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Capítulo 3 A contrarreforma do Estado: aprofundamento da condição

3.3 A condução da contrarreforma do Estado brasileiro

3.3.4 Heranças e obras do governo Lula

A vitória de Luís Inácio Lula da Silva nas eleições de 2002 esteve relacionada à queda da avaliação positiva em relação ao governo FHC ao final de seu segundo

mandato238 e ao redirecionamento levado a efeito pelo Partido dos Trabalhadores

(CARREIRÃO, 2004; MARQUES; MENDES, 2006). Luís Inácio Lula da Silva venceu as eleições em segundo turno, derrotando José Serra, candidato da oposição (CARREIRÃO, 2004).

O PT que foi criado a partir de uma base popular em fevereiro de 1980 redefiniu o seu programa ainda no final da década de sua criação, reduzindo os seus objetivos a ocupação do poder em detrimento da organização dos trabalhadores. A partir de então, iniciou uma série de reordenamentos internos que atravessou a década de 1990 “pautado em três eixos políticos fundamentais: alterações no programa partidário, mudanças na organização e estrutura interna do partido e estabelecimento de alianças com diversas frações da burguesia brasileira” (LIMA, 2007, p. 108).

Lima (2007) argumenta que até a metade dos anos de 1990 era possível verificar o deslocamento do PT para uma posição "social-democrata", mas, em seguida o partido se direcionou mais "à direita" retirando da pauta de ações a luta pelo socialismo e adensando a conciliação de classes.

A aliança de Lula com os pequenos partidos de esquerda (PCdoB), com partidos inclinados a social-democracia (como o Partido Socialista de Miguel Arraes) e o partido liderado por Leonel Brizola (o Partido Democrático Trabalhista) foi ampliada

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A avaliação negativa crescente quanto ao segundo mandato de FHC sobreveio principalmente após a desvalorização do real (em janeiro de 1999), ao aumento das taxas de desemprego e a percepção de que permanecia um elevado grau de desigualdade social no país (CARREIRÃO, 2004). Assim “o percentual de eleitores que ainda avaliavam positivamente o governo fornecia combustível para que um candidato situacionista pudesse chegar ao 2º turno, embora dificilmente pudesse ganhar as eleições”, o que de fato se concretizou (CARREIRÃO, 2004, p. 181).

e redesenhada incluindo a elite brasileira. Parte da burguesia internacional que parecia preferir o candidato do PSDB, José Serra, se aliou a Lula sem hesitar após a Carta aos Brasileiros divulgada em 2002. Dessa forma, “representantes de grandes grupos econômicos – dos setores financeiro, industrial, agrobusiness, comunicações – migraram para a candidatura Lula, fato que mais tarde se refletiu no ministério e na agenda do governo” (LEHER, 2003, p. 82).

O partido abandonou o seu projeto original e o radicalismo mostrando uma clara moderação, que ao final direcionou este governo ao cumprimento das expectativas neoliberais. Na Carta aos Brasileiros publicada em 22 de junho de 2002, Lula assumiu “o compromisso do futuro governo com os contratos e acordos firmados com os organismos internacionais, implicando: a) adotar o regime de metas de inflação; b) manter o câmbio flutuante; c) praticar superávits elevados, e d) manter altos juros” (LEHER, 2003, p. 83). Tal atitude acalmou as camadas mais conservadoras da população que ainda foi agraciada com o anúncio de que um empresário (José Alencar) ocuparia o cargo de vice-presidente (CARREIRÃO, 2004).

A aliança com a classe burguesa, já expressa no programa de governo239, ficou

evidente quando da escolha da equipe do presidente. Apenas a título de ilustração, citaremos: Henrique Meirelles escolhido como presidente do Banco Central (BC) e Antônio Palocci como Ministro da Fazenda. O primeiro foi “deputado eleito pelo PSDB e ex-presidente mundial do Bank of Boston, [...] o 7º maior banco dos EUA e, após o Citigroup, a segunda maior instituição credora do Brasil” (LEHER, 2003, p. 85). O segundo foi prefeito “de uma cidade paulista de médio porte, que promovera intensa privatização, incluindo a distribuição de água, e que tornou-se o braço das novas alianças do governo com o capital financeiro” (LEHER, 2003, p. 85).

