornitologia daquele Museu , enquanto que o outro realizava pesquisa de pós-doutorado. Contou-nos que explicou a situação à Lúcia33/IBAMA e que ela foi compreensiva, apesar de ter se dirigido ao acampamento com instruções expressas do Sr. Leandro Cortese Aranha (atual gerente da FLONA) para “interromper prontamente as atividades dos pesquisadores estrangeiros presentes na FLONA, levá-los imediatamente para Belém e proceder à apreensão de todo o material coletado”. Ao fazer a vistoria in loco a agente do IBAMA concluiu que não havia irregularidade, mesmo assim aconselhou o pesquisador a passar na sede do IBAMA o que foi feito. Estava apenas começando mais um episódio que resultou no auto de infração 45815 emitido pelo analista ambiental Gunther Barbosa.

Outra questão que vem sendo tratada conjuntamente pelo IBAMA e Museu Goeldi é a discussão de uma nova modalidade de Unidade de Conservação para a Floresta Nacional de Caxiuanã. Essa nova modalidade proposta pelo IBAMA poderá ter implicações na atividade de pesquisa do MPEG, razão pela qual a Instituição está se organizando para realizar um seminário sobre o assunto. Este é outro assunto que aguarda a pacificação dos ânimos e a definição sobre as relações com o Museu Goeldi, que neste momento não estão claras. Quem será o interlocutor? O IBAMA ou o Instituto Chico Mendes? Ou os dois? Em nota recente veiculada na imprensa, a SBPC, em carta de seu presidente apóia a criação do Instituto Chico Mendes, o que indica que a comunidade científica deposita suas esperanças de resolver os impasses que giram em torno das autorizações para a coleta e acesso à biodiversidade.

31 JC e-mail 3006, de 02 de maio de 2006: Biopiratas, criminosos ambientais e pesquisadores: “farinha do mesmo saco”? artigo de Alexandre Aleixo.

32 Dr. John M. Bates, chefe do Depto de Zoologia do Field Museum de Chicago e Dr. Jason D. Weckstein, pós-doutorando daquele Museu.

CAPÍTULO 2

O PROCESSO DE PRODUÇÃO E REPRODUÇÃO DO SABER ENTRE OS