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3 EXPLORANDO OUTRAS NOTAÇÕES NOS MESMOS ESPAÇOS E TEMPOS:

3.3 TRATAMENTO DA INFORMAÇÃO

3.3.1 A coleta dos dados: fazendo escolhas

Lopes e Coutinho (2009) acreditam que é papel do professor a criação de um ambiente de aula, de propor, organizar e coordenar atividades envolvendo o tratamento da informação, também denominada pelos autores como educação estatística. Para iniciarmos as discussões, traremos o episódio 15, denominado “A escolha das cores para pintar os círculos no jogo dos dentes” foi recortado da aula filmada no dia 2/7/2009 na sala de referência do grupo três, com a participação de todos os alunos e professoras 1 e 3 (que acompanhou a votação pois em seguida daria continuidade ao trabalho no espaço do ateliê). Essa aula faz parte das atividades desencadeadas pelo projeto sobre os dentes e dá início ao processo de construção do jogo dos dentes.

No dia anterior planejamos com as crianças que escolheríamos três cores para pintar os círculos (que representam os dentes no jogo), uma cor representaria os alimentos que são bons para os dentes, a outra cor os alimentos que são prejudiciais aos dentes e a outra cor seria neutra, não representando nenhuma, nem outra situação. Os alunos sentaram na bancada30 em frente ao quadro de giz e dividi o quadro em três partes, uma para os votos de cada cor, como havia sido planejado.

Episódio 15: A escolha das cores para pintar os círculos no jogo dos dentes

(1) (Prof.ª 1 solicita que cada criança escolha uma cor aleatoriamente) (2) N: Rosa.

(3) C: Rosa.

(4) Prof.ª 1: Será que todos precisam votar na mesma cor? (5) R: (pensa com o dedo no rosto e fala) roxo.

(6) A: Vermelho. (7) F: Azul. (8) L: Verde. (9) V: Vermelho. (10) AL: Roxo. (11) J: Rosa. (12) AC: Rosa. (13) CS: Roxo. (14) G: Azul

(15) Enquanto as crianças dizem a cor escolhida a professora escreve no quadro o nome das cores e um risquinho para cada voto. O A reclama que o vermelho precisa vencer.

(16) Prof.ª 1: Calma A, são três cores que vamos escolher!

(17) Prof.ª 1: Como podemos determinar a cor que tem mais votos? Quantos temos no rosa?

30

Móvel com dois degraus em que as crianças sentam para reuniões, discussões, para planejarmos a agenda do dia e escrevermos no quadro de giz.

(18) (Contam juntos e dizem quatro, nas cores seguintes vão logo dizendo a quantidade alegando que não é necessário contar indicando com o dedo, pois são quantidades pequenas e contam apenas olhando para o quadro: roxo – 3 votos, vermelho- 2 votos, azul- 2votos e verde- 1 voto).

(19) (A reclama e chora que quer o vermelho. A professora continua com a atividade).

(20) Prof.ª 1: Qual a cor que tem mais votos?

(21) Grupo: Rosa. (a professora escreve no lugar correspondente a uma das cores vencedoras, com quatro votos).

(22) Prof.ª 1: Qual a segunda cor que tem mais votos? (23) Grupo: Roxo.

(24) G e AL: Porque ganhou 3 votos. (professora escreve roxo como a segunda cor escolhida)

(25) Prof.ª 1: Temos um problema aqui (apontando para as cores vermelha e azul, ambas com dois votos).

(26) G Levanta, mostra com a mão e fala: Vermelho e azul deu igual!

(27) Prof.ª 1: Que cor vamos usar, porque combinamos de usar somente 3 cores, já temos duas, falta uma!

(28) A: Vermelho. (29) Prof.ª 1: Por quê? (30) A: É a cor do meu time!

(31) Prof.ª 1: Como vamos desempatar?

(32) C: Tive uma idéia, sai um dali e completa aqui (referindo-se a cor verde que recebeu apenas um voto).

(33) Prof.ª 1: Quem votou no verde? (34) L: Eu.