No primeiro mandato de Lula a economia obteve crescimento sustentado através do ajuste das contas públicas e medidas destinadas à geração de superávits primários (TEIXEIRA; PINTO, 2012). A preferência em manter os compromissos tanto com a

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No Programa de Governo 2002 - Coligação Lula Presidente, há a seguinte afirmação: "o nosso governo não vai romper contratos nem revogar regras estabelecidas. Compromissos internacionais serão respeitados. Mudanças que forem necessárias serão feitas democraticamente, dentro dos marcos institucionais" (SILVA; ALENCAR, 2002, p. 5).

elite nacional quanto internacional impactou as políticas sociais. No âmbito da seguridade social, podemos destacar o surgimento em 2003 da focalizada política

de transferência de renda - bolsa família - e a reforma da previdência social240

(MARQUES; MENDES, 2007).

Tendo como pilar os programas de transferência de renda (em detrimento da universalização das políticas sociais) o governo Lula não rompeu com as

perspectivas neoliberais que estavam se desenrolando no Brasil241. O que também

teve repercussões para política de educação, assunto que discutiremos mais adiante.

Assim, há duas questões a serem ressaltadas. A primeira refere-se à continuidade das ações focalizadas nos mais pobres, previstas em documentos do governo Lula a exemplo do documento Gasto social do governo central: 2001 e 2002. O segundo diz respeito às parcerias entre o setor público e o setor privado (PPP), formando o setor público não-estatal, que se apresenta como forma de democratizar o acesso aos serviços públicos, mas que na verdade é uma forma de diluir as fronteiras entre o público e o privado, permitindo “o financiamento público para o setor privado e o financiamento privado dos serviços públicos” (LIMA, 2007, p. 113). Essa situação está clara na lei das PPP

A análise da Lei nº 11.079/2004 [...] demonstra que o governo federal destinará verbas públicas para o financiamento de políticas sociais focalizadas nos segmentos populacionais mais pobres; as demais políticas serão privatizadas, sob a necessária aparência de uma nova divisão de responsabilidades sociais nos marcos do pacto social proposto pelo

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Sobre a reforma da previdência social Marques e Mendes (2007) destacam a contrarreforma da previdência social dos funcionários públicos. Este projeto foi encaminhado para apreciação do Congresso Nacional em 2003 e foi aprovado no final do mesmo ano. Tal contrarreforma deixa claras as vantagens dadas ao capital financeiro em decorrência do incentivo à previdência privada

(MARQUES; MENDES, 2007). Citando Lesbaupin (2003, p. 15) “a proposta de reforma previdenciária

de Lula cria extraordinárias oportunidades de negócios para os bancos via fundos de pensão complementar”.

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Sobre esse assunto Coutinho (2006, p. 198) salienta: “Tenho dúvida sobre a possibilidade de aplicar à atual conjuntura, iniciada com o governo Collor, a categoria gramsciana de ‘revolução passiva’. Uma ‘revolução passiva’ implica algumas concessões às classes subalternas, como foi precisamente o caso do governo Vargas, do populismo em geral e até mesmo da ditadura militar (a qual, por exemplo, estendeu direitos previdenciários aos trabalhadores rurais e aos autônomos urbanos). Ao contrário, os últimos governos têm tido como meta apenas desconstruir direitos sociais já conquistados, o que talvez permita dizer que estamos numa época de ‘contrarreforma’ – argumenta em favor desta posição Behring [...] Mas, ainda que se trate de contrarreforma e não de revolução passiva, a justeza da aplicação da noção de ‘transformismo’ ao período que se inicia com o governo Cardoso e prossegue no governo Lula me parece inegável”.

governo Lula da Silva. Trata-se de uma nova estratégia de privatização dos serviços públicos, ampliando a ação dos setores privados e destruindo a concepção destes serviços como direitos sociais (LIMA, 2007, p. 121).

