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Capítulo 3 A contrarreforma do Estado: aprofundamento da condição

3.3 A condução da contrarreforma do Estado brasileiro

3.3.1 Collor e a difusão das ideias neoliberais

Em seus estudos Lima (2007) argumenta que os governos de Fernando Collor de Mello (1990-1992) e Itamar Franco (1993-1994) identificam o momento de adesão do país ao projeto neoliberal. A burguesia brasileira, em sintonia com o avanço do neoliberalismo em todo o mundo, tratou de fomentar as bases para a difusão e implementação desse ideário no país. Seria uma forma de substituir o modelo desenvolvimentista por novos padrões de acumulação, pautado no fim da intervenção do Estado e na desregulamentação dos direitos sociais, já inseridos na Carta Magna.

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Divulgada pela Globo News no dia 26/11/2011.

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A partir dos fatos divulgados podemos afirmar que a Rede Globo de Televisão manipulou todo o processo e não apenas o debate.

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Sobre esse assunto sugerimos o filme Muito além do cidadão Kane e a leitura do livro A história secreta da Rede Globo de Daniel Herz.

De acordo com Lima (2007) o projeto Brasil Novo, Reconstrução Nacional e os Planos Collor I e II estavam fundamentados nos acordos do Consenso de

Washington219. Quando Collor tomou posse, em março de 1990, a inflação chegou a

80% ao mês e ameaçava aumentar. Como forma de enfrentamento o presidente anunciou um plano econômico radical que bloqueava todos os depósitos bancários existentes, por dezoito meses, permitindo apenas saques cujo limite era de 50 mil cruzeiros. O plano estabelecia também o congelamento de preços, o corte de despesas públicas e a elevação de alguns impostos. Collor também extinguiu a moeda vigente (o cruzado) e restabeleceu o antigo cruzeiro. Ao mesmo tempo,

iniciou a privatização de empresas estatais220, concedeu maior abertura ao comércio

exterior221 e incentivou a redução do número de funcionários públicos (FAUSTO,

2012).

Entretanto, denúncias de corrupção feitas pelo irmão do presidente Collor, levaram a Câmara dos Deputados a votar pelo seu afastamento em setembro de 1992, até que o Senado julgasse o pedido de impeachment. O prosseguimento das investigações e a mobilização dos jovens de classe média já anunciavam que Collor não voltaria à presidência. Collor renunciou ao cargo em dezembro de 1992, mas, mesmo assim foi julgado culpado pelo Senado e teve os direitos políticos suspensos por oito anos (FAUSTO, 2012).

A política de educação não ficou alheia a esse processo de contrarreforma do Estado. A partir do governo Collor de Mello (1990-1992) houve um conjunto de alterações na política de educação superior em direção à formação de recursos humanos requeridos por um mercado competitivo e de inserção do Brasil na dinâmica da globalização econômica e da chamada "sociedade da informação" (LIMA, 2007).

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O consenso de Washington foi estabelecido a partir de um seminário realizado nesta cidade, entre os dias 14 e 16 de janeiro de 1993. Nesse encontro, que reuniu executivos de governo, dos bancos multilaterais, empresários e acadêmicos de onze países, foi discutido um texto do economista John Williamson e decididos os passos políticos para a implementação de programas de estabilização, cujo receituário indicava medidas de ajuste para as economias dos países da América com vistas à sua associação à dinâmica neoliberal mundial sob a ingerência norte-americana (FIORI, 1994 apud BEHRING, 2008, p. 149).

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Privatizou todo o setor siderúrgico como a Usiminas, Siderúrgica de Tubarão, Aços Piratini, Mafersa e preparou a futura privatização da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) (LIMA, 2007).

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De acordo com Behring (2008) essa abertura representou uma versão atual da abertura dos portos às nações amigas. A política econômica dos dois anos de governo Collor fez com que o Brasil se adequasse destrutivamente ao reordenamento mundial.

Após a posse de Collor em 1990, o que eram apenas relatórios no Governo Sarney passou a se efetivar. Várias medidas foram tomadas com vistas à redução de gastos e que culminou com a extinção da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) e do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), ligados ao Ministério da Educação. Entretanto, a reação da comunidade acadêmica levou a recriação destes órgãos (CUNHA, 1997).

No primeiro ano do governo Collor foi criado o Plano Setorial de Educação 1991- 1995 que retomava diretrizes já discutidas pela desativada Comissão Nacional para Reformulação da Educação Superior e pelo GERES. Em seu prefácio continha a afirmação de que a “autonomia universitária dependeria do desempenho das instituições” (CUNHA, 1997, p. 27) como também preconizava o documento do Banco Mundial intitulado Higher Education Reform in Brazil de 1991 (CUNHA, 1997).

Outro documento marcante foi o Brasil, um projeto de reconstrução nacional conhecido popularmente como "Projetão" lançado em fevereiro de 1991. Em relação ao ensino superior o material deu destaque para o debate da implantação da autonomia universitária; a alocação de recursos pautada na avaliação de desempenho; o estímulo para que as universidades buscassem recursos no mercado principalmente via empresas (TAVARES, 1997).

Diante das discussões que envolviam o ensino superior, o ministro Goldenberg222

apresentou um projeto de emenda constitucional223 para regulamentar a autonomia

universitária. Este projeto foi recebido pelo governo federal que o reuniu junto “a outras questões que tratavam da regulação pelo mercado da distribuição de derivados de petróleo, da exploração dos serviços de telecomunicações, da mineração, da desregulamentação do comércio exterior e outras” (CUNHA, 1997, p. 28). Este projeto de emenda constitucional

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Em agosto de 1991 o presidente substituiu o Ministro da Educação Carlos Chiarelli por José Goldenberg, “ex-reitor da Universidade de São Paulo que ao atuar como secretário estadual da educação negociou com a Assembleia Legislativa paulista o dispositivo da autonomia financeira das universidades paulistas” (CUNHA, 1997, p. 28).

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já com os adendos de parecer favorável recebidos na Câmara dos Deputados, estipulava que as universidades públicas constituiriam uma categoria específica de entidade, distinta dos órgãos da administração direta e indireta (fundações e autarquias) de modo que seu pessoal perdesse o status de funcionário público, inclusive o benefício da estabilidade (garantindo-se os direitos adquiridos pela Constituição). O governo federal passaria a destinar às suas universidades um percentual fixo dos recursos resultantes de impostos, com o que elas cobririam as despesas de pessoal ativo, inativo e pensionista, com a única restrição de que esses gastos não ultrapassassem 80% do total do orçamento de cada instituição. Para complementar os recursos transferidos pelo Poder Público, as universidades deveriam buscar fontes alternativas de financiamento obtido através da necessária interação com a comunidade (CUNHA, 1997, p. 28, 29).

Entretanto, a resistência política de entidades como o Andes-SN, a Fasubra e a UNE aliada à crise que envolvia o governo contribuíram para o não prosseguimento deste projeto (MARTINS; NEVES, 2004).

Lima (2007) também apresenta como uma das ações empreendidas pelo governo Collor a desnacionalização de setores estratégicos a exemplo da política de ciência e tecnologia, especialmente por meio da Lei de Informática, nº 8.248/91. Para a autora a desnacionalização surgiu como uma forma de ampliar a integração do país ao mercado mundial de forma privatista.

Além disso, o governo Collor gastou um valor menor que o mínimo estipulado pela Constituição Federal de 1988 de 18% da receita anual para o financiamento público da educação superior (LIMA, 2007).