(35) Prof.ª 1: Que cor você escolhe? Vermelho ou azul? (36) L: (fala baixo) Vermelho.

(37) (A professora escreve vermelho no quadro, como a terceira cor escolhida pelo grupo).

Nas linhas 1 -14 as crianças escolhem as cores, através de uma espécie de votação e iniciamos dessa forma a coleta dos dados para selecionarmos três cores a serem utilizadas. Observamos que a coleta de dados foi utilizada para resolvermos um problema, ou seja, conforme combinado com o grupo, não poderíamos utilizar mais de três cores. A professora interage com o grupo quando questiona para que pensem a cor que vão escolher, não necessitando imitar a escolhida pelo colega (linha 4) e escrevendo o nome das cores e desenhando um risquinho para o voto de cada criança (linha 15).

Podemos observar também, no decorrer do episódio (linhas 15, 16, 19, 28, 29, 30) que o aluno A quer que sua vontade prevaleça, ou seja, que a cor vermelha seja escolhida na votação. A professora sugere que espere a contagem dos votos e continua com a aula, mas ele insiste que o vermelho é a cor do seu time. A coleta de dados realizada com os alunos, onde cada um pode fazer sua escolha nos auxiliou na tomada de decisões, pois caso contrário a atividade não seria democrática. Além disso, introduzimos, nesse momento, a idéia de probabilidade, com a “percepção do acaso pela apreensão do componente de imprevisibilidade em uma situação ou fenômeno (...)” (LOPES e COUTINHO, 2009, p.70) e a criança vai desenvolvendo o seu pensamento estatístico e se acostumando com a ideia de

que nem tudo pode ser previsto o que foi demonstrado pela angustia do aluno A para saber se a cor que escolheu será utilizada para a pintura dos círculos.

Seguindo com o episódio (linha 17), a professora problematiza como fará a contagem dos votos e a definição das três cores. Logo contam e descobrem que a cor que tem mais votos é o rosa, e a segunda é o roxo. Observamos que o conceito de número cardinal (quantidade total de votos de cada cor) e ordinal (ordem em que cada cor ficou), discutida no capítulo dois volta à tona e as crianças contam pequenas quantidades sem dificuldade.

A decisão da terceira e última cor que seria incluída através da coleta dos dados, envolveu a resolução de um outro problema, apontado pelo aluno G, pois duas cores receberam o mesmo número de votos – o azul e o vermelho. A professora não disse como fariam o desempate, apenas questionou como fazê-lo, pois como afirma Moysés (2007, p.37) o processo de ensino e aprendizagem e de significação dos conceitos é “um processo dinâmico, construído passo a passo pelos alunos em estreita interação com o professor”. Para a mesma autora, os questionamentos do professor desempenham um papel importante para a aprendizagem, se o mesmo fizer perguntas que provocam o desequilíbrio cognitivo, ou seja, se façam o aluno pensar sobre. A aluna C (linha 32), sugere tirar o único voto do verde e colocar na outra cor. Então, a professora questionou quem votou no verde e o aluno L decidiu trocar pela cor vermelha (linha 36) e esta então é a terceira cor a ser utilizada para pintar os círculos para o “jogo dos dentes”.

Observamos que fazer escolhas não é algo fácil por diversos motivos: por quererem repetir a cor que o colega escolheu, por mudar o voto para agradar o colega (no caso do L que supostamente escolheu o vermelho para agradar A), etc. Segundo Silva e Buriasco (2006, p.42) esse pode ser um momento para que as questões éticas sejam pensadas, como, por exemplo, a confiança na própria capacidade de fazer escolhas, ter que respeitar a escolha dos colegas, o fato de influenciarem-se ou não pela resposta dos outros.

Com a escolha das três cores, encerramos a etapa de coleta dos dados, que “são vistos como números em um contexto, contexto este que motiva os procedimentos e é a base para a interpretação dos resultados” (LOPES e COUTINHO, 2009, p.67). No subitem seguinte discutiremos a organização e representação dos dados.