De acordo com Marques e Mendes (2006) para se manter no poder o governo Lula optou por cumprir a agenda política que ficou pendente ao final do governo FHC e construiu uma base de sustentação política a partir da população mais pobre e com menos experiência organizativa. Essa aproximação com a população pobre explica em boa medida a reeleição de Lula após disputar o segundo turno com Geraldo

Alckmin em 2006242. De acordo com Carreirão (2007, p. 110, 111)

A manutenção da estabilidade econômica (com inflação ainda menor do que no governo anterior); o crescimento do poder de compra do salário mínimo; a ampliação da abrangência e do volume de recursos destinados aos programas sociais do governo, que implicam em transferência de renda (especialmente o Bolsa Família) parecem ter neutralizado e superado, para grande parte do eleitorado, sobretudo o mais pobre, os efeitos negativos das denúncias de corrupção, fazendo com que a avaliação do governo fosse predominantemente positiva e influenciando na boa votação do presidente.

O governo Lula continuou seguindo os pressupostos do social-liberalismo ou do neoliberalismo da terceira via, pautado na impossível "humanização do capitalismo" em detrimento do "neoliberalismo clássico". A política do governo foi concentrada no ajuste fiscal, na estabilidade econômica, e nas parcerias com o setor privado (LIMA,

2007) tal como anunciava o seu programa de governo243.

Durante o seu segundo mandato, percebe-se no plano econômico os seguintes elementos: a) adoção de ações voltadas à ampliação do crédito ao consumidor e ao mutuário; b) aumento real no salário mínimo, c) expansão dos programas de transferência de renda direta, d) criação do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e ampliação da atuação do BNDES, e) medidas anticíclicas de combate à crise internacional a partir de 2009 (TEIXEIRA, PINTO, 2012).

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Em 2006 candidataram-se à presidência: Luís Inácio Lula da Silva (PT), Geraldo Alckmin (PSDB), Heloísa Helena (PSOL), Cristovam Buarque (PDT), José Maria Eymael (PSDC), Luciano Bivar (PSL), Ana Maria Rangel (PRP). Rui Pimenta (PCO) teve sua candidatura impugnada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) por não ter prestado contas de sua campanha presidencial em 2002 (CARREIRÃO, 2007).

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Nos referimos ao documento Lula Presidente - Programa de governo 2007/2010 (SILVA; ALENCAR, 2007).

Em termos mundiais o papel ocupado pelo Brasil na exportação de produtos primários permaneceu e se aprofundou. Apesar do crescimento de 10% do setor

industrial entre 1930 e 1980244, houve uma mudança nessa relação a partir do golpe

civil militar de 1964245, mas, principalmente após as eleições diretas na década de

1980. As privatizações foram acompanhadas “pela desnacionalização dos altos comandos da economia e a desregulação dos mercados de capital” (PETRAS, 2013, p. 12). Esse processo foi agravado no governo de FHC na medida em que

[...] estabeleceu o período de fluxo massivo de capital estrangeiro nos setores agrominerador, financeiro, de seguros e imobiliário. O aumento das taxas de juros, conforme demandado pelo Fundo Monetário Internacional (FMI), o Banco Mundial (BM) e o mercado especulativo imobiliário, elevou os custos de produção industrial. As baixas tarifas de Cardoso acabaram com os subsídios industriais e abriram as portas para a importação industrial. Essas políticas neoliberais contribuíram para o declínio absoluto e relativo da produção industrial (PETRAS, 2013, p. 12).

