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A INVENÇÃO DA ESTAÇÃO CIENTÍFICA NA FLORESTA NACIONAL DE CAXIUANÃ

1.2 IBDF, IBAMA, Instituto Chico Mendes: as diferentes gestões da floresta

1.2.2 Expectativas em torno do plano de manejo

O IBAMA, até o início de maio de 2007, subordinado ao Ministério do Meio Ambiente, era o órgão federal responsável pelo gerenciamento, fiscalização e manutenção das florestas nacionais brasileiras. Entre suas atribuições estavam a elaboração do Plano de Manejo e a criação de Conselhos Gestores para cada FLONA.

No momento em que este trabalho está sendo finalizado, o IBAMA tem suas atribuições concentradas na fiscalização enquanto que o recém-criado Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) passa a ser responsável pela gestão das florestas. Em 2006, foi criado o Serviço Florestal Brasileiro (Lei 11.284 de 2 de março de 2006), que apoiando-se em uma comissão de gestão tem por atribuição a gestão sustentável das florestas públicas, incluindo planos de manejo e concessões de uso das florestas. Antropologicamente é o deslocamento da categoria “floresta nacional” para “floresta pública”. A leitura da Lei 11.284 inaugura outra concepção de floresta, na qual se consagra o direito de permanência das populações tradicionais.

Com esta mudança, possivelmente será adiada mais uma vez a elaboração do plano de manejo, há muito demandado pelos ribeirinhos, que ainda hoje sofrem as rigorosas limitações praticadas no passado quanto ao uso dos recursos naturais. O Plano de Manejo é um instrumento exigido para qualquer unidade de conservação, sendo o uso de recursos madeireiros um dos pontos críticos. É no Plano de Manejo que se define o planejamento territorial da unidade, os programas, as áreas que podem ser submetidas à concessão pública para exploração madeireira, os direitos das comunidades tradicionais que vivem dentro e no entorno da Floresta. Como o Plano de Manejo é uma exigência para o manejo de qualquer floresta nacional, estima-se que, apesar dos adiamentos, Caxiuanã terá logo o seu plano de manejo elaborado, uma vez que é uma das FLONAS já listadas pelo IBAMA para a possível concessão para a exploração de madeira. Para a elaboração do Plano, existem informações técnicas e científicas disponíveis, especialmente do Museu Paraense Emílio Goeldi, que tem se dedicado a produzir informações científicas sobre a floresta.

As discussões visando a elaboração do Plano de Manejo já vêm de algum tempo. Depois da cessão de uso para o Museu Goeldi realizar pesquisas científicas, já em 1996, portanto há dez anos, realizou-se na Estação Científica Ferreira Penna, uma reunião com o representante nacional do setor de florestas, em Brasília, o senhor Adalberto Meira Filho. Nesta reunião, da qual participaram além de Pedro Lisboa, coordenador da Estação Científica, outros pesquisadores do Museu, técnicos da Sudam e da Sectam e pesquisadores da UFPA, já ficou estabelecido um cronograma de reuniões a serem realizadas entre IBAMA e Museu para desenhar o roteiro do Plano de Manejo. Na oportunidade foram apreciados alguns documentos de outras florestas nacionais e reservas biológicas. Um dos motivos que suscitou a visita do representante

do IBAMA de Brasília a Caxiuanã foi a possibilidade de um financiamento da ITTO23 para a elaboração do referido Plano. Retornando a Brasília, o Sr. Adalberto ainda manteve contato por telefone por algum tempo, depois o assunto foi se perdendo no dia a dia de ambas as instituições.

Em 2000 a coordenação da Estação Científica Ferreira Penna era exercida por Samuel Almeida, que retomou as discussões com o IBAMA para a elaboração do Plano. Este não teve seguimento por várias razões políticas e financeiras. No período de 2001 a 2005, a coordenação da Estação Científica Ferreira Penna foi substituida três vezes, o que certamente dificultou o encaminhamento da discussão por parte do Museu Goeldi, apesar de Samuel Almeida continuar acompanhando o assunto, agora não mais como representante institucional e sim como pesquisador.

Em 2006, o coordenador da Estação Científica Ferreira Penna24 participou de duas reuniões no município de Portel, organizadas pelo IBAMA de Brasília, com representantes dos Municípios de Melgaço e Portel e das comunidades da Floresta Nacional de Caxiuanã para retomar a discussão sobre a elaboração do Plano de Manejo. Nestas reuniões, segundo o coordenador, foi tratado basicamente da necessidade das comunidades da FLONA se organizarem em associações. Além das reuniões em Portel, foram realizados também encontros “nas comunidades” para tratar do mesmo assunto. Em reunião realizada na Estação Científica Ferreira Penna, em outubro de 2006, por ocasião da V Gincana de Caxiuanã25, na qual foi organizada uma oficina para discutir o associativismo, um representante de uma “comunidade” da FLONA Caxiuanã deixou a todos preocupados quando externou o motivo da reunião do IBAMA em sua “comunidade”. No seu entendimento: “os ribeirinhos precisam se organizar em associações a fim de poderem trabalhar como prestadores de serviços para as madeireiras que virão explorar a FLONA Caxiuanã”. Apesar de terem sido convidados para a Gincana, os representantes do IBAMA local estiveram na Estação Científica no dia anterior se desculpando por não poderem participar do evento, em virtude de compromissos já assumidos. Não havia, portanto, como esclarecer a constrangedora situação, que ficou em suspenso, tendo o coordenador da Estação Científica ficado de pedir aos técnicos do IBAMA que retornassem às “comunidades”,

23 ITTO – International Tropical Timber Organization. 24 Refiro-me à Antonio Carlos Lobo Soares, arquiteto.

25 Gincana de Caxiuanã – evento idealizado para comemorar o aniversário da Estação Científica e que reúne estudantes, professores e lideranças comunitárias da FLONA.

para explicar a abrangência e a importância do Plano de Manejo para quem vive na floresta. Esse episódio mostra que, quando não há organizações sociais atuantes como a Comissão Nacional de Seringueiros, que intervêm no processo, não só a elaboração do plano se estende no tempo, como as fórmulas idealizadas em Brasília são reinterpretadas à luz da experiência histórica da relação com as instituições.

Com a reestruturação do MMA, visando a gestão de unidades de conservação, o Museu ainda busca reconhecer o interlocutor para a retomada do assunto. Enquanto isso, a extração ilegal de madeira vem avançando.