O governo petista não só tomou posse desta "herança" como a reafirmou. De acordo com Petras (2013, p. 13) o Brasil “voltou a ser um exportador de mercadorias, como soja, gado, ferro e metais, que tiveram suas exportações multiplicadas; enquanto tecidos, transporte e manufaturados tiveram suas exportações reduzidas”. Para este autor o Brasil transformou-se em um dos principais exportadores de produtos extrativistas no mundo. A dependência do Brasil em exportação de commodities foi contrabalanceada pela “massiva entrada de corporações multinacionais imperiais e fluxos financeiros de bancos estrangeiros. Mercados internacionais e bancos estrangeiros se tornaram a força propulsora do crescimento extrativo e falência industrial” (PETRAS, 2013, p. 13). A análise do autor leva em consideração os seguintes dados

Em 2005, o Brasil exportou US$ 55,3 bilhões em matéria-prima e US$ 44,2 bilhões em produtos manufaturados; em 2011, o Brasil triplicou sua exportação de matéria-prima para US$ 162,2 bilhões, enquanto sua exportação de produtos manufaturados cresceu para menos US$ 60,3 bilhões. Em outras palavras, a diferença entre o valor das exportações de matéria-prima e produtos manufaturados aumentou de US$ 13 bilhões para mais de US$ 100 bilhões nos últimos cinco anos do governo Lula. A relativa desindustrialização da economia, o desequilíbrio crescente entre o extrativismo dominante e o setor manufatureiro ilustra a reversão do Brasil para seu “estilo colonial de desenvolvimento” (PETRAS, 2013, p. 17).

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Crescimento sustentado por políticas estatais intervencionistas direcionadoras do fortalecimento de empresas nacionais públicas e privadas (PETRAS, 2013).

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De acordo com Petras (2013) a política econômica do período de ditadura civil-militar respaldou-se em uma aliança entre o capital estatal, o capital estrangeiro e o capital privado nacional, orientada principalmente para a exportação industrial e, em segundo lugar para as commodities agrícolas (como o café).

A especialização do Brasil na produção e exportação de commodities agrícolas (soja e café) e industriais (siderurgia, papel e celulose, derivados do petróleo, etc) deve-se a dois fatores fundamentais. Em primeiro lugar, a valorização do real dificultou as exportações e facilitou as importações. Desse modo, os ramos que dependem de competitividade tiveram suas vendas externas inviabilizadas e no âmbito do mercado interno sofreu com a concorrência dos produtos estrangeiros que se tornaram artificialmente mais baratos em decorrência da valorização do real. Em segundo lugar, países caracterizados por escassez de recursos naturais, como China e Índia, ao ampliar as importações de commodities, elevaram seus preços estimulando o crescimento deste setor, no qual o Brasil se insere (MAGALHÃES, 2010).

A ascensão do que Petras (2013) denomina de capitalismo extrativo se fez mediante o incentivo ao agronegócio e de grandes proprietários rurais. Observa-se inclusive, que os maiores investimentos em infraestrutura dos governos Lula e de sua sucessora Dilma (que abordaremos mais adiante) dirigiram-se a abertura de áreas florestais que antes não eram acessíveis para as empresas de gado. Sob os mandatos dos presidentes petistas “a agricultura comercial, especialmente a de

grãos de soja, se tornou a segunda maior causa do desmatamento da Amazônia”

(PETRAS, 2013, p. 20). Neste aspecto, embora não tenha ocorrido um deslocamento na hegemonia da fração burguesa bancário-financeira, observa-se durante o governo Lula o aumento relativo do poder da burguesia produtora e

exportadora de commodities246 (TEIXEIRA, PINTO, 2012).

Do que foi apresentado verificamos que as parcas melhorias para as condições de

vida da classe trabalhadora, vivenciadas no segundo mandato de Lula247, não

significaram um afastamento do Estado no que tange ao cumprimento de medidas

246

Este assunto nos remete a seguinte afirmação de Leher (2004, p. 21) "Um novo bloco de poder vem sendo forjado, agregando, sob a direção do capital financeiro, a burocracia sindical, as oligarquias e setores econômicos como o agrobusiness e, mais genericamente, o setor de exportação de commodities, setores que não necessitam de uma universidade pública capaz de produzir conhecimento novo. Ao contrário, aprofundam a condição capitalista dependente e, por conseguinte, a heteronomia cultural; por isso, estarão empenhados na contrarreforma, almejando, como indicado anteriormente, objetivos políticos".

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Maiores taxas de crescimento da economia, redução das taxas de desemprego, ampliação do crédito, e uma pequena melhora (na margem) da distribuição da renda (FILGUEIRAS et al., 2010).

requeridas pela elite nacional e internacional. Ao contrário, "a cooptação do sindicalismo e dos movimentos sociais, redirecionando suas energias para apoiar as políticas do governo" (FILGUEIRAS et al., 2010, p. 39) fomentou o consentimento dos setores dominados que "permitiram a Lula acomodar e compatibilizar interesses potencialmente conflitantes" (FILGUEIRAS et al., 2010, p. 39). Ao final, houve uma incorporação de demandas da classe trabalhadora que não feriram vigorosamente os interesses do capital.

Essas ponderações nos permitem afirmar que o "acordo feito pelo alto" entre participantes do PT e a classe burguesa não permitiram a realização de mudanças estruturais. Segundo Frigotto (2011, p. 241)

[...] ao não disputar um projeto societário antagônico à modernização e ao capitalismo dependente e, [...] ao estabelecer políticas e programas para a grande massa de desvalidos, harmonizando-as com os interesses da classe dominante (a minoria prepotente), o governo também não disputou um projeto educacional antagônico, no conteúdo, no método e na forma.

As ações do governo Lula para o ensino superior tiveram início oficialmente em 20 de outubro de 2003, quando instituiu o Grupo de Trabalho Interministerial (GTI) responsável por analisar a situação deste nível de ensino e apresentar um plano de ação visando a reestruturação das Instituições Federais de Ensino Superior

(IFES)248. Fizeram parte deste grupo 12 membros, sendo 2 representantes de cada

órgão citado a seguir: Ministério da Educação, Casa Civil, Secretaria Geral da Presidência da República, Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, Ministério da Ciência e Tecnologia, Ministério da Fazenda (OTRANTO, 2006).

O documento elaborado pelo GTI denominado Bases para o enfrentamento da crise emergencial das universidades brasileiras e roteiro para a reforma da universidade brasileira possui quatro partes. A primeira apresenta as ações emergenciais para o

enfrentamento da crise das universidades federais249. A segunda trata da autonomia

248

Este documento foi divulgado extra oficialmente em dezembro de 2003 (OTRANTO, 2006).

249

Nesta parte o documento reconhece a crise da universidade como um reflexo da crise fiscal do Estado sem problematizar de forma mais aprofundada essa suposta relação. Também aponta para uma preocupação com as instituições de ensino privadas em decorrência do “risco de uma inadimplência generalizada do alunado e de uma crescente desconfiança em relação a seus diplomas” (BRASIL, 2003a, s/p). Esse é um ponto importante que nos permite afirmar o quanto as ações levadas a efeito durante o governo Lula e que se estendeu no governo Dilma também privilegiou o setor privado haja vista o PROUNI, o FIES, dentre outros. Ao final deste primeiro item o

universitária. A terceira apresenta linhas de ação imediata para complementação de

recursos e o redesenho do quadro atual das universidades250 e a quarta indica as

etapas necessárias para a formulação e implantação da reforma universitária

brasileira251 (BRASIL, 2003a; LIMA 2004).

Sendo a autonomia universitária objeto do presente estudo, lançaremos foco sobre este tema. A concepção de autonomia presente no documento elaborado pelo GTI é totalmente desconexa dos anseios dos movimentos em favor do ensino público, gratuito e de qualidade. Dado a clareza como tal concepção aparece no relatório vale aqui a sua citação direta

Se, por um lado, a gravidade da crise emergencial das universidades está na falta de recursos financeiros do setor público, não se pode negar que, por outro lado, a crise decorre também das amarras legais que impedem

cada universidade de captar e administrar recursos, definir prioridades e

estruturas de gastos e planejamento. Por isso, a imediata garantia de

grupo de trabalho coloca como ações emergenciais: “a. Formular e implementar as diretrizes de um plano emergencial para equacionar e superar o endividamento progressivo junto aos fornecedores, combinado com a elevação dos recursos para os custos operacionais. b. Abrir concursos para preencher as vagas de professores e servidores, originadas por demissões, aposentadorias e exonerações, não preenchidas ao longo dos últimos dez anos, e para substituir os professores contratados em caráter temporário por professores efetivos. Assegurar ainda recursos para cobrir os déficits em manutenção e investimento. c. Outorgar autonomia para garantir às universidades

federais o uso mais racional de recursos, maior eficiência no seu gerenciamento e liberdade para captar e aplicar recursos extra-orçamentários, além da autonomia didático-pedagógica

[observe que a autonomia didático-pedagógica é pouco valorizada]. d. Garantir novas vagas: (i) concedendo bolsas de aproveitamento e regionalização para a contratação de doutores que desejem se dedicar ao magistério, especialmente nas licenciaturas em física, matemática, biologia, química, nos locais carentes de pessoal com formação superior, (ii) adotando critérios de regionalização e interiorização na política de abertura de vagas para concurso, juntamente com um auxílio para implantação de novas linhas de pesquisa para esses novos contratados, e (iii) reintegrando aposentados às atividades das universidades federais, mediante a implementação de um programa especial de bolsas de excelência” (BRASIL, 2003a, grifo nosso, s/p).

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Como medidas centrais o documento indica o pacto de educação para o desenvolvimento inclusivo e a educação à distância (BRASIL, 2003a).

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Fazem parte das etapas: a aprovação do referido documento pela Presidência da República; lançamento, em março, do Movimento Nacional Universidade XXI, para conduzir a reforma universitária; a criação de um grupo de trabalho que, em diálogo com a sociedade, elabore o documento base para a proposta de reforma; a divulgação em abril, pelo MEC e por esse grupo de trabalho, do acervo de propostas relacionadas com a reforma universitária, e de uma proposta do novo desenho do sistema universitário brasileiro para debate; ao longo de maio, a escolha de um dia por semana que será dedicado ao debate da proposta com a comunidade universitária e todos os setores da sociedade brasileira; em junho, a formulação (com base nas contribuições recebidas) do documento da reforma universitária, a ser apresentado no primeiro semestre de 2004 ao Congresso Nacional, visando sua transformação em Lei; no segundo semestre, debate no Congresso Nacional, objetivando aprovar, ainda em 2004, os novos instrumentos de promoção e construção da Universidade XXI no Brasil, que seria implementado a partir de 2005 (BRASIL, 2003a).

autonomia às universidades é um passo necessário para enfrentar a emergência. A autonomia deve conferir à universidade, de forma participativa e transparente, competência para dispor sobre sua organização administrativa, suas questões financeiras e suas políticas em matéria educacional, sem interferência de outros órgãos do Governo, nos

limites constitucionais. A relação com o Governo e o Estado se daria no momento de sua avaliação, quanto aos aspectos da boa gerência, feita

pelo TCU, e pelo Sistema Nacional de Avaliação e Progresso do Ensino Superior do MEC.

2.1 Autonomia didático-científica

A autonomia didático-científica confere à universidade, sob a égide do pluralismo de ideias, o direito à liberdade do ensino e de comunicação do pensamento. No âmbito da autonomia didática estariam: o direito de organizar ensino, pesquisa e extensão, de criar e extinguir cursos, de elaborar e estabelecer currículos para a graduação e pós-graduação, de estabelecer critérios de acesso de alunos em todos os níveis e de conferir